Há 12 anos que a bolsa de Lisboa não fechava o ano tão pequena

02-01-2015
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Só as bolsas da Rússia e Grécia tiveram um ano de 2014 pior do que a bolsa de Lisboa. As cotadas valem 51 mil milhões de euros, um valor de fecho de ano que é o mais baixo, pelo menos, desde 2002.

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Às 13 horas desta quarta-feira, quando a bolsa portuguesa fechou o ano, as ações cotadas valiam, em conjunto, 51.220 milhões de euros. O valor de mercado das ações da bolsa de Lisboa nunca foi tão baixo num fecho de ano desde 2002. Em 2007, antes de a crise financeira global estalar, as ações nacionais valiam quase 213 mil milhões de euros, cerca de quatro vezes mais do que hoje. A bolsa nacional está cada vez mais pequena, em valor e também em número de empresas.

A desvalorização média de 24,98% das cotações portuguesas em 2014, apenas atrás da Rússia e da Grécia a nível internacional, reforçou a reduzida dimensão do mercado. A praça financeira portuguesa é cada vez mais marginal no panorama internacional: as 50 ações nacionais que compõem o índice PSI Geral representam 0,1% do valor de mercado das bolsas em todo o mundo, um terço da importância que tinham em 2007, segundo dados da Bloomberg.

A bolsa nacional vale hoje menos de um quarto do que era a capitalização total de mercado em 2007. Lisboa não foi a única bolsa a encolher neste período marcado pela crise financeira global e pela crise do euro, mas as perdas das bolsas congéneres não foi comparável. Madrid, por exemplo, perdeu 12% em capitalização de mercado e Paris caiu 11%. Por outro lado, a bolsa de Londres aumentou 18% em valor total de mercado e Nova Iorque cresceu 12%.

O colapso do Banco Espírito Santo e do Espírito Santo Financial Group (ESGF) é apenas a face mais recente do desaparecimento de valor da bolsa portuguesa. A saída de firmas espanholas dos boletins de cotações nacionais teve um impacto mais profundo. O Banco Popular Español deixou a Euronext alfacinha em 2013, mas, nos cinco anos anteriores, outras fizeram o mesmo: Banco Santander, a construtora Sacyr e a papeleira Europac. Estas companhias entraram para a bolsa portuguesa após terem adquirido sociedades lusas cotadas (Banco Totta, Somague, Gescartão), retirando-as do mercado acionista.

Outras empresas nacionais saíram da bolsa depois de terem sido alvo de compra. A Brisa deixou o mercado em abril de 2013, após uma oferta pública de aquisição (OPA) iniciada cerca de um ano antes. O Finibanco foi adquirido pelo Montepio em 2010. Mais recentemente, a Fidelidade conseguiu 96% do capital da Espírito Santo Saúde numa OPA, mas a dona do Hospital da Luz ainda permanece na bolsa. A Espírito Santo Saúde foi para a bolsa de Lisboa em janeiro, no encalço dos CTT – Correios de Portugal, que tinham cotado o capital cerca de um mês antes. Antes disso, é preciso recuar a 2008 para ver uma empresa nacional a tornar o capital disponível ao público: a EDP Renováveis.

Em 2014, houve, na verdade, mais uma empresa portuguesa além da Espírito Santo Saúde a ir para a bolsa. Mas não foi para a bolsa portuguesa. A Mota-Engil cotou na bolsa de Amesterdão as operações em África no final de novembro. Porque não em Lisboa e porquê em Amesterdão? “Por ser a segunda maior praça europeia e uma das cinco maiores do mundo em IPO [estreia em bolsa] ao longo de 2014, Amesterdão assegura-nos uma expectativa de liquidez e de visibilidade junto de uma comunidade de investidores que nos posiciona na primeira linha das empresas com exposição a África”, justificou, na altura a empresa.

"Por ser a segunda maior praça europeia e uma das cinco maiores do mundo em IPO [estreia em bolsa] ao longo de 2014, Amesterdão assegura-nos uma expectativa de liquidez e de visibilidade junto de uma comunidade de investidores que nos posiciona na primeira linha das empresas com exposição a África" Mota-Engil, em comunicado relativo à estreia na bolsa de Amesterdão

Um ano que começou tão bem

Uma bolsa deprimida significa que, em média, não estão a ser rentáveis as aplicações de quem tem poupanças investidas nas empresas cotadas na bolsa de valores. Mas significa, também, que é menor a capacidade das empresas de investir, financiar a expansão das atividades e a contratação de funcionários. Se o seu valor de mercado for baixo, é menor a capacidade de um banco de emprestar à economia. Se as ações de uma empresa industrial estão em queda, é mais difícil obter o financiamento para comprar maquinaria pesada. No fundo, este é um sinal de que os investidores – nacionais e estrangeiros – estão pouco otimistas em relação às perspetivas de resultados das empresas ou, pelo menos, que estão ainda a recuperar de traumas recentes: com o colapso do BES e as dificuldades da PT SGPS à cabeça.

Até março de 2014, o índice de referência das ações da bolsa de Lisboa – o PSI-20 – acumulava nove meses consecutivos de ganhos. No início do ano que hoje termina, as ações portuguesas eram vistas como estando entre as que mais tinham a ganhar com a retoma europeia em torno da qual existia grande otimismo nos mercados. O PSI-20 fechou o primeiro trimestre de 2014 a ganhar 16%. Este era o cenário no início do ano, porque a partir da primavera, o conflito entre a Ucrânia e a Rússia subiria de tom, numa altura em que a Reserva Federal dos EUA estava a retirar os estímulos monetários e a zona euro se deparava com o risco de deflação e um regresso à estagnação económica. Mas, em Lisboa, foi a partir do verão, com o colapso do Banco Espírito Santo, que a bolsa de Lisboa partiu para o pior ano desde 2011.

O índice PSI-20, atualmente com apenas 18 cotadas, teve em dezembro o seu nono mês consecutivo em queda. Uma sequência negativa que lhe conferiu o estatuto de terceira pior bolsa de valores a nível mundial em 2014, com uma desvalorização de 27% (excluindo efeito de dividendos). Só as bolsas da Rússia e da Grécia tiveram um ano ainda mais negativo, dois países que estão envoltos em grande incerteza económica e política. Na Rússia, Vladimir Putin enfrenta sanções económicas, uma grave recessão, risco de fuga de capitais e um preço do petróleo em queda acentuada. Em Atenas, o governo caiu depois de ser incapaz de eleger um novo Presidente da República no parlamento e estão agendadas novas eleições para 25 de janeiro, o que garante à zona euro um início de ano agitado. As melhores bolsas do ano, em moeda local, foram a Argentina, a China (Xangai) e a Venezuela.

As ações dos CTT foram uma das poucas notas positivas no índice PSI-20 em 2014. Foram para a bolsa em dezembro de 2013 a valer 5,52 euros e, pouco mais de doze meses volvidos, termina o ano de 2014 a valer mais de oito euros por ação. Isto apesar de ter havido uma segunda fase de privatização, em que mais ações chegaram ao mercado. O retorno anual, incluindo dividendos, foi de 51,5%. Ano positivo tiveram também as ações do grupo EDP, que beneficiam entre outros fatores de custos de financiamento mais baratos no mercado de dívida, e também as papeleiras. A Portucel subiu 14,27% e a Altri ganhou 12,89% (retorno total, com dividendos).

Do lado das perdas, a principal foi, sem dúvida, a ação do Banco Espírito Santo. A negociação das ações foi suspensa indefinidamente a 1 de agosto, quando os títulos perdiam 87% e valiam 12 cêntimos. O banco viria a ser alvo de um processo de resolução, que daria lugar à transferência dos ativos “saudáveis” para uma nova instituição, a que se deu o nome de Novo Banco. O colapso do BES arrastou consigo, também, a Portugal Telecom, empresa que investiu quase 900 milhões de euros em papel comercial do Grupo Espírito Santo no início do ano e que ainda não viu reembolsado esse valor.

Na bolsa de Lisboa, o que está cotado é a PT SGPS, que além de uma participação da empresa resultante da fusão da Portugal Telecom e da Oi tem essa dívida da Rioforte e uma opção de compra de ações da empresa resultante da fusão. Essas ações fecham o ano de 2014 a perder 71,66%, um ano que também ficou marcado pelo processo de venda da “telecom” portuguesa por parte da Oi. Os franceses da Altice parecem estar em boa posição para garantir o concurso da empresa. Entre as maiores perdas no PSI-20 em 2014, estiveram, também, as ações da Mota-Engil, dos bancos BCP e Banif, e a Jerónimo Martins, que tem enfrentado dificuldades crescentes no crucial mercado polaco.

2015 pode, contudo, ser um ano bem mais positivo para a bolsa de Lisboa. Segundo estimativas da Bloomberg a partir das recomendações médias dos analistas de ações, a bolsa portuguesa tem um potencial de valorização de 27,9%. É o potencial mais expressivo em todas as principais bolsas mundiais, segundo estas estimativas. O ano de 2015 será, contudo, um ano repleto de riscos para as bolsas mundiais, ainda que com elevado potencial para surpresas positivas.

Só as bolsas da Rússia e Grécia tiveram um ano de 2014 pior do que a bolsa de Lisboa. As cotadas valem 51 mil milhões de euros, um valor de fecho de ano que é o mais baixo, pelo menos, desde 2002.

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Às 13 horas desta quarta-feira, quando a bolsa portuguesa fechou o ano, as ações cotadas valiam, em conjunto, 51.220 milhões de euros. O valor de mercado das ações da bolsa de Lisboa nunca foi tão baixo num fecho de ano desde 2002. Em 2007, antes de a crise financeira global estalar, as ações nacionais valiam quase 213 mil milhões de euros, cerca de quatro vezes mais do que hoje. A bolsa nacional está cada vez mais pequena, em valor e também em número de empresas.

A desvalorização média de 24,98% das cotações portuguesas em 2014, apenas atrás da Rússia e da Grécia a nível internacional, reforçou a reduzida dimensão do mercado. A praça financeira portuguesa é cada vez mais marginal no panorama internacional: as 50 ações nacionais que compõem o índice PSI Geral representam 0,1% do valor de mercado das bolsas em todo o mundo, um terço da importância que tinham em 2007, segundo dados da Bloomberg.

A bolsa nacional vale hoje menos de um quarto do que era a capitalização total de mercado em 2007. Lisboa não foi a única bolsa a encolher neste período marcado pela crise financeira global e pela crise do euro, mas as perdas das bolsas congéneres não foi comparável. Madrid, por exemplo, perdeu 12% em capitalização de mercado e Paris caiu 11%. Por outro lado, a bolsa de Londres aumentou 18% em valor total de mercado e Nova Iorque cresceu 12%.

O colapso do Banco Espírito Santo e do Espírito Santo Financial Group (ESGF) é apenas a face mais recente do desaparecimento de valor da bolsa portuguesa. A saída de firmas espanholas dos boletins de cotações nacionais teve um impacto mais profundo. O Banco Popular Español deixou a Euronext alfacinha em 2013, mas, nos cinco anos anteriores, outras fizeram o mesmo: Banco Santander, a construtora Sacyr e a papeleira Europac. Estas companhias entraram para a bolsa portuguesa após terem adquirido sociedades lusas cotadas (Banco Totta, Somague, Gescartão), retirando-as do mercado acionista.

Outras empresas nacionais saíram da bolsa depois de terem sido alvo de compra. A Brisa deixou o mercado em abril de 2013, após uma oferta pública de aquisição (OPA) iniciada cerca de um ano antes. O Finibanco foi adquirido pelo Montepio em 2010. Mais recentemente, a Fidelidade conseguiu 96% do capital da Espírito Santo Saúde numa OPA, mas a dona do Hospital da Luz ainda permanece na bolsa. A Espírito Santo Saúde foi para a bolsa de Lisboa em janeiro, no encalço dos CTT – Correios de Portugal, que tinham cotado o capital cerca de um mês antes. Antes disso, é preciso recuar a 2008 para ver uma empresa nacional a tornar o capital disponível ao público: a EDP Renováveis.

Em 2014, houve, na verdade, mais uma empresa portuguesa além da Espírito Santo Saúde a ir para a bolsa. Mas não foi para a bolsa portuguesa. A Mota-Engil cotou na bolsa de Amesterdão as operações em África no final de novembro. Porque não em Lisboa e porquê em Amesterdão? “Por ser a segunda maior praça europeia e uma das cinco maiores do mundo em IPO [estreia em bolsa] ao longo de 2014, Amesterdão assegura-nos uma expectativa de liquidez e de visibilidade junto de uma comunidade de investidores que nos posiciona na primeira linha das empresas com exposição a África”, justificou, na altura a empresa.

"Por ser a segunda maior praça europeia e uma das cinco maiores do mundo em IPO [estreia em bolsa] ao longo de 2014, Amesterdão assegura-nos uma expectativa de liquidez e de visibilidade junto de uma comunidade de investidores que nos posiciona na primeira linha das empresas com exposição a África" Mota-Engil, em comunicado relativo à estreia na bolsa de Amesterdão

Um ano que começou tão bem

Uma bolsa deprimida significa que, em média, não estão a ser rentáveis as aplicações de quem tem poupanças investidas nas empresas cotadas na bolsa de valores. Mas significa, também, que é menor a capacidade das empresas de investir, financiar a expansão das atividades e a contratação de funcionários. Se o seu valor de mercado for baixo, é menor a capacidade de um banco de emprestar à economia. Se as ações de uma empresa industrial estão em queda, é mais difícil obter o financiamento para comprar maquinaria pesada. No fundo, este é um sinal de que os investidores – nacionais e estrangeiros – estão pouco otimistas em relação às perspetivas de resultados das empresas ou, pelo menos, que estão ainda a recuperar de traumas recentes: com o colapso do BES e as dificuldades da PT SGPS à cabeça.

Até março de 2014, o índice de referência das ações da bolsa de Lisboa – o PSI-20 – acumulava nove meses consecutivos de ganhos. No início do ano que hoje termina, as ações portuguesas eram vistas como estando entre as que mais tinham a ganhar com a retoma europeia em torno da qual existia grande otimismo nos mercados. O PSI-20 fechou o primeiro trimestre de 2014 a ganhar 16%. Este era o cenário no início do ano, porque a partir da primavera, o conflito entre a Ucrânia e a Rússia subiria de tom, numa altura em que a Reserva Federal dos EUA estava a retirar os estímulos monetários e a zona euro se deparava com o risco de deflação e um regresso à estagnação económica. Mas, em Lisboa, foi a partir do verão, com o colapso do Banco Espírito Santo, que a bolsa de Lisboa partiu para o pior ano desde 2011.

O índice PSI-20, atualmente com apenas 18 cotadas, teve em dezembro o seu nono mês consecutivo em queda. Uma sequência negativa que lhe conferiu o estatuto de terceira pior bolsa de valores a nível mundial em 2014, com uma desvalorização de 27% (excluindo efeito de dividendos). Só as bolsas da Rússia e da Grécia tiveram um ano ainda mais negativo, dois países que estão envoltos em grande incerteza económica e política. Na Rússia, Vladimir Putin enfrenta sanções económicas, uma grave recessão, risco de fuga de capitais e um preço do petróleo em queda acentuada. Em Atenas, o governo caiu depois de ser incapaz de eleger um novo Presidente da República no parlamento e estão agendadas novas eleições para 25 de janeiro, o que garante à zona euro um início de ano agitado. As melhores bolsas do ano, em moeda local, foram a Argentina, a China (Xangai) e a Venezuela.

As ações dos CTT foram uma das poucas notas positivas no índice PSI-20 em 2014. Foram para a bolsa em dezembro de 2013 a valer 5,52 euros e, pouco mais de doze meses volvidos, termina o ano de 2014 a valer mais de oito euros por ação. Isto apesar de ter havido uma segunda fase de privatização, em que mais ações chegaram ao mercado. O retorno anual, incluindo dividendos, foi de 51,5%. Ano positivo tiveram também as ações do grupo EDP, que beneficiam entre outros fatores de custos de financiamento mais baratos no mercado de dívida, e também as papeleiras. A Portucel subiu 14,27% e a Altri ganhou 12,89% (retorno total, com dividendos).

Do lado das perdas, a principal foi, sem dúvida, a ação do Banco Espírito Santo. A negociação das ações foi suspensa indefinidamente a 1 de agosto, quando os títulos perdiam 87% e valiam 12 cêntimos. O banco viria a ser alvo de um processo de resolução, que daria lugar à transferência dos ativos “saudáveis” para uma nova instituição, a que se deu o nome de Novo Banco. O colapso do BES arrastou consigo, também, a Portugal Telecom, empresa que investiu quase 900 milhões de euros em papel comercial do Grupo Espírito Santo no início do ano e que ainda não viu reembolsado esse valor.

Na bolsa de Lisboa, o que está cotado é a PT SGPS, que além de uma participação da empresa resultante da fusão da Portugal Telecom e da Oi tem essa dívida da Rioforte e uma opção de compra de ações da empresa resultante da fusão. Essas ações fecham o ano de 2014 a perder 71,66%, um ano que também ficou marcado pelo processo de venda da “telecom” portuguesa por parte da Oi. Os franceses da Altice parecem estar em boa posição para garantir o concurso da empresa. Entre as maiores perdas no PSI-20 em 2014, estiveram, também, as ações da Mota-Engil, dos bancos BCP e Banif, e a Jerónimo Martins, que tem enfrentado dificuldades crescentes no crucial mercado polaco.

2015 pode, contudo, ser um ano bem mais positivo para a bolsa de Lisboa. Segundo estimativas da Bloomberg a partir das recomendações médias dos analistas de ações, a bolsa portuguesa tem um potencial de valorização de 27,9%. É o potencial mais expressivo em todas as principais bolsas mundiais, segundo estas estimativas. O ano de 2015 será, contudo, um ano repleto de riscos para as bolsas mundiais, ainda que com elevado potencial para surpresas positivas.

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