Benfica e Sporting, esquerda e direita. Ânimos inflamados na Câmara de Lisboa

06-10-2015
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Na linguagem da bola, a reunião desta tarde do executivo municipal de Lisboa foi uma partida rasgadinha, com jogo de equipa, tácticas bem estudadas, algumas entradas bem duras, provocações ao adversário e remates indefensáveis.

O pano de fundo era o dos incidentes ocorridos nos festejos do Benfica, no Marquês de Pombal, há 10 dias. No jargão futebolístico, o presidente da Câmara, Fernando Medina, teve a iniciativa do jogo - e por aí desarmou logo qualquer veleidade que poderia haver em sectores da oposição.

No início da intervenção, o autarca que sucedeu a António Costa reafirmou, no essencial, o que já dissera na sexta-feira passada, em conferência de imprensa. A PSP "nunca desaconselhou os festejos"; a "motivação" da Câmara e dos outros intervenientes (polícia e Benfica) "foi a de encontrar um modelo de maior segurança", visando "anular elementos causadores de risco" como os verificados no ano passado. Como exemplos, referiu a subida de pessoas à estátua e a diminuta proximidade entre os jogadores e os adeptos, suscetível de criar situações de insegurança.

Medina deu depois a palavra ao vereador responsável pelo Desporto, Carlos Castro. Este, numa intervenção apoiada na projeção de um "powerpoint", mostrou as imagens e esquemas dos festejos de 2015 comparados com os de anos anteriores, para dessa forma ilustrar os cuidados colocados na organização da festa de 17 de maio.

Tremoços e algum gelo

Castro desfiou números da operação logística, como algum do material apreendido pela Polícia Municipal. A título de exemplo, sairam de circulação 720 garrafas de vidro, 14 sacos de tremoços, 346 cornetas, 26 latas, 445 cachecóis e duas cuvetes de gelo.

Na parte da proteção civil, 16 equipas a pé estavam distribuídas por vários pontos da Praça e ruas adjacentes, disponíveis para encaminhar quem se sentisse mal para um dos dois postos médicos montados (uma, em tenda, no topo Sul do Parque Eduardo VII; outro, num quartel de bombeiros, na Rua Camilo Castelo Branco, nas traseiras do Marquês).

Se o estado do adepto inspirasse mais cuidados, meia dúzia de ambulâncias estava a postos (três a Norte da rotunda, com destino ao Hospital de Santa Maria; outras três na Avenida da Liberdade, com direção ao Hospital de São José).

Parecia este ponto do PAOD (período de antes da ordem do dia, quando os diversos partidos fazem as suas declarações políticas) estar a caminhar para o fim. Com efeito, até ao momento, ninguém da oposição fizera qualquer intervenção de fundo sobre o assunto (o vereador do CDS, João Gonçalves Pereira, prometera apenas que se iria referir a ele).

Mas há jogos em que os golos e a animação só surgem no fim, e o desafio desta tarde nos Paços do Concelho de Lisboa é uma boa prova disso.

Novamente no uso da palavra, Fernando Medina invectiva o "conjunto de arruaceiros" responsável pelos incidentes, ao mesmo tempo que volta a pedir esclarecimentos ao ministério da Administração Interna sobre o apuramento de responsabilidades.

Sentido de oportunidade

De repente, num movimento súbito que parece saído do nada, muda de flanco: "Não gostava de terminar este tema sem dizer ao vereador António Prôa que o que tentou fazer (...) é do mais lamentável oportunismo político".

Na mira do presidente da Câmara estavam declarações proferidas na semana passada por António Prôa, que considerou ser Fernando Medina "o primeiro responsável" pelos incidentes ocorridos no Marquês de Pombal.

Há uma semana, em declarações à agência Lusa, o vereador do PSD afirmou: "Vou pedir esclarecimentos na sequência dos incidentes e tendo em conta a informação de que a Câmara não respeitou as preocupações que a polícia transmitiu".

Em tom sereno, mas seco, e sem levantar a voz, Fernando Medina prosseguiu: "O senhor vereador expressou bem o que é um oportunista político em ação".

Numa sessão pública, em que as palavras atingiram um raro grau de dureza, o sucessor de António Costa manteve-se na ofensiva, considerando Prôa como "o primeiro e o maior oportunista político da cidade [de Lisboa]", por ter proferido tais afirmações sem "qualquer informação sobre os factos, num momento difícil e da maior delicadeza. E fê-lo sem qualquer pudor, para ter um ganho político imediato".

Em busca do golo de honra

Da bancada de imprensa, António Prôa pareceu derrotado por um KO fulminante. Mas manteve-se no ringue. Sem possibilidades de ripostar com a mesma contundência, acusou Fernando Medina de se "refugiar nas responsabilidades de terceiros" e de "fugir às suas responsabilidades".

O vereador do PSD disse compreender a "reação mais emotiva" do presidente da Câmara, mas criticou-o por "irresponsabilidade e ligeireza", e por "não ter a humildade de reconhecer o que correu mal".

Medina "devia dar um sinal de confiança de que, no futuro, os lisboetas que queiram comemorar títulos no Marquês o possam fazer sem receio", afirmou Prôa.

Chegados aqui, a crispação transbordava. Afinal, ela já estava na sala desde há muito, quando os primeiros galhardetes eram trocados entre (e sob) sorrisos. Há um pequeno diálogo entre Carlos Castro e António Prôa, anterior aos momentos mais tensos da tarde, que lido à posteriori dá para perceber como já havia muita eletricidade no ar.

Ao iniciar a sua intervenção, Castro projetou um slide em que se vêem duas imagens de festejos no Marquês de Pombal, uma do Benfica, em cima, outra do Sporting, em baixo.

Ao lado do púlpito de onde falou o vereador do PS está a bancada do PSD. No que pareceu ser a resposta a um aparte de Prôa (um sportinguista conhecido), Castro deixou ao microfone um recado bem audível: "Eu compreendo que alguns vereadores se comportem como adeptos".

Carrossel de emoções

As acusações de Fernando Medina a António Prôa, e a resposta deste, geraram intervenções de outros vereadores, dos vários partidos.

E do futebol rapidamente se passou para uma discussão acesa sobre a política, um debate feito como se fosse à moda antiga, nos tempos em que só favia esquerda e direita, sem meios termos nem variações de uma e outra coisa.

Da parte do CDS, que antes da reunião se mostrara crítico da atuação da Câmara, o discurso foi hoje mais contemporizador. João Gonçalves Pereira começou por dizer que não assaca a Fernando Medina "qualquer responsabilidade política" pelos incidentes, reconheceu de seguida "o empenhamento da Câmara e das forças de segurança" e, por fim, pediu apenas "uma reflexão" sobre o sucedido, da qual "devem ser retiradas todas as consequências".

Um ponto do esquema montado para a noite de 17 de maio foi até considerado positivo por Gonçalves Pereira: "O modelo do palco parece-me mais seguro do que o anterior".

Da parte do PCP, Carlos Moura criticou quem pretende "valorizar ou empolar" o que se passou. "Até parece dar a ideia de que houve um massacre, uma situação de quase catástrofe nacional", afirmou. Outro vereador comunista, João Bernardino, defendeu que "todos os cidadãos devem ter o direito de viver o espaço público sem restrições nenhumas".

Nova causa fraturante

O ponto em que as coisas voltaram a ficar extremadas foi lançado por João Paulo Saraiva, vereador dos Cidadãos por Lisboa, recentemente entrado para o executivo (na vaga deixada por António Costa).

Voltando à linguagem do futebol, entrou a pés junto: "Estou perplexo com o que ouvi da direita, do PSD e do CDS". Foi interrompido por um aparte de João Gonçalves Pereira. "Peço desculpa se o ofendi no intróito. É que eu ainda sou do tempo da AD", prosseguiu Saraiva.

Depois, dirigiu-se expressamente a Gonçalves Pereira e a Prôa (também deputados na Assembleia da República): "Tão ufanos a apurar as responsabilidades e a atribuir culpas ao presidente da Câmara de Lisboa, os senhores, enquanto deputados, que perguntas já fizeram ao Governo para apurar responsabilidades?", disse o vereador das Finanças da Câmara.

Como se não bastasse, ainda parecer querer tirar desforço da situação: "Aproveitem e encham-se de coragem. Esclareçam lá isso", afirmou, em tom paternalista.

A resposta foi dada por Fernando Seara - que antes alertara, "mesmo os que só há pouco tempo são atores políticos", que "a violencia associada ao desporto é das coisas mais complexas do mundo contemporâneo".

Disse depois o vereador que lidera a bancada do PSD na Câmara de Lisboa: "Vir para aqui com essa ideia da direita e da esquerda, como se a esquerda tivesse uma superioridade ética, é de outro tempo e de outra circunstância. A não ser que sejam já os tempos do professor Sampaio da Nóvoa".

António Prôa recusou o epíteto. "Começo por dizer que não sou de direita". João Paulo Saraiva interrompe. Prôa não o deixa falar (e mostra-se aqui mais desenvolvoto do que estivera frente a Medina): "A não ser que o senhor vereador não me deixe não ser de direita".

João Gonçalves Pereira também acusou o toque: "O vereador João Paulo Saraiva assume-se como o "kamikaze" político da maioria contra a direita".

Avé Medina!

Não foi suicida, antes pelo contrário, o conforto político dado por alguns vereadores da maioria (socialistas e dos Cidadãos por Lisboa) ao seu presidente. Mas em algumas intervenções só quase faltou dizer que se sacrificariam pelo líder, se necessário.

O tom da solidariedade é que foi variando. "Aquilo que nos ofendeu a todos, é dizer que ele [Fernando Medina] foi o principal culpado. E isso dói-nos, porque não é verdade", afirmou José Sá Fernandes.

O vereador do Ambiente salientou igualmente que Medina "deu a cara" e foi "um presidente de Câmara que esteve à altura".

Já Manuel Salgado, em resposta a uma crítica de António Prôa, que acusara Medina de "não ter poder de encaixe face a críticas", afirmou: "Quando se cavalgam certas situações, eu também não encaixo. Felizmente tenho o presidente que tenho. E, infelizmente, no jogo político há muito quem encaixe".

À vez, também Duarte Cordeiro e João Afonso sairam a terreiro em defesa de Fernando Medina. Este, na segunda sessão pública da autarquia como presidente efetivo, acabou por ter uma espécie de aclamação da sua liderança, senão de todos os quadrantes da maioria, pelo menos de quase todos.

O "fair play", segundo Jesus

Embalado, antes do apito final e já quase em tempo de descontos, Medina repetiu a tese do "oportunismo político" e foi ao arsenal de munições buscar alguma ironia. Deu razão a António Prôa num ponto: "Foi emotiva a minha reação, concedo. Mas pode chegar o momento em que eu deixe de ter qualquer resposta às suas intervenções", disse ao vereador do PSD.

Uma advertência em sentido figurado, claro está. Uns minutos depois, quando se discutia o regulamento do arvoredo, Medina voltou a dar novo "feed back" a uma intervenção de Prôa: "O senhor vereador tem uma capacidade notável de fazer de coisas irrelevantes assuntos de Estado".

Foi Jorge Jesus, o treinador do Benfica, quem o disse um dia: "O 'fair play' é uma treta". Referia-se ao futebol, claro. Mas há dias assim na política: não se chutam bolas para fora para ser prestada assistência ao adversário.

Na linguagem da bola, a reunião desta tarde do executivo municipal de Lisboa foi uma partida rasgadinha, com jogo de equipa, tácticas bem estudadas, algumas entradas bem duras, provocações ao adversário e remates indefensáveis.

O pano de fundo era o dos incidentes ocorridos nos festejos do Benfica, no Marquês de Pombal, há 10 dias. No jargão futebolístico, o presidente da Câmara, Fernando Medina, teve a iniciativa do jogo - e por aí desarmou logo qualquer veleidade que poderia haver em sectores da oposição.

No início da intervenção, o autarca que sucedeu a António Costa reafirmou, no essencial, o que já dissera na sexta-feira passada, em conferência de imprensa. A PSP "nunca desaconselhou os festejos"; a "motivação" da Câmara e dos outros intervenientes (polícia e Benfica) "foi a de encontrar um modelo de maior segurança", visando "anular elementos causadores de risco" como os verificados no ano passado. Como exemplos, referiu a subida de pessoas à estátua e a diminuta proximidade entre os jogadores e os adeptos, suscetível de criar situações de insegurança.

Medina deu depois a palavra ao vereador responsável pelo Desporto, Carlos Castro. Este, numa intervenção apoiada na projeção de um "powerpoint", mostrou as imagens e esquemas dos festejos de 2015 comparados com os de anos anteriores, para dessa forma ilustrar os cuidados colocados na organização da festa de 17 de maio.

Tremoços e algum gelo

Castro desfiou números da operação logística, como algum do material apreendido pela Polícia Municipal. A título de exemplo, sairam de circulação 720 garrafas de vidro, 14 sacos de tremoços, 346 cornetas, 26 latas, 445 cachecóis e duas cuvetes de gelo.

Na parte da proteção civil, 16 equipas a pé estavam distribuídas por vários pontos da Praça e ruas adjacentes, disponíveis para encaminhar quem se sentisse mal para um dos dois postos médicos montados (uma, em tenda, no topo Sul do Parque Eduardo VII; outro, num quartel de bombeiros, na Rua Camilo Castelo Branco, nas traseiras do Marquês).

Se o estado do adepto inspirasse mais cuidados, meia dúzia de ambulâncias estava a postos (três a Norte da rotunda, com destino ao Hospital de Santa Maria; outras três na Avenida da Liberdade, com direção ao Hospital de São José).

Parecia este ponto do PAOD (período de antes da ordem do dia, quando os diversos partidos fazem as suas declarações políticas) estar a caminhar para o fim. Com efeito, até ao momento, ninguém da oposição fizera qualquer intervenção de fundo sobre o assunto (o vereador do CDS, João Gonçalves Pereira, prometera apenas que se iria referir a ele).

Mas há jogos em que os golos e a animação só surgem no fim, e o desafio desta tarde nos Paços do Concelho de Lisboa é uma boa prova disso.

Novamente no uso da palavra, Fernando Medina invectiva o "conjunto de arruaceiros" responsável pelos incidentes, ao mesmo tempo que volta a pedir esclarecimentos ao ministério da Administração Interna sobre o apuramento de responsabilidades.

Sentido de oportunidade

De repente, num movimento súbito que parece saído do nada, muda de flanco: "Não gostava de terminar este tema sem dizer ao vereador António Prôa que o que tentou fazer (...) é do mais lamentável oportunismo político".

Na mira do presidente da Câmara estavam declarações proferidas na semana passada por António Prôa, que considerou ser Fernando Medina "o primeiro responsável" pelos incidentes ocorridos no Marquês de Pombal.

Há uma semana, em declarações à agência Lusa, o vereador do PSD afirmou: "Vou pedir esclarecimentos na sequência dos incidentes e tendo em conta a informação de que a Câmara não respeitou as preocupações que a polícia transmitiu".

Em tom sereno, mas seco, e sem levantar a voz, Fernando Medina prosseguiu: "O senhor vereador expressou bem o que é um oportunista político em ação".

Numa sessão pública, em que as palavras atingiram um raro grau de dureza, o sucessor de António Costa manteve-se na ofensiva, considerando Prôa como "o primeiro e o maior oportunista político da cidade [de Lisboa]", por ter proferido tais afirmações sem "qualquer informação sobre os factos, num momento difícil e da maior delicadeza. E fê-lo sem qualquer pudor, para ter um ganho político imediato".

Em busca do golo de honra

Da bancada de imprensa, António Prôa pareceu derrotado por um KO fulminante. Mas manteve-se no ringue. Sem possibilidades de ripostar com a mesma contundência, acusou Fernando Medina de se "refugiar nas responsabilidades de terceiros" e de "fugir às suas responsabilidades".

O vereador do PSD disse compreender a "reação mais emotiva" do presidente da Câmara, mas criticou-o por "irresponsabilidade e ligeireza", e por "não ter a humildade de reconhecer o que correu mal".

Medina "devia dar um sinal de confiança de que, no futuro, os lisboetas que queiram comemorar títulos no Marquês o possam fazer sem receio", afirmou Prôa.

Chegados aqui, a crispação transbordava. Afinal, ela já estava na sala desde há muito, quando os primeiros galhardetes eram trocados entre (e sob) sorrisos. Há um pequeno diálogo entre Carlos Castro e António Prôa, anterior aos momentos mais tensos da tarde, que lido à posteriori dá para perceber como já havia muita eletricidade no ar.

Ao iniciar a sua intervenção, Castro projetou um slide em que se vêem duas imagens de festejos no Marquês de Pombal, uma do Benfica, em cima, outra do Sporting, em baixo.

Ao lado do púlpito de onde falou o vereador do PS está a bancada do PSD. No que pareceu ser a resposta a um aparte de Prôa (um sportinguista conhecido), Castro deixou ao microfone um recado bem audível: "Eu compreendo que alguns vereadores se comportem como adeptos".

Carrossel de emoções

As acusações de Fernando Medina a António Prôa, e a resposta deste, geraram intervenções de outros vereadores, dos vários partidos.

E do futebol rapidamente se passou para uma discussão acesa sobre a política, um debate feito como se fosse à moda antiga, nos tempos em que só favia esquerda e direita, sem meios termos nem variações de uma e outra coisa.

Da parte do CDS, que antes da reunião se mostrara crítico da atuação da Câmara, o discurso foi hoje mais contemporizador. João Gonçalves Pereira começou por dizer que não assaca a Fernando Medina "qualquer responsabilidade política" pelos incidentes, reconheceu de seguida "o empenhamento da Câmara e das forças de segurança" e, por fim, pediu apenas "uma reflexão" sobre o sucedido, da qual "devem ser retiradas todas as consequências".

Um ponto do esquema montado para a noite de 17 de maio foi até considerado positivo por Gonçalves Pereira: "O modelo do palco parece-me mais seguro do que o anterior".

Da parte do PCP, Carlos Moura criticou quem pretende "valorizar ou empolar" o que se passou. "Até parece dar a ideia de que houve um massacre, uma situação de quase catástrofe nacional", afirmou. Outro vereador comunista, João Bernardino, defendeu que "todos os cidadãos devem ter o direito de viver o espaço público sem restrições nenhumas".

Nova causa fraturante

O ponto em que as coisas voltaram a ficar extremadas foi lançado por João Paulo Saraiva, vereador dos Cidadãos por Lisboa, recentemente entrado para o executivo (na vaga deixada por António Costa).

Voltando à linguagem do futebol, entrou a pés junto: "Estou perplexo com o que ouvi da direita, do PSD e do CDS". Foi interrompido por um aparte de João Gonçalves Pereira. "Peço desculpa se o ofendi no intróito. É que eu ainda sou do tempo da AD", prosseguiu Saraiva.

Depois, dirigiu-se expressamente a Gonçalves Pereira e a Prôa (também deputados na Assembleia da República): "Tão ufanos a apurar as responsabilidades e a atribuir culpas ao presidente da Câmara de Lisboa, os senhores, enquanto deputados, que perguntas já fizeram ao Governo para apurar responsabilidades?", disse o vereador das Finanças da Câmara.

Como se não bastasse, ainda parecer querer tirar desforço da situação: "Aproveitem e encham-se de coragem. Esclareçam lá isso", afirmou, em tom paternalista.

A resposta foi dada por Fernando Seara - que antes alertara, "mesmo os que só há pouco tempo são atores políticos", que "a violencia associada ao desporto é das coisas mais complexas do mundo contemporâneo".

Disse depois o vereador que lidera a bancada do PSD na Câmara de Lisboa: "Vir para aqui com essa ideia da direita e da esquerda, como se a esquerda tivesse uma superioridade ética, é de outro tempo e de outra circunstância. A não ser que sejam já os tempos do professor Sampaio da Nóvoa".

António Prôa recusou o epíteto. "Começo por dizer que não sou de direita". João Paulo Saraiva interrompe. Prôa não o deixa falar (e mostra-se aqui mais desenvolvoto do que estivera frente a Medina): "A não ser que o senhor vereador não me deixe não ser de direita".

João Gonçalves Pereira também acusou o toque: "O vereador João Paulo Saraiva assume-se como o "kamikaze" político da maioria contra a direita".

Avé Medina!

Não foi suicida, antes pelo contrário, o conforto político dado por alguns vereadores da maioria (socialistas e dos Cidadãos por Lisboa) ao seu presidente. Mas em algumas intervenções só quase faltou dizer que se sacrificariam pelo líder, se necessário.

O tom da solidariedade é que foi variando. "Aquilo que nos ofendeu a todos, é dizer que ele [Fernando Medina] foi o principal culpado. E isso dói-nos, porque não é verdade", afirmou José Sá Fernandes.

O vereador do Ambiente salientou igualmente que Medina "deu a cara" e foi "um presidente de Câmara que esteve à altura".

Já Manuel Salgado, em resposta a uma crítica de António Prôa, que acusara Medina de "não ter poder de encaixe face a críticas", afirmou: "Quando se cavalgam certas situações, eu também não encaixo. Felizmente tenho o presidente que tenho. E, infelizmente, no jogo político há muito quem encaixe".

À vez, também Duarte Cordeiro e João Afonso sairam a terreiro em defesa de Fernando Medina. Este, na segunda sessão pública da autarquia como presidente efetivo, acabou por ter uma espécie de aclamação da sua liderança, senão de todos os quadrantes da maioria, pelo menos de quase todos.

O "fair play", segundo Jesus

Embalado, antes do apito final e já quase em tempo de descontos, Medina repetiu a tese do "oportunismo político" e foi ao arsenal de munições buscar alguma ironia. Deu razão a António Prôa num ponto: "Foi emotiva a minha reação, concedo. Mas pode chegar o momento em que eu deixe de ter qualquer resposta às suas intervenções", disse ao vereador do PSD.

Uma advertência em sentido figurado, claro está. Uns minutos depois, quando se discutia o regulamento do arvoredo, Medina voltou a dar novo "feed back" a uma intervenção de Prôa: "O senhor vereador tem uma capacidade notável de fazer de coisas irrelevantes assuntos de Estado".

Foi Jorge Jesus, o treinador do Benfica, quem o disse um dia: "O 'fair play' é uma treta". Referia-se ao futebol, claro. Mas há dias assim na política: não se chutam bolas para fora para ser prestada assistência ao adversário.

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