No sábado, dia 24 de Fevereiro, eram 15:20 quando reparei que o número 1 da Avenida Casal Ribeiro - um prédio abandonado onde viveu durante algum tempo o poeta Fernando Pessoa - estava a ser vítima de um roubo em plena luz do dia. Numa das varandas do terceiro andar estava um homem, em posição de equilíbrio perigoso, a arrancar os frisos de azulejos Arte Nova que decoram todos os pisos daquele elegante prédio de gaveto.O facto de um imóvel desta qualidade arquitectónica, e com uma ligação à vida do poeta Fernando Pessoa, estar em tão grande ruína representa uma vergonha para a cidade. Que a Câmara Municipal de Lisboa não faça, mais uma vez, cumprir a lei é razão para revoltar qualquer cidadão que se preocupe com o futuro do património da cidade. A falta de acção por parte da CML é cúmplice das óbvias intenções de demolição do proprietário? Em 2001 deu entrada na CML um pedido para demolir o edifício (Nº 811/PGU2001). Este brutal desejo não teve luz verde da CML apenas porque várias instituições e cidadãos da cidade protestaram. Em 2003 a historiadora Drª Marina Tavares Dias e a Directora da Casa Fernando Pessoa, Drª Clara Ferreira Alves, manifestaram-se contra a demolição. A Directora da Casa Fernando Pessoa fez um pedido à CML para que não autoriza-se a demolição; e o então Presidente da CML, Dr Santana Lopes, até prometeu a todos, incluíndo a mim próprio, que o edifício não seria demolido. No ano seguinte a CML iniciou o processo de classificação do imóvel.Entretanto, desde 2003, "mãos invisíveis" cuidaram de partir vidraças, abrir janelas, portas, dar livre acesso a tudo o que degrada e vandaliza, lenta ou rápidamente, seja a água das chuvas ou os ladrões de azulejos Arte Nova.Depois de tirar três fotografias do flagrante delito, para que se veja aquilo que é inaceitável, telefonei para a Polícia Munícipal que apareceu no local dois minutos depois. Mas já não fiquei para ver a acção das autoridades policiais. Porque a esperança - mínima - que eu ainda tinha de ver aquele imóvel recuperado perdeu-se completamente às 15:20 do dia 24 de Fevereiro de 2007. Os lisboetas, e concerteza o Presidente da CML, já sabem qual vai ser o veredicto final do número 1 da Avenida Casal Ribeiro. Depois de tanta chuva, depois de tanto vandalismo, depois de tanto desprezo municipal e privado, vai aparecer em breve um relatório de linguagem séria que afirmará: "o imóvel em questão apresenta um grau 1 de risco".Não será mesmo novidade nenhuma senhor Presidente da CML. Vivemos todos num cenário urbano marcado por demolições, por milhares de imóveis abandonados, por ruínas. A intensificação destes cenários apenas indicia um futuro muito incerto para a nossa cidade.A história do número 1 da Avenida Casal Ribeiro é um paradigma da incultura, desinteresse e fraqueza do planemento urbano que caracteriza, cada vez mais, Lisboa. Para humilhação da cidade, o inaceitável torna-se legítimo, à força de ser tão corrente. Parece que em Lisboa o crime é quem ordena a capital.
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No sábado, dia 24 de Fevereiro, eram 15:20 quando reparei que o número 1 da Avenida Casal Ribeiro - um prédio abandonado onde viveu durante algum tempo o poeta Fernando Pessoa - estava a ser vítima de um roubo em plena luz do dia. Numa das varandas do terceiro andar estava um homem, em posição de equilíbrio perigoso, a arrancar os frisos de azulejos Arte Nova que decoram todos os pisos daquele elegante prédio de gaveto.O facto de um imóvel desta qualidade arquitectónica, e com uma ligação à vida do poeta Fernando Pessoa, estar em tão grande ruína representa uma vergonha para a cidade. Que a Câmara Municipal de Lisboa não faça, mais uma vez, cumprir a lei é razão para revoltar qualquer cidadão que se preocupe com o futuro do património da cidade. A falta de acção por parte da CML é cúmplice das óbvias intenções de demolição do proprietário? Em 2001 deu entrada na CML um pedido para demolir o edifício (Nº 811/PGU2001). Este brutal desejo não teve luz verde da CML apenas porque várias instituições e cidadãos da cidade protestaram. Em 2003 a historiadora Drª Marina Tavares Dias e a Directora da Casa Fernando Pessoa, Drª Clara Ferreira Alves, manifestaram-se contra a demolição. A Directora da Casa Fernando Pessoa fez um pedido à CML para que não autoriza-se a demolição; e o então Presidente da CML, Dr Santana Lopes, até prometeu a todos, incluíndo a mim próprio, que o edifício não seria demolido. No ano seguinte a CML iniciou o processo de classificação do imóvel.Entretanto, desde 2003, "mãos invisíveis" cuidaram de partir vidraças, abrir janelas, portas, dar livre acesso a tudo o que degrada e vandaliza, lenta ou rápidamente, seja a água das chuvas ou os ladrões de azulejos Arte Nova.Depois de tirar três fotografias do flagrante delito, para que se veja aquilo que é inaceitável, telefonei para a Polícia Munícipal que apareceu no local dois minutos depois. Mas já não fiquei para ver a acção das autoridades policiais. Porque a esperança - mínima - que eu ainda tinha de ver aquele imóvel recuperado perdeu-se completamente às 15:20 do dia 24 de Fevereiro de 2007. Os lisboetas, e concerteza o Presidente da CML, já sabem qual vai ser o veredicto final do número 1 da Avenida Casal Ribeiro. Depois de tanta chuva, depois de tanto vandalismo, depois de tanto desprezo municipal e privado, vai aparecer em breve um relatório de linguagem séria que afirmará: "o imóvel em questão apresenta um grau 1 de risco".Não será mesmo novidade nenhuma senhor Presidente da CML. Vivemos todos num cenário urbano marcado por demolições, por milhares de imóveis abandonados, por ruínas. A intensificação destes cenários apenas indicia um futuro muito incerto para a nossa cidade.A história do número 1 da Avenida Casal Ribeiro é um paradigma da incultura, desinteresse e fraqueza do planemento urbano que caracteriza, cada vez mais, Lisboa. Para humilhação da cidade, o inaceitável torna-se legítimo, à força de ser tão corrente. Parece que em Lisboa o crime é quem ordena a capital.