In Expresso, 03/12/2011
Acredito que a natureza do desempenho político dos atuais líderes europeus, incluindo os recentemente afastados do poder, tornará indispensável, a breve prazo, uma extensa e aprofundada abordagem psicobiográfica dos entrecruzamentos entre as suas vidas e as suas carreiras políticas, como forma de se obter algum enquadramento explicativo para o papel que as subjetividades, as personalidades e as interioridades psíquicas individuais podem estar a desempenhar nos embotamentos, nas impotências, nas indecisões, nas imprevidências, nas inseguranças e, pior, na aceitação normativa e inquestionada de mandos e concomitantes obediências.
Não sendo propósito deste post abalançar-se pela via de tão exigente empreendimento, confino-me a um fugaz e ainda exíguo entremostrar, quer dos traços psicobiográficos para que a parangona da notícia do Expresso, em cima, remete, quer das implicações para o nosso futuro coletivo que advirão dos mesmos.
Mercê de processos que as dinâmicas de grupo e a psicologia social têm estudado abundantemente, como a mente de grupo (group think) e a polarização, torna-se expectável que a inteligência coletiva, especificamente a que tem emergido nas instituições europeias, fique muito aquém da média das inteligências individuais, o que explica uma parte da paralisia atual.
Se a esta contingência acrescentarmos o enfoque da psicologia cultural na propensão imperial que atravessa a mentalidade alemã e no flagrante contraste entre o protestantismo (o castigo, a expiação e a afirmação pessoal) e o catolicismo (as virtudes da submissão, da obediência e da aceitação do empobrecimento - as bem-aventuranças consumam-se no reino dos céus), então, temos reunidas as ferramentas teóricas propiciadoras da compreensão, tanto da emergência de uma chancelaria alemã autoritária e castigadora, ainda que, no passado recente, negligenciadora para proveito próprio, como de um governo português obediente.
Como se isto não bastasse, tivemos a negligência, também alemã, no exercício da autoridade tendente a impor a disciplina orçamental (ameaçou-se com penalizações no passado, mas nunca se concretizaram verdadeiramente, porque o despesismo dos países do sul servia os interesses da banca e da indústria alemãs), bem como nas mensagens contraditórias que foram sendo dadas a países como Portugal e a Grécia, no sentido de adquirirem os serviços, produtos e empréstimos germânicos, fomentando ou tolerando, desta forma, os seus endividamentos.
O problema de tudo isto é que, à semelhança do que acontece com as relações interpessoais e familiares, pode redundar daqui, para futuro, uma dinâmica patológica de abuso continuado por parte da mãe negligente, que se aproveita da submissão, da insegurança e da perda de assertividade e autoestima do filho obediente.
A posição de quem se predispõe a levar açoites germânicos, vergado, camisola repuxada e calças descidas, parecendo exibir a prontidão das nádegas, não é recomendável para ninguém, quanto mais para um governo ou um estado soberano.
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In Expresso, 03/12/2011
Acredito que a natureza do desempenho político dos atuais líderes europeus, incluindo os recentemente afastados do poder, tornará indispensável, a breve prazo, uma extensa e aprofundada abordagem psicobiográfica dos entrecruzamentos entre as suas vidas e as suas carreiras políticas, como forma de se obter algum enquadramento explicativo para o papel que as subjetividades, as personalidades e as interioridades psíquicas individuais podem estar a desempenhar nos embotamentos, nas impotências, nas indecisões, nas imprevidências, nas inseguranças e, pior, na aceitação normativa e inquestionada de mandos e concomitantes obediências.
Não sendo propósito deste post abalançar-se pela via de tão exigente empreendimento, confino-me a um fugaz e ainda exíguo entremostrar, quer dos traços psicobiográficos para que a parangona da notícia do Expresso, em cima, remete, quer das implicações para o nosso futuro coletivo que advirão dos mesmos.
Mercê de processos que as dinâmicas de grupo e a psicologia social têm estudado abundantemente, como a mente de grupo (group think) e a polarização, torna-se expectável que a inteligência coletiva, especificamente a que tem emergido nas instituições europeias, fique muito aquém da média das inteligências individuais, o que explica uma parte da paralisia atual.
Se a esta contingência acrescentarmos o enfoque da psicologia cultural na propensão imperial que atravessa a mentalidade alemã e no flagrante contraste entre o protestantismo (o castigo, a expiação e a afirmação pessoal) e o catolicismo (as virtudes da submissão, da obediência e da aceitação do empobrecimento - as bem-aventuranças consumam-se no reino dos céus), então, temos reunidas as ferramentas teóricas propiciadoras da compreensão, tanto da emergência de uma chancelaria alemã autoritária e castigadora, ainda que, no passado recente, negligenciadora para proveito próprio, como de um governo português obediente.
Como se isto não bastasse, tivemos a negligência, também alemã, no exercício da autoridade tendente a impor a disciplina orçamental (ameaçou-se com penalizações no passado, mas nunca se concretizaram verdadeiramente, porque o despesismo dos países do sul servia os interesses da banca e da indústria alemãs), bem como nas mensagens contraditórias que foram sendo dadas a países como Portugal e a Grécia, no sentido de adquirirem os serviços, produtos e empréstimos germânicos, fomentando ou tolerando, desta forma, os seus endividamentos.
O problema de tudo isto é que, à semelhança do que acontece com as relações interpessoais e familiares, pode redundar daqui, para futuro, uma dinâmica patológica de abuso continuado por parte da mãe negligente, que se aproveita da submissão, da insegurança e da perda de assertividade e autoestima do filho obediente.
A posição de quem se predispõe a levar açoites germânicos, vergado, camisola repuxada e calças descidas, parecendo exibir a prontidão das nádegas, não é recomendável para ninguém, quanto mais para um governo ou um estado soberano.