Alma Lusíada: Perto da Lucidez

30-06-2011
marcar artigo

No artigo de hoje no Público – Longe da Salvação – Vasco Pulido Valente aproxima-se finalmente da lucidez, ao dar como confirmado o equívoco político de Manuela Ferreira Leite, à frente do PSD.

Causa estranheza que analistas de prestígio, como VPV, há longas décadas no centro da discussão política, ainda tivessem alimentado ilusões acerca de MFL, como líder do maior partido da Oposição, o PSD, capaz de o retirar do presente marasmo em que se encontra atolado, para o conduzir à vitória no próximo ano.

M.F.L. tem já uma extensa carreira político-partidária, na qual provou, à saciedade, a sua falta de vocação para o exercício de cargos políticos relevantes. Tal como muitas outras figuras do PSD, M.F. Leite beneficiou de uma espécie de efeito de aspiração provocado por Aníbal Cavaco Silva, quando este surgiu de rompante na cena política, após uma experiência limitada, como Ministro das Finanças, de um Governo da Aliança Democrática presidido por Sá Carneiro.

Cavaco, à frente das Finanças, havia causado boa impressão técnica a Sá Carneiro e, com apreciável sentido político, nos anos do descolorido Governo do Bloco Central, afirmou-se como uma reserva do PSD e da Nação, com intervenções curtas, mas acutilantes, na vida política de então, desferindo nesse bloco de interesses repetidos golpes até à sua inevitável queda.

Na altura, havia um cansaço evidente dos Portugueses com os políticos palavrosos, em que os homens de formação em Direito, com mais habilidade retórica que razão, dominavam em absoluto. O aparecimento da figura austera de Cavaco Silva agradou logo, até por contraste.

Daí a facilidade com que se impôs no Congresso da Figueira da Foz e, na sua sequência, as vitórias eleitorais que o PSD obteve, duas delas, em 1987 e 1991, com maioria absoluta, a tal que, para os socialistas, era uma forma de Ditadura da maioria, como incansavelmente proclamavam, com Soares à cabeça, antes e depois da sua entrada na Presidência da República, de onde sempre orquestrou contra Cavaco Silva uma clandestina e persistente conspiração.

Mas, se os êxitos eleitorais de Cavaco Silva abriram o País a uma certa renovação económica, dotando-o de infra-estruturas mais modernas, sobretudo, no plano político era igualmente notório um certo esvaziamento. Muitas das pessoas que o acompanharam não tinham nenhuma preparação política, regiam-se por noções de mero pragmatismo, de resto, incentivadas nesta atitude pelo próprio PM e líder do Partido, estrutura esta ostensivamente relegado para um secundaríssimo plano.

A ilusão desta gente que Cavaco promoveu com a súbita prosperidade económico-financeira do País, inundado de Fundos de Apoio da Comunidade, fez com que se vissem a si mesmos na pele de Gestores e Administradores, deslumbrados com as oportunidades criadas com as Privatizações de Empresas e a abertura de múltiplos negócios, apadrinhados, muitos deles, a partir das posições que eles próprios detinham no interior do aparelho de Estado.

Era mais do que visível o défice político do PSD, nos últimos anos dos Governos de Cavaco. Havia até uma certa relutância em aceitar a condição política por toda esta pretensa elite.

Todos eles queriam ser denominados Gestores ou Administradores, com cópia de privilégios associados aos cargos que desempenhavam, invariavelmente por decorrência política de eleições ganhas ou por nomeação de outros, por sua vez também eles designados por influência política.

Nesse tempo, a Educação do sábio Roberto Carneiro já era um fracasso, em que sucessivamente pontificaram a sua irrelevância nomes como Manuela F. Leite, Joaquim Durão e Couto dos Santos, este último, um caso raro de inépcia no cargo, onde mais parecia um dirigente estudantil, um pouco mais velho, na idade, mas igualmente leviano no espírito e na credibilidade.

Veio 1995 e a melopeia guterrista convenceu os Portugueses a mudarem de dirigentes. O homem para quem a Educação era a verdadeira paixão, para quem as pessoas valiam mais que as auto-estradas, rapidamente se revelou um hábil demagogo, mas pusilânime, de coração generoso para uma enorme torrente de militantes «socialistas» que, com proficiência e sentido solidário, povoaram o Estado e as Empresas, transformando-se, também eles, em Gestores, tão credíveis ou mais, para os Grupos Financeiros em ascensão, que os seus antecessores «social-democratas».

O País viu, assim, aumentar significativamente a sua família de Gestores, de raiz política, já que a anterior emigrou, lesta, para cargos de Administração, bem rendosos e prestigiados, tomando a nova posições hegemónicas no Estado e nas Empresas em que aquele detinha influência dominante.

Com a fuga desordenada de Guterres, deu-se a subida quase inevitável de Barroso e da sua prometedora comitiva, que, analogamente, decepcionaram quem esperava pronta correcção de rumo e eliminação de abusos.

Com uma sucessão impressionante de êxitos pessoais e concomitantes insucessos políticos internos, Barroso viu-se guindado a Bruxelas, ao topo da hierarquia política da União Europeia, enquanto a nova estrela do firmamento «social-democrático», Santana Lopes, o tal fenómeno político, perito, apregoava-se, em ganhar eleições, em escassos meses, enredou-se em trapalhadas sucessivas, acabando por ser vítima da subtil perfídia de Sampaio, que não perdeu tempo em demiti-lo, congraçando-se deste modo com a família socialista, que tanto se irritara com a anterior nomeação de Santana para PM.

Este, apesar de toda a sua propalada mestria política, não logrou apoio, nem sequer comiseração, da parte do eleitorado, o qual, espantosamente, se voltou para o PS de Sócrates, outro anunciado redentor, em nome do rigor financeiro, que antes, quando protagonizado por MFLeite ou por Bagão Félix, nos Governos de Barroso e Santana, combatia ou desvalorizava, com veemência.

Três anos e meio depois da entrada em cena de Sócrates, o País está, todo ele, um pouco mais pobre, um pouco mais deprimido, mais sobrecarregado de impostos, mergulhado numa embrulhada ainda maior, no campo do Ensino, da Saúde, da Justiça, da Agricultura, da Economia, progressivamente desindustrializada e com uma dívida externa aumentada.

Com enorme espanto, o PSD vai mudando de líder, mas não cresce nas sondagens, em nada beneficiando dos falhanços de Sócrates.

Nem com a sisudez de MFLeite o PSD lucrou alguma coisa. A sua incapacidade de inspirar ânimo nos Portugueses está demonstrada, mesmo para aqueles, como VPValente, que nela fundaram esperanças.

Tornou-se evidente, para quase todos já, que a senhora não tem ideias políticas, não encontra sequer discurso fora do jargão económico-financeiro, tropeça, com frequência, nos recursos de linguagem utilizados, confundindo o seu auditório com ironias mal ensaiadas, deixando a convicção entre os que a ouvem de que a sua mudez anterior era mais uma necessidade, por escassez de inspiração, do que uma opção pessoal.

Mas o nosso drama com este mesmo facto se agrava, porque a possibilidade de uma nova vitória socrática, ainda que minoritária, se torna cada vez mais real.

Com o PSD desprovido de líder capaz de gerar empatia nos eleitores, sem nenhum outro candidato a líder com talentos óbvios para a tarefa, o horizonte vai-se progressivamente fechando, ficando cada vez mais lúgubre.

O PSD, como partido, quase não conta para nada. Até para colar cartazes é preciso pagar a tarefeiros. Como instrumento de mobilização da opinião pública, não funciona, nem pelos seus mais antigos e prolíferos intervenientes no comentário político, Vasco Graça Moura e Pacheco Pereira, consegue cobrar ânimo ou confiança no eleitorado.

Pacheco, presuntivo conselheiro intelectual de MFLeite, está visivelmente desgastado, exaurido, de tanta cumplicidade mediática mantida com figuras dúbias do bloco central e já voltou às suas tradicionais crónicas lamurientas do martírio das classes laboriosas da outra banda do Tejo, as que, no caminho diário de casa para o trabalho e retorno, levam 3 horas no trânsito, permanentemente entupido, findas as quais estão preparadas para a cadência deprimente do «jantar, telenovela e cama».

Sobre este negrume, caiu recentemente o escândalo do Banco de Negócios Português, onde um ramo da família «social-democrática» dispunha de alto assento, notoriamente embaraçando, com tais ligações, o actual Presidente da República, uma das raras figuras do regime não atingidas pelo labéu da suspeição ou da desconfiança.

Nada disto ajuda, pois, à recuperação do PSD. Toda a gente percebe agora que nenhum destes senhores associados a tantos negócios de fundo duvidoso alguma vez se interessou pela Social-Democracia, mesmo em versão muito mitigada. Para eles, o PSD não passou de um veículo, um instrumento político que se apressaram em manobrar, dirigindo-o para fins diversos, mais convergentes com os seus pessoais interesses.

Daí que todo o seu discurso incidisse nos negócios, na sua liberalização, na ausência de intervenção estatal, que hoje, todavia, não hesitam solicitar e em recomendar, como forma de restaurar, dizem, a confiança entretanto abalada no sistema financeiro que eles próprios se empenharam em degradar.

A isto, a família socrática chama-lhe naturalmente um figo, logo lhes abrindo o seu amplo regaço, contanto que aceitem a comparticipação de alguns dos seus elementos nas Instituições mais enfermas, porventura ainda pouco povoadas pelos seus correligionários.

Com tantos escândalos revelados, pode dizer-se que, a cada ano que passa, mais se defrauda a confiança dos Portugueses nas Instituições, públicas e privadas, criadas pelo 25 de Abril de 1974.

Triste comprovação, esta, a ilustrar a tremenda crise moral que se abateu sobre a vida política nacional. Como bem nos advertiu um valoroso português, António José Saraiva, nos luminosos escritos que nos legou, desta crise moral em que caímos derivam as demais e, sem compreendermos e debelarmos esta, dificilmente resolveremos as outras, que são muitas e todas gravosas.

E de nada valerá igualmente reerguer mitos falhados, utopias fracassadas, como o Comunismo, que, por todo o lado em que foram Poder, deixaram um rasto de miséria e de embuste, criando sociedades totalitárias, sem liberdade, sem alegria e sem conforto, ainda que mais igualitárias, naquele sentido trágico da igualdade na penúria, condição que, todavia, conserva os seus indefectíveis adeptos.

A alternativa, contudo, não reside aí, mas no regresso a uma prática política pautada pelo respeito da Ética, perseguindo critérios de equidade social, mais harmoniosa, mais equilibrada, mais solidária, como já estivemos mais perto de atingir, nas décadas do pós-guerra, nos designados trinta gloriosos anos de prosperidade económica e social, entre 1945 e 1975, nos países da Comunidade Europeia, para onde compreensivelmente se encaminhava a nossa corrente migratória.

Como sistema económico, a eficiência produtiva do Capitalismo não carece de demonstração, nem suporta comparação competitiva com formas ditas alternativas de Sistemas Político-Económicos, chamem-se eles Socialismo ou Comunismo, nas suas versões europeias, asiáticas ou das Antilhas.

No entanto, o Capitalismo, na sua modalidade revelada nos últimas decénios, sob a designação de neo-liberalismo económico e financeiro, inimigo da regulação e da fiscalização estatal, da concertação social, da solidariedade, da coesão e da justiça social, esse sim, precisa de ser denunciado, sustido e combatido politicamente, sem margem para dúvidas, se queremos construir um mundo mais convivente.

E, neste sentido, muitos agiram, por todo o lado, sem achar necessidade de recuperar ideologias falidas, desacreditadas pela prova da História. Seria duplamente trágico, para usar uma frase de ressonância marxista, que elas regressassem agora. Nem Marx, que era dotado de fina inteligência, a tal aconselharia.

De resto, como filósofo, julgo que será sempre estudado com interesse e proveito. Como Profeta, creio que não voltará a ganhar o pedestal perdido.

A História, essa, continua e sempre continuará a reservar-nos múltiplas surpresas. É de sua natureza mostrar-se rebelde a quaisquer sistemas de ideias ou doutrinas, por mais perfeitas ou científicas que no-las queiram apresentar os seus mais ou menos iluminados arautos.

AV_Lisboa, 30 de Novembro de 2008

PS : Reparo, agora, na data, 30 de Novembro, dia da morte do nosso infortunado Fernando Pessoa, ocorrida em 1935, num sombrio quarto do Hospital de S. Luís dos Franceses, ao Bairro Alto, em Lisboa, quase ignorado da Pátria e do Mundo, que, no entanto, hoje o reconhecem e festejam como uma das maiores figuras literárias de todas as Literaturas, de todos os tempos. Caprichoso destino o seu, como ele próprio parece ter previsto, quando considerava ser esse o verdadeiro triunfo, viver uma vida incógnita, apagada, para obter a consagração permanente após a morte. Só almas de excepcional grandeza podem conceber com verdade semelhante destino. Aqui fica mais esta breve e singela homenagem de um seu fiel e grato leitor.

No artigo de hoje no Público – Longe da Salvação – Vasco Pulido Valente aproxima-se finalmente da lucidez, ao dar como confirmado o equívoco político de Manuela Ferreira Leite, à frente do PSD.

Causa estranheza que analistas de prestígio, como VPV, há longas décadas no centro da discussão política, ainda tivessem alimentado ilusões acerca de MFL, como líder do maior partido da Oposição, o PSD, capaz de o retirar do presente marasmo em que se encontra atolado, para o conduzir à vitória no próximo ano.

M.F.L. tem já uma extensa carreira político-partidária, na qual provou, à saciedade, a sua falta de vocação para o exercício de cargos políticos relevantes. Tal como muitas outras figuras do PSD, M.F. Leite beneficiou de uma espécie de efeito de aspiração provocado por Aníbal Cavaco Silva, quando este surgiu de rompante na cena política, após uma experiência limitada, como Ministro das Finanças, de um Governo da Aliança Democrática presidido por Sá Carneiro.

Cavaco, à frente das Finanças, havia causado boa impressão técnica a Sá Carneiro e, com apreciável sentido político, nos anos do descolorido Governo do Bloco Central, afirmou-se como uma reserva do PSD e da Nação, com intervenções curtas, mas acutilantes, na vida política de então, desferindo nesse bloco de interesses repetidos golpes até à sua inevitável queda.

Na altura, havia um cansaço evidente dos Portugueses com os políticos palavrosos, em que os homens de formação em Direito, com mais habilidade retórica que razão, dominavam em absoluto. O aparecimento da figura austera de Cavaco Silva agradou logo, até por contraste.

Daí a facilidade com que se impôs no Congresso da Figueira da Foz e, na sua sequência, as vitórias eleitorais que o PSD obteve, duas delas, em 1987 e 1991, com maioria absoluta, a tal que, para os socialistas, era uma forma de Ditadura da maioria, como incansavelmente proclamavam, com Soares à cabeça, antes e depois da sua entrada na Presidência da República, de onde sempre orquestrou contra Cavaco Silva uma clandestina e persistente conspiração.

Mas, se os êxitos eleitorais de Cavaco Silva abriram o País a uma certa renovação económica, dotando-o de infra-estruturas mais modernas, sobretudo, no plano político era igualmente notório um certo esvaziamento. Muitas das pessoas que o acompanharam não tinham nenhuma preparação política, regiam-se por noções de mero pragmatismo, de resto, incentivadas nesta atitude pelo próprio PM e líder do Partido, estrutura esta ostensivamente relegado para um secundaríssimo plano.

A ilusão desta gente que Cavaco promoveu com a súbita prosperidade económico-financeira do País, inundado de Fundos de Apoio da Comunidade, fez com que se vissem a si mesmos na pele de Gestores e Administradores, deslumbrados com as oportunidades criadas com as Privatizações de Empresas e a abertura de múltiplos negócios, apadrinhados, muitos deles, a partir das posições que eles próprios detinham no interior do aparelho de Estado.

Era mais do que visível o défice político do PSD, nos últimos anos dos Governos de Cavaco. Havia até uma certa relutância em aceitar a condição política por toda esta pretensa elite.

Todos eles queriam ser denominados Gestores ou Administradores, com cópia de privilégios associados aos cargos que desempenhavam, invariavelmente por decorrência política de eleições ganhas ou por nomeação de outros, por sua vez também eles designados por influência política.

Nesse tempo, a Educação do sábio Roberto Carneiro já era um fracasso, em que sucessivamente pontificaram a sua irrelevância nomes como Manuela F. Leite, Joaquim Durão e Couto dos Santos, este último, um caso raro de inépcia no cargo, onde mais parecia um dirigente estudantil, um pouco mais velho, na idade, mas igualmente leviano no espírito e na credibilidade.

Veio 1995 e a melopeia guterrista convenceu os Portugueses a mudarem de dirigentes. O homem para quem a Educação era a verdadeira paixão, para quem as pessoas valiam mais que as auto-estradas, rapidamente se revelou um hábil demagogo, mas pusilânime, de coração generoso para uma enorme torrente de militantes «socialistas» que, com proficiência e sentido solidário, povoaram o Estado e as Empresas, transformando-se, também eles, em Gestores, tão credíveis ou mais, para os Grupos Financeiros em ascensão, que os seus antecessores «social-democratas».

O País viu, assim, aumentar significativamente a sua família de Gestores, de raiz política, já que a anterior emigrou, lesta, para cargos de Administração, bem rendosos e prestigiados, tomando a nova posições hegemónicas no Estado e nas Empresas em que aquele detinha influência dominante.

Com a fuga desordenada de Guterres, deu-se a subida quase inevitável de Barroso e da sua prometedora comitiva, que, analogamente, decepcionaram quem esperava pronta correcção de rumo e eliminação de abusos.

Com uma sucessão impressionante de êxitos pessoais e concomitantes insucessos políticos internos, Barroso viu-se guindado a Bruxelas, ao topo da hierarquia política da União Europeia, enquanto a nova estrela do firmamento «social-democrático», Santana Lopes, o tal fenómeno político, perito, apregoava-se, em ganhar eleições, em escassos meses, enredou-se em trapalhadas sucessivas, acabando por ser vítima da subtil perfídia de Sampaio, que não perdeu tempo em demiti-lo, congraçando-se deste modo com a família socialista, que tanto se irritara com a anterior nomeação de Santana para PM.

Este, apesar de toda a sua propalada mestria política, não logrou apoio, nem sequer comiseração, da parte do eleitorado, o qual, espantosamente, se voltou para o PS de Sócrates, outro anunciado redentor, em nome do rigor financeiro, que antes, quando protagonizado por MFLeite ou por Bagão Félix, nos Governos de Barroso e Santana, combatia ou desvalorizava, com veemência.

Três anos e meio depois da entrada em cena de Sócrates, o País está, todo ele, um pouco mais pobre, um pouco mais deprimido, mais sobrecarregado de impostos, mergulhado numa embrulhada ainda maior, no campo do Ensino, da Saúde, da Justiça, da Agricultura, da Economia, progressivamente desindustrializada e com uma dívida externa aumentada.

Com enorme espanto, o PSD vai mudando de líder, mas não cresce nas sondagens, em nada beneficiando dos falhanços de Sócrates.

Nem com a sisudez de MFLeite o PSD lucrou alguma coisa. A sua incapacidade de inspirar ânimo nos Portugueses está demonstrada, mesmo para aqueles, como VPValente, que nela fundaram esperanças.

Tornou-se evidente, para quase todos já, que a senhora não tem ideias políticas, não encontra sequer discurso fora do jargão económico-financeiro, tropeça, com frequência, nos recursos de linguagem utilizados, confundindo o seu auditório com ironias mal ensaiadas, deixando a convicção entre os que a ouvem de que a sua mudez anterior era mais uma necessidade, por escassez de inspiração, do que uma opção pessoal.

Mas o nosso drama com este mesmo facto se agrava, porque a possibilidade de uma nova vitória socrática, ainda que minoritária, se torna cada vez mais real.

Com o PSD desprovido de líder capaz de gerar empatia nos eleitores, sem nenhum outro candidato a líder com talentos óbvios para a tarefa, o horizonte vai-se progressivamente fechando, ficando cada vez mais lúgubre.

O PSD, como partido, quase não conta para nada. Até para colar cartazes é preciso pagar a tarefeiros. Como instrumento de mobilização da opinião pública, não funciona, nem pelos seus mais antigos e prolíferos intervenientes no comentário político, Vasco Graça Moura e Pacheco Pereira, consegue cobrar ânimo ou confiança no eleitorado.

Pacheco, presuntivo conselheiro intelectual de MFLeite, está visivelmente desgastado, exaurido, de tanta cumplicidade mediática mantida com figuras dúbias do bloco central e já voltou às suas tradicionais crónicas lamurientas do martírio das classes laboriosas da outra banda do Tejo, as que, no caminho diário de casa para o trabalho e retorno, levam 3 horas no trânsito, permanentemente entupido, findas as quais estão preparadas para a cadência deprimente do «jantar, telenovela e cama».

Sobre este negrume, caiu recentemente o escândalo do Banco de Negócios Português, onde um ramo da família «social-democrática» dispunha de alto assento, notoriamente embaraçando, com tais ligações, o actual Presidente da República, uma das raras figuras do regime não atingidas pelo labéu da suspeição ou da desconfiança.

Nada disto ajuda, pois, à recuperação do PSD. Toda a gente percebe agora que nenhum destes senhores associados a tantos negócios de fundo duvidoso alguma vez se interessou pela Social-Democracia, mesmo em versão muito mitigada. Para eles, o PSD não passou de um veículo, um instrumento político que se apressaram em manobrar, dirigindo-o para fins diversos, mais convergentes com os seus pessoais interesses.

Daí que todo o seu discurso incidisse nos negócios, na sua liberalização, na ausência de intervenção estatal, que hoje, todavia, não hesitam solicitar e em recomendar, como forma de restaurar, dizem, a confiança entretanto abalada no sistema financeiro que eles próprios se empenharam em degradar.

A isto, a família socrática chama-lhe naturalmente um figo, logo lhes abrindo o seu amplo regaço, contanto que aceitem a comparticipação de alguns dos seus elementos nas Instituições mais enfermas, porventura ainda pouco povoadas pelos seus correligionários.

Com tantos escândalos revelados, pode dizer-se que, a cada ano que passa, mais se defrauda a confiança dos Portugueses nas Instituições, públicas e privadas, criadas pelo 25 de Abril de 1974.

Triste comprovação, esta, a ilustrar a tremenda crise moral que se abateu sobre a vida política nacional. Como bem nos advertiu um valoroso português, António José Saraiva, nos luminosos escritos que nos legou, desta crise moral em que caímos derivam as demais e, sem compreendermos e debelarmos esta, dificilmente resolveremos as outras, que são muitas e todas gravosas.

E de nada valerá igualmente reerguer mitos falhados, utopias fracassadas, como o Comunismo, que, por todo o lado em que foram Poder, deixaram um rasto de miséria e de embuste, criando sociedades totalitárias, sem liberdade, sem alegria e sem conforto, ainda que mais igualitárias, naquele sentido trágico da igualdade na penúria, condição que, todavia, conserva os seus indefectíveis adeptos.

A alternativa, contudo, não reside aí, mas no regresso a uma prática política pautada pelo respeito da Ética, perseguindo critérios de equidade social, mais harmoniosa, mais equilibrada, mais solidária, como já estivemos mais perto de atingir, nas décadas do pós-guerra, nos designados trinta gloriosos anos de prosperidade económica e social, entre 1945 e 1975, nos países da Comunidade Europeia, para onde compreensivelmente se encaminhava a nossa corrente migratória.

Como sistema económico, a eficiência produtiva do Capitalismo não carece de demonstração, nem suporta comparação competitiva com formas ditas alternativas de Sistemas Político-Económicos, chamem-se eles Socialismo ou Comunismo, nas suas versões europeias, asiáticas ou das Antilhas.

No entanto, o Capitalismo, na sua modalidade revelada nos últimas decénios, sob a designação de neo-liberalismo económico e financeiro, inimigo da regulação e da fiscalização estatal, da concertação social, da solidariedade, da coesão e da justiça social, esse sim, precisa de ser denunciado, sustido e combatido politicamente, sem margem para dúvidas, se queremos construir um mundo mais convivente.

E, neste sentido, muitos agiram, por todo o lado, sem achar necessidade de recuperar ideologias falidas, desacreditadas pela prova da História. Seria duplamente trágico, para usar uma frase de ressonância marxista, que elas regressassem agora. Nem Marx, que era dotado de fina inteligência, a tal aconselharia.

De resto, como filósofo, julgo que será sempre estudado com interesse e proveito. Como Profeta, creio que não voltará a ganhar o pedestal perdido.

A História, essa, continua e sempre continuará a reservar-nos múltiplas surpresas. É de sua natureza mostrar-se rebelde a quaisquer sistemas de ideias ou doutrinas, por mais perfeitas ou científicas que no-las queiram apresentar os seus mais ou menos iluminados arautos.

AV_Lisboa, 30 de Novembro de 2008

PS : Reparo, agora, na data, 30 de Novembro, dia da morte do nosso infortunado Fernando Pessoa, ocorrida em 1935, num sombrio quarto do Hospital de S. Luís dos Franceses, ao Bairro Alto, em Lisboa, quase ignorado da Pátria e do Mundo, que, no entanto, hoje o reconhecem e festejam como uma das maiores figuras literárias de todas as Literaturas, de todos os tempos. Caprichoso destino o seu, como ele próprio parece ter previsto, quando considerava ser esse o verdadeiro triunfo, viver uma vida incógnita, apagada, para obter a consagração permanente após a morte. Só almas de excepcional grandeza podem conceber com verdade semelhante destino. Aqui fica mais esta breve e singela homenagem de um seu fiel e grato leitor.

marcar artigo