Devaneios Desintéricos: a aliança anti-Razão

21-01-2012
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As declarações de Rowan Williams, Arcebispo de Cantuária, na sua Conferência "A lei civil e religiosa em Inglaterra - a perspectiva religiosa" são lamentáveis. Senão repare-se:"Eu não acredito que esta desconstrução possa ser feita sem alguma análise da verdadeira natureza da Lei. É sempre fácil procurar refúgio em alguma forma de Positivismo; mais, aquilo que eu chamo de Universalismo Legal, quando divorciado de um sério substrato teórico (e, defenderia mesmo, religioso) pode tornar-se num positivismo tão estéril quanto outro qualquer."Estas afirmações, na linha da temática que há um ano e meio abordámos no Devaneios, são, tão simplesmente, perigosas.E não o são apenas porque, explicitamente, Rowan Williams admitiu, ainda que teoricamente, a vigência da Lei Sharia no Reino Unido.As suas palavras são muito mais que a expressão de uma conceptualização em sede de uma qualquer conferência académicaTravestidas de um apelo à sustentabilidade teórica da Lei, faz-se um ataque às "derivas" do Universalismo Legal como se o mesmo representasse por si a clivagem completa entre, por um lado, aquilo que mais natural há na sociedade - as suas formas de auto regulação - e, por outro lado, as formas algo estatizantes e positivadas de regulação social, consideradas frias e desfeitas de qualquer materialiade. Em suma: estéreis porque universais.Posto assim, o discurso teórico poderá colher os frutos da melhor retórica. Repare-se, por exemplo, como a costumeira e auto intitulada blogoesfera liberal rapidamente se apressou a defender e "compreender" Rowan Williams. Afinal de contas, é da "liberdade" de auto regulação das pessoas que falamos. De pluralismo legal, ideia tão simpática a um certo (e, arriscaria, falso) multiculturalismo inconsequente.Pois.Mas disse ainda o polémico Arcebispo:“Uma aproximação à Lei que simplesmente dissesse - A lei é igual para todos - seria, creio eu, uma coisa perigosa"
Evidentemente que ninguém, de boa fé, acredita que Rowan Williams queira ver mulheres apedrejadas em solo britânico. Quem assim o veja perde-se no imediatismo demagógico.O que se deve reconhecer nas palavras do Arcebispo da Cantuária é, em bom rigor, assaz sintomático da nova trajectória das sociedades contemporâneas. Implícito nas suas palavras está a formação de uma silenciosa mas poderosa Aliança Anti-Razão, numa luta contra a Modernidade que temos - aquela que nos trouxe o Iluminismo e o advento da Razão. A ideia de aceitar diferentes ordenamentos normativos dentro do Estado é pretensamente liberal. E a sua aparente sedução assenta no escamotear e no olvidar de um intorneável facto democrático: se é verdade, por um lado, que se deve reconhecer um âmbito próprio de regulação aos individuos, não é menos verdade que Direitos e Liberdades só existem quando o indivíduo está em em relação imediata com o poder.E, assim sendo, só numa sociedade de individuos que beneficiam de um estatuto comum, não separados em razão de grupo ou condições culturais, se pode assegurar a livre vigência dos Direitos Fundamentais que a Lei (positivada) insiste (e muitíssimo bem) em considerar universais.PS: a não perder o excelente "O Estado de Direito e a Religião" do Igor, no "reino dos Fins".


As declarações de Rowan Williams, Arcebispo de Cantuária, na sua Conferência "A lei civil e religiosa em Inglaterra - a perspectiva religiosa" são lamentáveis. Senão repare-se:"Eu não acredito que esta desconstrução possa ser feita sem alguma análise da verdadeira natureza da Lei. É sempre fácil procurar refúgio em alguma forma de Positivismo; mais, aquilo que eu chamo de Universalismo Legal, quando divorciado de um sério substrato teórico (e, defenderia mesmo, religioso) pode tornar-se num positivismo tão estéril quanto outro qualquer."Estas afirmações, na linha da temática que há um ano e meio abordámos no Devaneios, são, tão simplesmente, perigosas.E não o são apenas porque, explicitamente, Rowan Williams admitiu, ainda que teoricamente, a vigência da Lei Sharia no Reino Unido.As suas palavras são muito mais que a expressão de uma conceptualização em sede de uma qualquer conferência académicaTravestidas de um apelo à sustentabilidade teórica da Lei, faz-se um ataque às "derivas" do Universalismo Legal como se o mesmo representasse por si a clivagem completa entre, por um lado, aquilo que mais natural há na sociedade - as suas formas de auto regulação - e, por outro lado, as formas algo estatizantes e positivadas de regulação social, consideradas frias e desfeitas de qualquer materialiade. Em suma: estéreis porque universais.Posto assim, o discurso teórico poderá colher os frutos da melhor retórica. Repare-se, por exemplo, como a costumeira e auto intitulada blogoesfera liberal rapidamente se apressou a defender e "compreender" Rowan Williams. Afinal de contas, é da "liberdade" de auto regulação das pessoas que falamos. De pluralismo legal, ideia tão simpática a um certo (e, arriscaria, falso) multiculturalismo inconsequente.Pois.Mas disse ainda o polémico Arcebispo:“Uma aproximação à Lei que simplesmente dissesse - A lei é igual para todos - seria, creio eu, uma coisa perigosa"
Evidentemente que ninguém, de boa fé, acredita que Rowan Williams queira ver mulheres apedrejadas em solo britânico. Quem assim o veja perde-se no imediatismo demagógico.O que se deve reconhecer nas palavras do Arcebispo da Cantuária é, em bom rigor, assaz sintomático da nova trajectória das sociedades contemporâneas. Implícito nas suas palavras está a formação de uma silenciosa mas poderosa Aliança Anti-Razão, numa luta contra a Modernidade que temos - aquela que nos trouxe o Iluminismo e o advento da Razão. A ideia de aceitar diferentes ordenamentos normativos dentro do Estado é pretensamente liberal. E a sua aparente sedução assenta no escamotear e no olvidar de um intorneável facto democrático: se é verdade, por um lado, que se deve reconhecer um âmbito próprio de regulação aos individuos, não é menos verdade que Direitos e Liberdades só existem quando o indivíduo está em em relação imediata com o poder.E, assim sendo, só numa sociedade de individuos que beneficiam de um estatuto comum, não separados em razão de grupo ou condições culturais, se pode assegurar a livre vigência dos Direitos Fundamentais que a Lei (positivada) insiste (e muitíssimo bem) em considerar universais.PS: a não perder o excelente "O Estado de Direito e a Religião" do Igor, no "reino dos Fins".

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