Protesto pacífico e em festa leva mais de 40 mil às ruas de Madrid

20-06-2011
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Manifestantes pretendiam provar a vitalidade do movimento 15M e poupá-lo ao contágio da violência. Conseguiram

O movimento 15M - assim denominado porque a primeira mobilização decorreu na manifestação de 15 de Maio convocada pela plataforma "Democracia Real, já!" - cumpriu ontem na capital espanhola as expectativas geradas. Segundo a polícia, foram 40 mil os que se concentraram na Praça de Neptuno, um número que os organizadores elevam para 50 mil, mais do dobro dos reunidos em meados de Maio último. Gritaram palavras de ordem contra as implicações sociais e políticas do "Pacto do Euro", num protesto pacífico e em festa.

"Vamos lá a isto." Com voz determinada e um leque na mão, uma mulher de meia-idade junta-se a uma das seis colunas que, oriundas de vários bairros de Madrid e de municípios vizinhos, rumava à concentração de Neptuno. Pouco passa das 10 horas da manhã, a coluna vinha da zona norte da capital, com origem na "Plaza de Castilla", e já se adivinha a companhia de um parceiro incómodo: o calor. Ontem, foi o dia mais quente do ano, com os termómetros a ultrapassarem os 30 graus. Apesar da canícula, a senhora entra no desfile. Outros se vão juntando à passagem, num percurso rigorosamente vigiado pela polícia. Cerca de mil agentes participaram no esquema de segurança.

"Já sabem, se houver violência, sentem-se no chão e levantem as mãos". Miguel, de 19 anos, de colete amarelo pistáchio, integra o serviço de ordem e não se cansa de repetir a orientação. Consciente de que os incidentes de Barcelona - a erupção de actos violentos na passada quarta-feira no cerco ao Parlamento da Catalunha - prejudica a imagem e a matriz do 15M, ontem o movimento tudo apostou na normalidade da concentração. "Não podemos permitir que uns poucos nos estraguem a festa", explica o jovem.

A marcha vai morna. O trajecto, Castellana a baixo, não concita adesões. A principal artéria madrilena, sede da city espanhola e onde residem classes abastadas, não é habitat de "indignados". Adivinhando uma longa jornada, que ainda decorre à hora do fecho desta edição com uma assembleia na Puerta del Sol, os integrantes da coluna norte administram as forças. Levam os panos a meia haste e poupam as palavras de ordem.

A passagem pelos Nuevos Ministérios, um complexo de vários ministérios com traça franquista, desperta a militância. "Não, não, não nos representam", começam a gritar, dirigindo-se à classe política. Domingo é dia sem administração. Mas a mensagem, a mais popular das que lançam, ficou dada. Dos passeios chegam aplausos. Habitantes do bairro de Chambéri, zona antiga e popular, manifestam o seu apoio. "Estou reformado, recebo 850 euros por mês, e que quer que lhe diga...", lamenta António. António Muñoz González, como o antigo funcionário da Câmara de Madrid, de 72 anos, faz questão de se apresentar. Veio com a mulher, Concha, e a inseparável Lolita, a cadela rafeira. Fala de uma vida de dificuldades. "E agora querem que sejamos nós a pagar as gillipoeses [sacanices] que fizeram os banqueiros...", desabafa.

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"Caminhemos juntos contra a crise e o capital" é o lema da concentração de Madrid. Uma das muitas dezenas previstas para várias cidades espanholas, e a mais matinal. "Vamos parar este pacto", lê-se num pano, referindo-se às políticas adoptadas pelo "Pacto do Euro". À medida que a coluna se aproxima do local da concentração aumenta o entusiasmo. As notícias da rádio sobre a marcha das outras colunas são saudadas. Há sorrisos quando é divulgado que à passagem da coluna do bairro popular de Vallecas se abriam janelas e idosos os aplaudiam. "Já era tempo que a juventude acordasse", diz com satisfação Maria Jiménez. "Sou enfermeira, trabalho no centro de saúde de Lavapiés, mas venho nesta coluna com uma amiga que mora no bairro de Pilar", revela Maria. O bairro de Pilar, uma concentração de edifícios de três andares, habitação social dos anos 60, onde então se marcava o subúrbio norte da cidade.

Habitantes dos bairros de Madrid estão na rua. "Sou informático, vivo em Chámberri com "los viejos", sou precário, nem "milieurista" sou", comenta Francisco, de 28 anos. "Quanto ganho?... já sabes, menos que mil euros", afirma ajustando as folhas de tabaco à mortalha. "Ninguém nos defende, nem os sindicatos nem as comissões de trabalhadores, hoje pelo menos posso gritar", diz entre risos.

"O povo levantou-se, estamos a dizer aos políticos e aos banqueiros que não nos representam, a concentração está a ser um êxito total, um protesto pacífico e em festa", comenta Aída Sanchéz, porta-voz do 15M. A seu lado está uma família inteira, com carro de bebé incluído. "Pelo menos protestamos", desaba Ângel. "Não podemos continuar assim", corrobora a mulher Raquel. Casal de trinta anos, estudos secundários e no desemprego. "A loja onde trabalhava fechou", recorda ela. "Já pensei em emigrar, mas ficava longe do miúdo", diz ele antecipando a tristeza. Ouvem-se bombos. Som compassado. Num rufar de festa e protesto.

Manifestantes pretendiam provar a vitalidade do movimento 15M e poupá-lo ao contágio da violência. Conseguiram

O movimento 15M - assim denominado porque a primeira mobilização decorreu na manifestação de 15 de Maio convocada pela plataforma "Democracia Real, já!" - cumpriu ontem na capital espanhola as expectativas geradas. Segundo a polícia, foram 40 mil os que se concentraram na Praça de Neptuno, um número que os organizadores elevam para 50 mil, mais do dobro dos reunidos em meados de Maio último. Gritaram palavras de ordem contra as implicações sociais e políticas do "Pacto do Euro", num protesto pacífico e em festa.

"Vamos lá a isto." Com voz determinada e um leque na mão, uma mulher de meia-idade junta-se a uma das seis colunas que, oriundas de vários bairros de Madrid e de municípios vizinhos, rumava à concentração de Neptuno. Pouco passa das 10 horas da manhã, a coluna vinha da zona norte da capital, com origem na "Plaza de Castilla", e já se adivinha a companhia de um parceiro incómodo: o calor. Ontem, foi o dia mais quente do ano, com os termómetros a ultrapassarem os 30 graus. Apesar da canícula, a senhora entra no desfile. Outros se vão juntando à passagem, num percurso rigorosamente vigiado pela polícia. Cerca de mil agentes participaram no esquema de segurança.

"Já sabem, se houver violência, sentem-se no chão e levantem as mãos". Miguel, de 19 anos, de colete amarelo pistáchio, integra o serviço de ordem e não se cansa de repetir a orientação. Consciente de que os incidentes de Barcelona - a erupção de actos violentos na passada quarta-feira no cerco ao Parlamento da Catalunha - prejudica a imagem e a matriz do 15M, ontem o movimento tudo apostou na normalidade da concentração. "Não podemos permitir que uns poucos nos estraguem a festa", explica o jovem.

A marcha vai morna. O trajecto, Castellana a baixo, não concita adesões. A principal artéria madrilena, sede da city espanhola e onde residem classes abastadas, não é habitat de "indignados". Adivinhando uma longa jornada, que ainda decorre à hora do fecho desta edição com uma assembleia na Puerta del Sol, os integrantes da coluna norte administram as forças. Levam os panos a meia haste e poupam as palavras de ordem.

A passagem pelos Nuevos Ministérios, um complexo de vários ministérios com traça franquista, desperta a militância. "Não, não, não nos representam", começam a gritar, dirigindo-se à classe política. Domingo é dia sem administração. Mas a mensagem, a mais popular das que lançam, ficou dada. Dos passeios chegam aplausos. Habitantes do bairro de Chambéri, zona antiga e popular, manifestam o seu apoio. "Estou reformado, recebo 850 euros por mês, e que quer que lhe diga...", lamenta António. António Muñoz González, como o antigo funcionário da Câmara de Madrid, de 72 anos, faz questão de se apresentar. Veio com a mulher, Concha, e a inseparável Lolita, a cadela rafeira. Fala de uma vida de dificuldades. "E agora querem que sejamos nós a pagar as gillipoeses [sacanices] que fizeram os banqueiros...", desabafa.

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"Caminhemos juntos contra a crise e o capital" é o lema da concentração de Madrid. Uma das muitas dezenas previstas para várias cidades espanholas, e a mais matinal. "Vamos parar este pacto", lê-se num pano, referindo-se às políticas adoptadas pelo "Pacto do Euro". À medida que a coluna se aproxima do local da concentração aumenta o entusiasmo. As notícias da rádio sobre a marcha das outras colunas são saudadas. Há sorrisos quando é divulgado que à passagem da coluna do bairro popular de Vallecas se abriam janelas e idosos os aplaudiam. "Já era tempo que a juventude acordasse", diz com satisfação Maria Jiménez. "Sou enfermeira, trabalho no centro de saúde de Lavapiés, mas venho nesta coluna com uma amiga que mora no bairro de Pilar", revela Maria. O bairro de Pilar, uma concentração de edifícios de três andares, habitação social dos anos 60, onde então se marcava o subúrbio norte da cidade.

Habitantes dos bairros de Madrid estão na rua. "Sou informático, vivo em Chámberri com "los viejos", sou precário, nem "milieurista" sou", comenta Francisco, de 28 anos. "Quanto ganho?... já sabes, menos que mil euros", afirma ajustando as folhas de tabaco à mortalha. "Ninguém nos defende, nem os sindicatos nem as comissões de trabalhadores, hoje pelo menos posso gritar", diz entre risos.

"O povo levantou-se, estamos a dizer aos políticos e aos banqueiros que não nos representam, a concentração está a ser um êxito total, um protesto pacífico e em festa", comenta Aída Sanchéz, porta-voz do 15M. A seu lado está uma família inteira, com carro de bebé incluído. "Pelo menos protestamos", desaba Ângel. "Não podemos continuar assim", corrobora a mulher Raquel. Casal de trinta anos, estudos secundários e no desemprego. "A loja onde trabalhava fechou", recorda ela. "Já pensei em emigrar, mas ficava longe do miúdo", diz ele antecipando a tristeza. Ouvem-se bombos. Som compassado. Num rufar de festa e protesto.

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