Devaneios Desintéricos: pluralismo legal: limite ao Multiculturalismo?

21-01-2012
marcar artigo


O programa Law in Action, transmitido todas as terças feiras no canal 4 da Rádio BBC, abordou na sua última emissão uma questão que tem entretido tantos académicos do Direito por esta Europa fora. Trata-se do problema do "pluralismo legal" que, grosso modo, se traduz na multiplicação de fenómenos de aplicação de outros feixes normativos que não aqueles de origem estritamente estatal.Podemos dizer, de um ponto de vista cientificamente algo inexacto mas suficiente para o fim que visamos, que as teses mais recentes nas Academias Jurídicas tendem a reconhecer a preponderância de uma ideia Jusnaturalista em detrimento da Jusracionalista, defendendo que, em Sociedade, o Direito é muito mais que apenas aquilo que é uma "excreção estatal".O debate, algo académico, tem girado à volta de argumentos relacionados com o carácter impositivo de outras ordens de normas como a Moral ou a Religião. Os Jusnaturalistas tendem a ver nestas "Direito autêntico" uma vez que os destinatários da norma as sentem como que dotadas de convicção de obrigatoriedade. Os Jusracionalistas, em franca minoria e academicamente isolados, defendem-se dizendo que nem a Moral nem a Religião são verdadeiro Direito porque, entre outras coisas, não são dotados de coercibilidade como só as normas de um Estado são.O debate tem tido, contrariamente ao que se seria esperado, um curioso reacendimento. Isto porque no Reino Unido tem sido observado um interessante fenómeno na sua larga comunidade de imigrantes: as comunidades começam a resolver os seus problemas, não através dos tribunais seculares instituídos pelo Estado, mas sim pelas cúrias das respectivas religiões.Isto faz com que, muito simplesmente, se aderirmos por completo à tal tese dominante nas faculdades de Direito - a Jusnaturalista- tenhamos que reconhecer que, em pleno Estado Britânico, podem e devem valer a Lei Sharia para os Islâmicos, a Lei Judaica para os judeus, etc etc...Dir-me-ão os mais cautelosos que, de certo modo, tal até será mais de acordo com o multiculturalismo das sociedades contemporâneas e, mesmo democraticamente salutar, se observados determinados pressupostos. Entre estes, por exemplo, a manutenção do exclusividade da tutela penal no controlo do estado, deixando aos outros ordenamentos apenas as questões de índole civilistica, tradicionalmente mais abertas a pactos de foro e direito aplicável.Mas, mesmo neste caso, sabemos que a tutela da parte mais fraca, e o assegurar de uma igualdade processual entre as partes (algo normalmente tão caro aos ordenamentos estatais), pode ser algo bem difícil de obter no quadro dos ordenamentos religiosos. Veja-se, entre tantas outras situações, a (des)consideração da mulher no quadro da Lei Sharia.Até que ponto deverá um Estado transigir na não aplicação da sua lei no seu próprio território é uma questão bem mais complexa do que parece. Certo é que este Multiculturalismo evidencia as suas brechas. É necessário colmatá-las para que os seus inimigos não retirem daqui razões para o seu poder.Na Ilustração: "O Triunfo da Justiça" de Hans von Aachen.


O programa Law in Action, transmitido todas as terças feiras no canal 4 da Rádio BBC, abordou na sua última emissão uma questão que tem entretido tantos académicos do Direito por esta Europa fora. Trata-se do problema do "pluralismo legal" que, grosso modo, se traduz na multiplicação de fenómenos de aplicação de outros feixes normativos que não aqueles de origem estritamente estatal.Podemos dizer, de um ponto de vista cientificamente algo inexacto mas suficiente para o fim que visamos, que as teses mais recentes nas Academias Jurídicas tendem a reconhecer a preponderância de uma ideia Jusnaturalista em detrimento da Jusracionalista, defendendo que, em Sociedade, o Direito é muito mais que apenas aquilo que é uma "excreção estatal".O debate, algo académico, tem girado à volta de argumentos relacionados com o carácter impositivo de outras ordens de normas como a Moral ou a Religião. Os Jusnaturalistas tendem a ver nestas "Direito autêntico" uma vez que os destinatários da norma as sentem como que dotadas de convicção de obrigatoriedade. Os Jusracionalistas, em franca minoria e academicamente isolados, defendem-se dizendo que nem a Moral nem a Religião são verdadeiro Direito porque, entre outras coisas, não são dotados de coercibilidade como só as normas de um Estado são.O debate tem tido, contrariamente ao que se seria esperado, um curioso reacendimento. Isto porque no Reino Unido tem sido observado um interessante fenómeno na sua larga comunidade de imigrantes: as comunidades começam a resolver os seus problemas, não através dos tribunais seculares instituídos pelo Estado, mas sim pelas cúrias das respectivas religiões.Isto faz com que, muito simplesmente, se aderirmos por completo à tal tese dominante nas faculdades de Direito - a Jusnaturalista- tenhamos que reconhecer que, em pleno Estado Britânico, podem e devem valer a Lei Sharia para os Islâmicos, a Lei Judaica para os judeus, etc etc...Dir-me-ão os mais cautelosos que, de certo modo, tal até será mais de acordo com o multiculturalismo das sociedades contemporâneas e, mesmo democraticamente salutar, se observados determinados pressupostos. Entre estes, por exemplo, a manutenção do exclusividade da tutela penal no controlo do estado, deixando aos outros ordenamentos apenas as questões de índole civilistica, tradicionalmente mais abertas a pactos de foro e direito aplicável.Mas, mesmo neste caso, sabemos que a tutela da parte mais fraca, e o assegurar de uma igualdade processual entre as partes (algo normalmente tão caro aos ordenamentos estatais), pode ser algo bem difícil de obter no quadro dos ordenamentos religiosos. Veja-se, entre tantas outras situações, a (des)consideração da mulher no quadro da Lei Sharia.Até que ponto deverá um Estado transigir na não aplicação da sua lei no seu próprio território é uma questão bem mais complexa do que parece. Certo é que este Multiculturalismo evidencia as suas brechas. É necessário colmatá-las para que os seus inimigos não retirem daqui razões para o seu poder.Na Ilustração: "O Triunfo da Justiça" de Hans von Aachen.

marcar artigo