Funes, el memorioso: Uma réplica ao Luís Maia

26-01-2012
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Vou-lhe responder em post, meu caro Luís Maia, porque acho que o seu comentário ao meu post anterior o justifica.Entendo o tom colérico que adoptou: afinal de contas deve ser irritante para um apoiante do Bloco registar uma espécie de "proibição dos factos" a que se lhes dê, por uma vez que seja, a oportunidade de governarem o país.Talvez a venham a ter, até; contudo, respondendo a "tudo" você só parcialmente esclareceu a objecção central que eu levantava; esclareceu parcialmente e só parcialmente mas os dirigentes do Bloco nem sequer parcialmente o fazem: e a questão é de saber se abandonaram ou não o trotskismo e o estalinismo que defenderam no passado e, se abandonaram, qual é verdadeiramente a sua ideologia actual. Dito de forma mais concreta: aceitam que as sociedades mais prósperas e civilizadas que a humanidade criou são (ou foram) as dos regimes sociais-democratas e democratas-cristãos que evoluiram na Alemanha, Suécia, Holanda, Noruega, Reino Unido, Dinamarca, França, Itália, etc, a partir dos anos 5o do século passado até que a deriva neo-liberal e a crise do estado-providência vieram estragar um pouco as coisas?Ou continuam a execrar tais regimes? E se continuam que tipo de sociedade propõem afinal?Durante o perído mais agudo do PREC, em Portugal, se alguém se proclamasse social-democrata era tratado como "fascista" e entre os regimes mais defendidos por esses censores tínhamos o efémero socialismo militar peruano (!), o Titismo Joguslavo, o regime concentracionário de Kim-Il -Sung na Coreia do Norte e o modelo Albanês de Enver Hoxha...São esses os modelos de sociedade que o Bloco almeja criar? E se não são quais são afinal? Sim, confesso, senti-me um pouco ridículo e panfletário quando pus a hipótese de um governo do Bloco a solo gerar uma sub-espécie da revolução cultural maoísta.Questão é que você pode ser apoiante do Bloco e condenar o maoísmo puro e duro mas suspeito que "eles", os dirigentes do Bloco, apenas condenariam a China actual, pós Deng Xiaoping, que é sem dúvida outra loiça.Não estou a delirar: ainda recentemente, numa entrevista dada creio que ao Diário de Notícias, o Dr. Garcia Pereira, advogado de mérito, líder do MRPP e personagem pública respeitada defendeu o estalinismo e a revolução cultural maoísta; alegando, entre outras pérolas, que os crimes de massa que se lhes imputavam eram invenções progandeadas por uma lituratura hostil difundida por "valettes de chambre". Louçã é um indivíduo inteligente e faço-lho a justiça de o considerar honesto e bem intencionado segundo as suas concepções ideológicas - mas a respeitabilidade democrática que discutivelmente conseguiu, a travar batalhas políticas por causas parcelares, não ilude a questão: sozinho no poder que modelo de sociedade quereria impor? Uma sociedade burguesa do tipo europeu-ocidental? Curioso é que, ao pensá-lo, ainda me sinto mais ridículo do que antes... Mais: tanto ele como os camaradas dirigentes do partido, por uma questão de honestidade intelectual e teimosia ideologica, nem sequer o admitem e fogem à questão.Durão Barroso foi maoísta e deixou de o ser: claro que sim, mas a esse tenho-o por um tecnocrata oportunista; Pacheco Pereira foi de extrema esquerda mas derivou ideologicamente para a direita e hoje toda a gente sabe o que ele é: contudo, como não lhe podem chamar corrupto nem estúpido resta chamar-lhe "peixeiro", com a falta de complacência com que a esquerda trata os adversários ideológicos mas que curiosamente não admite que a direita use em troca. Mas Louçã, Miguel Portas, Fernando Rosas, Luís Fazenda são o quê hoje em dia?O errado optimismo sobre a natureza humana, o materialismo filosófico, o utopismo, a obsessão por engenharias sociais que corrigissem depressa desigualdades sociais indignas, conjugados com o exercício do poder político levam de imediato a um chocante contacto com a fria realidade das coisas: pessoas naturalmente egoístas (nem todas felizmente e umas mais que outras, mas essas serão a maioria), individualismo, pulsão pela propriedade privada, convicções religiosas, apego a certas tradições revolucionariamente desprezíveis. Depois vem a vertigem. Os melhores entre os revolucionários triunfantes são esmagados pelo próprio vórtice da "sua" revolução (Buckarine, Camilo Cienfuegos, etc, etc); os piores tentam corrigir e reeducar as pessoas à bruta para depois lhe poderem impor a sua engenharia social; a dinâmica revolucionária torna-se imparável e dá no que sempre dá. Não é preciso ir ao maoísmo: Louçã, a quem nunca chamaria Jesuítico, faz-me logo pensar em Robespierre, homem que suponho ter sido incorruptível (pelo menos era a alcunha que lhe deram os contemporâneos) e, ao princípio, muito ao princípio, também socialmente bem intencionado.


Vou-lhe responder em post, meu caro Luís Maia, porque acho que o seu comentário ao meu post anterior o justifica.Entendo o tom colérico que adoptou: afinal de contas deve ser irritante para um apoiante do Bloco registar uma espécie de "proibição dos factos" a que se lhes dê, por uma vez que seja, a oportunidade de governarem o país.Talvez a venham a ter, até; contudo, respondendo a "tudo" você só parcialmente esclareceu a objecção central que eu levantava; esclareceu parcialmente e só parcialmente mas os dirigentes do Bloco nem sequer parcialmente o fazem: e a questão é de saber se abandonaram ou não o trotskismo e o estalinismo que defenderam no passado e, se abandonaram, qual é verdadeiramente a sua ideologia actual. Dito de forma mais concreta: aceitam que as sociedades mais prósperas e civilizadas que a humanidade criou são (ou foram) as dos regimes sociais-democratas e democratas-cristãos que evoluiram na Alemanha, Suécia, Holanda, Noruega, Reino Unido, Dinamarca, França, Itália, etc, a partir dos anos 5o do século passado até que a deriva neo-liberal e a crise do estado-providência vieram estragar um pouco as coisas?Ou continuam a execrar tais regimes? E se continuam que tipo de sociedade propõem afinal?Durante o perído mais agudo do PREC, em Portugal, se alguém se proclamasse social-democrata era tratado como "fascista" e entre os regimes mais defendidos por esses censores tínhamos o efémero socialismo militar peruano (!), o Titismo Joguslavo, o regime concentracionário de Kim-Il -Sung na Coreia do Norte e o modelo Albanês de Enver Hoxha...São esses os modelos de sociedade que o Bloco almeja criar? E se não são quais são afinal? Sim, confesso, senti-me um pouco ridículo e panfletário quando pus a hipótese de um governo do Bloco a solo gerar uma sub-espécie da revolução cultural maoísta.Questão é que você pode ser apoiante do Bloco e condenar o maoísmo puro e duro mas suspeito que "eles", os dirigentes do Bloco, apenas condenariam a China actual, pós Deng Xiaoping, que é sem dúvida outra loiça.Não estou a delirar: ainda recentemente, numa entrevista dada creio que ao Diário de Notícias, o Dr. Garcia Pereira, advogado de mérito, líder do MRPP e personagem pública respeitada defendeu o estalinismo e a revolução cultural maoísta; alegando, entre outras pérolas, que os crimes de massa que se lhes imputavam eram invenções progandeadas por uma lituratura hostil difundida por "valettes de chambre". Louçã é um indivíduo inteligente e faço-lho a justiça de o considerar honesto e bem intencionado segundo as suas concepções ideológicas - mas a respeitabilidade democrática que discutivelmente conseguiu, a travar batalhas políticas por causas parcelares, não ilude a questão: sozinho no poder que modelo de sociedade quereria impor? Uma sociedade burguesa do tipo europeu-ocidental? Curioso é que, ao pensá-lo, ainda me sinto mais ridículo do que antes... Mais: tanto ele como os camaradas dirigentes do partido, por uma questão de honestidade intelectual e teimosia ideologica, nem sequer o admitem e fogem à questão.Durão Barroso foi maoísta e deixou de o ser: claro que sim, mas a esse tenho-o por um tecnocrata oportunista; Pacheco Pereira foi de extrema esquerda mas derivou ideologicamente para a direita e hoje toda a gente sabe o que ele é: contudo, como não lhe podem chamar corrupto nem estúpido resta chamar-lhe "peixeiro", com a falta de complacência com que a esquerda trata os adversários ideológicos mas que curiosamente não admite que a direita use em troca. Mas Louçã, Miguel Portas, Fernando Rosas, Luís Fazenda são o quê hoje em dia?O errado optimismo sobre a natureza humana, o materialismo filosófico, o utopismo, a obsessão por engenharias sociais que corrigissem depressa desigualdades sociais indignas, conjugados com o exercício do poder político levam de imediato a um chocante contacto com a fria realidade das coisas: pessoas naturalmente egoístas (nem todas felizmente e umas mais que outras, mas essas serão a maioria), individualismo, pulsão pela propriedade privada, convicções religiosas, apego a certas tradições revolucionariamente desprezíveis. Depois vem a vertigem. Os melhores entre os revolucionários triunfantes são esmagados pelo próprio vórtice da "sua" revolução (Buckarine, Camilo Cienfuegos, etc, etc); os piores tentam corrigir e reeducar as pessoas à bruta para depois lhe poderem impor a sua engenharia social; a dinâmica revolucionária torna-se imparável e dá no que sempre dá. Não é preciso ir ao maoísmo: Louçã, a quem nunca chamaria Jesuítico, faz-me logo pensar em Robespierre, homem que suponho ter sido incorruptível (pelo menos era a alcunha que lhe deram os contemporâneos) e, ao princípio, muito ao princípio, também socialmente bem intencionado.

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