O discurso dos cínicos

08-10-2014
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O discurso dos cínicos

Já não é a primeira nem a segunda vez que escrevo sobre a apropriação indevida das palavras nos discursos dos políticos e na tentativa porfiada de afirmarem exactamente o contrário daquilo que fazem. Exemplo disto foi este Congresso do PSD onde o cinismo encontrou culminâncias inatingidas. Atentemos em algumas frases de Passos Coelho, poucas: O […]

Já não é a primeira nem a segunda vez que escrevo sobre a apropriação indevida das palavras nos discursos dos políticos e na tentativa porfiada de afirmarem exactamente o contrário daquilo que fazem. Exemplo disto foi este Congresso do PSD onde o cinismo encontrou culminâncias inatingidas.

Atentemos em algumas frases de Passos Coelho, poucas:

O 2º resgate “representaria para todos os portugueses uma péssima notícia” pois traria “sacríficos incomparavelmente maiores” do que os já feitos…

(desmesura num condicional e com um advérbio de modo aquilo de que hipoteticamente nos livrou…)

“Não é preciso fazer um contrato com o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia para sabermos o que é preciso fazer…”

(andou sempre a reboque e agora quer parecer um lidere incontestado…)

“Eu não quero festejar porque verdadeiramente nós não temos nenhuma vontade de festejar”

(não tem feito outra coisa: deita foguetes e apanha as canas, agora vem com o compungimento hipócrita…)

“muitas pessoas no país ainda não sentem a melhoria da macroeconomia” e acrescenta “um Governo que não tem noção dos sacrifícios do país nunca conseguirá governar de acordo com as aspirações dos cidadãos”

(é exactamente o governo que encabeça aquele que se borrifa para os sacrificados – sempre os mesmos, os mais fracos – e quanto a aspirações dos cidadãos, só a sua demissão imediata…)

“Não queremos um país fechado sobre si próprio, nem o regresso do escudo. Queremos um país com um Estado social forte — e sabemos que é forte, comparado a outros países — mas que só será sustentável se a economia o permitir e as escolhas o determinarem”

(a demência emerge…)

“Foi possível chegar aqui e evitar uma situação mais grave, porque trilhámos o nosso caminho e tomámos a nossas opções, e quero, com muita humildade, apresentar a minha enorme gratidão perante todos os portugueses, que, com todos os sacrifícios, fizeram que este pudesse vir a ser um momento de esperança para o futuro de Portugal”

(humilde e grato…, o espelho estilhaçou-se)

“Será preciso pedir à troika que nos diga o que temos de fazer? Não sabemos nós encontrar as medidas de que precisamos?”

(o Rambo que só pia nas costas da troika…)

“Essa era a melhor oferta que os partidos podiam fazer no 25 de Abril”, afirmou, “era uma convergência política nos 40 anos da Revolução”

(falar na Revolução de Abril, naquela boca, é um paroxismo de escárnio…)

“a crise vivida no país não tem paralelo com os outros dois pedidos de ajuda externa efetuados nos últimos 40 anos pelo Estado português, tendo comparação apenas com a bancarrota que Portugal viveu no final do século XIX.”

(e já agora com o terramoto de 1755 e a erupção do Etna e o tsunami nas Filipinas, não?)

As inverdades são tantas vezes repetidas e com um ar tão convicto de jesuíta no púlpito, que há quem nelas acredite. O povo afirma: “Uma mentira muitas vezes repetida torna-se uma verdade.” Esta postura não é exclusiva de Passos Coelho, mas é, no caso, de muita mestria de quem lhe serve as discursatas em bandeja, pois faltar-lhe-á competência para tão hábil urdidura.

Este discurso não tem nenhum valor de comunicação. São chavões de impacto para aquecer as plateias. Existe apenas porque tem uma coincidência entre o real e o proferido. Um código que exprime uma relação contrária ao seu conteúdo. Usa termos progressistas para veicular cláusulas de conjuração. Muitos substantivos para dar cobertura da realidade. O verbo perde valor. O adjectivo e o advérbio funcionam como uma revigoração para apresentar inocência e credibilidade. Veiculam o vazio da retórica… O oco que ecoa na acefalia.

Habituemo-nos: quando este homem fala basta virarmos o discurso ao contrário para percebermos a verdade das suas palavras…

Entretanto, apresentou os orgãos Nacionais do Partido, sem surpresas à excepção do antigo colega da Tecnoforma, o inefável Dr. Relvas (ou agora é engenheiro?)…

Mesa do Congresso

– Fernando Ruas (Presidente)

– Hermínio Loureiro e Fernando Costa (Vice-Presidentes)

Conselho de Jurisdição Nacional

– Calvão da Silva (Presidente)

Comissão Nacional de Auditoria Financeira

– Pedro Reis (Presidente)

Conselho Nacional

– Miguel Relvas – a cereja em cima do bolo…

– Nilza de Sena

– Hélder Silva

– Cancela de Moura

– Vítor Martins

Comissão Política Nacional

– Jorge Moreira da Silva (1º Vice-Presidente)

– Marco António Costa (Vice-Presidente e Coordenador Permanente da CPN)

– Teresa Leal Coelho (Vice-Presidente)

– Pedro Pinto (Vice-Presidente)

– José Matos Correia (Vice-Presidente)

– Carlos Carreiras (Vice-Presidente)

– José Matos Rosa (Secretário-Geral)

Director do “Povo Livre”

– Miguel Santos

Comissão de Relações Internacionais

– Braga de Macedo

Comunidades Portuguesas

– Carlos Gonçalves

O Congresso do CDS foi o que se viu; este idem aspas, o do PS o que se prevê… Em suma, tudo mais do mesmo; uma cáfila de trauliteiros travestidos em missionários, a evangelizar as hostes, galvanizando-as com a imagem do lauto banquete para o qual eles, e só eles, foram convivialmente convocados. A manjedoura do poder.

O discurso dos cínicos

Já não é a primeira nem a segunda vez que escrevo sobre a apropriação indevida das palavras nos discursos dos políticos e na tentativa porfiada de afirmarem exactamente o contrário daquilo que fazem. Exemplo disto foi este Congresso do PSD onde o cinismo encontrou culminâncias inatingidas. Atentemos em algumas frases de Passos Coelho, poucas: O […]

Já não é a primeira nem a segunda vez que escrevo sobre a apropriação indevida das palavras nos discursos dos políticos e na tentativa porfiada de afirmarem exactamente o contrário daquilo que fazem. Exemplo disto foi este Congresso do PSD onde o cinismo encontrou culminâncias inatingidas.

Atentemos em algumas frases de Passos Coelho, poucas:

O 2º resgate “representaria para todos os portugueses uma péssima notícia” pois traria “sacríficos incomparavelmente maiores” do que os já feitos…

(desmesura num condicional e com um advérbio de modo aquilo de que hipoteticamente nos livrou…)

“Não é preciso fazer um contrato com o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia para sabermos o que é preciso fazer…”

(andou sempre a reboque e agora quer parecer um lidere incontestado…)

“Eu não quero festejar porque verdadeiramente nós não temos nenhuma vontade de festejar”

(não tem feito outra coisa: deita foguetes e apanha as canas, agora vem com o compungimento hipócrita…)

“muitas pessoas no país ainda não sentem a melhoria da macroeconomia” e acrescenta “um Governo que não tem noção dos sacrifícios do país nunca conseguirá governar de acordo com as aspirações dos cidadãos”

(é exactamente o governo que encabeça aquele que se borrifa para os sacrificados – sempre os mesmos, os mais fracos – e quanto a aspirações dos cidadãos, só a sua demissão imediata…)

“Não queremos um país fechado sobre si próprio, nem o regresso do escudo. Queremos um país com um Estado social forte — e sabemos que é forte, comparado a outros países — mas que só será sustentável se a economia o permitir e as escolhas o determinarem”

(a demência emerge…)

“Foi possível chegar aqui e evitar uma situação mais grave, porque trilhámos o nosso caminho e tomámos a nossas opções, e quero, com muita humildade, apresentar a minha enorme gratidão perante todos os portugueses, que, com todos os sacrifícios, fizeram que este pudesse vir a ser um momento de esperança para o futuro de Portugal”

(humilde e grato…, o espelho estilhaçou-se)

“Será preciso pedir à troika que nos diga o que temos de fazer? Não sabemos nós encontrar as medidas de que precisamos?”

(o Rambo que só pia nas costas da troika…)

“Essa era a melhor oferta que os partidos podiam fazer no 25 de Abril”, afirmou, “era uma convergência política nos 40 anos da Revolução”

(falar na Revolução de Abril, naquela boca, é um paroxismo de escárnio…)

“a crise vivida no país não tem paralelo com os outros dois pedidos de ajuda externa efetuados nos últimos 40 anos pelo Estado português, tendo comparação apenas com a bancarrota que Portugal viveu no final do século XIX.”

(e já agora com o terramoto de 1755 e a erupção do Etna e o tsunami nas Filipinas, não?)

As inverdades são tantas vezes repetidas e com um ar tão convicto de jesuíta no púlpito, que há quem nelas acredite. O povo afirma: “Uma mentira muitas vezes repetida torna-se uma verdade.” Esta postura não é exclusiva de Passos Coelho, mas é, no caso, de muita mestria de quem lhe serve as discursatas em bandeja, pois faltar-lhe-á competência para tão hábil urdidura.

Este discurso não tem nenhum valor de comunicação. São chavões de impacto para aquecer as plateias. Existe apenas porque tem uma coincidência entre o real e o proferido. Um código que exprime uma relação contrária ao seu conteúdo. Usa termos progressistas para veicular cláusulas de conjuração. Muitos substantivos para dar cobertura da realidade. O verbo perde valor. O adjectivo e o advérbio funcionam como uma revigoração para apresentar inocência e credibilidade. Veiculam o vazio da retórica… O oco que ecoa na acefalia.

Habituemo-nos: quando este homem fala basta virarmos o discurso ao contrário para percebermos a verdade das suas palavras…

Entretanto, apresentou os orgãos Nacionais do Partido, sem surpresas à excepção do antigo colega da Tecnoforma, o inefável Dr. Relvas (ou agora é engenheiro?)…

Mesa do Congresso

– Fernando Ruas (Presidente)

– Hermínio Loureiro e Fernando Costa (Vice-Presidentes)

Conselho de Jurisdição Nacional

– Calvão da Silva (Presidente)

Comissão Nacional de Auditoria Financeira

– Pedro Reis (Presidente)

Conselho Nacional

– Miguel Relvas – a cereja em cima do bolo…

– Nilza de Sena

– Hélder Silva

– Cancela de Moura

– Vítor Martins

Comissão Política Nacional

– Jorge Moreira da Silva (1º Vice-Presidente)

– Marco António Costa (Vice-Presidente e Coordenador Permanente da CPN)

– Teresa Leal Coelho (Vice-Presidente)

– Pedro Pinto (Vice-Presidente)

– José Matos Correia (Vice-Presidente)

– Carlos Carreiras (Vice-Presidente)

– José Matos Rosa (Secretário-Geral)

Director do “Povo Livre”

– Miguel Santos

Comissão de Relações Internacionais

– Braga de Macedo

Comunidades Portuguesas

– Carlos Gonçalves

O Congresso do CDS foi o que se viu; este idem aspas, o do PS o que se prevê… Em suma, tudo mais do mesmo; uma cáfila de trauliteiros travestidos em missionários, a evangelizar as hostes, galvanizando-as com a imagem do lauto banquete para o qual eles, e só eles, foram convivialmente convocados. A manjedoura do poder.

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