Papel comercial do GES alimenta guerra entre supervisores

25-03-2015
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Papel comercial do GES alimenta guerra entre supervisores

Filipe Alves e Marta Marques Silva

00:07

Ao contrário do esperado, Carlos Costa não apresentou no Parlamento a solução para o papel comercial, que causou polémica com CMVM. E reiterou que responsabilidade é dos emitentes.

O tema do papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) vendido a clientes de retalho do antigo BES marcou as audições do governador do Banco de Portugal (BdP) e do presidente da CMVM na Comissão Parlamentar de Inquérito. Os supervisores continuam às avessas em relação à solução para este problema que afecta 2.500 investidores, com Carlos Tavares a opor-se a uma solução que faça discriminação entre clientes e Carlos Costa a repetir que a responsabilidade não é do Novo Banco, mas sim das ‘holdings' do GES no Luxemburgo, ou do BES "mau", nos casos em que tenha existido venda fraudulenta.

Carlos Costa mostrou-se revoltado com a forma como tem sido tratado pelos clientes lesados do papel comercial e defendeu a actuação do BdP que, em seu entender, assegurou a estabilidade financeira do país, com a resolução do BES. "Se a 3 de Agosto o BdP se tivesse acobardado, o país estaria hoje muito mal", disse.

"Fui apelidado, este fim-de-semana, de gatuno. Não roubei nada a ninguém", afirmou o governador, numa alusão à manifestação à porta da sua residência pelos clientes lesados. Carlos Costa defendeu que as aplicações financeiras, como o papel comercial, têm risco, portanto, a menos que os clientes tenham sido alvo de práticas de venda desadequadas, terão de assumir as perdas.

Solução não pode afectar rácios de capital do Novo Banco

O governador reiterou que, ainda assim, o Novo Banco pode avançar com uma solução para estes clientes, se a mesma não afectar os seus rácios. Mas, ao contrário do que se esperava, não formalizou a solução que foi noticiada na segunda-feira e que prevê a perda de mais de metade do capital.

"O Novo Banco está obrigado a critérios de boa gestão, pelo que tais iniciativas só poderão ser promovidas se forem geradoras de valor para o banco, nomeadamente se não colocarem em causa os rácios de capital e se permitirem preservar a relação comercial do banco com os seus clientes", defendeu, acrescentando que "qualquer proposta comercial tem de assentar no princípio da equivalência financeira, segundo o qual o Novo Banco deve pagar pelos títulos que eventualmente venha a adquirir aos seus clientes o valor correspondente à real estimativa de recuperação desses instrumentos". Como a Rioforte e a ESI estão insolventes, isto significa que os clientes só recuperam uma pequena parte. Carlos Costa acrescentou, porém, que é admissível que o Novo Banco ofereça um prémio sobre a estimativa de recuperação dos títulos GES que estes detêm (...) e o seu impacto para o banco pode ser limitado pela criação de um excedente de fundos próprios que os mesmos investidores ajudem a criar".

Assim, referiu-se, sem entrar em detalhes, à solução que está a ser ultimada com o Novo Banco e que prevê a perda de cerca de 60% dos montantes investidos. Só terão acesso à solução os clientes que fizerem uma aplicação adicional no equivalente a 20% do investimento original. O objectivo é fazer com que o impacto nos rácios do Novo Banco seja nulo.

Esta solução não tem a concordância da CMVM, cujo presidente, Carlos Tavares, disse que os investidores não podem ser discriminados e que o BdP tem de honrar as promessas feitas aos clientes. "A solução adoptada não deve ser discriminatória dos clientes, dado que não é possível estabelecer diferenças entre clientes. De ver uma solução generalizada", defendeu. Mas a CMVM não tem poder de veto sobre a solução que venha a ser decidida pelo BdP.

BdP disse aos clientes que provisão estava no Novo Banco

Carlos Costa foi confrontado, na audição, com uma dessas promessas feitas por escrito. Mariana Mortágua (BE) questionou-o sobre os emails, a que o Económico teve acesso, que o BdP enviou aos clientes lesados no início de Agosto; onde era dito que "a provisão que acautela o risco relacionado com o reembolso aos clientes de retalho do BES de papel comercial do GES foi transferido para o Novo Banco". E ainda: "Compete ao Novo Banco decidir sobre o reembolso de papel comercial do GES".

Confrontado com estes documentos, o governador afirmou que os mesmos não conferem um direito a esses investidores e que o texto foi mal escrito. "Se fosse eu a escrever, não escreveria assim", disse Carlos Costa, suscitando um protesto de Mortágua, por o governador não assumir a responsabilidade por esta forma de actuação do Banco de Portugal.

Papel comercial do GES alimenta guerra entre supervisores

Filipe Alves e Marta Marques Silva

00:07

Ao contrário do esperado, Carlos Costa não apresentou no Parlamento a solução para o papel comercial, que causou polémica com CMVM. E reiterou que responsabilidade é dos emitentes.

O tema do papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES) vendido a clientes de retalho do antigo BES marcou as audições do governador do Banco de Portugal (BdP) e do presidente da CMVM na Comissão Parlamentar de Inquérito. Os supervisores continuam às avessas em relação à solução para este problema que afecta 2.500 investidores, com Carlos Tavares a opor-se a uma solução que faça discriminação entre clientes e Carlos Costa a repetir que a responsabilidade não é do Novo Banco, mas sim das ‘holdings' do GES no Luxemburgo, ou do BES "mau", nos casos em que tenha existido venda fraudulenta.

Carlos Costa mostrou-se revoltado com a forma como tem sido tratado pelos clientes lesados do papel comercial e defendeu a actuação do BdP que, em seu entender, assegurou a estabilidade financeira do país, com a resolução do BES. "Se a 3 de Agosto o BdP se tivesse acobardado, o país estaria hoje muito mal", disse.

"Fui apelidado, este fim-de-semana, de gatuno. Não roubei nada a ninguém", afirmou o governador, numa alusão à manifestação à porta da sua residência pelos clientes lesados. Carlos Costa defendeu que as aplicações financeiras, como o papel comercial, têm risco, portanto, a menos que os clientes tenham sido alvo de práticas de venda desadequadas, terão de assumir as perdas.

Solução não pode afectar rácios de capital do Novo Banco

O governador reiterou que, ainda assim, o Novo Banco pode avançar com uma solução para estes clientes, se a mesma não afectar os seus rácios. Mas, ao contrário do que se esperava, não formalizou a solução que foi noticiada na segunda-feira e que prevê a perda de mais de metade do capital.

"O Novo Banco está obrigado a critérios de boa gestão, pelo que tais iniciativas só poderão ser promovidas se forem geradoras de valor para o banco, nomeadamente se não colocarem em causa os rácios de capital e se permitirem preservar a relação comercial do banco com os seus clientes", defendeu, acrescentando que "qualquer proposta comercial tem de assentar no princípio da equivalência financeira, segundo o qual o Novo Banco deve pagar pelos títulos que eventualmente venha a adquirir aos seus clientes o valor correspondente à real estimativa de recuperação desses instrumentos". Como a Rioforte e a ESI estão insolventes, isto significa que os clientes só recuperam uma pequena parte. Carlos Costa acrescentou, porém, que é admissível que o Novo Banco ofereça um prémio sobre a estimativa de recuperação dos títulos GES que estes detêm (...) e o seu impacto para o banco pode ser limitado pela criação de um excedente de fundos próprios que os mesmos investidores ajudem a criar".

Assim, referiu-se, sem entrar em detalhes, à solução que está a ser ultimada com o Novo Banco e que prevê a perda de cerca de 60% dos montantes investidos. Só terão acesso à solução os clientes que fizerem uma aplicação adicional no equivalente a 20% do investimento original. O objectivo é fazer com que o impacto nos rácios do Novo Banco seja nulo.

Esta solução não tem a concordância da CMVM, cujo presidente, Carlos Tavares, disse que os investidores não podem ser discriminados e que o BdP tem de honrar as promessas feitas aos clientes. "A solução adoptada não deve ser discriminatória dos clientes, dado que não é possível estabelecer diferenças entre clientes. De ver uma solução generalizada", defendeu. Mas a CMVM não tem poder de veto sobre a solução que venha a ser decidida pelo BdP.

BdP disse aos clientes que provisão estava no Novo Banco

Carlos Costa foi confrontado, na audição, com uma dessas promessas feitas por escrito. Mariana Mortágua (BE) questionou-o sobre os emails, a que o Económico teve acesso, que o BdP enviou aos clientes lesados no início de Agosto; onde era dito que "a provisão que acautela o risco relacionado com o reembolso aos clientes de retalho do BES de papel comercial do GES foi transferido para o Novo Banco". E ainda: "Compete ao Novo Banco decidir sobre o reembolso de papel comercial do GES".

Confrontado com estes documentos, o governador afirmou que os mesmos não conferem um direito a esses investidores e que o texto foi mal escrito. "Se fosse eu a escrever, não escreveria assim", disse Carlos Costa, suscitando um protesto de Mortágua, por o governador não assumir a responsabilidade por esta forma de actuação do Banco de Portugal.

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