A hora de António Costa. Xeque-mate ou “reflexo do náufrago”?

11-10-2015
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O líder socialista não se dá por derrotado. A questão é se terá condições para sair mais forte deste ciclo ou se está condenado a ser transitório. Ainda aí vêm os testes do OE e das presidenciais.

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Conquistou o Rato numa luta que deixou marcas. Partiu para as legislativas para governar e governar com maioria absoluta. Perdeu, mas não deixou a liderança do PS. Agora, parece não excluir a hipótese de unir a esquerda para governar. Bluff? Ninguém se arrisca a dizê-lo de forma categórica – mas, no póquer, o trio bate sempre o par. Ao mesmo tempo, conversa com a direita, que parece desconfiada, mas disposta a ver até onde vai. No horizonte, Belém parece reservado a Marcelo. Nóvoa – o escolhido – e Maria – a imposta – dividem o partido e, olhando para as sondagens, dificilmente farão mossa ao professor. O caminho é cheio de obstáculos. António Costa conseguirá resistir a tudo isto e sair reforçado? Ou todas as suas fichas políticas voaram no dia 4 de outubro de 2015? As opiniões dividem-se.

Para João Cardoso Rosas, da Universidade do Minho, as hipóteses do socialista são residuais. “António Costa está no fio da navalha” entre “duas opções muito arriscadas“, começa por dizer o politólogo ao Observador. O jogo que o líder socialista que decidiu jogar – falar à esquerda e à direita – “foi a saída que encontrou para se tentar salvar”. O “reflexo do náufrago” que se tenta agarrar ao bote para não submergir, explica.

António Costa “percebeu que estava encurralado“, sobretudo depois do discurso de Cavaco Silva. Neste momento, tem duas soluções: ou fica na história como o líder socialista “que serviu de muleta da coligação” quando tinha tudo para a deixar cair; ou como o líder que conseguiu “romper”, unindo a esquerda e provocando a queda de um Governo legitimado nas urnas. O socialista sabe disso e pode estar a tentar “algo surpreendente” que mudaria “a própria natureza do regime”.

Até porque é a “sobrevivência política” de um líder que “saiu muito fragilizado das eleições”, mas também a sobrevivência política da entourage que o acompanhou, que estão em jogo, continua João Cardoso Rosas. Daí a tentação de falar à esquerda e derrubar Passos e Portas já.

A curto prazo, uma solução dessas inclinaria o tabuleiro a favor de Costa? O politólogo acredita que sim. “Num primeiro momento, António Costa sairia como um líder ganhador e como o grande vencedor destas eleições”. Mas, “o estado de graça duraria pouco“, porque o socialista teria “muitas dificuldades” em gerir a relação interna com o Bloco de Esquerda e CDU, ao mesmo tempo que respondia perante Bruxelas e perante os credores. Uma aposta dessa natureza revelar-se-ia uma “aposta perdida“, afirma.

"António Costa está no fio da navalha" entre "duas opções muito arriscadas" João Cardoso Rosas, politólogo

André Freire, o politólogo que nestas eleições foi número cinco do Livre/Tempo de Avançar por Lisboa, não podia discordar mais. Ao Observador, Freire faz questão de contrariar a tese de que os governos PS/PSD ou PS/CDS são sinónimo de estabilidade. “São instáveis e este assim o seria“. Por isso, o argumento para empurrar um possível acordo entre PS, BE e CDU para o plano da instabilidade não cola, insiste.

Mesmo reconhecendo que o secretário-geral socialista saiu “fragilizado” destas eleições e que manter-se “no poder depois de ter ficado em segundo lugar pode ser problemático”, André Freire acredita que “tudo pode mudar se António Costa conseguir agora liderar uma alternativa de esquerda“. Aí, poderia sair na fotografia para memória futura como um “líder ganhador”.

Uma solução dessas passaria pelo crivo de Aníbal Cavaco Silva? “O Presidente da República não tem margem política para recusar essa solução“, defende André Freire. Para o politólogo, António Costa tem tudo a ganhar se colocar todas as suas fichas à esquerda e tudo a perder se tentar a sorte à direita.

“Se o fizesse contrariava tudo o que disse na campanha, de querer acabar com o conceito de arco de governabilidade” e perderia toda a margem dentro do partido. “Do ponto de vista interno, seria uma derrota para António Costa. Se Costa se voltasse ao centro, usando como justificação a necessidade de salvar o país, sairia fragilizado e dificilmente seria reeleito. Para ocupar esse espaço já existe Francisco Assis”, explica André Freire.

Para o politólogo, o ideal em democracia, “era que os líderes não saltassem sempre fora de cada vez que perdem eleições”. Mas isso não significa que vale de tudo. “Não podem contradizer tudo o que disseram em campanha” em nome da sobrevivência política.

"Tudo pode mudar se António Costa conseguir agora liderar uma alternativa de esquerda" André Freire

No PS está tudo à espera do que Costa vai fazer

António Costa está a tentar fechar todos os dossiers até a terça-feira, ainda antes da reunião da comissão política do PS. Como o Público escreve esta sexta-feira, este órgão tem de aprovar qualquer decisão sobre um possível acordo desenhado entre o líder socialista e outros partidos – seja com a coligação, seja à esquerda.

No PS paira um silêncio ruidoso. Ao Observador, um dos dirigentes socialistas disse que uma solução governativa à esquerda nunca passará na comissão política. Mas, entre seguristas, existe o receio de que tal possa mesmo vir a acontecer. Fala-se, entre dentes, de um “partido fantasma“, dominado por “poderes fáticos” e motivado por um único objetivo comum: “chegar ao poder” custe o que custar, mesmo que isso signifique aliar-se à esquerda.

A perceção entre alguns socialistas é de que Costa tem todos os trunfos na mão. O líder socialista controla a comissão política e, como sublinharam várias pessoas ouvidas pelo Observador, não há capacidade de mobilizar socráticos e seguristas para que, juntos, possam derrubar uma eventual solução à esquerda. Se decidir derrubar já Passos e Portas, António Costa terá a força e todo o apoio interno que precisa.

Todo o plano pode ser muito mais abrangente do que a disposição das peças de xadrez parecem mostrar. Há, entre socialistas, quem acredite que a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa como próximo Presidente da República poderá ser a chave que faltava para dar viabilidade a um governo socialista apoiado por Bloco e CDU. E Costa poderá estar a contar com isso. Xeque-mate, diria o líder socialista.

No dia em que apresentou a candidatura a Belém, Marcelo Rebelo de Sousa apelou ao “diálogo e à tolerância”, às “convergências alargadas” e à necessidade de “construir pontes”. E acrescentou: “A estabilidade tem de estar ao serviço do combate à pobreza, isto é, ao serviço das pessoas”. Um discurso ao centro que, no limite, não exclui a hipótese de dar luz verde a uma eventual solução governativa à esquerda.

Horas antes, António Costa reconhecia que Marcelo Rebelo de Sousa era um “candidato forte” às presidenciais de 2016, mas mostrava, no entanto, confiança na passagem à segunda volta de um candidato da área socialista para o sufrágio de janeiro. Vale o que vale, claro.

Do outro canto do ringue que se começa a desenhar, Francisco Assis, na primeira vez que falou depois de conhecidos os resultados eleitorais, deixou claro que estar na oposição não pode significar “uma indisponibilidade de princípio para a viabilização dos instrumentos imprescindíveis à governação do país” e apontou o caminho: negociem ao centro, esqueçam a esquerda. “[Com este resultado abriu-se] uma possibilidade real para a realização de um diálogo útil entre o Governo e a principal força da oposição, sem pôr em causa a identidade nem de um nem de outro”, escreveu Assis na terça-feira.

Os recados do eurodeputado não se ficaram por aqui: além de deixar claro que era “agora ainda mais importante garantir a eleição de um Presidente da República oriundo do nosso espaço político”, Assis atirou para depois das presidenciais a discussão pela liderança do partido. De uma penada, o homem que abandonou o congresso de consagração de Costa por entre críticas aos “discursos de fantasia de esquerda” tentou marcar o ritmo e o modus operandi do PS.

Mas o líder socialista é um jogador e pode estar a tentar outra estratégia quando todos estão concentrados a tentar descortinar se faz all in ou se desiste do jogo. É isso que diz João Cardoso Rosas. Ameaçando juntar-se à esquerda, “uma ameaça que é credível” insiste Cardoso Rosas, forçava Passos e Portas a cederem e conseguia “um acordo especialmente favorável” para o PS.

Assim, “não teria impedido a formação do Governo” e seria visto como uma “muleta” da coligação, mas uma muleta “reforçada” pelo peso de ter tido uma palavra a dizer. Uma situação win/win para quem perdeu quase tudo e que dava mais força ao líder socialista para sobreviver à oposição interna. Estratégia possível? Sim, diz Cardoso Rosas. Mas “muito difícil de realizar” porque a “coligação também vai jogar as suas cartadas”.

A somar a tudo isto, existem ainda as eleições presidenciais. António Costa viu a oposição interna a cozinhar a candidatura de Maria de Belém e foi forçado a recuar no apoio a Sampaio da Nóvoa. Ou isso, “ou romperia o partido”, sublinha Cardoso Rosas. A solução? Não apoiar nenhum candidato até à segunda volta das presidenciais. Mas, do outro lado, vai estar o (super)favorito Marcelo Rebelo de Sousa, que esta sexta-feira apresentou a candidatura a Belém, depois de meses a preparar terreno e a controlar à distância o ritmo da corrida.

O secretário-geral socialista arrisca-se, por isso, a apresentar-se no congresso extraordinário como o líder que rompeu o ciclo vitorioso (autárquicas e europeias) e perdeu duas eleições de seguida (legislativas e presidenciais). Conseguirá ser reconduzido no cargo? João Cardoso Rosas tem muitas dúvidas.

“Não vejo como António Costa possa conseguir sobreviver ao congresso extraordinário. Neste momento, está num beco sem saída. Seja qual for a solução que venha a conseguir – encostar-se à coligação de direita ou à esquerda – haverá ruturas internas dentro do partido“, defende o politólogo. O que segura Costa é o “facto de o PS estar neste momento muito perdido” e de ainda não ter aparecido “nenhum challenger suficiente credível. Os que apareceram não são relevantes. Vieram só ocupar terreno”. Não significa que esse challenger não venha a aparecer.

E, mesmo ultrapassando todos estes obstáculos, o secretário-geral socialista pode alimentar esperanças de se manter como líder do maior partido da oposição e vir a disputar o lugar de primeiro-ministro nas próximas eleições? “Não tenho bola de cristal”, mas tendo em conta “o imenso desgaste” político do lugar, Cardoso Rosas acredita que Costa não conseguiria o regresso triunfante. “Voltava a apresentar-se a eleições e arriscava-se a perder novamente“, conclui.

"Existe uma ala mainstream do PS que não quererá abandonar António Costa" António Costa Pinto

António Costa Pinto, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, tem uma tese contrária à de João Cardoso Rosas. “A saída de um líder que perde eleições não tem de ser uma consequência imediata. Não tem de ser um automatismo nas democracias”.

À cabeça vem o exemplo de Francisco Sá Carneiro, que perde as legislativas de 1976 para Mário Soares e, ainda assim, consegue resistir na liderança do partido. Três anos depois, os papeis invertem-se: Mário Soares perde as eleições de 1979 para Francisco Sá Carneiro e regressa vitorioso em 1983. Dezasseis anos mais tarde, Durão Barroso perde as legislativas de 1999 para António Guterres, sobrevive na liderança do PSD, e vence as de 2002.

Mas os três casos têm particularidades que não se aplicam a António Costa: Soares e Sá Carneiro eram fundadores dos respetivos partidos – e, a bem da verdade, os tempos eram outros; quanto a Barroso, aterrou na liderança de um partido esfrangalhado pela demissão de Marcelo Rebelo de Sousa e a cinco meses de umas eleições que ninguém queria disputar contra Guterres. Já Costa, tirou António José Seguro da liderança do PS e perdeu umas eleições que, a maioria dos analistas, dava como certas para o PS. “É, [por isso], difícil e perigoso fazer paralelismos“, alerta António Costa Pinto, em conversa com o Observador.

Ainda assim, o politólogo reconhece que a vitória nas eleições “é o motor fundamental para a sobrevivência dos líderes dos grandes partidos” e que António Costa está numa “posição relativamente frágil.

A continuação à frente do PS, explica o politólogo, “vai depender, em primeiro lugar, da vontade do próprio“, da “conjuntura interna e partidária” e da força que tiver “o desafio à liderança” do partido.

Para Costa Pinto, no entanto, o socialista pode conseguir sobreviver porque, “num contexto de um governo minoritário, o PS será um partido de charneira“. Com isso em cima da mesa, o secretário-geral socialista será um jogador demasiado importante para ser atirado para fora do jogo.

Além disso, existe, também, a “hipótese de o governo não sobreviver a curto-médio prazo” o que coloca o partido em sentido de alerta. “Existe uma ala mainstream do PS que não quererá abandonar António Costa” até porque não existe, para já, “uma alternativa mais forte”. A hipótese de o país voltar às urnas dentro em breve não está excluída.

E uma possível derrota nas presidenciais? Não fragilizaria ainda mais o líder socialista? “Existem muitas variáveis em jogo. As presidenciais não têm grande importância” neste momento, desvaloriza António Costa Pinto.

"Não haverá grandes possibilidades [de Costa ser reeleito]. Não acredito que os partidos sejam masoquistas" Viriato Soromenho Marques

Em equipa que ganha não se mexe é uma máxima que se aplica geralmente aos vencedores. O seu inverso também costuma ser verdade. E é isso que começa por dizer Viriato Soromenho Marques. “Quando há uma derrota muda-se de treinador. António Costa assumiu a liderança do partido com o objetivo de conseguir a maioria absoluta e perdeu. Não pode continuar à frente do PS“.

Para Soromenho Marques, a saída de Costa da liderança do partido seria a chicotada psicológica num partido que “está escavacado e precisa de ser renovado. Um dirigente que não consegue sequer controlar o seu partido não pode continuar”, insiste.

Até ao congresso extraordinário, o “PS e António Costa têm um dever: contribuir para que haja um governo estável” e não caírem na “estupidez” de insistirem no bloqueio. O professor universitário acredita que o PS tem a obrigação de ser “inteligente” e abster-se na votação do programa do Governo e na discussão sobre o Orçamento.

No futuro, “é pouco provável” que António Costa “venha a ser reeleito” se o partido se abrir novamente a primárias. “Não haverá grandes possibilidades. Não acredito que os partidos sejam masoquistas“, resume Soromenho Marques.

Os líderes derrotados que se mantiveram no poder: de Churchill a Miterrand, de González a Berlusconi. E Barroso também

A decisão de António Costa de não se demitir da direção do PS mesmo depois de ter perdido as eleições legislativas e – mais relevante – a hipótese de ser reconduzido no cargo pelos seus pares parece contrariar a tradição partidária portuguesa. Na Europa, a tradição já não é o que era, mas houve líderes que resistiriam a (quase) tudo.

Numa viagem ao passado, o nome de Winston Churchill salta à vista como o homem que venceu tudo, até a guerra, mas perdeu as eleições. Em 1940, com 65 anos, chegou ao cargo de primeiro-ministro para conduzir os destinos do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial. Venceu-a, mas, nesse mesmo ano, perdeu as eleições de forma esmagadora para o trabalhista Clement Attlee. Manteve-se como líder da oposição e, seis anos depois, em 1951, esmagou os trabalhistas e voltou ao cargo de primeiro-ministro de onde só saiu em 1955.

Dez anos depois, em França, um homem tentou por duas vezes e por duas vezes falhou. François Mitterrand perdeu para De Gaulle, em 1965. Nove anos mais tarde, já como líder do Partido Socialista francês, volta a perder para Valéry Giscard d’Estaing. Só em 1981 chegaria ao Eliseu, onde ficou até 1995.

O velho rival, Jacques Chirac, viria a ter um percurso semelhante: perde eleições, sobrevive politicamente e, em 1995, sucede a Mitterrand como Presidente francês. Só sairia em 2007 para dar lugar a Nicolas Sarkozy.

Por cá, Mário Soares conseguiu chegar ao poder anos antes. Fundou o Partido Socialista português para vencer as duas primeiras eleições realizadas depois do Estado Novo – as de 1975 (Constituintes) e 1976 (Legislativas). Derrotou o seu grande rival Álvaro Cunhal, mas perderia em 1979 para um homem que queria ser alternativa a PS e CDU: Francisco Sá Carneiro.

Só em 1983, já depois de Camarate e já com Pinto Balsemão no poder, é que Soares voltaria a recuperar o poder. Eram os tempos do Bloco Central que durariam apenas dois anos. Depois disso, em 1985, Cavaco Silva chegaria ao cargo de primeiro-ministro, de onde só sairia em 1995. Quanto a Soares, só deixaria a liderança do PS em 1986, dando o lugar a Almeida Santos.

Ali ao lado, na vizinha Espanha, Felipe González, líder do PSOE, teria de perder duas eleições e esperar anos para chegar a primeiro-ministro. Foi derrotado em 1977 por Adolfo Suárez e, dois anos depois, perdeu novamente para Leopoldo Calvo-Sotelo. Só venceria as eleições de 1982. Manteve-se no cargo durante 14 anos, até 1996. Nesse ano, o PSOE acabaria por perder para o PP de José María Aznar.

González continuou como líder do PSOE – agora na oposição – até 1997, mas os casos de corrupção que começaram a rodear o socialista e a luta, sobretudo os meios que utilizou, para travar a ETA fragilizaram a sua situação e levaram à perda de apoio político. González saía, assim, da liderança do partido.

Nesta lista, não podia faltar Silvio Berlusconi, claro. O italiano viveu, morreu e renasceu tantas vezes que é dificíl não perder a conta. Foi primeiro-ministro entre 1994 a 1995, de 2001 a 2005, conseguiu manter-se no poder até 2006 e, depois, venceu as eleições de 2008 para ocupar o cargo de primeiro-ministro até 2011. Tudo isto sob acusações de corrupção, suspeitas de ligações à máfia italiana e mais uma mão cheia de escândalos. Tudo isto ofuscado pela grande mediática que tinha (e tem) ao seu dispor, claro.

Por cá, em maio de 1999, José Manuel Durão Barroso começava uma corrida que só viria a terminar na presidência da Comissão Europeia. Nesse ano, depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter deixado cair a Alternativa Democrática e de se ter demitido da liderança do partido, Barroso toma as rédeas da equipa social-democrata e assume a difícil tarefa de combater o PS de Guterres. Resultado? Pior seria (quase) impossível: um mês depois de ascender à liderança do PSD , perde as europeias para o PS (31,1% contra 43,1%) e, logo a seguir, em outubro, as legislativas (32,3% contra 44,1%).

Mas os maus resultados nas autárquicas de 2001 e as crises que fragilizaram o PS viriam a precipitar o pedido de demissão de António Guterres. Durão Barroso, que aguentou como líder da oposição, avança para as legislativas de 2002 e derrota o PS de Ferro Rodrigues. Agarra Paulo Portas e forma um Governo maioritário. O verdadeiro final feliz.

Agora, com todas as distâncias e diferenças possíveis, António Costa procura dar o seu “golpe de asa”, para tentar o que outros não conseguiram. Mário Sá Carneiro chegou a escrever: “Um pouco mais de sol – eu era brasa / Um pouco mais de azul – eu era além / Para atingir, faltou-me um golpe de asa / Se ao menos eu permanecesse aquém…”. Neste jogo difícil, onde as fichas já são escassas, qual será o próximo passo de António Costa? Conseguirá sobreviver politicamente?

O líder socialista não se dá por derrotado. A questão é se terá condições para sair mais forte deste ciclo ou se está condenado a ser transitório. Ainda aí vêm os testes do OE e das presidenciais.

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Conquistou o Rato numa luta que deixou marcas. Partiu para as legislativas para governar e governar com maioria absoluta. Perdeu, mas não deixou a liderança do PS. Agora, parece não excluir a hipótese de unir a esquerda para governar. Bluff? Ninguém se arrisca a dizê-lo de forma categórica – mas, no póquer, o trio bate sempre o par. Ao mesmo tempo, conversa com a direita, que parece desconfiada, mas disposta a ver até onde vai. No horizonte, Belém parece reservado a Marcelo. Nóvoa – o escolhido – e Maria – a imposta – dividem o partido e, olhando para as sondagens, dificilmente farão mossa ao professor. O caminho é cheio de obstáculos. António Costa conseguirá resistir a tudo isto e sair reforçado? Ou todas as suas fichas políticas voaram no dia 4 de outubro de 2015? As opiniões dividem-se.

Para João Cardoso Rosas, da Universidade do Minho, as hipóteses do socialista são residuais. “António Costa está no fio da navalha” entre “duas opções muito arriscadas“, começa por dizer o politólogo ao Observador. O jogo que o líder socialista que decidiu jogar – falar à esquerda e à direita – “foi a saída que encontrou para se tentar salvar”. O “reflexo do náufrago” que se tenta agarrar ao bote para não submergir, explica.

António Costa “percebeu que estava encurralado“, sobretudo depois do discurso de Cavaco Silva. Neste momento, tem duas soluções: ou fica na história como o líder socialista “que serviu de muleta da coligação” quando tinha tudo para a deixar cair; ou como o líder que conseguiu “romper”, unindo a esquerda e provocando a queda de um Governo legitimado nas urnas. O socialista sabe disso e pode estar a tentar “algo surpreendente” que mudaria “a própria natureza do regime”.

Até porque é a “sobrevivência política” de um líder que “saiu muito fragilizado das eleições”, mas também a sobrevivência política da entourage que o acompanhou, que estão em jogo, continua João Cardoso Rosas. Daí a tentação de falar à esquerda e derrubar Passos e Portas já.

A curto prazo, uma solução dessas inclinaria o tabuleiro a favor de Costa? O politólogo acredita que sim. “Num primeiro momento, António Costa sairia como um líder ganhador e como o grande vencedor destas eleições”. Mas, “o estado de graça duraria pouco“, porque o socialista teria “muitas dificuldades” em gerir a relação interna com o Bloco de Esquerda e CDU, ao mesmo tempo que respondia perante Bruxelas e perante os credores. Uma aposta dessa natureza revelar-se-ia uma “aposta perdida“, afirma.

"António Costa está no fio da navalha" entre "duas opções muito arriscadas" João Cardoso Rosas, politólogo

André Freire, o politólogo que nestas eleições foi número cinco do Livre/Tempo de Avançar por Lisboa, não podia discordar mais. Ao Observador, Freire faz questão de contrariar a tese de que os governos PS/PSD ou PS/CDS são sinónimo de estabilidade. “São instáveis e este assim o seria“. Por isso, o argumento para empurrar um possível acordo entre PS, BE e CDU para o plano da instabilidade não cola, insiste.

Mesmo reconhecendo que o secretário-geral socialista saiu “fragilizado” destas eleições e que manter-se “no poder depois de ter ficado em segundo lugar pode ser problemático”, André Freire acredita que “tudo pode mudar se António Costa conseguir agora liderar uma alternativa de esquerda“. Aí, poderia sair na fotografia para memória futura como um “líder ganhador”.

Uma solução dessas passaria pelo crivo de Aníbal Cavaco Silva? “O Presidente da República não tem margem política para recusar essa solução“, defende André Freire. Para o politólogo, António Costa tem tudo a ganhar se colocar todas as suas fichas à esquerda e tudo a perder se tentar a sorte à direita.

“Se o fizesse contrariava tudo o que disse na campanha, de querer acabar com o conceito de arco de governabilidade” e perderia toda a margem dentro do partido. “Do ponto de vista interno, seria uma derrota para António Costa. Se Costa se voltasse ao centro, usando como justificação a necessidade de salvar o país, sairia fragilizado e dificilmente seria reeleito. Para ocupar esse espaço já existe Francisco Assis”, explica André Freire.

Para o politólogo, o ideal em democracia, “era que os líderes não saltassem sempre fora de cada vez que perdem eleições”. Mas isso não significa que vale de tudo. “Não podem contradizer tudo o que disseram em campanha” em nome da sobrevivência política.

"Tudo pode mudar se António Costa conseguir agora liderar uma alternativa de esquerda" André Freire

No PS está tudo à espera do que Costa vai fazer

António Costa está a tentar fechar todos os dossiers até a terça-feira, ainda antes da reunião da comissão política do PS. Como o Público escreve esta sexta-feira, este órgão tem de aprovar qualquer decisão sobre um possível acordo desenhado entre o líder socialista e outros partidos – seja com a coligação, seja à esquerda.

No PS paira um silêncio ruidoso. Ao Observador, um dos dirigentes socialistas disse que uma solução governativa à esquerda nunca passará na comissão política. Mas, entre seguristas, existe o receio de que tal possa mesmo vir a acontecer. Fala-se, entre dentes, de um “partido fantasma“, dominado por “poderes fáticos” e motivado por um único objetivo comum: “chegar ao poder” custe o que custar, mesmo que isso signifique aliar-se à esquerda.

A perceção entre alguns socialistas é de que Costa tem todos os trunfos na mão. O líder socialista controla a comissão política e, como sublinharam várias pessoas ouvidas pelo Observador, não há capacidade de mobilizar socráticos e seguristas para que, juntos, possam derrubar uma eventual solução à esquerda. Se decidir derrubar já Passos e Portas, António Costa terá a força e todo o apoio interno que precisa.

Todo o plano pode ser muito mais abrangente do que a disposição das peças de xadrez parecem mostrar. Há, entre socialistas, quem acredite que a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa como próximo Presidente da República poderá ser a chave que faltava para dar viabilidade a um governo socialista apoiado por Bloco e CDU. E Costa poderá estar a contar com isso. Xeque-mate, diria o líder socialista.

No dia em que apresentou a candidatura a Belém, Marcelo Rebelo de Sousa apelou ao “diálogo e à tolerância”, às “convergências alargadas” e à necessidade de “construir pontes”. E acrescentou: “A estabilidade tem de estar ao serviço do combate à pobreza, isto é, ao serviço das pessoas”. Um discurso ao centro que, no limite, não exclui a hipótese de dar luz verde a uma eventual solução governativa à esquerda.

Horas antes, António Costa reconhecia que Marcelo Rebelo de Sousa era um “candidato forte” às presidenciais de 2016, mas mostrava, no entanto, confiança na passagem à segunda volta de um candidato da área socialista para o sufrágio de janeiro. Vale o que vale, claro.

Do outro canto do ringue que se começa a desenhar, Francisco Assis, na primeira vez que falou depois de conhecidos os resultados eleitorais, deixou claro que estar na oposição não pode significar “uma indisponibilidade de princípio para a viabilização dos instrumentos imprescindíveis à governação do país” e apontou o caminho: negociem ao centro, esqueçam a esquerda. “[Com este resultado abriu-se] uma possibilidade real para a realização de um diálogo útil entre o Governo e a principal força da oposição, sem pôr em causa a identidade nem de um nem de outro”, escreveu Assis na terça-feira.

Os recados do eurodeputado não se ficaram por aqui: além de deixar claro que era “agora ainda mais importante garantir a eleição de um Presidente da República oriundo do nosso espaço político”, Assis atirou para depois das presidenciais a discussão pela liderança do partido. De uma penada, o homem que abandonou o congresso de consagração de Costa por entre críticas aos “discursos de fantasia de esquerda” tentou marcar o ritmo e o modus operandi do PS.

Mas o líder socialista é um jogador e pode estar a tentar outra estratégia quando todos estão concentrados a tentar descortinar se faz all in ou se desiste do jogo. É isso que diz João Cardoso Rosas. Ameaçando juntar-se à esquerda, “uma ameaça que é credível” insiste Cardoso Rosas, forçava Passos e Portas a cederem e conseguia “um acordo especialmente favorável” para o PS.

Assim, “não teria impedido a formação do Governo” e seria visto como uma “muleta” da coligação, mas uma muleta “reforçada” pelo peso de ter tido uma palavra a dizer. Uma situação win/win para quem perdeu quase tudo e que dava mais força ao líder socialista para sobreviver à oposição interna. Estratégia possível? Sim, diz Cardoso Rosas. Mas “muito difícil de realizar” porque a “coligação também vai jogar as suas cartadas”.

A somar a tudo isto, existem ainda as eleições presidenciais. António Costa viu a oposição interna a cozinhar a candidatura de Maria de Belém e foi forçado a recuar no apoio a Sampaio da Nóvoa. Ou isso, “ou romperia o partido”, sublinha Cardoso Rosas. A solução? Não apoiar nenhum candidato até à segunda volta das presidenciais. Mas, do outro lado, vai estar o (super)favorito Marcelo Rebelo de Sousa, que esta sexta-feira apresentou a candidatura a Belém, depois de meses a preparar terreno e a controlar à distância o ritmo da corrida.

O secretário-geral socialista arrisca-se, por isso, a apresentar-se no congresso extraordinário como o líder que rompeu o ciclo vitorioso (autárquicas e europeias) e perdeu duas eleições de seguida (legislativas e presidenciais). Conseguirá ser reconduzido no cargo? João Cardoso Rosas tem muitas dúvidas.

“Não vejo como António Costa possa conseguir sobreviver ao congresso extraordinário. Neste momento, está num beco sem saída. Seja qual for a solução que venha a conseguir – encostar-se à coligação de direita ou à esquerda – haverá ruturas internas dentro do partido“, defende o politólogo. O que segura Costa é o “facto de o PS estar neste momento muito perdido” e de ainda não ter aparecido “nenhum challenger suficiente credível. Os que apareceram não são relevantes. Vieram só ocupar terreno”. Não significa que esse challenger não venha a aparecer.

E, mesmo ultrapassando todos estes obstáculos, o secretário-geral socialista pode alimentar esperanças de se manter como líder do maior partido da oposição e vir a disputar o lugar de primeiro-ministro nas próximas eleições? “Não tenho bola de cristal”, mas tendo em conta “o imenso desgaste” político do lugar, Cardoso Rosas acredita que Costa não conseguiria o regresso triunfante. “Voltava a apresentar-se a eleições e arriscava-se a perder novamente“, conclui.

"Existe uma ala mainstream do PS que não quererá abandonar António Costa" António Costa Pinto

António Costa Pinto, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, tem uma tese contrária à de João Cardoso Rosas. “A saída de um líder que perde eleições não tem de ser uma consequência imediata. Não tem de ser um automatismo nas democracias”.

À cabeça vem o exemplo de Francisco Sá Carneiro, que perde as legislativas de 1976 para Mário Soares e, ainda assim, consegue resistir na liderança do partido. Três anos depois, os papeis invertem-se: Mário Soares perde as eleições de 1979 para Francisco Sá Carneiro e regressa vitorioso em 1983. Dezasseis anos mais tarde, Durão Barroso perde as legislativas de 1999 para António Guterres, sobrevive na liderança do PSD, e vence as de 2002.

Mas os três casos têm particularidades que não se aplicam a António Costa: Soares e Sá Carneiro eram fundadores dos respetivos partidos – e, a bem da verdade, os tempos eram outros; quanto a Barroso, aterrou na liderança de um partido esfrangalhado pela demissão de Marcelo Rebelo de Sousa e a cinco meses de umas eleições que ninguém queria disputar contra Guterres. Já Costa, tirou António José Seguro da liderança do PS e perdeu umas eleições que, a maioria dos analistas, dava como certas para o PS. “É, [por isso], difícil e perigoso fazer paralelismos“, alerta António Costa Pinto, em conversa com o Observador.

Ainda assim, o politólogo reconhece que a vitória nas eleições “é o motor fundamental para a sobrevivência dos líderes dos grandes partidos” e que António Costa está numa “posição relativamente frágil.

A continuação à frente do PS, explica o politólogo, “vai depender, em primeiro lugar, da vontade do próprio“, da “conjuntura interna e partidária” e da força que tiver “o desafio à liderança” do partido.

Para Costa Pinto, no entanto, o socialista pode conseguir sobreviver porque, “num contexto de um governo minoritário, o PS será um partido de charneira“. Com isso em cima da mesa, o secretário-geral socialista será um jogador demasiado importante para ser atirado para fora do jogo.

Além disso, existe, também, a “hipótese de o governo não sobreviver a curto-médio prazo” o que coloca o partido em sentido de alerta. “Existe uma ala mainstream do PS que não quererá abandonar António Costa” até porque não existe, para já, “uma alternativa mais forte”. A hipótese de o país voltar às urnas dentro em breve não está excluída.

E uma possível derrota nas presidenciais? Não fragilizaria ainda mais o líder socialista? “Existem muitas variáveis em jogo. As presidenciais não têm grande importância” neste momento, desvaloriza António Costa Pinto.

"Não haverá grandes possibilidades [de Costa ser reeleito]. Não acredito que os partidos sejam masoquistas" Viriato Soromenho Marques

Em equipa que ganha não se mexe é uma máxima que se aplica geralmente aos vencedores. O seu inverso também costuma ser verdade. E é isso que começa por dizer Viriato Soromenho Marques. “Quando há uma derrota muda-se de treinador. António Costa assumiu a liderança do partido com o objetivo de conseguir a maioria absoluta e perdeu. Não pode continuar à frente do PS“.

Para Soromenho Marques, a saída de Costa da liderança do partido seria a chicotada psicológica num partido que “está escavacado e precisa de ser renovado. Um dirigente que não consegue sequer controlar o seu partido não pode continuar”, insiste.

Até ao congresso extraordinário, o “PS e António Costa têm um dever: contribuir para que haja um governo estável” e não caírem na “estupidez” de insistirem no bloqueio. O professor universitário acredita que o PS tem a obrigação de ser “inteligente” e abster-se na votação do programa do Governo e na discussão sobre o Orçamento.

No futuro, “é pouco provável” que António Costa “venha a ser reeleito” se o partido se abrir novamente a primárias. “Não haverá grandes possibilidades. Não acredito que os partidos sejam masoquistas“, resume Soromenho Marques.

Os líderes derrotados que se mantiveram no poder: de Churchill a Miterrand, de González a Berlusconi. E Barroso também

A decisão de António Costa de não se demitir da direção do PS mesmo depois de ter perdido as eleições legislativas e – mais relevante – a hipótese de ser reconduzido no cargo pelos seus pares parece contrariar a tradição partidária portuguesa. Na Europa, a tradição já não é o que era, mas houve líderes que resistiriam a (quase) tudo.

Numa viagem ao passado, o nome de Winston Churchill salta à vista como o homem que venceu tudo, até a guerra, mas perdeu as eleições. Em 1940, com 65 anos, chegou ao cargo de primeiro-ministro para conduzir os destinos do Reino Unido durante a Segunda Guerra Mundial. Venceu-a, mas, nesse mesmo ano, perdeu as eleições de forma esmagadora para o trabalhista Clement Attlee. Manteve-se como líder da oposição e, seis anos depois, em 1951, esmagou os trabalhistas e voltou ao cargo de primeiro-ministro de onde só saiu em 1955.

Dez anos depois, em França, um homem tentou por duas vezes e por duas vezes falhou. François Mitterrand perdeu para De Gaulle, em 1965. Nove anos mais tarde, já como líder do Partido Socialista francês, volta a perder para Valéry Giscard d’Estaing. Só em 1981 chegaria ao Eliseu, onde ficou até 1995.

O velho rival, Jacques Chirac, viria a ter um percurso semelhante: perde eleições, sobrevive politicamente e, em 1995, sucede a Mitterrand como Presidente francês. Só sairia em 2007 para dar lugar a Nicolas Sarkozy.

Por cá, Mário Soares conseguiu chegar ao poder anos antes. Fundou o Partido Socialista português para vencer as duas primeiras eleições realizadas depois do Estado Novo – as de 1975 (Constituintes) e 1976 (Legislativas). Derrotou o seu grande rival Álvaro Cunhal, mas perderia em 1979 para um homem que queria ser alternativa a PS e CDU: Francisco Sá Carneiro.

Só em 1983, já depois de Camarate e já com Pinto Balsemão no poder, é que Soares voltaria a recuperar o poder. Eram os tempos do Bloco Central que durariam apenas dois anos. Depois disso, em 1985, Cavaco Silva chegaria ao cargo de primeiro-ministro, de onde só sairia em 1995. Quanto a Soares, só deixaria a liderança do PS em 1986, dando o lugar a Almeida Santos.

Ali ao lado, na vizinha Espanha, Felipe González, líder do PSOE, teria de perder duas eleições e esperar anos para chegar a primeiro-ministro. Foi derrotado em 1977 por Adolfo Suárez e, dois anos depois, perdeu novamente para Leopoldo Calvo-Sotelo. Só venceria as eleições de 1982. Manteve-se no cargo durante 14 anos, até 1996. Nesse ano, o PSOE acabaria por perder para o PP de José María Aznar.

González continuou como líder do PSOE – agora na oposição – até 1997, mas os casos de corrupção que começaram a rodear o socialista e a luta, sobretudo os meios que utilizou, para travar a ETA fragilizaram a sua situação e levaram à perda de apoio político. González saía, assim, da liderança do partido.

Nesta lista, não podia faltar Silvio Berlusconi, claro. O italiano viveu, morreu e renasceu tantas vezes que é dificíl não perder a conta. Foi primeiro-ministro entre 1994 a 1995, de 2001 a 2005, conseguiu manter-se no poder até 2006 e, depois, venceu as eleições de 2008 para ocupar o cargo de primeiro-ministro até 2011. Tudo isto sob acusações de corrupção, suspeitas de ligações à máfia italiana e mais uma mão cheia de escândalos. Tudo isto ofuscado pela grande mediática que tinha (e tem) ao seu dispor, claro.

Por cá, em maio de 1999, José Manuel Durão Barroso começava uma corrida que só viria a terminar na presidência da Comissão Europeia. Nesse ano, depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter deixado cair a Alternativa Democrática e de se ter demitido da liderança do partido, Barroso toma as rédeas da equipa social-democrata e assume a difícil tarefa de combater o PS de Guterres. Resultado? Pior seria (quase) impossível: um mês depois de ascender à liderança do PSD , perde as europeias para o PS (31,1% contra 43,1%) e, logo a seguir, em outubro, as legislativas (32,3% contra 44,1%).

Mas os maus resultados nas autárquicas de 2001 e as crises que fragilizaram o PS viriam a precipitar o pedido de demissão de António Guterres. Durão Barroso, que aguentou como líder da oposição, avança para as legislativas de 2002 e derrota o PS de Ferro Rodrigues. Agarra Paulo Portas e forma um Governo maioritário. O verdadeiro final feliz.

Agora, com todas as distâncias e diferenças possíveis, António Costa procura dar o seu “golpe de asa”, para tentar o que outros não conseguiram. Mário Sá Carneiro chegou a escrever: “Um pouco mais de sol – eu era brasa / Um pouco mais de azul – eu era além / Para atingir, faltou-me um golpe de asa / Se ao menos eu permanecesse aquém…”. Neste jogo difícil, onde as fichas já são escassas, qual será o próximo passo de António Costa? Conseguirá sobreviver politicamente?

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