NOVA ÁGUIA: REVISTA DE CULTURA PARA O SÉCULO XXI: Não me batas, que eu sou Deus!

27-01-2012
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O Bobo (1923), Lionel Arthur Lindsay(...) Vede o homem e os sete pecados mortais, sete sombras que ele projecta para dentro! Sete sombras da Ferocidade aparando, polindo e envernizando as garras… Sim, o homem enverniza as garras.Porquê? Porque é doido. E como doido, tem o sentido da Beleza. Mas a Beleza sai-lhe feia das mãos . Ai dele! Quer ser Deus e nem mesmo é Satanás. Ai dele! O delírio, essa labareda do Sol, lambeu-lhe os miolos, e o desgraçado começou a dar com a cabeça pelas paredes do Cárcere para ter a ilusão da liberdade! – a ilusão duma letra grande…E assim, vive o pobre orango, sob o azorrague do Destino que lhe impõe as mais cómicas e dolorosas atitudes, sobretudo, a última atitude, infinitamente cómica e funérea!– Não me batas, que eu sou Deus!Mas o Destino ri aquele riso inexorável, fulminante, que rasga uma árvore de alto a baixo!O Destino ri, caro leitor, e Júpiter, encafuado no teu ser, empalidece. Empalidece e ajoelha aos pés dum altar ou se precipita duma ponte! Implora Deus, um outro Deus, ou arromba as portas do Infinito e vai ter com ele!Forçar as portas do Infinito! O belo sonho desvairado! Forçá-lo a tiros de revólver, como Antero.O homem, às vezes, é sublime, pois não é?Teixeira de Pascoaes, ‘O Bailado’ (1921), Poesia de Teixeira de Pascoaes, antologia organizada por Mário Cesariny, Círculo de Leitores, Lisboa: 2005, pp.169-170


O Bobo (1923), Lionel Arthur Lindsay(...) Vede o homem e os sete pecados mortais, sete sombras que ele projecta para dentro! Sete sombras da Ferocidade aparando, polindo e envernizando as garras… Sim, o homem enverniza as garras.Porquê? Porque é doido. E como doido, tem o sentido da Beleza. Mas a Beleza sai-lhe feia das mãos . Ai dele! Quer ser Deus e nem mesmo é Satanás. Ai dele! O delírio, essa labareda do Sol, lambeu-lhe os miolos, e o desgraçado começou a dar com a cabeça pelas paredes do Cárcere para ter a ilusão da liberdade! – a ilusão duma letra grande…E assim, vive o pobre orango, sob o azorrague do Destino que lhe impõe as mais cómicas e dolorosas atitudes, sobretudo, a última atitude, infinitamente cómica e funérea!– Não me batas, que eu sou Deus!Mas o Destino ri aquele riso inexorável, fulminante, que rasga uma árvore de alto a baixo!O Destino ri, caro leitor, e Júpiter, encafuado no teu ser, empalidece. Empalidece e ajoelha aos pés dum altar ou se precipita duma ponte! Implora Deus, um outro Deus, ou arromba as portas do Infinito e vai ter com ele!Forçar as portas do Infinito! O belo sonho desvairado! Forçá-lo a tiros de revólver, como Antero.O homem, às vezes, é sublime, pois não é?Teixeira de Pascoaes, ‘O Bailado’ (1921), Poesia de Teixeira de Pascoaes, antologia organizada por Mário Cesariny, Círculo de Leitores, Lisboa: 2005, pp.169-170

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