«O império português foi, durante séculos, mantido, regido e administrado por negros, indianos, chineses, mistos de todos os cruzamentos e até, pasmem-se os ouvidos pudibundos, por escravos. Foi esse o segredo da nossa longevidade.» Miguel Castelo-BrancoRevoltante paternalismo via COMBUSTÕES de Combustões em 03/05/09 Se o racismo é coisa repugnante que sintomaticamente só parece agarrar seguidores entre os mais desclassificados elementos de uma raça - os que maior número de dúvidas carregam a respeito das suas qualidades individuais, escudando-se numa confortável generalização para não terem de se olhar ao espelho - esse outro racismo que dá pelo nome de paternalismo é revoltante, pois estriba-se num preconceito de superioridade escondido que trata de olhar com altaneira bonomia as restantes raças. Se um é brutal, o outro é hipócrita; se um é grosseiro, o outro é artificial; se um é reles, o outro é mentiroso.A campanha promocional de Obama e da sua mulher - já tida como cânone universal de beleza - é dessas coisas que fazem o retrato acabado da falsidade instituida como regra. O pensar correcto é, sempre, uma violação das diferenças constitutivas e enriquecedoras da humanidade, pelo que lavrar elogio (ou o seu oposto) a respeito de um homem pelo facto de ser negro, amarelo ou branco constitui insulto ao homem singular e intolerável demonstração de minimização do grupo étnico a que este se vincula por nascimento. Obama terá de ser julgado, elogiado ou contestado pela obra que fará, não por ser negro. O nóvel presidente ainda nada fez, mas as sirenes do paternalismo trompeteiam aos sete ventos os mais descabelados e irrazoáveis panegíricos. A verdade é que, se Obama morresse hoje, nada teria para deixar e dele só ficaria a nota - absolutamente irrelevante para um não-racista - por haver sido o primeiro presidente negro da história do Ocidente.A ignorância tem destas coisas, pois lembraria aos mais afoitos paternalistas que Portugal teve no século XVI os primeiros bispos negros, no século XVII um grande diplomata e príncipe das letras que dava pelo nome de António Vieira - mulato muito escuro - e no século XVIII o primeiro primeiro-ministro misto da Europa. Obama passa, assim, como produto promocional sem novidade, apenas tido como excepção para os ignorantes da história portuguesa. Lembro que Ronald Daus - historiador de grande foôlego infelizmente pouco conhecido do público português - estudou durante décadas a antropologia racial portuguesa dispersa pelos azimutes do planeta e chegou a conclusões espantosas. O império português foi, durante séculos, mantido, regido e administrado por negros, indianos, chineses, mistos de todos os cruzamentos e até, pasmem-se os ouvidos pudibundos, por escravos. Foi esse o segredo da nossa longevidade. Ao quebrá-lo, em 1820, com a invenção da cidadania - e depois, com a criação das colónias e províncias ultramarinas, acto de estupidez a reboque o colonialismo europeu - perdemos essa grandeza que nos fazia detestados e temidos pelos inimigos de Portugal.
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«O império português foi, durante séculos, mantido, regido e administrado por negros, indianos, chineses, mistos de todos os cruzamentos e até, pasmem-se os ouvidos pudibundos, por escravos. Foi esse o segredo da nossa longevidade.» Miguel Castelo-BrancoRevoltante paternalismo via COMBUSTÕES de Combustões em 03/05/09 Se o racismo é coisa repugnante que sintomaticamente só parece agarrar seguidores entre os mais desclassificados elementos de uma raça - os que maior número de dúvidas carregam a respeito das suas qualidades individuais, escudando-se numa confortável generalização para não terem de se olhar ao espelho - esse outro racismo que dá pelo nome de paternalismo é revoltante, pois estriba-se num preconceito de superioridade escondido que trata de olhar com altaneira bonomia as restantes raças. Se um é brutal, o outro é hipócrita; se um é grosseiro, o outro é artificial; se um é reles, o outro é mentiroso.A campanha promocional de Obama e da sua mulher - já tida como cânone universal de beleza - é dessas coisas que fazem o retrato acabado da falsidade instituida como regra. O pensar correcto é, sempre, uma violação das diferenças constitutivas e enriquecedoras da humanidade, pelo que lavrar elogio (ou o seu oposto) a respeito de um homem pelo facto de ser negro, amarelo ou branco constitui insulto ao homem singular e intolerável demonstração de minimização do grupo étnico a que este se vincula por nascimento. Obama terá de ser julgado, elogiado ou contestado pela obra que fará, não por ser negro. O nóvel presidente ainda nada fez, mas as sirenes do paternalismo trompeteiam aos sete ventos os mais descabelados e irrazoáveis panegíricos. A verdade é que, se Obama morresse hoje, nada teria para deixar e dele só ficaria a nota - absolutamente irrelevante para um não-racista - por haver sido o primeiro presidente negro da história do Ocidente.A ignorância tem destas coisas, pois lembraria aos mais afoitos paternalistas que Portugal teve no século XVI os primeiros bispos negros, no século XVII um grande diplomata e príncipe das letras que dava pelo nome de António Vieira - mulato muito escuro - e no século XVIII o primeiro primeiro-ministro misto da Europa. Obama passa, assim, como produto promocional sem novidade, apenas tido como excepção para os ignorantes da história portuguesa. Lembro que Ronald Daus - historiador de grande foôlego infelizmente pouco conhecido do público português - estudou durante décadas a antropologia racial portuguesa dispersa pelos azimutes do planeta e chegou a conclusões espantosas. O império português foi, durante séculos, mantido, regido e administrado por negros, indianos, chineses, mistos de todos os cruzamentos e até, pasmem-se os ouvidos pudibundos, por escravos. Foi esse o segredo da nossa longevidade. Ao quebrá-lo, em 1820, com a invenção da cidadania - e depois, com a criação das colónias e províncias ultramarinas, acto de estupidez a reboque o colonialismo europeu - perdemos essa grandeza que nos fazia detestados e temidos pelos inimigos de Portugal.