Portugal é um país achatado, com poucas montanhas e mal repartidas. Quase todo o território se situa abaixo dos 400 metros de altitude, com orlas recentes de grandes areais sem escarpas ou com elevações pouco acima do nível do mar. O norte é antigo, da chamada zona geológica centro-ibérica, com uma história tectónica de difícil destrinça e onde predominam o granito, o xisto e o quartzo. Aqui ocorre naturalmente a flora que aprecia solos ácidos. Mas há excepções, como as formações de rochas ultrabásicas do nordeste ou os raros afloramentos de calcário no Marão.
Fomos à procura deles, com a grata lembrança da flora calcícola das serras de Aire e Candeeiros. Habituados a calcorrear o Maciço Calcário Estremenho à procura de orquídeas, deveríamos ser capazes de achar umas pedras brancas a destoar nos montes se o nevoeiro não nos viesse atrapalhar a tarefa. O destino era Campanhó, no miolo do Marão, lugar de várias pedreiras desactivadas e não longe de antigas explorações mineiras de estanho e volfrâmio. Para lá chegar, houve que enfrentar as estradas de mau piso que foram apoio destas actividades. O primeiro sinal de que estávamos perto foi dado pela abundância de Ceterach officinarum, um feto que gosta de fissuras nas rochas e muros velhos e que, sendo em geral indiferente à natureza do solo, mostra no nosso país uma preferência nítida por substratos calcários. Outra evidência surgiu logo depois com os inúmeros exemplares de Helleborus foetidus, planta também de terrenos calcários, comum precisamente nas serras de Aire e Candeeiros. Mas onde estariam os mármores rosa eivados de pérola ou o chão avermelhado como o da Fórnea? Demorámos alguns minutos a perceber que tínhamos chegado: aquelas pedras gigantescas com a textura homogénea do carvão, de cor cinza e toque macio, eram bolhas de calcário no meio do xisto.
Campanhó (Mondim de Basto)
A confirmação não se fez esperar: ali estavam, meio escondidos pelas silvas, vários tufos de Asplenium ruta-muraria, um feto escasso no sul da Europa, muito sensível à poluição amosférica e que, em Portugal, se concentra numa área restrita do centro-oeste calcário.
Asplenium ruta-muraria L.
No livro Distribuição de pteridófitos e gimnospérmicas em Portugal (1982), Franco e Rocha Afonso, a propósito deste feto, assinalam com bolinhas negras uns poucos lugares no Marão. Bolinhas que, na realidade, crescem para se transformarem em maciços calcários da mesma cor, a que voltaremos na época das orquídeas.
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Portugal é um país achatado, com poucas montanhas e mal repartidas. Quase todo o território se situa abaixo dos 400 metros de altitude, com orlas recentes de grandes areais sem escarpas ou com elevações pouco acima do nível do mar. O norte é antigo, da chamada zona geológica centro-ibérica, com uma história tectónica de difícil destrinça e onde predominam o granito, o xisto e o quartzo. Aqui ocorre naturalmente a flora que aprecia solos ácidos. Mas há excepções, como as formações de rochas ultrabásicas do nordeste ou os raros afloramentos de calcário no Marão.
Fomos à procura deles, com a grata lembrança da flora calcícola das serras de Aire e Candeeiros. Habituados a calcorrear o Maciço Calcário Estremenho à procura de orquídeas, deveríamos ser capazes de achar umas pedras brancas a destoar nos montes se o nevoeiro não nos viesse atrapalhar a tarefa. O destino era Campanhó, no miolo do Marão, lugar de várias pedreiras desactivadas e não longe de antigas explorações mineiras de estanho e volfrâmio. Para lá chegar, houve que enfrentar as estradas de mau piso que foram apoio destas actividades. O primeiro sinal de que estávamos perto foi dado pela abundância de Ceterach officinarum, um feto que gosta de fissuras nas rochas e muros velhos e que, sendo em geral indiferente à natureza do solo, mostra no nosso país uma preferência nítida por substratos calcários. Outra evidência surgiu logo depois com os inúmeros exemplares de Helleborus foetidus, planta também de terrenos calcários, comum precisamente nas serras de Aire e Candeeiros. Mas onde estariam os mármores rosa eivados de pérola ou o chão avermelhado como o da Fórnea? Demorámos alguns minutos a perceber que tínhamos chegado: aquelas pedras gigantescas com a textura homogénea do carvão, de cor cinza e toque macio, eram bolhas de calcário no meio do xisto.
Campanhó (Mondim de Basto)
A confirmação não se fez esperar: ali estavam, meio escondidos pelas silvas, vários tufos de Asplenium ruta-muraria, um feto escasso no sul da Europa, muito sensível à poluição amosférica e que, em Portugal, se concentra numa área restrita do centro-oeste calcário.
Asplenium ruta-muraria L.
No livro Distribuição de pteridófitos e gimnospérmicas em Portugal (1982), Franco e Rocha Afonso, a propósito deste feto, assinalam com bolinhas negras uns poucos lugares no Marão. Bolinhas que, na realidade, crescem para se transformarem em maciços calcários da mesma cor, a que voltaremos na época das orquídeas.