O fenómeno está um pouco por todo o lado: O Estado de Ontário, no Canadá, pretendeu, através de uma moção apresentada à sua Assembleia Legislativa em Toronto, levar a cabo uma abertura do sistema, tendente a permitir a aplicação da lei Sharia na resolução de questões de Direito da Família, na esteira, aliás, do que aquele Executivo já havia feito em 1991 quando permitiu decisões judiciais baseadas em tribunais católicos e judaicos; no Reino Unido, por outro lado, as comunidades começam a resolver os seus problemas, não através dos tribunais seculares instituídos pelo Estado, mas sim pelas cúrias das respectivas religiões, suscitando um interessante debate do fenómeno do pluralismo legal na sociedade britânica.Toda esta temática, que muito deve a uma certa noção de multiculturalismo, foi reacendida pela recente decisão da juiz do tribunal de Família de Frankfurt, na Alemanha, na qual se nega a pretensão de divórcio a uma cidadã alemã de origem marroquina, vítima de maus tratos conjugais, com base do versículo 34 da quarta surata do Alcorão."Se temes que a tua mulher se rebele, então ameaça-a, rejeita-a no teu leito conjugal e bate-lhe". Embora sujeita a interpretações variadíssimas, como aliás quase todos os preceitos normativos, não deixa de ser arrepiante que os sistemas normativos da "cabeceira civilizacional" que é a Europa tenham sido trabalhados ao ponto de permitir que a aplicação da lei se tenha tornado uma escolha aleatória e acrítica de um cardápio tendente a reinstaurar uma sociedade de tribos.É certo que do adquirido civilizacional europeu faz parte a aceitação da diferença cultural, da liberdade de conformação social e cultural assim como de auto regulação social. Mas a Europa de hoje não pode, nem deve, transigir na defesa de um dado mínimo ético-político, imanente e na raiz dessa cultura de tolerância e liberdade democrática, mas que impondo-se sobre todos os obscurantismos, tornou este continente (a suposta) guarda avançada dos Direitos Humanos.Como outrora afirmámos, saber até que ponto deverá um Estado transigir na não aplicação da sua lei no seu próprio território é uma questão bem mais complexa do que parece. Certo é que este multiculturalismo evidencia as suas brechas. É necessário colmatá-las para que os seus inimigos (todos os extremismos que espreitam e almejam o descalabro do sistema) não retirem daqui razões para o seu poder.Também sobre este tema:o multiculturalismo na práticaainda o multiculturalismoD Quixote tinha moínhos O multicultarismo de todos Dois Tribunais - Editorial do DN
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O fenómeno está um pouco por todo o lado: O Estado de Ontário, no Canadá, pretendeu, através de uma moção apresentada à sua Assembleia Legislativa em Toronto, levar a cabo uma abertura do sistema, tendente a permitir a aplicação da lei Sharia na resolução de questões de Direito da Família, na esteira, aliás, do que aquele Executivo já havia feito em 1991 quando permitiu decisões judiciais baseadas em tribunais católicos e judaicos; no Reino Unido, por outro lado, as comunidades começam a resolver os seus problemas, não através dos tribunais seculares instituídos pelo Estado, mas sim pelas cúrias das respectivas religiões, suscitando um interessante debate do fenómeno do pluralismo legal na sociedade britânica.Toda esta temática, que muito deve a uma certa noção de multiculturalismo, foi reacendida pela recente decisão da juiz do tribunal de Família de Frankfurt, na Alemanha, na qual se nega a pretensão de divórcio a uma cidadã alemã de origem marroquina, vítima de maus tratos conjugais, com base do versículo 34 da quarta surata do Alcorão."Se temes que a tua mulher se rebele, então ameaça-a, rejeita-a no teu leito conjugal e bate-lhe". Embora sujeita a interpretações variadíssimas, como aliás quase todos os preceitos normativos, não deixa de ser arrepiante que os sistemas normativos da "cabeceira civilizacional" que é a Europa tenham sido trabalhados ao ponto de permitir que a aplicação da lei se tenha tornado uma escolha aleatória e acrítica de um cardápio tendente a reinstaurar uma sociedade de tribos.É certo que do adquirido civilizacional europeu faz parte a aceitação da diferença cultural, da liberdade de conformação social e cultural assim como de auto regulação social. Mas a Europa de hoje não pode, nem deve, transigir na defesa de um dado mínimo ético-político, imanente e na raiz dessa cultura de tolerância e liberdade democrática, mas que impondo-se sobre todos os obscurantismos, tornou este continente (a suposta) guarda avançada dos Direitos Humanos.Como outrora afirmámos, saber até que ponto deverá um Estado transigir na não aplicação da sua lei no seu próprio território é uma questão bem mais complexa do que parece. Certo é que este multiculturalismo evidencia as suas brechas. É necessário colmatá-las para que os seus inimigos (todos os extremismos que espreitam e almejam o descalabro do sistema) não retirem daqui razões para o seu poder.Também sobre este tema:o multiculturalismo na práticaainda o multiculturalismoD Quixote tinha moínhos O multicultarismo de todos Dois Tribunais - Editorial do DN