Cinema Notebook: [Rec] (2007)

01-07-2011
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Numa noite como tantas outras, uma equipa de reportagem de uma estação espanhola de televisão decide acompanhar a vida de um quartel de bombeiros local. Durante a madrugada – que estava a ser demasiado calma e apática para o gosto da jornalista de serviço - eis que surge finalmente uma chamada de emergência. Apesar de ser, segundo o telefonema, apenas uma senhora de idade presa no seu apartamento, sempre era algo para mostrar mais tarde. Mal sabiam eles que acabariam por ser encarcerados no prédio pelas autoridades, que isolam o edifício de forma célere e tresloucada. “Mas que raio se passa aqui?”, pergunta, a certa altura, o operador de imagem. “Não faço ideia! Mas não desligues essa camerâ, aconteça o que acontecer, ouviste?”, replica a jornalista. E é esta mesma a perspectiva que nos é dada: imagens aparentemente não editadas, com uma tremedeira intolerável, num estilo semelhante ao recente “Nome de Código: Cloverfield” ou ao semi-pioneiro do modo artístico representado, “O Projecto Blair Witch”.“[Rec]” foi o heróico vencedor da última edição do Fantasporto ao arrecadar o Grande Prémio de Melhor Filme, batendo o favorito à partida “El Orfanato” - outra produção espanhola - na corrida final pelo galardão. Apesar da sua curta duração – cerca de setenta e cinco minutos limpos (sem contabilizar os créditos finais, portanto) -, “[Rec]” é um mockumentário de zombies eficaz e compacto, que consegue criar, de modo incessante e de forma equilibrada um nível de tensão que se torna mais angustiante a cada minuto que passa e que culmina numa cuidada cena dramática final, que oferece ao espectador o que havia sido preterido até então: o domínio da paranóia de sugestão ao invés do medo violento e carnal que tomou, a certa altura, a fita por completo. E deste modo, Jaume Balagueró – responsável pelos levianos “Darkness” e “Fragile” - e Paco Plaza conseguem ofuscar algumas debilidades estruturais que colocavam “[Rec]” ao nível de tantas outras obras modernas de terror.Sem grande preocupação em levar as personagens a uma plataforma mais íntima, a dupla espanhola não cai por isso mesmo no erro de recorrer a uma ligação excessivamente sentimental entre as personagens principais para dar qualquer tipo de profundidade emocional que seria desnecessária à trama. Com um elenco de cariz realista comandado pela berrante Manuela Velasco – que conquistou o Goya de Melhor Actriz com este papel -, resta regozijar o formidável esforço colocado ao serviço da sonoplastia da fita, bem como o muitas vezes desprezado trabalho de caracterização estética das monstruosidades perversas de “[Rec]”. Com remake norte-americano já com estreia marcada – e pelo que o trailer dá a entender, muito fiel à produção espanhola -, “[Rec]” é a prova de que o cinema espanhol está a ganhar notoriedade (merecida) em várias frentes, ficando cada vez menos dependente do rótulo “Pedro Almodóvar”.


Numa noite como tantas outras, uma equipa de reportagem de uma estação espanhola de televisão decide acompanhar a vida de um quartel de bombeiros local. Durante a madrugada – que estava a ser demasiado calma e apática para o gosto da jornalista de serviço - eis que surge finalmente uma chamada de emergência. Apesar de ser, segundo o telefonema, apenas uma senhora de idade presa no seu apartamento, sempre era algo para mostrar mais tarde. Mal sabiam eles que acabariam por ser encarcerados no prédio pelas autoridades, que isolam o edifício de forma célere e tresloucada. “Mas que raio se passa aqui?”, pergunta, a certa altura, o operador de imagem. “Não faço ideia! Mas não desligues essa camerâ, aconteça o que acontecer, ouviste?”, replica a jornalista. E é esta mesma a perspectiva que nos é dada: imagens aparentemente não editadas, com uma tremedeira intolerável, num estilo semelhante ao recente “Nome de Código: Cloverfield” ou ao semi-pioneiro do modo artístico representado, “O Projecto Blair Witch”.“[Rec]” foi o heróico vencedor da última edição do Fantasporto ao arrecadar o Grande Prémio de Melhor Filme, batendo o favorito à partida “El Orfanato” - outra produção espanhola - na corrida final pelo galardão. Apesar da sua curta duração – cerca de setenta e cinco minutos limpos (sem contabilizar os créditos finais, portanto) -, “[Rec]” é um mockumentário de zombies eficaz e compacto, que consegue criar, de modo incessante e de forma equilibrada um nível de tensão que se torna mais angustiante a cada minuto que passa e que culmina numa cuidada cena dramática final, que oferece ao espectador o que havia sido preterido até então: o domínio da paranóia de sugestão ao invés do medo violento e carnal que tomou, a certa altura, a fita por completo. E deste modo, Jaume Balagueró – responsável pelos levianos “Darkness” e “Fragile” - e Paco Plaza conseguem ofuscar algumas debilidades estruturais que colocavam “[Rec]” ao nível de tantas outras obras modernas de terror.Sem grande preocupação em levar as personagens a uma plataforma mais íntima, a dupla espanhola não cai por isso mesmo no erro de recorrer a uma ligação excessivamente sentimental entre as personagens principais para dar qualquer tipo de profundidade emocional que seria desnecessária à trama. Com um elenco de cariz realista comandado pela berrante Manuela Velasco – que conquistou o Goya de Melhor Actriz com este papel -, resta regozijar o formidável esforço colocado ao serviço da sonoplastia da fita, bem como o muitas vezes desprezado trabalho de caracterização estética das monstruosidades perversas de “[Rec]”. Com remake norte-americano já com estreia marcada – e pelo que o trailer dá a entender, muito fiel à produção espanhola -, “[Rec]” é a prova de que o cinema espanhol está a ganhar notoriedade (merecida) em várias frentes, ficando cada vez menos dependente do rótulo “Pedro Almodóvar”.

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