A febre dos remakes chega à política portuguesa

06-07-2011
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A Semana Política

04/03/07-10/03/07

Depois do realizador italo-americano Martin Scorsese ter ganho um Óscar com um remake de um filme de Hong Kong, Paulo Portas parece querer seguir-lhe o exemplo, ganhando a liderança do CDS/PP com um remake de Zelig de Woody Allen.

Neste filme do realizador nova-iorquino, Leonard Zelig (Woody Allen) é um “camaleão” humano, que na companhia de chineses adopta uma fisionomia de chinês, na de jogadores de baseball se parece com eles, num comício de Hitler com um militante nazi. Na versão de Portas, Paulo (interpretado pelo próprio Portas), adopta sucessivamente a aparência de um irreverente colunista, na presença da redacção do Semanário, a de um director de jornal sempre à caça do escalpe de políticos, na companhia de Miguel Esteves Cardoso, a de raivoso populista e amante de carapaus infantis ao lado de Manuel Monteiro, a de demagogo eleitoralista junto de feirantes portugueses, a de europeísta “calmo” ao lado de Durão Barroso, a de “estadista” ao lado de Donald Rumsfeld, a de bronzeado comentador diante de Clara de Sousa, e finalmente a de “político moderno” ao lado das fotografias de políticos como Nicolas Sarkozy. E onde Zelig era cómico, A Vida de Paulo é trágico.

De facto, o espectáculo proporcionado numa das sequências-chave do filme, por uma das facções em luta no CDS/PP, é tudo menos edificante. António Carlos Monteiro ataca Ribeiro e Castro por não ter “coragem” de concorrer contra Portas em directas, esquecendo-se que Ribeiro e Castro havia afirmado estar disposto a disputar a liderança em qualquer circunstância, seja em directas ,seja em Congresso. A haver falta de coragem, aliás, seria de Portas, que exige ao líder contra quem se candidata que o possa fazer em directas (pode faltar-lhe coragem, mas não lhe falta lata).

Uma das personagens mais curiosas deste filme de Portas, é a de Ribeiro e Castro, o líder contra quem Paulo se candidata, depois de adoptar a aparência de “político moderno”. Ele é retratado como um pérfido usurpador do trono, nefasto para o seu partido devido à sua suposta “ineficácia”. Mas à medida que o filme avança, vai-se tornando claro que muita dessa “ineficácia” se deve à própria acção de Paulo e da sua “banda”, formada pelos membros do grupo parlamentar do partido. Estes são as personagens mais interessantes. Pois se a personagem interpretada por Portas é, como o Leonard Zelig do original de Allen, um “camaleão” que procura a aceitação das massas, os membros da “banda” são pequenos “camaleõezinhos”, que se limitam a adoptar a figura momentânea “do Paulo”, de forma a que este não se sinta só ou desamparado. Se o espectador chega a sentir comoção neste filme, são estes fiéis seguidores que a provocam.

Mas, à medida que o filme se aproxima do fim, é difícil não sentir algum desconforto. Na versão de Allen, Zelig acaba por descobrir que já havia sido casado várias vezes, nas várias personalidades que adoptara, e essa situação leva-o a ser alvo da fúria popular. Mudara tantas vezes para agradar a tanta gente, que era inevitável que provocasse a ira dos que entretanto deixara para trás. À medida que A Vida de Paulo se aproxima do seu clímax, o espectador não pode deixar de sentir que, a acontecer, o falhanço da personagem interpretada por Portas terá a sua raíz na mesma tragédia que, no original, se abatera sobre Leonard Zelig. É certo que, no filme de Allen, Zelig acaba por encontrar a redenção nos braços da sua psicológa. Mas a Política é uma mulher ainda mais instável que Mia Farrow.

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04/03/07-10/03/07

Depois do realizador italo-americano Martin Scorsese ter ganho um Óscar com um remake de um filme de Hong Kong, Paulo Portas parece querer seguir-lhe o exemplo, ganhando a liderança do CDS/PP com um remake de Zelig de Woody Allen.

Neste filme do realizador nova-iorquino, Leonard Zelig (Woody Allen) é um “camaleão” humano, que na companhia de chineses adopta uma fisionomia de chinês, na de jogadores de baseball se parece com eles, num comício de Hitler com um militante nazi. Na versão de Portas, Paulo (interpretado pelo próprio Portas), adopta sucessivamente a aparência de um irreverente colunista, na presença da redacção do Semanário, a de um director de jornal sempre à caça do escalpe de políticos, na companhia de Miguel Esteves Cardoso, a de raivoso populista e amante de carapaus infantis ao lado de Manuel Monteiro, a de demagogo eleitoralista junto de feirantes portugueses, a de europeísta “calmo” ao lado de Durão Barroso, a de “estadista” ao lado de Donald Rumsfeld, a de bronzeado comentador diante de Clara de Sousa, e finalmente a de “político moderno” ao lado das fotografias de políticos como Nicolas Sarkozy. E onde Zelig era cómico, A Vida de Paulo é trágico.

De facto, o espectáculo proporcionado numa das sequências-chave do filme, por uma das facções em luta no CDS/PP, é tudo menos edificante. António Carlos Monteiro ataca Ribeiro e Castro por não ter “coragem” de concorrer contra Portas em directas, esquecendo-se que Ribeiro e Castro havia afirmado estar disposto a disputar a liderança em qualquer circunstância, seja em directas ,seja em Congresso. A haver falta de coragem, aliás, seria de Portas, que exige ao líder contra quem se candidata que o possa fazer em directas (pode faltar-lhe coragem, mas não lhe falta lata).

Uma das personagens mais curiosas deste filme de Portas, é a de Ribeiro e Castro, o líder contra quem Paulo se candidata, depois de adoptar a aparência de “político moderno”. Ele é retratado como um pérfido usurpador do trono, nefasto para o seu partido devido à sua suposta “ineficácia”. Mas à medida que o filme avança, vai-se tornando claro que muita dessa “ineficácia” se deve à própria acção de Paulo e da sua “banda”, formada pelos membros do grupo parlamentar do partido. Estes são as personagens mais interessantes. Pois se a personagem interpretada por Portas é, como o Leonard Zelig do original de Allen, um “camaleão” que procura a aceitação das massas, os membros da “banda” são pequenos “camaleõezinhos”, que se limitam a adoptar a figura momentânea “do Paulo”, de forma a que este não se sinta só ou desamparado. Se o espectador chega a sentir comoção neste filme, são estes fiéis seguidores que a provocam.

Mas, à medida que o filme se aproxima do fim, é difícil não sentir algum desconforto. Na versão de Allen, Zelig acaba por descobrir que já havia sido casado várias vezes, nas várias personalidades que adoptara, e essa situação leva-o a ser alvo da fúria popular. Mudara tantas vezes para agradar a tanta gente, que era inevitável que provocasse a ira dos que entretanto deixara para trás. À medida que A Vida de Paulo se aproxima do seu clímax, o espectador não pode deixar de sentir que, a acontecer, o falhanço da personagem interpretada por Portas terá a sua raíz na mesma tragédia que, no original, se abatera sobre Leonard Zelig. É certo que, no filme de Allen, Zelig acaba por encontrar a redenção nos braços da sua psicológa. Mas a Política é uma mulher ainda mais instável que Mia Farrow.

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