Caso famoso. Relacionado com a pena de morte na América. Alguém pergunta:- Qual é tua opinião sobre a pena de morte?Resposta óbvia: - Sim, devemos ser contra qualquer pena de morte…… seja essa pena de morte proclamada por um tribunal americano ou por um “tribunal” chinês. O Poder não deve ter o poder sobre a vida humana. Pode, no máximo, prender perpetuamente. A lei de um estado de direito deve ter a capacidade para interromper o ciclo de vingança, deve ter a força para rasgar a lógica “olho por olho, dente por dente”. A pena de morte é isso: institucionalização de um certo direito de vingança. Um dos pilares da tolerância dos nossos regimes políticos é o seguinte: capacidade para transformar a vingança pessoal e social num compromisso legal e político. A Cadeia - algo temporário - substituiu a Espada - algo que tem esse irritante hábito de ser não-temporária quando toca em alguém. (é por isso que Foucault não percebeu nada da era contemporânea; a descrição que Foucault faz do nosso tempo deveria ser aplicada à Idade Média... e só ao início da Idade Média). Com a lei, com o tribunal, com a ideia de Cadeia, a antiga lógica tribal deu lugar a uma lógica legal. (era isto que Marcuse chamava de passagem à tolerância repressiva; pois, ele gostava, tal como Negri, de pôr a sua tribo, os seus meninos/índios, a queimar os livros de autores de outras tribos…). E já que falamos da América, país de crentes, deve-se relembrar o seguinte: a mensagem de Cristo era, precisamente, uma mensagem parecida com aquela que está presente nos quadros legais iluministas (não é por acaso…): pôr termo ao ciclo de violência, quebrar a lógica do “olho por olho, dente por dente”, encontrar uma forma de lidar com o inimigo ou adversário que vá além da murraça. Morto ou vivo, esta é a mensagem de JC. Mas, uma coisa é ser-se contra a pena de morte, outra coisa é aproveitar o tema para ser-se contra a América. Quando se lê certas opiniões sobre o tema, fica-se sempre com a impressão de que as almas que proclamam as ditas opiniões não querem, na verdade, o fim da pena de morte. Parece que querem a perpetuação da coisa. Dá jeito ter um tema fracturante como álibi para um ódio terminal e absoluto. Quando isto sucede, estas almas deixam de ter razão e passam para a zona do delírio. E entram directamente na escolinha da intolerância. [Henrique Raposo]
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Caso famoso. Relacionado com a pena de morte na América. Alguém pergunta:- Qual é tua opinião sobre a pena de morte?Resposta óbvia: - Sim, devemos ser contra qualquer pena de morte…… seja essa pena de morte proclamada por um tribunal americano ou por um “tribunal” chinês. O Poder não deve ter o poder sobre a vida humana. Pode, no máximo, prender perpetuamente. A lei de um estado de direito deve ter a capacidade para interromper o ciclo de vingança, deve ter a força para rasgar a lógica “olho por olho, dente por dente”. A pena de morte é isso: institucionalização de um certo direito de vingança. Um dos pilares da tolerância dos nossos regimes políticos é o seguinte: capacidade para transformar a vingança pessoal e social num compromisso legal e político. A Cadeia - algo temporário - substituiu a Espada - algo que tem esse irritante hábito de ser não-temporária quando toca em alguém. (é por isso que Foucault não percebeu nada da era contemporânea; a descrição que Foucault faz do nosso tempo deveria ser aplicada à Idade Média... e só ao início da Idade Média). Com a lei, com o tribunal, com a ideia de Cadeia, a antiga lógica tribal deu lugar a uma lógica legal. (era isto que Marcuse chamava de passagem à tolerância repressiva; pois, ele gostava, tal como Negri, de pôr a sua tribo, os seus meninos/índios, a queimar os livros de autores de outras tribos…). E já que falamos da América, país de crentes, deve-se relembrar o seguinte: a mensagem de Cristo era, precisamente, uma mensagem parecida com aquela que está presente nos quadros legais iluministas (não é por acaso…): pôr termo ao ciclo de violência, quebrar a lógica do “olho por olho, dente por dente”, encontrar uma forma de lidar com o inimigo ou adversário que vá além da murraça. Morto ou vivo, esta é a mensagem de JC. Mas, uma coisa é ser-se contra a pena de morte, outra coisa é aproveitar o tema para ser-se contra a América. Quando se lê certas opiniões sobre o tema, fica-se sempre com a impressão de que as almas que proclamam as ditas opiniões não querem, na verdade, o fim da pena de morte. Parece que querem a perpetuação da coisa. Dá jeito ter um tema fracturante como álibi para um ódio terminal e absoluto. Quando isto sucede, estas almas deixam de ter razão e passam para a zona do delírio. E entram directamente na escolinha da intolerância. [Henrique Raposo]