Sebastião Salgado - San Juan, 1979Hoje tenho sete anos. Ainda sinto as mãos da minha mãe a entrançar os meus cabelos. Hoje tenho sete anos e borboletas na barriga. Borboletas iguais, nas cores, aos laços que a minha mãe me põe na ponta das tranças. Hoje tenho sete anos e tenho pressa. As mãos da minha mãe nos cabelos e pressa. De te encontrar sentado contra o tempo. No jardim em frente aos prédios. Na praceta da minha infância. Tenho sete anos e saio de casa a correr. Tenho sete anos e posso brincar na rua. Tenho sete anos e uma cara perfeita. Como os anjos. Tenho sete anos e a minha cara ainda não partiu numa direcção indistinta. Saio de casa a correr. Para o jardim em frente aos prédios. Páro. Com um pé atrás do outro. A sentir as asas das borboletas às voltas na barriga. Páro. Porque te vejo sentado no balouço, com o saco dos berlindes a cair-te da mão direita. Avanço um bocadinho. Avanço tudo, com a minha cara perfeita como a dos anjos. Tenho sete anos e tenho pressa. Pergunto-te - e as asas já não voam, golpeiam - queres brincar comigo? #* Chano Domínguez (6:59) in 'Iman'# texto publicado antes, sem banda sonora e com o título Asas e Golpes, no blog entretanto extinto - Pilar da Ponte de Tédio
Categorias
Entidades
Sebastião Salgado - San Juan, 1979Hoje tenho sete anos. Ainda sinto as mãos da minha mãe a entrançar os meus cabelos. Hoje tenho sete anos e borboletas na barriga. Borboletas iguais, nas cores, aos laços que a minha mãe me põe na ponta das tranças. Hoje tenho sete anos e tenho pressa. As mãos da minha mãe nos cabelos e pressa. De te encontrar sentado contra o tempo. No jardim em frente aos prédios. Na praceta da minha infância. Tenho sete anos e saio de casa a correr. Tenho sete anos e posso brincar na rua. Tenho sete anos e uma cara perfeita. Como os anjos. Tenho sete anos e a minha cara ainda não partiu numa direcção indistinta. Saio de casa a correr. Para o jardim em frente aos prédios. Páro. Com um pé atrás do outro. A sentir as asas das borboletas às voltas na barriga. Páro. Porque te vejo sentado no balouço, com o saco dos berlindes a cair-te da mão direita. Avanço um bocadinho. Avanço tudo, com a minha cara perfeita como a dos anjos. Tenho sete anos e tenho pressa. Pergunto-te - e as asas já não voam, golpeiam - queres brincar comigo? #* Chano Domínguez (6:59) in 'Iman'# texto publicado antes, sem banda sonora e com o título Asas e Golpes, no blog entretanto extinto - Pilar da Ponte de Tédio