Dúvida Metódica: O dinheiro não traz a felicidade!

20-01-2012
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“Os filósofos antigos tiveram muito a dizer sobre a felicidade. Supunham que ‘a melhor vida’ e ‘a vida feliz’ eram a mesma coisa, e geralmente aceitavam que a felicidade consistia numa vida de razão e virtude. Epicuro (341-270 a. C.) recomendou uma vida simples, de modo a se evitarem sofrimentos e ansiedades. Os estóicos acrescentaram que um homem sábio não permitiria que a sua felicidade dependesse de coisas que estivessem fora do seu controlo, como a riqueza, a saúde, a boa aparência ou as opiniões dos outros. Não podemos controlar as circunstâncias externas, disseram, pelo que devemos ser indiferentes a essas coisas, aceitando-as como aparecem. Epitecto (c. 55-135 a. C.), um dos grandes professores estóicos, deu este conselho aos seus estudantes: ‘Não peçam que as coisas ocorram segundo a vossa vontade; façam com que a vossa vontade seja que as coisas ocorram como ocorrem de facto, e terão paz.’ Algumas destas ideias podem parecer questionáveis, mas uma parte significativa delas tem sido confirmada pela investigação psicológica moderna. Consideremos, por exemplo, a ideia de que a riqueza não traz felicidade. Dado que a maior parte das pessoas quer ser rica, poderíamos pensar que há alguma correlação entre a riqueza e a felicidade. Mas não há. Quando Ronald Inglehardt, cientista político da Universidade de Michigan, comparou os níveis de riqueza de países diferentes com aquilo que as pessoas desses países dizem sobre a sua satisfação com a sua vida, descobriu que as pessoas dos países mais ricos não são mais felizes do que as dos países mais pobres. Por vezes acontece o oposto: os alemães ocidentais têm o dobro da riqueza dos irlandeses, mas os irlandeses são mais felizes. Dentro de países específicos, encontrou a mesma ausência de correlação: as pessoas que têm mais dinheiro não são mais felizes que as outras. Portanto, sermos ricos não importa. As pessoas afectadas pela pobreza tendem a ser menos felizes do que aquelas que possuem o suficiente para viver; mas, para aqueles que estão acima da linha de pobreza, o dinheiro adicional faz pouca diferença. O psicólogo David Myers observa que ‘quando se ultrapassa a pobreza, o crescimento económico suplementar não melhora significativamente o ânimo dos seres humanos’. Os estudos sobre os vencedores de lotarias confirmam isto de forma notável. Como é óbvio, os vencedores de lotarias ficam extremamente felizes quando sabem das boas notícias e a euforia tende a durar alguns dias. Mas, passado pouco tempo, regressam ao seu nível normal de felicidade. No essencial, as pessoas amuadas voltam a ficar amuadas. Podem ser capazes de deixar o emprego e de comprar muitas coisas, mas, no que respeita ao seu nível de felicidade, a riqueza recentemente adquirida não faz diferença. (…) Então, o que tornará as pessoas felizes? Se não é a riqueza (…) o que será?” James Rachels, Problemas da Filosofia, tradução de Pedro Galvão, Gradiva, Lisboa, 2009, pp. 286-288.


“Os filósofos antigos tiveram muito a dizer sobre a felicidade. Supunham que ‘a melhor vida’ e ‘a vida feliz’ eram a mesma coisa, e geralmente aceitavam que a felicidade consistia numa vida de razão e virtude. Epicuro (341-270 a. C.) recomendou uma vida simples, de modo a se evitarem sofrimentos e ansiedades. Os estóicos acrescentaram que um homem sábio não permitiria que a sua felicidade dependesse de coisas que estivessem fora do seu controlo, como a riqueza, a saúde, a boa aparência ou as opiniões dos outros. Não podemos controlar as circunstâncias externas, disseram, pelo que devemos ser indiferentes a essas coisas, aceitando-as como aparecem. Epitecto (c. 55-135 a. C.), um dos grandes professores estóicos, deu este conselho aos seus estudantes: ‘Não peçam que as coisas ocorram segundo a vossa vontade; façam com que a vossa vontade seja que as coisas ocorram como ocorrem de facto, e terão paz.’ Algumas destas ideias podem parecer questionáveis, mas uma parte significativa delas tem sido confirmada pela investigação psicológica moderna. Consideremos, por exemplo, a ideia de que a riqueza não traz felicidade. Dado que a maior parte das pessoas quer ser rica, poderíamos pensar que há alguma correlação entre a riqueza e a felicidade. Mas não há. Quando Ronald Inglehardt, cientista político da Universidade de Michigan, comparou os níveis de riqueza de países diferentes com aquilo que as pessoas desses países dizem sobre a sua satisfação com a sua vida, descobriu que as pessoas dos países mais ricos não são mais felizes do que as dos países mais pobres. Por vezes acontece o oposto: os alemães ocidentais têm o dobro da riqueza dos irlandeses, mas os irlandeses são mais felizes. Dentro de países específicos, encontrou a mesma ausência de correlação: as pessoas que têm mais dinheiro não são mais felizes que as outras. Portanto, sermos ricos não importa. As pessoas afectadas pela pobreza tendem a ser menos felizes do que aquelas que possuem o suficiente para viver; mas, para aqueles que estão acima da linha de pobreza, o dinheiro adicional faz pouca diferença. O psicólogo David Myers observa que ‘quando se ultrapassa a pobreza, o crescimento económico suplementar não melhora significativamente o ânimo dos seres humanos’. Os estudos sobre os vencedores de lotarias confirmam isto de forma notável. Como é óbvio, os vencedores de lotarias ficam extremamente felizes quando sabem das boas notícias e a euforia tende a durar alguns dias. Mas, passado pouco tempo, regressam ao seu nível normal de felicidade. No essencial, as pessoas amuadas voltam a ficar amuadas. Podem ser capazes de deixar o emprego e de comprar muitas coisas, mas, no que respeita ao seu nível de felicidade, a riqueza recentemente adquirida não faz diferença. (…) Então, o que tornará as pessoas felizes? Se não é a riqueza (…) o que será?” James Rachels, Problemas da Filosofia, tradução de Pedro Galvão, Gradiva, Lisboa, 2009, pp. 286-288.

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