Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto

30-09-2015
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Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto

Sr. Presidente,

Sr. Ministro, Quero colocar uma pergunta sobre aspectos muito específicos, até porque o tempo de que dispomos é escasso. Em declaração de voto, referindo-se ao artigo 22.º da anterior proposta de lei de bases do desporto, o então Deputado Laurentino Dias criticou o facto de o governo «consagrar, de forma exaustiva, a matéria referente aos estatutos e regulamentos», tendo também dito que a norma relativa a limitação de mandatos era exemplo de uma matéria que deveria estar contemplada no regime de federações e não numa lei de bases. Salientou ainda que o Grupo Parlamentar do PS discordava totalmente da forma de criação do Comité Paraolímpico de Portugal por entender que a sua constituição deveria resultar do movimento associativo e da sua própria organização, podendo, depois disso, e verificados certos requisitos exigidos para a existência do Comité, ser acolhido na lei. A pergunta é óbvia: em ambos os casos referidos, o que é que mudou que justifique tal reviravolta? (…) Sr. Presidente,

Srs. Deputados: O Governo cumpre da pior maneira o seu compromisso programático de apresentar uma nova lei de bases do desporto. Apresenta-nos a proposta de lei de bases da actividade física e do desporto na sequência de um mal-amanhado embuste a que chamou Congresso e que caracterizou como nacional. É um mau serviço para a prática desportiva nacional, a qual, a ser aprovada a presente proposta de lei, não verá resolvidas as suas questões fundamentais e, pelo contrário, verá algumas delas agravadas. Salientamos o facto de que, nesta área, o Governo não fez ainda mais do que a organização de um Congresso de fachada e a apresentação apressada de uma lei de bases, operação de cosmética. Um Congresso que não produz outras conclusões do que as que já estavam escritas não pode ser o alicerce de uma lei de bases. O Governo utiliza o Congresso do Desporto como fonte para o conteúdo da proposta de lei que nos traz. De facto, o Governo enuncia muitos dos aspectos que, em diversas alturas, foram falados; aflora, por epígrafes, diversas matérias, podendo até fazer crer ao mais desatento que esta será até uma proposta de lei ampla e abrangente. No entanto, o que verificamos é que esta é uma lei de bases a prazo, feita à medida de um conjunto de programas do Governo, não apresentando nem uma forma estrutural nem estratégica. Estamos perante uma lei de bases que apenas enuncia as áreas em que o Governo a regulamentará. É, portanto, um «cheque em branco» para actuar na área do desporto. Do conjunto de intenções, porventura justas, de reforçar e clarificar o papel do Estado na promoção, dinamização e desenvolvimento do desporto, fica a sensação de que as mesmas são a máscara para uma lei de bases que acaba por redundar num cenário de aumento das barreiras à prática desportiva generalizada e democratizada. Para o PCP, actividade física e desporto são inseparáveis e constituem duas faces da mesma moeda, não podendo ser, por isso mesmo, dissociadas em conceitos complementares. Para o Governo, no entanto, actividade física é uma qualquer coisa que o povo faz e o desporto é algo assim… mais distante, mais reservado… O Governo mostra alguma intenção de generalizar a prática da actividade física, mas nunca associa esse conceito à prática desportiva. Para este Governo, a barreira entre desporto popular, actividade física e desporto profissional ou federativo é estanque. E é exactamente partindo desta oposição entre actividade física e desporto que o Governo nos propõe que aprovemos uma lei que só age sobre aquilo a que chamou desporto. Para a prática desportiva popular, para o papel do associativismo de base, das colectividades e do associativismo estudantil, para a prática desportiva regular amadora e para a criação de infra-estruturas públicas de apoio à actividade física desportiva parcas palavras se encontram no texto da lei; pouca concretização, apenas alguns enunciados difusos. Para a prática federada e profissional, então, todas as palavras. Tantas que chega ao cúmulo de se intrometer abusivamente nas matérias internas das federações, exigindo desde já um conjunto de requisitos que só às federações cabe decidir: limitação de mandatos, renovação de estatutos de utilidade pública desportiva, formas de tomada de deliberações e eleições, etc. Para o relacionamento entre liga profissional e federação desportiva assume-se, de facto, um avanço em relação à actual situação, clarificando o que em muitos casos tem dado origem a conflitos. Mas o que não se pode é chamar lei de bases a uma lei que só resolve esse aspecto do desporto, intimamente relacionado com um conjunto muito restrito de praticantes e distante da prática desportiva popular. E é todo o outro mundo do desporto que é esquecido nesta lei, desde o desporto no trabalho, que pura e simplesmente desaparece, até à democratização eficiente das práticas, passando pelo papel das várias formas de associativismo. Esta proposta de lei que o Governo nos apresenta vem pejada de lacunas, de redacções apressadas e imprecisas. É uma lei que refere o papel do Estado, separando-o totalmente das autarquias e das regiões autónomas; uma lei que, em alguns casos, passa ao lado da própria Constituição da República Portuguesa. É uma lei feita à medida do grande desporto, das notícias; uma lei feita à medida das necessidades do desporto profissional, esquecendo tudo o resto. Tudo o resto que é a mais importante expressão do desporto. Para o Governo, o desporto popular de massas é enunciado porque tinha de o ser, porque seria demasiadamente grave não o fazer, mas a verdade é que sobre ele esta lei mais não faz do que reconhecer que existe. Como, aliás, faz até para coisas que não existem, como é o caso do Comité Paraolímpicos Português. O PCP tem uma visão radicalmente diferente do desporto: o PCP entende que o Estado, onde se incluem, obviamente, o Governo, as autarquias e as regiões autónomas, tem o principal papel enquanto motor e garante da prática desportiva, numa profunda articulação com o movimento associativo em todas as suas expressões e com as escolas, promovendo uma prática ampla e abrangente, capaz de contrariar a tendência de sedentarização que se tem verificado. Entendemos o desporto como um direito fundamental dos cidadãos, como uma importante componente da sua formação enquanto indivíduo, capaz de formar cada um no sentido dos valores saudáveis da vivência individual e colectiva e capaz de servir como pilar de uma sociedade mais solidária, mais justa e simultaneamente mais saudável. Não resumimos, por isso mesmo, o desporto à sua expressão profissional nem tampouco a esta ou àquela modalidade. Não encaramos as federações desportivas como únicos responsáveis pelo desenvolvimento desportivo e não entendemos desenvolvimento desportivo exclusivamente como obtenção de melhores resultados. Denunciamos a estratégia duvidosa e enganosa de construção desta proposta de lei, a qual enferma de problemas políticos tanto quanto processuais. Uma lei que não virá dar resposta a qualquer dos problemas do desporto de massas, que não apresenta um plano estratégico, mas que, pelo contrário, o erradica, uma lei que de futuro trará mais impedimentos do que facilidades à prática desportiva popular não pode merecer da bancada do PCP um voto que não seja o de oposição. Não que seja pior do que a actual legislação mas, pura e simplesmente, não se nos configura melhor.

Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto

Sr. Presidente,

Sr. Ministro, Quero colocar uma pergunta sobre aspectos muito específicos, até porque o tempo de que dispomos é escasso. Em declaração de voto, referindo-se ao artigo 22.º da anterior proposta de lei de bases do desporto, o então Deputado Laurentino Dias criticou o facto de o governo «consagrar, de forma exaustiva, a matéria referente aos estatutos e regulamentos», tendo também dito que a norma relativa a limitação de mandatos era exemplo de uma matéria que deveria estar contemplada no regime de federações e não numa lei de bases. Salientou ainda que o Grupo Parlamentar do PS discordava totalmente da forma de criação do Comité Paraolímpico de Portugal por entender que a sua constituição deveria resultar do movimento associativo e da sua própria organização, podendo, depois disso, e verificados certos requisitos exigidos para a existência do Comité, ser acolhido na lei. A pergunta é óbvia: em ambos os casos referidos, o que é que mudou que justifique tal reviravolta? (…) Sr. Presidente,

Srs. Deputados: O Governo cumpre da pior maneira o seu compromisso programático de apresentar uma nova lei de bases do desporto. Apresenta-nos a proposta de lei de bases da actividade física e do desporto na sequência de um mal-amanhado embuste a que chamou Congresso e que caracterizou como nacional. É um mau serviço para a prática desportiva nacional, a qual, a ser aprovada a presente proposta de lei, não verá resolvidas as suas questões fundamentais e, pelo contrário, verá algumas delas agravadas. Salientamos o facto de que, nesta área, o Governo não fez ainda mais do que a organização de um Congresso de fachada e a apresentação apressada de uma lei de bases, operação de cosmética. Um Congresso que não produz outras conclusões do que as que já estavam escritas não pode ser o alicerce de uma lei de bases. O Governo utiliza o Congresso do Desporto como fonte para o conteúdo da proposta de lei que nos traz. De facto, o Governo enuncia muitos dos aspectos que, em diversas alturas, foram falados; aflora, por epígrafes, diversas matérias, podendo até fazer crer ao mais desatento que esta será até uma proposta de lei ampla e abrangente. No entanto, o que verificamos é que esta é uma lei de bases a prazo, feita à medida de um conjunto de programas do Governo, não apresentando nem uma forma estrutural nem estratégica. Estamos perante uma lei de bases que apenas enuncia as áreas em que o Governo a regulamentará. É, portanto, um «cheque em branco» para actuar na área do desporto. Do conjunto de intenções, porventura justas, de reforçar e clarificar o papel do Estado na promoção, dinamização e desenvolvimento do desporto, fica a sensação de que as mesmas são a máscara para uma lei de bases que acaba por redundar num cenário de aumento das barreiras à prática desportiva generalizada e democratizada. Para o PCP, actividade física e desporto são inseparáveis e constituem duas faces da mesma moeda, não podendo ser, por isso mesmo, dissociadas em conceitos complementares. Para o Governo, no entanto, actividade física é uma qualquer coisa que o povo faz e o desporto é algo assim… mais distante, mais reservado… O Governo mostra alguma intenção de generalizar a prática da actividade física, mas nunca associa esse conceito à prática desportiva. Para este Governo, a barreira entre desporto popular, actividade física e desporto profissional ou federativo é estanque. E é exactamente partindo desta oposição entre actividade física e desporto que o Governo nos propõe que aprovemos uma lei que só age sobre aquilo a que chamou desporto. Para a prática desportiva popular, para o papel do associativismo de base, das colectividades e do associativismo estudantil, para a prática desportiva regular amadora e para a criação de infra-estruturas públicas de apoio à actividade física desportiva parcas palavras se encontram no texto da lei; pouca concretização, apenas alguns enunciados difusos. Para a prática federada e profissional, então, todas as palavras. Tantas que chega ao cúmulo de se intrometer abusivamente nas matérias internas das federações, exigindo desde já um conjunto de requisitos que só às federações cabe decidir: limitação de mandatos, renovação de estatutos de utilidade pública desportiva, formas de tomada de deliberações e eleições, etc. Para o relacionamento entre liga profissional e federação desportiva assume-se, de facto, um avanço em relação à actual situação, clarificando o que em muitos casos tem dado origem a conflitos. Mas o que não se pode é chamar lei de bases a uma lei que só resolve esse aspecto do desporto, intimamente relacionado com um conjunto muito restrito de praticantes e distante da prática desportiva popular. E é todo o outro mundo do desporto que é esquecido nesta lei, desde o desporto no trabalho, que pura e simplesmente desaparece, até à democratização eficiente das práticas, passando pelo papel das várias formas de associativismo. Esta proposta de lei que o Governo nos apresenta vem pejada de lacunas, de redacções apressadas e imprecisas. É uma lei que refere o papel do Estado, separando-o totalmente das autarquias e das regiões autónomas; uma lei que, em alguns casos, passa ao lado da própria Constituição da República Portuguesa. É uma lei feita à medida do grande desporto, das notícias; uma lei feita à medida das necessidades do desporto profissional, esquecendo tudo o resto. Tudo o resto que é a mais importante expressão do desporto. Para o Governo, o desporto popular de massas é enunciado porque tinha de o ser, porque seria demasiadamente grave não o fazer, mas a verdade é que sobre ele esta lei mais não faz do que reconhecer que existe. Como, aliás, faz até para coisas que não existem, como é o caso do Comité Paraolímpicos Português. O PCP tem uma visão radicalmente diferente do desporto: o PCP entende que o Estado, onde se incluem, obviamente, o Governo, as autarquias e as regiões autónomas, tem o principal papel enquanto motor e garante da prática desportiva, numa profunda articulação com o movimento associativo em todas as suas expressões e com as escolas, promovendo uma prática ampla e abrangente, capaz de contrariar a tendência de sedentarização que se tem verificado. Entendemos o desporto como um direito fundamental dos cidadãos, como uma importante componente da sua formação enquanto indivíduo, capaz de formar cada um no sentido dos valores saudáveis da vivência individual e colectiva e capaz de servir como pilar de uma sociedade mais solidária, mais justa e simultaneamente mais saudável. Não resumimos, por isso mesmo, o desporto à sua expressão profissional nem tampouco a esta ou àquela modalidade. Não encaramos as federações desportivas como únicos responsáveis pelo desenvolvimento desportivo e não entendemos desenvolvimento desportivo exclusivamente como obtenção de melhores resultados. Denunciamos a estratégia duvidosa e enganosa de construção desta proposta de lei, a qual enferma de problemas políticos tanto quanto processuais. Uma lei que não virá dar resposta a qualquer dos problemas do desporto de massas, que não apresenta um plano estratégico, mas que, pelo contrário, o erradica, uma lei que de futuro trará mais impedimentos do que facilidades à prática desportiva popular não pode merecer da bancada do PCP um voto que não seja o de oposição. Não que seja pior do que a actual legislação mas, pura e simplesmente, não se nos configura melhor.

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