INSTANTE FATAL: A Curva do Mónaco

25-01-2012
marcar artigo


foto:Daniel Duque /OlharesA Curva do Mónaco sempre despertou em mim encanto. Era a curva da morte, nos anos sessenta e setenta. Tem um nome charmoso: Mónaco. E a geometria da curva tem qualquer coisa entre perigo e aventura. Imagino por lá minis vermelhos e brancos a acelerarem a grande velocidade, quando havia sonho e romantismo nos automóveis dos anos sessenta. O Restaurante do Mónaco, ali a abraçar a curva, chique e caro na época em que a classe média alta da linha mostrava bom gosto, encanto e um mundo social entre sexo e dança.Hoje a Curva do Mónaco lá está: mais segura, decadente, nostálgica e o seu restaurante a dar os últimos suspiros. Há por lá baile ao fim de semana, para velhotes solitários em busca de uma alma gémea para o Céu, pescadores furtivos, ciclistas lançados, e gente que por ali passa meia vagabunda.Por detrás da Curva há chalés recentes, numa encosta que é das mais belas da Linha. Casas com vista sobre o rio e o mar que o abraça. Imagino varandas ao fim da tarde com música tropical, bebidas geladas e cheiros a mar. Há ainda atrás da Curva, casebres abandonados, à espera de um tempo bom para investir numa zona invejável.Ontem peguei na minha bicicleta e, a conselho de amigos ciclistas, decidi explorar aquela paisagem permitida pelo caminho que arranca à saída da curva, passa pela estação da Cruz Quebrada e acaba na praia de Algés. Entre a linha do comboio e o Tejo, persiste uma vida de gente à margem, que sobrevive da pesca artesanal. Por ali comem peixe fresco, fazem churrascos, convivem entre barracas e carros velhos que conseguem mover-se. Parece uma paisagem de Antonioni, um deserto vermelho de solidão, paz e grande interioridade.O comboio passa com frequência, rápido, vencendo uma outra curva, a da falésia de Gibralta que desabou há quarenta anos sobre um comboio, fazendo várias mortes. Ainda se vê por ali a arquitectura promovida por Duarte Pacheco, com escadarias que ligavam a Marginal ao rio, num tempo em que os carros pretos passeavam na estrada como se estivéssemos em Acapulco e a vida fosse um filme technicolor filmado à medida do sonho.Naqueles 10 quilómetros há um mundo mágico, esquecido por autarcas e governos ávidos de rotundas e obras públicas. Um ambiente que tem qualquer coisa de sensual, proibido, santo.Não aconselho ninguém a ir para lá. Quero aquilo só para mim.


foto:Daniel Duque /OlharesA Curva do Mónaco sempre despertou em mim encanto. Era a curva da morte, nos anos sessenta e setenta. Tem um nome charmoso: Mónaco. E a geometria da curva tem qualquer coisa entre perigo e aventura. Imagino por lá minis vermelhos e brancos a acelerarem a grande velocidade, quando havia sonho e romantismo nos automóveis dos anos sessenta. O Restaurante do Mónaco, ali a abraçar a curva, chique e caro na época em que a classe média alta da linha mostrava bom gosto, encanto e um mundo social entre sexo e dança.Hoje a Curva do Mónaco lá está: mais segura, decadente, nostálgica e o seu restaurante a dar os últimos suspiros. Há por lá baile ao fim de semana, para velhotes solitários em busca de uma alma gémea para o Céu, pescadores furtivos, ciclistas lançados, e gente que por ali passa meia vagabunda.Por detrás da Curva há chalés recentes, numa encosta que é das mais belas da Linha. Casas com vista sobre o rio e o mar que o abraça. Imagino varandas ao fim da tarde com música tropical, bebidas geladas e cheiros a mar. Há ainda atrás da Curva, casebres abandonados, à espera de um tempo bom para investir numa zona invejável.Ontem peguei na minha bicicleta e, a conselho de amigos ciclistas, decidi explorar aquela paisagem permitida pelo caminho que arranca à saída da curva, passa pela estação da Cruz Quebrada e acaba na praia de Algés. Entre a linha do comboio e o Tejo, persiste uma vida de gente à margem, que sobrevive da pesca artesanal. Por ali comem peixe fresco, fazem churrascos, convivem entre barracas e carros velhos que conseguem mover-se. Parece uma paisagem de Antonioni, um deserto vermelho de solidão, paz e grande interioridade.O comboio passa com frequência, rápido, vencendo uma outra curva, a da falésia de Gibralta que desabou há quarenta anos sobre um comboio, fazendo várias mortes. Ainda se vê por ali a arquitectura promovida por Duarte Pacheco, com escadarias que ligavam a Marginal ao rio, num tempo em que os carros pretos passeavam na estrada como se estivéssemos em Acapulco e a vida fosse um filme technicolor filmado à medida do sonho.Naqueles 10 quilómetros há um mundo mágico, esquecido por autarcas e governos ávidos de rotundas e obras públicas. Um ambiente que tem qualquer coisa de sensual, proibido, santo.Não aconselho ninguém a ir para lá. Quero aquilo só para mim.

marcar artigo