Foi ontem aprovado pelo PS na Assembleia da República o Orçamento de Estado para 2009, com os votos contra de todas as bancadas parlamentares. Em mais de 500 propostas de alteração foram apenas aprovadas 4. É apenas mais um sinal da falta de abertura e diálogo do governo. Falta de diálogo que em certas áreas se pode tornar profundamente dramática – falo do Ensino Superior. Desde o início do ano lectivo que a proposta de OE2009 para o Ensino Superior tem vindo a ser alvo de duras críticas por parte de toda a comunidade académica. Logo em Setembro o Presidente do CRUP, Seabra Santos que denunciou a “institucionalização do financiamento intercalar à medida das necessidades” e ainda que a má gestão é a “consequência inevitável e esperável do sub-financiamento e não a sua causa”. Na mesma altura, o Senado da UL emitia uma deliberação sobre o financiamento previsto onde assinalava que “A maneira como o Governo condiciona a vida das universidades, sugerindo-lhes práticas desresponsabilizantes de sub-orçamentação ou, pior ainda, obrigando-as a medidas de ‘comercialização’ do ensino e de desqualificação do seu corpo docente não auguram nada de positivo para os próximos tempos” . Esta prática não é nova, mas este ano foram introduzidas alterações que, num cenário em que o novo Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior já se encontra implementado, lhe dão novos, e mais preocupantes, contornos. Basta analisar a distribuição do aumento de 90 milhões de euros para perceber imediatamente quais as prioridades do Ministro Mariano Gago: 36 milhões para distribuição pelas instituições10 milhões para Acção Social Escolar20 milhões de reserva para recuperação institucional e reforços24 milhões para “orçamento competitivo”Após anos de sucessivos cortes orçamentais não espanta que mais de 20% deste aumento se destine a instituições que se encontram ou em ruptura financeira ou próximo dela, dado que já há 4 instituições neste momento que se encontram em ruptura financeira (UTAD, U. Algarve, U. Évora e U. Açores). O que espanta é a análise da distribuição do orçamento pelas diversas Universidades e o que isso representa em termos de aumento percentual:- As maiores universidades do país recebem aumentos de 2% - abaixo da inflação;- As universidades que se encontram já em ruptura financeira recebem aumentos entre os 6% e os 11%;- O ISCTE – com apenas cerca de 5000 alunos mas que decidiu passar a fundação – tem um aumento de 24%.Convém lembrar que em 2006 os encargos com a Caixa Geral de Aposentações passaram a estar a cargo das instituições, o que limitou ainda mais os seus orçamentos. No caso da UL, em que as despesas com a CGA representam cerca de 11% do orçamento da instituição, isto traduz-se numa diminuição de 25%, em valores reais, das verbas transferidas. As alterações introduzidas na fórmula do financiamento revelam a opção política de Mariano Gago que promove a tecnologia e esquece tudo o resto: enquanto os estudantes de Engenharia viram o seu índice de custo aumentado em 11%, os estudantes de Medicina viram-no reduzido em 6%, os de línguas vivas em 10% e os de matemática em 3%. Além disso, o novo “orçamento competitivo” veio acentuar ainda mais a discriminação entre instituições mais pequenas ou periféricas e as grandes instituições com uma parte reservada a fundações de direito privado. Acresce ainda que as fundações são as únicas instituições a ter direito a financiamento plurianual, enquanto as universidades públicas são impedidas, na prática, de fazer planos estratégicos a longo prazo. As universidades, asfixiadas financeiramente, vêem a sua actividade condicionada, obrigadas a limitar a contratação de pessoal e a encontrar formas de aumentar as receitas próprias – através de aumentos de propinas e da comercialização do ensino. Também neste aspecto, as universidades orientadas para a tecnologia são favorecidas, já que áreas de conhecimento fundamentais como a história, a linguística ou a matemática pura não geram necessariamente receitas. Com o governo a desresponsabilizar-se cada vez mais do serviço público que deveria assegurar, as universidades são conduzidas a um beco: ou passam a fundação e são privilegiadas (como o ISCTE), ou entram em ruptura financeira, sem capacidade para definir políticas estratégicas, vigiadas por um controlador financeiro, vendo as autonomias claramente limitadas. Nesse sentido o financiamento foge ao enquadramento legal. Num momento em que professores e estudantes do ensino básico e secundário inundam as ruas e fervem em protestos contra a Ministra da Educação, seria natural que estudantes e professores do Ensino Superior levantassem também a voz bem alto contra as políticas do Ministro Mariano Gago. Seria natural que a aprovação do Orçamento de Estado ontem tivesse sido marcada por protestos. No entanto os protestos estudantis são tímidos e localizados sobretudo na UL, e os professores permanecem tranquilamente nos seus gabinetes, mesmo quando vêem o salário de Dezembro em risco. Comentarei esta questão num futuro post.
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Foi ontem aprovado pelo PS na Assembleia da República o Orçamento de Estado para 2009, com os votos contra de todas as bancadas parlamentares. Em mais de 500 propostas de alteração foram apenas aprovadas 4. É apenas mais um sinal da falta de abertura e diálogo do governo. Falta de diálogo que em certas áreas se pode tornar profundamente dramática – falo do Ensino Superior. Desde o início do ano lectivo que a proposta de OE2009 para o Ensino Superior tem vindo a ser alvo de duras críticas por parte de toda a comunidade académica. Logo em Setembro o Presidente do CRUP, Seabra Santos que denunciou a “institucionalização do financiamento intercalar à medida das necessidades” e ainda que a má gestão é a “consequência inevitável e esperável do sub-financiamento e não a sua causa”. Na mesma altura, o Senado da UL emitia uma deliberação sobre o financiamento previsto onde assinalava que “A maneira como o Governo condiciona a vida das universidades, sugerindo-lhes práticas desresponsabilizantes de sub-orçamentação ou, pior ainda, obrigando-as a medidas de ‘comercialização’ do ensino e de desqualificação do seu corpo docente não auguram nada de positivo para os próximos tempos” . Esta prática não é nova, mas este ano foram introduzidas alterações que, num cenário em que o novo Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior já se encontra implementado, lhe dão novos, e mais preocupantes, contornos. Basta analisar a distribuição do aumento de 90 milhões de euros para perceber imediatamente quais as prioridades do Ministro Mariano Gago: 36 milhões para distribuição pelas instituições10 milhões para Acção Social Escolar20 milhões de reserva para recuperação institucional e reforços24 milhões para “orçamento competitivo”Após anos de sucessivos cortes orçamentais não espanta que mais de 20% deste aumento se destine a instituições que se encontram ou em ruptura financeira ou próximo dela, dado que já há 4 instituições neste momento que se encontram em ruptura financeira (UTAD, U. Algarve, U. Évora e U. Açores). O que espanta é a análise da distribuição do orçamento pelas diversas Universidades e o que isso representa em termos de aumento percentual:- As maiores universidades do país recebem aumentos de 2% - abaixo da inflação;- As universidades que se encontram já em ruptura financeira recebem aumentos entre os 6% e os 11%;- O ISCTE – com apenas cerca de 5000 alunos mas que decidiu passar a fundação – tem um aumento de 24%.Convém lembrar que em 2006 os encargos com a Caixa Geral de Aposentações passaram a estar a cargo das instituições, o que limitou ainda mais os seus orçamentos. No caso da UL, em que as despesas com a CGA representam cerca de 11% do orçamento da instituição, isto traduz-se numa diminuição de 25%, em valores reais, das verbas transferidas. As alterações introduzidas na fórmula do financiamento revelam a opção política de Mariano Gago que promove a tecnologia e esquece tudo o resto: enquanto os estudantes de Engenharia viram o seu índice de custo aumentado em 11%, os estudantes de Medicina viram-no reduzido em 6%, os de línguas vivas em 10% e os de matemática em 3%. Além disso, o novo “orçamento competitivo” veio acentuar ainda mais a discriminação entre instituições mais pequenas ou periféricas e as grandes instituições com uma parte reservada a fundações de direito privado. Acresce ainda que as fundações são as únicas instituições a ter direito a financiamento plurianual, enquanto as universidades públicas são impedidas, na prática, de fazer planos estratégicos a longo prazo. As universidades, asfixiadas financeiramente, vêem a sua actividade condicionada, obrigadas a limitar a contratação de pessoal e a encontrar formas de aumentar as receitas próprias – através de aumentos de propinas e da comercialização do ensino. Também neste aspecto, as universidades orientadas para a tecnologia são favorecidas, já que áreas de conhecimento fundamentais como a história, a linguística ou a matemática pura não geram necessariamente receitas. Com o governo a desresponsabilizar-se cada vez mais do serviço público que deveria assegurar, as universidades são conduzidas a um beco: ou passam a fundação e são privilegiadas (como o ISCTE), ou entram em ruptura financeira, sem capacidade para definir políticas estratégicas, vigiadas por um controlador financeiro, vendo as autonomias claramente limitadas. Nesse sentido o financiamento foge ao enquadramento legal. Num momento em que professores e estudantes do ensino básico e secundário inundam as ruas e fervem em protestos contra a Ministra da Educação, seria natural que estudantes e professores do Ensino Superior levantassem também a voz bem alto contra as políticas do Ministro Mariano Gago. Seria natural que a aprovação do Orçamento de Estado ontem tivesse sido marcada por protestos. No entanto os protestos estudantis são tímidos e localizados sobretudo na UL, e os professores permanecem tranquilamente nos seus gabinetes, mesmo quando vêem o salário de Dezembro em risco. Comentarei esta questão num futuro post.