A Moda dos Sistemas Fiscais Paralelos – (Matem o Monstro / Parte III)

08-04-2015
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A Moda dos Sistemas Fiscais Paralelos – (Matem o Monstro / Parte III)

O infame Projecto-Lei 118 (#PL118), sobre cópia privada, apresentado pela deputada Gabriela Canavilhas, não pecava apenas pela ignomínia moral de extorquir riqueza a muitos consumidores de produtos electrónicos para distribuir pelo grupo patrocinante com quem a deputada se sente identificada.

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Tão negativo como esta usurpação de riqueza, estava o método de apropriação que o #PL118 criava: um sistema fiscal paralelo em que os elevadíssimos custos administrativos e burocráticos ficavam a cargo de quem paga, amplificando significativamente o preço real do imposto. Uma monstruosidade.

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Para disfarçar, chamavam ao imposto “compensação”. Apenas uma figura de estilo. Era um imposto. A diferença entre este e outros impostos, estava apenas no circuito redistributivo. Estes impostos não passavam pelo estado, sendo entregues directamente às organizações privadas dos beneficiários.

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A criação de sistemas fiscais paralelos, parece que virou moda. O novo Projecto Lei do Cinema (pdf), apresentado pelo Secretário de Estado da Cultura Francisco José Viegas, faz o mesmo. Não apenas cria ou adapta o imposto paralelo, como inventa obrigações de aplicações de recursos para as empresas do sector, substituindo-se por antecipação às opções das administrações e dos accionistas das empresas. Para completar o ramalhete de tudo o que não se pode fazer, não faltam os habituais sistemas de controle obrigatório, suportados em grande parte por quem já tem que pagar as taxas e a insensata catrefada de obrigações futuras que se legislam para um estado falido.

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Não existe melhor exemplo de tudo o que não deve ser feito.

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Veja-se:

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1. As taxas para alimentar o sistema:

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“A publicidade comercial exibida nas salas de cinema, a comunicação comercial audiovisual difundida pelos operadores de televisão (os estrangeiros, também?) ou por qualquer meio transmitida pelos operadores de distribuição, a comunicação comercial audiovisual incluída nos serviços audiovisuais a pedido (leia-se, Internet – You Tube a afins, paguem), bem como a publicidade incluída nos guias electrónicos de programação, (Zon, Meo, paguem) qualquer que seja a plataforma de exibição (telemóveis, iPads, ecrãs públicos, paguem), difusão ou transmissão, está sujeita a uma taxa, denominada taxa de exibição, que constitui encargo do anunciante, de 4% sobre o preço pago.”

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“ Os operadores de serviços de televisão por subscrição contribuem com o pagamento de uma taxa anual correspondente a cinco euros por cada subscrição dos seus serviços que permita o acesso a serviços de programas televisivos, que constitui encargo dos operadores”. Exige-se a todos os clientes de televisão por cabo um imposto de 5 euros + IVA, a acrescer ao custo actual do serviço – sobre este não restam dúvidas – vai directamente ao bolso dos consumidores, sem passar pela Lei do Orçamento.

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“Os operadores de serviços audiovisuais a pedido contribuem com o pagamento de uma taxa anual correspondente a um euro por cada subscrição individual dos seus serviços, independentemente do número de utilizações efetivas por cada utilizador, que constitui encargo dos operadores”. – mais 1 euro, do bolso dos consumidores.

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2. As obrigações impostas às empresas – uma mistura de imposto com imposição de actuação na área de actividade rentista que esta lei pretende beneficiar:

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“Obrigações de investimento anual dos operadores de televisão no financiamento de trabalhos de escrita e desenvolvimento, produção, co-produção de obras criativas nacionais, ou na aquisição de direitos de difusão, transmissão ou disponibilização de obras criativas nacionais e europeias, de 1,25% das receitas anuais da comunicação comercial audiovisual” – repare-se que as empresas são OBRIGADAS a investir no sector. A SportTV, por exemplo, vai ser obrigada a reter 1,25% das suas receitas para investir no cinema português – algo que não faz o menor sentido para uma empresa vocacionada para transmissões desportivas. Estes 1,25% acabam por ser apenas mais uma taxa encapotada, e o melhor para as empresas é pagarem para se livrarem da obrigação de fazerem coisas para as quais não têm a menor vocação. Como é óbvio, este 1,25% vai acrescer directa ou indirectamente ao preço do serviço ao cliente final.

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“A obrigação de investimento aplicável ao operador de serviço público de televisão equivale a uma quantia correspondente a 8% das receitas anuais proveniente da contribuição para o audiovisual, criada pela Lei n. 30/2003” – a RTP, falida, continua a ser sobrecarregada por obrigações para com terceiros. Já não basta a taxa do audiovisual – outro absurdo que deveria ser extinto – como agora se determina a obrigação de parte dessa taxa no grupo rentista do cinema português. A falácia desta obrigação é grande. Sendo os prejuízos da RTP suportados pelo contribuinte, ao obrigar a RTP a gastar para lá do que já são os seus custos operativos num qualquer desígnio cultural, está a impôr-se ao contribuinte que suporte essa fatia via impostos. Por estas e por outras é que é essencial privatizar rapidamente a RTP.

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“A participação dos distribuidores na produção cinematográfica e audiovisual é assegurada através do investimento anual em obras cinematográficas nacionais de um montante não inferior ao equivalente a 3% das receitas provenientes da actividade de distribuição de obras cinematográficas, percentagem que pode ser revista, anualmente, através de diploma próprio”. Imposto de 3% sobre as receitas.

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“participação dos distribuidores de videogramas através do investimento anual na aquisição de direitos para edição ou distribuição em videograma de obras cinematográficas nacionais em montante não inferior ao equivalente a 2% das receitas resultantes do exercício da actividade de distribuição de videogramas” – Mais um a pagar pelos consumidores e que afecta, sobretudo, a compra de DVDs.

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“ Os exibidores cinematográficos devem reter 7,5% da importância do preço da venda ao público dos bilhetes de cinema.” – um imposto de 7,5% sobre todos os bilhetes de cinema – nada meigo – mas neste caso com uma piada adicional:

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a) 5% destinam-se exclusivamente ao fomento da exibição cinematográfica e à manutenção da sala geradora da receita, é receita gerida pelo exibidor e tem expressão contabilística própria;

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O legislador explica ao distribuidor como deve gerir a receita. Isto é tão absurdo que não tem explicação. Os custos de manutenção dos espaços não se definem por lei. Pode ser muito menos ou muito mais e se há alguém que não faz a mínima ideia do que esses custos possam representar em cada caso, é o legislador. Fica por saber o que acontece se a sala for de uma empresa e o distribuidor for outro. Que disparate.

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3. Big Brother

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As obrigações que se pretendem eternizar para o nosso estado falido são imensas – ver Tirem-me deste filme (Matem o Monstro II). E não falta o Big Brother:

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“O Estado assegura um registo de empresas cinematográficas e audiovisuais regularmente constituídas, para efeitos da atribuição dos apoios e do cumprimento das obrigações previstos na presente Lei. … O registo referido no número anterior é obrigatório para todas as pessoas singulares ou colectivas com sede ou estabelecimento estável no território nacional que tenham por actividade comercial a produção, a distribuição e a exibição, bem como os laboratórios e estúdios de rodagem, dobragem e legendagem e as empresas de equipamento e meios técnicos.” Livre criação? Não, em Portugal não. Só com licença, registo e alvará.

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E depois, cada um que pague a sua própria sepultura – o Estado quer saber tudo:.

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“O controlo de bilheteiras é efectuado pelo sistema de gestão e controlo de bilheteiras, que permite a recepção e tratamento da informação relativa à emissão de bilhetes, e respectiva divulgação, nos termos legalmente permitidos, para garantir o efectivo controlo de receitas e a informação relativa ao período de exibição de cada filme e ao número de espectadores, nos termos do diploma próprio que o regulamenta”.

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Não aprendemos. Em vez de desmontar o Monstro, continuamos a alimentá-lo, de uma maneira absurda, impensada, desgraçada. Se querem dar dinheiro ao cinema português, é preferível que vão ao orçamento e tirem uma fatia. Abram menos um hospital, despeçam 1000 polícias, fechem meia dúzia de creches, cortem nas reformas. Agora fazer este tipo de leis, criar burocracias e taxas disfarçadas, por favor, não. Isto são só impostos desorçamentados e burocracia. Parem com isto.

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Caros deputados do PP e do PSD, vocês têm maioria. TENHAM MÃO NISTO.

A Moda dos Sistemas Fiscais Paralelos – (Matem o Monstro / Parte III)

O infame Projecto-Lei 118 (#PL118), sobre cópia privada, apresentado pela deputada Gabriela Canavilhas, não pecava apenas pela ignomínia moral de extorquir riqueza a muitos consumidores de produtos electrónicos para distribuir pelo grupo patrocinante com quem a deputada se sente identificada.

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Tão negativo como esta usurpação de riqueza, estava o método de apropriação que o #PL118 criava: um sistema fiscal paralelo em que os elevadíssimos custos administrativos e burocráticos ficavam a cargo de quem paga, amplificando significativamente o preço real do imposto. Uma monstruosidade.

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Para disfarçar, chamavam ao imposto “compensação”. Apenas uma figura de estilo. Era um imposto. A diferença entre este e outros impostos, estava apenas no circuito redistributivo. Estes impostos não passavam pelo estado, sendo entregues directamente às organizações privadas dos beneficiários.

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A criação de sistemas fiscais paralelos, parece que virou moda. O novo Projecto Lei do Cinema (pdf), apresentado pelo Secretário de Estado da Cultura Francisco José Viegas, faz o mesmo. Não apenas cria ou adapta o imposto paralelo, como inventa obrigações de aplicações de recursos para as empresas do sector, substituindo-se por antecipação às opções das administrações e dos accionistas das empresas. Para completar o ramalhete de tudo o que não se pode fazer, não faltam os habituais sistemas de controle obrigatório, suportados em grande parte por quem já tem que pagar as taxas e a insensata catrefada de obrigações futuras que se legislam para um estado falido.

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Não existe melhor exemplo de tudo o que não deve ser feito.

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Veja-se:

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1. As taxas para alimentar o sistema:

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“A publicidade comercial exibida nas salas de cinema, a comunicação comercial audiovisual difundida pelos operadores de televisão (os estrangeiros, também?) ou por qualquer meio transmitida pelos operadores de distribuição, a comunicação comercial audiovisual incluída nos serviços audiovisuais a pedido (leia-se, Internet – You Tube a afins, paguem), bem como a publicidade incluída nos guias electrónicos de programação, (Zon, Meo, paguem) qualquer que seja a plataforma de exibição (telemóveis, iPads, ecrãs públicos, paguem), difusão ou transmissão, está sujeita a uma taxa, denominada taxa de exibição, que constitui encargo do anunciante, de 4% sobre o preço pago.”

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“ Os operadores de serviços de televisão por subscrição contribuem com o pagamento de uma taxa anual correspondente a cinco euros por cada subscrição dos seus serviços que permita o acesso a serviços de programas televisivos, que constitui encargo dos operadores”. Exige-se a todos os clientes de televisão por cabo um imposto de 5 euros + IVA, a acrescer ao custo actual do serviço – sobre este não restam dúvidas – vai directamente ao bolso dos consumidores, sem passar pela Lei do Orçamento.

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“Os operadores de serviços audiovisuais a pedido contribuem com o pagamento de uma taxa anual correspondente a um euro por cada subscrição individual dos seus serviços, independentemente do número de utilizações efetivas por cada utilizador, que constitui encargo dos operadores”. – mais 1 euro, do bolso dos consumidores.

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2. As obrigações impostas às empresas – uma mistura de imposto com imposição de actuação na área de actividade rentista que esta lei pretende beneficiar:

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“Obrigações de investimento anual dos operadores de televisão no financiamento de trabalhos de escrita e desenvolvimento, produção, co-produção de obras criativas nacionais, ou na aquisição de direitos de difusão, transmissão ou disponibilização de obras criativas nacionais e europeias, de 1,25% das receitas anuais da comunicação comercial audiovisual” – repare-se que as empresas são OBRIGADAS a investir no sector. A SportTV, por exemplo, vai ser obrigada a reter 1,25% das suas receitas para investir no cinema português – algo que não faz o menor sentido para uma empresa vocacionada para transmissões desportivas. Estes 1,25% acabam por ser apenas mais uma taxa encapotada, e o melhor para as empresas é pagarem para se livrarem da obrigação de fazerem coisas para as quais não têm a menor vocação. Como é óbvio, este 1,25% vai acrescer directa ou indirectamente ao preço do serviço ao cliente final.

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“A obrigação de investimento aplicável ao operador de serviço público de televisão equivale a uma quantia correspondente a 8% das receitas anuais proveniente da contribuição para o audiovisual, criada pela Lei n. 30/2003” – a RTP, falida, continua a ser sobrecarregada por obrigações para com terceiros. Já não basta a taxa do audiovisual – outro absurdo que deveria ser extinto – como agora se determina a obrigação de parte dessa taxa no grupo rentista do cinema português. A falácia desta obrigação é grande. Sendo os prejuízos da RTP suportados pelo contribuinte, ao obrigar a RTP a gastar para lá do que já são os seus custos operativos num qualquer desígnio cultural, está a impôr-se ao contribuinte que suporte essa fatia via impostos. Por estas e por outras é que é essencial privatizar rapidamente a RTP.

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“A participação dos distribuidores na produção cinematográfica e audiovisual é assegurada através do investimento anual em obras cinematográficas nacionais de um montante não inferior ao equivalente a 3% das receitas provenientes da actividade de distribuição de obras cinematográficas, percentagem que pode ser revista, anualmente, através de diploma próprio”. Imposto de 3% sobre as receitas.

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“participação dos distribuidores de videogramas através do investimento anual na aquisição de direitos para edição ou distribuição em videograma de obras cinematográficas nacionais em montante não inferior ao equivalente a 2% das receitas resultantes do exercício da actividade de distribuição de videogramas” – Mais um a pagar pelos consumidores e que afecta, sobretudo, a compra de DVDs.

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“ Os exibidores cinematográficos devem reter 7,5% da importância do preço da venda ao público dos bilhetes de cinema.” – um imposto de 7,5% sobre todos os bilhetes de cinema – nada meigo – mas neste caso com uma piada adicional:

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a) 5% destinam-se exclusivamente ao fomento da exibição cinematográfica e à manutenção da sala geradora da receita, é receita gerida pelo exibidor e tem expressão contabilística própria;

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O legislador explica ao distribuidor como deve gerir a receita. Isto é tão absurdo que não tem explicação. Os custos de manutenção dos espaços não se definem por lei. Pode ser muito menos ou muito mais e se há alguém que não faz a mínima ideia do que esses custos possam representar em cada caso, é o legislador. Fica por saber o que acontece se a sala for de uma empresa e o distribuidor for outro. Que disparate.

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3. Big Brother

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As obrigações que se pretendem eternizar para o nosso estado falido são imensas – ver Tirem-me deste filme (Matem o Monstro II). E não falta o Big Brother:

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“O Estado assegura um registo de empresas cinematográficas e audiovisuais regularmente constituídas, para efeitos da atribuição dos apoios e do cumprimento das obrigações previstos na presente Lei. … O registo referido no número anterior é obrigatório para todas as pessoas singulares ou colectivas com sede ou estabelecimento estável no território nacional que tenham por actividade comercial a produção, a distribuição e a exibição, bem como os laboratórios e estúdios de rodagem, dobragem e legendagem e as empresas de equipamento e meios técnicos.” Livre criação? Não, em Portugal não. Só com licença, registo e alvará.

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E depois, cada um que pague a sua própria sepultura – o Estado quer saber tudo:.

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“O controlo de bilheteiras é efectuado pelo sistema de gestão e controlo de bilheteiras, que permite a recepção e tratamento da informação relativa à emissão de bilhetes, e respectiva divulgação, nos termos legalmente permitidos, para garantir o efectivo controlo de receitas e a informação relativa ao período de exibição de cada filme e ao número de espectadores, nos termos do diploma próprio que o regulamenta”.

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Não aprendemos. Em vez de desmontar o Monstro, continuamos a alimentá-lo, de uma maneira absurda, impensada, desgraçada. Se querem dar dinheiro ao cinema português, é preferível que vão ao orçamento e tirem uma fatia. Abram menos um hospital, despeçam 1000 polícias, fechem meia dúzia de creches, cortem nas reformas. Agora fazer este tipo de leis, criar burocracias e taxas disfarçadas, por favor, não. Isto são só impostos desorçamentados e burocracia. Parem com isto.

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Caros deputados do PP e do PSD, vocês têm maioria. TENHAM MÃO NISTO.

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