O Cachimbo de Magritte: Crónicas da Renascença: Consciência e Circunstâncias

07-07-2011
marcar artigo


Na passada segunda-feira, o Presidente da República comunicou ao país que iria promulgar a lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo para “não arrastar mais o debate”, como aconteceria se vetasse o diploma e a Assembleia da República o discutisse outra vez, mas também para que os portugueses não se distraíssem dos seus verdadeiros problemas, a saber, a crise económica.Dito de outro modo, Cavaco Silva informou-nos, em directo e em prime time, que considera a mudança radical na definição jurídica de casamento aprovada pela maioria parlamentar de esquerda, com tudo o que isso implica para a sociedade, uma questão secundária. E nós agradecemos: dá sempre jeito conhecer as prioridades de quem nos governa.Mas o pior da decisão é o fundamento invocado. Servindo-se da dicotomia de Max Weber entre “ética de convicção” (a que devemos seguir, de acordo com a nossa consciência) e “ética de responsabilidade” (a que somos obrigados a seguir, de acordo com as circunstâncias), o Presidente da República esclareceu que há circunstâncias difíceis em que a única opção é agir contra a própria consciência.Os horizontes que esta doutrina abre à acção humana são infinitos. Estou certo que os portugueses saberão explorá-los quando forem chamados a pagar impostos. Ou a votar nas presidenciais. Em contrapartida, a ideia de que não podia fazer outra coisa diminui o mais alto magistrado da nação. Cavaco tinha toda a legitimidade ética, jurídica e política para vetar a lei, sobretudo se acreditava que o devia fazer. Não o fez e isso é uma escolha. Livre, como todas as escolhas. Atribuí-la à responsabilidade do cargo é negar a sua própria liberdade. Uma liberdade de consciência que todos temos, mesmo nas circunstâncias mais difíceis. Porque o nosso eterno dilema não é entre ética da responsabilidade e ética da convicção, mas entre seguir as circunstâncias ou seguir a consciência.(23/5/10)


Na passada segunda-feira, o Presidente da República comunicou ao país que iria promulgar a lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo para “não arrastar mais o debate”, como aconteceria se vetasse o diploma e a Assembleia da República o discutisse outra vez, mas também para que os portugueses não se distraíssem dos seus verdadeiros problemas, a saber, a crise económica.Dito de outro modo, Cavaco Silva informou-nos, em directo e em prime time, que considera a mudança radical na definição jurídica de casamento aprovada pela maioria parlamentar de esquerda, com tudo o que isso implica para a sociedade, uma questão secundária. E nós agradecemos: dá sempre jeito conhecer as prioridades de quem nos governa.Mas o pior da decisão é o fundamento invocado. Servindo-se da dicotomia de Max Weber entre “ética de convicção” (a que devemos seguir, de acordo com a nossa consciência) e “ética de responsabilidade” (a que somos obrigados a seguir, de acordo com as circunstâncias), o Presidente da República esclareceu que há circunstâncias difíceis em que a única opção é agir contra a própria consciência.Os horizontes que esta doutrina abre à acção humana são infinitos. Estou certo que os portugueses saberão explorá-los quando forem chamados a pagar impostos. Ou a votar nas presidenciais. Em contrapartida, a ideia de que não podia fazer outra coisa diminui o mais alto magistrado da nação. Cavaco tinha toda a legitimidade ética, jurídica e política para vetar a lei, sobretudo se acreditava que o devia fazer. Não o fez e isso é uma escolha. Livre, como todas as escolhas. Atribuí-la à responsabilidade do cargo é negar a sua própria liberdade. Uma liberdade de consciência que todos temos, mesmo nas circunstâncias mais difíceis. Porque o nosso eterno dilema não é entre ética da responsabilidade e ética da convicção, mas entre seguir as circunstâncias ou seguir a consciência.(23/5/10)

marcar artigo