Da Literatura: LER OS OUTROS

03-07-2011
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Um livro cada domingo. James Wood (n. 1965) está para as gerações mais jovens como George Steiner (n. 1929) e Harold Bloom (n. 1930) para a minha. E depois há aquelas pessoas que dizem com um sorriso de desdém: «Para actor, este gajo não escreve mal de todo.» Estão a confundir os cavalheiros e os nomes, sem dar por nada. James Wood, professor de crítica literária em Harvard, é um dos autores mais influentes do seu tempo. Quem lê a NYRB e a New Yorker, duas das publicações onde escreve com regularidade, sabe do que falo. Agora, a Quetzal publicou a mais recente das suas colectâneas de ensaio, How Fiction Works / A Mecânica da Ficção. Rogério Casanova traduziu. O texto de Wood e os «abundantes excertos» de obras citadas. Discurso directo: «Todos esses excertos foram traduzidos de raiz, não se tendo recorrido a traduções portuguesas já existentes.» Isto significa saltar de Isherwood para Coetzee, de Flaubert para Thomas Mann, etc. Wood coloca questões essenciais: «É o realismo real? Como é que definimos uma metáfora bem-sucedida? O que é uma personagem? Como é que reconhecemos uma utilização brilhante do detalhe ficcional? O que é o ponto de vista, e como é que funciona?» E assim sucessivamente, sem jargão fútil, com a clareza de uma narrativa envolvente. Li o livro numa viagem de comboio mais longa do que desejaria. A agilidade do discurso é viciante. Como sempre, Rui Rodrigues desenhou a capa exacta.Jansenista: «Depois de termos andado tantos anos a pensar que o ensino obrigatório visava proporcionar às crianças e jovens o convívio com os da sua geração, a partilha de valores, a socialização do conhecimento, descobrimos agora que não, que é uma corrida – que estimula os fugitivos e proporciona até um atalho para os retardatários. [...]»João Lopes: «Referindo-se à questão da implicação de José Sócrates na compra da TVI pela PT, o deputado João Semedo esclareceu que não foi possível provar a origem do conhecimento informal que o primeiro-ministro teria do assunto.Quer isto dizer que a Comissão de Inquérito ao "caso TVI" produziu um redondo zero. Ou seja: não há implicação política decorrente dos seus trabalhos, a não ser a reiteração daqueles que consideram que o primeiro-ministro mentiu. Têm, desde o princípio, toda a legitimidade para o fazer. O certo é que ocuparam um ano do tempo português para sustentar algo que nem sequer adquiriu pertinência política, ficando-se pelo sanção unilateral do seu discurso moral. [...]»Luís Novaes Tito: «Se a Alemanha não tivesse implementado a dose de língua de pau aos seus cidadãos que agora vai passar a exigir aos outros países seus subsidiários, continuavam todos a gesticular e a dizer que o que se está a passar no areal lusitano só decorre da aselhice dos actuais detentores do poder. / É verdade que há por aqui alguma aselhice e principalmente muito ouvido-duro mas, em todo o continente europeu, há principalmente uma vontade sub-reptícia de recuar, a todo o vapor, a um tempo anterior àquele a que nos habituámos a chamar de civilização. A qualidade de vida decorrente das lutas que os europeus travaram durante décadas para obterem vida melhor está em retrocesso, em nome de uma coisa qualquer que ninguém sabe muito bem o que é nem a quem serve. [...] Caso para perguntar, como no slogan publicitário, se se podia viver num espaço mais federativo e social para que alguém respondesse que sim, que se podia, mas que não era a mesma coisa.»Porfírio Silva: «[...] Se a Comissão de Inquérito tivesse, ao fim de semanas (e de outra comissão parlamentar a trabalhar para o mesmo) encontrado algum facto que contradissesse o PM, seria fácil mostrar isso mesmo: seria só juntar 2 e 2. Citar o facto e a afirmação do PM que era desmentida por esse facto. Se, mesmo assim e ao fim de toda esta tourada, João Semedo vem dizer (vi eu na TV) que não escreveu que Sócrates mentiu, mas escreveu que ele disse o contrário do que se tinha passado, só podemos concluir duas coisas. Uma, que já se sabia, outra que se vinha adivinhando. Já se sabia que Semedo queria arranjar palco para uma tese, que já trazia de casa, e que não partiu para isto por amor à verdade e de mente aberta. Vinha-se adivinhando, e agora confirma-se, que Semedo, além do mais, é cobarde: gasta 250 páginas para dizer que não diz mas afinal diz ou se não disse podia ter dito e patati patatá. Que gente!»Valupi: «[...] Porque foi só isso o que lhe ocorreu perante uma referência cujo contexto era linguístico, abstracto, remetendo para temáticas disciplinares, conceptuais, teóricas, não de relação clínica fulanizada. E foi essa pulhice que resolveu tornar pública para efeitos de ataque pessoal, usando um registo de cagança tão bolorento que lhe deve ter deixado o teclado encardido. [...]»Vieira do Mar: «Finalmente, vi um ou dois programas da Nigella Lawson, isto depois de ter lido sobre a dita em tanto babado blogue masculino. E percebi finalmente a razão do babanço: a criatura tem um charme irresistível, que mistura a beleza de um anjo de Boticelli com a opulência de uma madonna de Rafael, a par com uma aillure natural e um modo de estar desastrado mas sincero, que desarmam o cínico ou o crítico mais empedernido. É claro que o sucesso de Nigella nada tem a ver com comida, pelo menos na vertente gourmet. Aquilo é sexo puro e duro, é um apelo aos sentidos mais primários, aquelas mamas, as ancas, a lambuzice desastrada, o tom confessional de boudoir, a insinuação do pecadilho, a assunção da gula, do excesso, da entrega ao prazer e ao gozo, da sedução com os convidados. [...]»Etiquetas: Blogues, Nota de leitura

Um livro cada domingo. James Wood (n. 1965) está para as gerações mais jovens como George Steiner (n. 1929) e Harold Bloom (n. 1930) para a minha. E depois há aquelas pessoas que dizem com um sorriso de desdém: «Para actor, este gajo não escreve mal de todo.» Estão a confundir os cavalheiros e os nomes, sem dar por nada. James Wood, professor de crítica literária em Harvard, é um dos autores mais influentes do seu tempo. Quem lê a NYRB e a New Yorker, duas das publicações onde escreve com regularidade, sabe do que falo. Agora, a Quetzal publicou a mais recente das suas colectâneas de ensaio, How Fiction Works / A Mecânica da Ficção. Rogério Casanova traduziu. O texto de Wood e os «abundantes excertos» de obras citadas. Discurso directo: «Todos esses excertos foram traduzidos de raiz, não se tendo recorrido a traduções portuguesas já existentes.» Isto significa saltar de Isherwood para Coetzee, de Flaubert para Thomas Mann, etc. Wood coloca questões essenciais: «É o realismo real? Como é que definimos uma metáfora bem-sucedida? O que é uma personagem? Como é que reconhecemos uma utilização brilhante do detalhe ficcional? O que é o ponto de vista, e como é que funciona?» E assim sucessivamente, sem jargão fútil, com a clareza de uma narrativa envolvente. Li o livro numa viagem de comboio mais longa do que desejaria. A agilidade do discurso é viciante. Como sempre, Rui Rodrigues desenhou a capa exacta.Jansenista: «Depois de termos andado tantos anos a pensar que o ensino obrigatório visava proporcionar às crianças e jovens o convívio com os da sua geração, a partilha de valores, a socialização do conhecimento, descobrimos agora que não, que é uma corrida – que estimula os fugitivos e proporciona até um atalho para os retardatários. [...]»João Lopes: «Referindo-se à questão da implicação de José Sócrates na compra da TVI pela PT, o deputado João Semedo esclareceu que não foi possível provar a origem do conhecimento informal que o primeiro-ministro teria do assunto.Quer isto dizer que a Comissão de Inquérito ao "caso TVI" produziu um redondo zero. Ou seja: não há implicação política decorrente dos seus trabalhos, a não ser a reiteração daqueles que consideram que o primeiro-ministro mentiu. Têm, desde o princípio, toda a legitimidade para o fazer. O certo é que ocuparam um ano do tempo português para sustentar algo que nem sequer adquiriu pertinência política, ficando-se pelo sanção unilateral do seu discurso moral. [...]»Luís Novaes Tito: «Se a Alemanha não tivesse implementado a dose de língua de pau aos seus cidadãos que agora vai passar a exigir aos outros países seus subsidiários, continuavam todos a gesticular e a dizer que o que se está a passar no areal lusitano só decorre da aselhice dos actuais detentores do poder. / É verdade que há por aqui alguma aselhice e principalmente muito ouvido-duro mas, em todo o continente europeu, há principalmente uma vontade sub-reptícia de recuar, a todo o vapor, a um tempo anterior àquele a que nos habituámos a chamar de civilização. A qualidade de vida decorrente das lutas que os europeus travaram durante décadas para obterem vida melhor está em retrocesso, em nome de uma coisa qualquer que ninguém sabe muito bem o que é nem a quem serve. [...] Caso para perguntar, como no slogan publicitário, se se podia viver num espaço mais federativo e social para que alguém respondesse que sim, que se podia, mas que não era a mesma coisa.»Porfírio Silva: «[...] Se a Comissão de Inquérito tivesse, ao fim de semanas (e de outra comissão parlamentar a trabalhar para o mesmo) encontrado algum facto que contradissesse o PM, seria fácil mostrar isso mesmo: seria só juntar 2 e 2. Citar o facto e a afirmação do PM que era desmentida por esse facto. Se, mesmo assim e ao fim de toda esta tourada, João Semedo vem dizer (vi eu na TV) que não escreveu que Sócrates mentiu, mas escreveu que ele disse o contrário do que se tinha passado, só podemos concluir duas coisas. Uma, que já se sabia, outra que se vinha adivinhando. Já se sabia que Semedo queria arranjar palco para uma tese, que já trazia de casa, e que não partiu para isto por amor à verdade e de mente aberta. Vinha-se adivinhando, e agora confirma-se, que Semedo, além do mais, é cobarde: gasta 250 páginas para dizer que não diz mas afinal diz ou se não disse podia ter dito e patati patatá. Que gente!»Valupi: «[...] Porque foi só isso o que lhe ocorreu perante uma referência cujo contexto era linguístico, abstracto, remetendo para temáticas disciplinares, conceptuais, teóricas, não de relação clínica fulanizada. E foi essa pulhice que resolveu tornar pública para efeitos de ataque pessoal, usando um registo de cagança tão bolorento que lhe deve ter deixado o teclado encardido. [...]»Vieira do Mar: «Finalmente, vi um ou dois programas da Nigella Lawson, isto depois de ter lido sobre a dita em tanto babado blogue masculino. E percebi finalmente a razão do babanço: a criatura tem um charme irresistível, que mistura a beleza de um anjo de Boticelli com a opulência de uma madonna de Rafael, a par com uma aillure natural e um modo de estar desastrado mas sincero, que desarmam o cínico ou o crítico mais empedernido. É claro que o sucesso de Nigella nada tem a ver com comida, pelo menos na vertente gourmet. Aquilo é sexo puro e duro, é um apelo aos sentidos mais primários, aquelas mamas, as ancas, a lambuzice desastrada, o tom confessional de boudoir, a insinuação do pecadilho, a assunção da gula, do excesso, da entrega ao prazer e ao gozo, da sedução com os convidados. [...]»Etiquetas: Blogues, Nota de leitura

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