Pulo do Lobo: Ando a ler a Odisseia de Virgílio

30-06-2011
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Fico sempre estupefacto quando oiço pessoas falarem de Vasco Pulido Valente como aquele tipo que uma vez, na televisão, não sabia o salário mínimo. Na maior parte dos casos os indignados são criaturas que nunca leram os livros de VPV, não lêem as crónicas, não acompanham o estilo. Mas bastou um lapso, uma omissão, um esquecimento, para que eles desfizessem o homem e declarassem que no fundo, no fundo ele não era nenhum génio e, mais ainda, não era nada. Pode escrever-se sobre a História do século XIX sem conhecer o salário mínimo de um ano do século XX? Não, esses práticos da tolerância cultural, habitualmente mais incultos que as suas vítimas, não admitem. A intolerância traz sempre uma marca de cretinice. Lembro-me de um exame na faculdade em que o meu colega de carteira protestava contra o professor que tinha dito, antes de entregar os enunciados de teste, “alugar um imóvel” em vez de ‘arrendar”. O coitado, ao fim de quinze minutos, estava a entregar a prova. Sabia que não se diz “alugar um imóvel” mas não sabia mais nada. O que nos leva a Cavaco Silva e àquele dia triste para a cultura portuguesa em que Cavaco confundiu Thomas More e Thomas Mann, dois nomes que, como se pode ver, não têm nada a ver um com o outro, não têm sequer palavras idênticas, a mesma aliteração, as mesmas consoantes, dois nomes que qualquer um distingue. Confusões destas não se aceitam. O meu amigo Pedro Mexia que confessava recentemente ter trocado os nomes de Galvão Telles e Cunha Telles bem pode pedir protecção. E eu, que às vezes misturo Tom Wolfe e Thomas Wolfe, ou Henry Green ou Julien Green, ou Ian Banks e Russell Banks, devo ficar no meu lugar esperando a pena. A quantidade de gente que se diz conhecedora da mesa de cabeceira de Cavaco Silva daria para um filme cheio de figuração. Somos todos muito tolerantes, muito complacentes com o erro, muito cultos, muito educados, muito clássicos, lemos “A Utopia”, “Os Buddenbrook”, só nos falta agora aprender coisas mais simples, coisas como a humildade, a moderação no juízo e, se não for pedir muito, uma certa noção do ridículo.

Fico sempre estupefacto quando oiço pessoas falarem de Vasco Pulido Valente como aquele tipo que uma vez, na televisão, não sabia o salário mínimo. Na maior parte dos casos os indignados são criaturas que nunca leram os livros de VPV, não lêem as crónicas, não acompanham o estilo. Mas bastou um lapso, uma omissão, um esquecimento, para que eles desfizessem o homem e declarassem que no fundo, no fundo ele não era nenhum génio e, mais ainda, não era nada. Pode escrever-se sobre a História do século XIX sem conhecer o salário mínimo de um ano do século XX? Não, esses práticos da tolerância cultural, habitualmente mais incultos que as suas vítimas, não admitem. A intolerância traz sempre uma marca de cretinice. Lembro-me de um exame na faculdade em que o meu colega de carteira protestava contra o professor que tinha dito, antes de entregar os enunciados de teste, “alugar um imóvel” em vez de ‘arrendar”. O coitado, ao fim de quinze minutos, estava a entregar a prova. Sabia que não se diz “alugar um imóvel” mas não sabia mais nada. O que nos leva a Cavaco Silva e àquele dia triste para a cultura portuguesa em que Cavaco confundiu Thomas More e Thomas Mann, dois nomes que, como se pode ver, não têm nada a ver um com o outro, não têm sequer palavras idênticas, a mesma aliteração, as mesmas consoantes, dois nomes que qualquer um distingue. Confusões destas não se aceitam. O meu amigo Pedro Mexia que confessava recentemente ter trocado os nomes de Galvão Telles e Cunha Telles bem pode pedir protecção. E eu, que às vezes misturo Tom Wolfe e Thomas Wolfe, ou Henry Green ou Julien Green, ou Ian Banks e Russell Banks, devo ficar no meu lugar esperando a pena. A quantidade de gente que se diz conhecedora da mesa de cabeceira de Cavaco Silva daria para um filme cheio de figuração. Somos todos muito tolerantes, muito complacentes com o erro, muito cultos, muito educados, muito clássicos, lemos “A Utopia”, “Os Buddenbrook”, só nos falta agora aprender coisas mais simples, coisas como a humildade, a moderação no juízo e, se não for pedir muito, uma certa noção do ridículo.

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