Devaneios Desintéricos: seringas

24-01-2012
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O caro 'vizinho' Pedro Morgado mostra-se, à semelhança de muita blogoesfera, indignado com a recente decisão governamental de disponibilizar seringas nas prisões, considerando que o "mundo está ao contrário" quando o Estado não consegue evitar que as prisões sejam locais livres de drogas e seringas. Esta ideia, comummente veiculada e defendida, de que o Estado se deve guiar por rígidos critérios de um qualquer xadrez valorativo avesso à realidade na solução de uma determinada questão social arrasta consigo a concomitante irresponsabilidade de potenciar e aumentar a gravidade de problemáticas conexas que são, não raras vezes, de uma maior relevância e urgência social do que a própria razão da intervenção-base. É a lógica do Estado moralista em detrimento do providência. É o autismo impondo-se sobre a Razoabilidade.No caso presente, subjaz ao argumentário do caro Morgado a desconsideração objectiva pelo consumo de droga a cujo combate considera valorativamente mais premente do que a cautela devida à Saúde Pública. Trata-se, pelos vistos, de um embate entre prioridades políticas numa, arrisco a arrogância, confusão valorativa. A possibilidade de programas de troca de seringas em meio prisional foi aberta com a Lei n.º 170/99, que descriminalizou o consumo de drogas. Em teoria, e na senda da lógica democrática de paralelo entre Direito Penal e comportamentos socialmente desadequados, quererá isto dizer que a sociedade não vê o consumo de drogas como um comportamento de tal modo desadequado que justifique a prevenção penal por via da imputação de um crime. Caminhou-se rumo à compreensão do fenómeno da Toxicodependência, não tanto como algo estritamente afecto aos critérios da Balança de Témis, mas antes sim considerando-o uma questão de Saúde Pública.Assim, parece líquido e razoável concluir que a réstea de desconsideração penal, e concomitantemente, o núcleo máximo de punição social, se encontra no tráfico de estupefacientes, que em nada sai menorizado por esta medida, e não no seu consumo.Ora, aqui chegados, dever-se-á enfatizar que o facto de o Estado não conseguir evitar que substâncias toxicológicas entrem nos estabelecimentos prisionais não pode, nem deve, obstar a que a prioridade de acautelamento da Saúde Pública seja devidamente seguida. São esferas de actuação distintas que não devem ser confundidas. E quando 35% dos reclusos se encontra infectado com hepatites e 9,1% com o VIH/SIDA a questão é, acima de tudo, de saúde pública. Os consumidores condenados a uma pena não são condenados a uma doença.


O caro 'vizinho' Pedro Morgado mostra-se, à semelhança de muita blogoesfera, indignado com a recente decisão governamental de disponibilizar seringas nas prisões, considerando que o "mundo está ao contrário" quando o Estado não consegue evitar que as prisões sejam locais livres de drogas e seringas. Esta ideia, comummente veiculada e defendida, de que o Estado se deve guiar por rígidos critérios de um qualquer xadrez valorativo avesso à realidade na solução de uma determinada questão social arrasta consigo a concomitante irresponsabilidade de potenciar e aumentar a gravidade de problemáticas conexas que são, não raras vezes, de uma maior relevância e urgência social do que a própria razão da intervenção-base. É a lógica do Estado moralista em detrimento do providência. É o autismo impondo-se sobre a Razoabilidade.No caso presente, subjaz ao argumentário do caro Morgado a desconsideração objectiva pelo consumo de droga a cujo combate considera valorativamente mais premente do que a cautela devida à Saúde Pública. Trata-se, pelos vistos, de um embate entre prioridades políticas numa, arrisco a arrogância, confusão valorativa. A possibilidade de programas de troca de seringas em meio prisional foi aberta com a Lei n.º 170/99, que descriminalizou o consumo de drogas. Em teoria, e na senda da lógica democrática de paralelo entre Direito Penal e comportamentos socialmente desadequados, quererá isto dizer que a sociedade não vê o consumo de drogas como um comportamento de tal modo desadequado que justifique a prevenção penal por via da imputação de um crime. Caminhou-se rumo à compreensão do fenómeno da Toxicodependência, não tanto como algo estritamente afecto aos critérios da Balança de Témis, mas antes sim considerando-o uma questão de Saúde Pública.Assim, parece líquido e razoável concluir que a réstea de desconsideração penal, e concomitantemente, o núcleo máximo de punição social, se encontra no tráfico de estupefacientes, que em nada sai menorizado por esta medida, e não no seu consumo.Ora, aqui chegados, dever-se-á enfatizar que o facto de o Estado não conseguir evitar que substâncias toxicológicas entrem nos estabelecimentos prisionais não pode, nem deve, obstar a que a prioridade de acautelamento da Saúde Pública seja devidamente seguida. São esferas de actuação distintas que não devem ser confundidas. E quando 35% dos reclusos se encontra infectado com hepatites e 9,1% com o VIH/SIDA a questão é, acima de tudo, de saúde pública. Os consumidores condenados a uma pena não são condenados a uma doença.

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