A imprensa tunisina de hoje - de que a capa aqui publicada do Essahafa é exemplo - publicou, com o destaque que as ditaduras impõem, a mensagem do Presidente Zine El Abidine Ben Ali ao povo tunisino sobre os eventos de 8 e 9 deAbril de 1938 que possibilitaram a luta pela libertação da Tunísia da «opressão colonialista». E, tendo visto mais este exemplo de propaganda de estado por parte de uma ditadura, apeteceu-me escrever sobre este pequeno estado mediterrânico. Mas que Tunísia é esta que já atrai tantos portugueses para as estâncias de Djerba?? Que mutações sofreu este (relativamente pouco falado) país desde da sua eufórica independência, a 20 de Março de 1956? Habib Bourguiba e Zine El Abidine Ben Ali são as figuras chave daquilo que o regime de Túnis é hoje. O primeiro encetou a sua intervenção política no oposicionismo ao colonialismo francês nas colunas de jornais como La voix du tunisien ou L'action tunisienne. Eram os tempos áureos da luta de classes e dos sonhos por si trazidos, do romantismo de uma dada ideia de nacionalidade tunisina e de um pan arabismo socialista "de Rabat a Teerão". Em 1925, Bourguiba fundou o seu partido, o Neo Destour, que viria a ficar para a História tunisina como o veículo político para a independência e libertação do povo tunisino. Depois de ser prisioneiro político do colonialismo francês e de se ter exilado no Cairo, Habib Bourguiba consegue ser primeiro ministro em 1956 e presidente em 1957. Em 1964, dando início a um longo período de ditadura, seu partido torna-se o único legal. Não obstante, promoveu um regime relativamente ocidentalista, marcado pelo diálogo com os Estados Unidos e com Israel. O secularismo que impôs fê-lo ser considerado pelo editoriais de vários jornais europeus da altura como o Kemal Atatürk da África Islâmica. As mulheres gozavam de um estatuto social relativamente pouco comum no universo político islâmico. A TUNISAIR, por exemplo, foi das primeiras companhias aéreas de um estado islâmico a ter um mulher aos comandos de uma aeronave. Contudo, a invasão do sul do país pela Líbia, em 1980, embora repelida de modo tendencialmente célere, suscitou nas ruas de Tunis e Sousse as mais variadas greves e manifestações populares. Eram os anos 80 da contestação e repressão sanguinária de Bourguiba, que marcaram o início da sua decadência. Recorde-se, para tanto, a sangrenta repressão dos «motins do pão» em meados de Dezembro de 1983. Foi um Habib Bourguiba enfraquecido aquele que, em Outubro de 1987, cometeu o erro político de nomear para Primeiro Ministro o General Zine El Abidine Ben Ali porquanto a intriga palaciana tanta vezes vista na História da Humanidade não tardaria. Logo em Novembro desse mesmo ano, o calculista general conseguiu obter a declaração oficial de incapacidade mental do presidente para governar fazendo-se a si mesmo valer do posto presidencial. E, se no princípio dos anos 90 encetou reformas para "americano e europeu" verem, não tardou a demonstrar a mais pesada mão de ferro na perseguição política de quem outrora o havia apoiado. Perseguições, torturas, exílios, controlo de imprensa...toda a panóplia típica de qualquer ditadura. Em 1999, promoveu eleições "livres" em que obteve uma votação oficial de 99,6%. Os dois candidatos que então o desafiaram foram, mais tarde, detidos, processados e condenados a penas de prisão. Em 2004, em novo "acto eleitoral", obteve 94% de votos favoráveis. As organizações humanitárias, essas, não se cansam de denunciar as matanças e perseguições políticas de Ben Ali e os silêncios coadjuvantes de Washington, Bruxelas ou do Quai d'Orsay. Agora que os receios do Islamismo extremista se adensam qualquer moderado, mesmo que totalitário e sanguinário, é "nosso" aliado. Seria bom que tivéssemos isto em mente quando, este Verão, muito de nós correrem à Halcón Viagens para reservar um pacote "tudo incluído" para Djerba.MSD
Categorias
Entidades
A imprensa tunisina de hoje - de que a capa aqui publicada do Essahafa é exemplo - publicou, com o destaque que as ditaduras impõem, a mensagem do Presidente Zine El Abidine Ben Ali ao povo tunisino sobre os eventos de 8 e 9 deAbril de 1938 que possibilitaram a luta pela libertação da Tunísia da «opressão colonialista». E, tendo visto mais este exemplo de propaganda de estado por parte de uma ditadura, apeteceu-me escrever sobre este pequeno estado mediterrânico. Mas que Tunísia é esta que já atrai tantos portugueses para as estâncias de Djerba?? Que mutações sofreu este (relativamente pouco falado) país desde da sua eufórica independência, a 20 de Março de 1956? Habib Bourguiba e Zine El Abidine Ben Ali são as figuras chave daquilo que o regime de Túnis é hoje. O primeiro encetou a sua intervenção política no oposicionismo ao colonialismo francês nas colunas de jornais como La voix du tunisien ou L'action tunisienne. Eram os tempos áureos da luta de classes e dos sonhos por si trazidos, do romantismo de uma dada ideia de nacionalidade tunisina e de um pan arabismo socialista "de Rabat a Teerão". Em 1925, Bourguiba fundou o seu partido, o Neo Destour, que viria a ficar para a História tunisina como o veículo político para a independência e libertação do povo tunisino. Depois de ser prisioneiro político do colonialismo francês e de se ter exilado no Cairo, Habib Bourguiba consegue ser primeiro ministro em 1956 e presidente em 1957. Em 1964, dando início a um longo período de ditadura, seu partido torna-se o único legal. Não obstante, promoveu um regime relativamente ocidentalista, marcado pelo diálogo com os Estados Unidos e com Israel. O secularismo que impôs fê-lo ser considerado pelo editoriais de vários jornais europeus da altura como o Kemal Atatürk da África Islâmica. As mulheres gozavam de um estatuto social relativamente pouco comum no universo político islâmico. A TUNISAIR, por exemplo, foi das primeiras companhias aéreas de um estado islâmico a ter um mulher aos comandos de uma aeronave. Contudo, a invasão do sul do país pela Líbia, em 1980, embora repelida de modo tendencialmente célere, suscitou nas ruas de Tunis e Sousse as mais variadas greves e manifestações populares. Eram os anos 80 da contestação e repressão sanguinária de Bourguiba, que marcaram o início da sua decadência. Recorde-se, para tanto, a sangrenta repressão dos «motins do pão» em meados de Dezembro de 1983. Foi um Habib Bourguiba enfraquecido aquele que, em Outubro de 1987, cometeu o erro político de nomear para Primeiro Ministro o General Zine El Abidine Ben Ali porquanto a intriga palaciana tanta vezes vista na História da Humanidade não tardaria. Logo em Novembro desse mesmo ano, o calculista general conseguiu obter a declaração oficial de incapacidade mental do presidente para governar fazendo-se a si mesmo valer do posto presidencial. E, se no princípio dos anos 90 encetou reformas para "americano e europeu" verem, não tardou a demonstrar a mais pesada mão de ferro na perseguição política de quem outrora o havia apoiado. Perseguições, torturas, exílios, controlo de imprensa...toda a panóplia típica de qualquer ditadura. Em 1999, promoveu eleições "livres" em que obteve uma votação oficial de 99,6%. Os dois candidatos que então o desafiaram foram, mais tarde, detidos, processados e condenados a penas de prisão. Em 2004, em novo "acto eleitoral", obteve 94% de votos favoráveis. As organizações humanitárias, essas, não se cansam de denunciar as matanças e perseguições políticas de Ben Ali e os silêncios coadjuvantes de Washington, Bruxelas ou do Quai d'Orsay. Agora que os receios do Islamismo extremista se adensam qualquer moderado, mesmo que totalitário e sanguinário, é "nosso" aliado. Seria bom que tivéssemos isto em mente quando, este Verão, muito de nós correrem à Halcón Viagens para reservar um pacote "tudo incluído" para Djerba.MSD