Octávio V. Gonçalves: Demasiados treinos para tão escassa competição

30-06-2011
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In Público, 13-06-2011
A propósito da temática relativa à administração de testes intermédios no contexto do 3º ciclo (mas, cuja reflexão também alargo ao ensino secundário), supostamente excessiva e perturbadora das aprendizagens dos alunos, tal como se procurou apresentá-la na edição de ontem do jornal "Público", apraz-me empreender a seguinte análise, no pressuposto de que veiculo apenas a minha visão, que sempre exprimi nos órgãos próprios da minha escola de pertença, mas em relação à qual admito, igualmente, legítimas e fundamentadas discordâncias, por parte de outros professores. Aliás, a própria circunstância de o GAVE respeitar a autonomia das escolas, deixando-lhes a opção de aderirem, ou não, à aplicação dos testes intermédios, parece-me um princípio de bom senso que, desde logo, esbate uma parte substantiva da controvérsia que este tipo de práticas avaliativas podia desencadear. Ainda que seja, por princípio, favorável a uma avaliação exigente e uniformizada das aprendizagens dos alunos, no formato de exames nacionais à quase generalidade das disciplinas em cada fim de ciclo, não confundo, porém, a natureza e as funções dos testes intermédios, que, no essencial, procuram obter uma espécie de mediana das aprendizagens a nível nacional, em cada ano lectivo, que permita balizar uma concepção dos exames ajustada à mesma (daí as variações de grau de dificuldade entre os testes), com a relevância que deve caber aos exames nacionais, enquanto factores que, digam os especialistas o que digam, induzem maior e mais trabalhado investimento da parte dos professores na leccionação das matérias e na preparação dos alunos, além de que funcionam como mecanismos de correcção de disparidades avaliativas que se vão constatando de escola para escola ou de professor para professor, assim como permitem disponibilizar às escolas indicadores fidedignos à reflexão/intervenção conducente à melhoria de processos e de resultados, não susceptíveis de serem disfarçados ou compensados na forma de afectos, atitudes, valores e folclores. Se uma lógica de exames nacionais, associada a uma política de autonomia e de avaliação externa das escolas, visa a progressiva qualificação e o gradual robustecimento dos processos de ensino-aprendizagem que estão implementados em cada escola, os testes intermédios partem de uma filosofia oficial diversa (ainda que na prática também possam ter, aqui ou ali, um efeito indutor do ensino e do estudo, não o quero negar), procurando espelhar as realidades no terreno, de molde a aferirem-se conhecimentos médios e se poderem adequar os exames à mediana das aprendizagens ocorridas. No quadro da actual política educativa, desvalorizadora de uma filosofia de exames nacionais generalizados e sistemáticos, esta aposta num grande número de testes intermédios assemelha-se a uma espécie de campeonato de uma qualquer modalidade, em que as equipas eram submetidas a excesso de treinos, mas competiam escassamente. Do meu ponto de vista, obviamente sujeito ao contraditório, o recurso a esta metodologia de aplicação intensiva de testes intermédios consubstancia: - uma orientação centralista e paternalista do Ministério da Educação, substituindo-se à autonomia e à capacidade de organização e de avaliação contínua das aprendizagens, por parte das escolas; - uma menorização das escolas e uma desconfiança básica relativamente à capacidade dos docentes para elaborarem testes com a estrutura e o nível de exigência dos exames (por mim, estranho que muitos professores aceitem, de forma tão entusiasta, esta espécie de passagem, mesmo que não intencional, de atestados de incompetência), no quadro de uma leccionação e de uma avaliação do professor ou do grupo disciplinar exigentes; - uma óbvia insegurança do Ministério da Educação relativamente ao seu sistema de avaliação por exames nacionais, precavendo a variabilidade nas condições da leccionação, escola a escola e professor a professor, dos conteúdos programáticos de cada disciplina sujeita a exame nacional (leccionações que as políticas educativas dos últimos anos atrapalharam com farsas, burocracias e pressões para a facilitação), e evitando, deste modo, exames nacionais demasiado encostados ao programa oficial ou ao mínimo denominador comum de algumas das suas leccionações concretas.Como tal, considero que a partir do ponto em que sejam assegurados o enquadramento político, as condições e os mecanismos que suportem uma aposta exigente dos professores nos processos de ensino-aprendizagem, a administração dos testes intermédios deixa de fazer qualquer sentido, ganhando-se em poupança de recursos, em reconhecimento da autoridade e maioridade dos professores e em redução de interferências centralistas e paternalistas na planificação disciplinar e na aferição contínua das aprendizagens dos alunos.

In Público, 13-06-2011
A propósito da temática relativa à administração de testes intermédios no contexto do 3º ciclo (mas, cuja reflexão também alargo ao ensino secundário), supostamente excessiva e perturbadora das aprendizagens dos alunos, tal como se procurou apresentá-la na edição de ontem do jornal "Público", apraz-me empreender a seguinte análise, no pressuposto de que veiculo apenas a minha visão, que sempre exprimi nos órgãos próprios da minha escola de pertença, mas em relação à qual admito, igualmente, legítimas e fundamentadas discordâncias, por parte de outros professores. Aliás, a própria circunstância de o GAVE respeitar a autonomia das escolas, deixando-lhes a opção de aderirem, ou não, à aplicação dos testes intermédios, parece-me um princípio de bom senso que, desde logo, esbate uma parte substantiva da controvérsia que este tipo de práticas avaliativas podia desencadear. Ainda que seja, por princípio, favorável a uma avaliação exigente e uniformizada das aprendizagens dos alunos, no formato de exames nacionais à quase generalidade das disciplinas em cada fim de ciclo, não confundo, porém, a natureza e as funções dos testes intermédios, que, no essencial, procuram obter uma espécie de mediana das aprendizagens a nível nacional, em cada ano lectivo, que permita balizar uma concepção dos exames ajustada à mesma (daí as variações de grau de dificuldade entre os testes), com a relevância que deve caber aos exames nacionais, enquanto factores que, digam os especialistas o que digam, induzem maior e mais trabalhado investimento da parte dos professores na leccionação das matérias e na preparação dos alunos, além de que funcionam como mecanismos de correcção de disparidades avaliativas que se vão constatando de escola para escola ou de professor para professor, assim como permitem disponibilizar às escolas indicadores fidedignos à reflexão/intervenção conducente à melhoria de processos e de resultados, não susceptíveis de serem disfarçados ou compensados na forma de afectos, atitudes, valores e folclores. Se uma lógica de exames nacionais, associada a uma política de autonomia e de avaliação externa das escolas, visa a progressiva qualificação e o gradual robustecimento dos processos de ensino-aprendizagem que estão implementados em cada escola, os testes intermédios partem de uma filosofia oficial diversa (ainda que na prática também possam ter, aqui ou ali, um efeito indutor do ensino e do estudo, não o quero negar), procurando espelhar as realidades no terreno, de molde a aferirem-se conhecimentos médios e se poderem adequar os exames à mediana das aprendizagens ocorridas. No quadro da actual política educativa, desvalorizadora de uma filosofia de exames nacionais generalizados e sistemáticos, esta aposta num grande número de testes intermédios assemelha-se a uma espécie de campeonato de uma qualquer modalidade, em que as equipas eram submetidas a excesso de treinos, mas competiam escassamente. Do meu ponto de vista, obviamente sujeito ao contraditório, o recurso a esta metodologia de aplicação intensiva de testes intermédios consubstancia: - uma orientação centralista e paternalista do Ministério da Educação, substituindo-se à autonomia e à capacidade de organização e de avaliação contínua das aprendizagens, por parte das escolas; - uma menorização das escolas e uma desconfiança básica relativamente à capacidade dos docentes para elaborarem testes com a estrutura e o nível de exigência dos exames (por mim, estranho que muitos professores aceitem, de forma tão entusiasta, esta espécie de passagem, mesmo que não intencional, de atestados de incompetência), no quadro de uma leccionação e de uma avaliação do professor ou do grupo disciplinar exigentes; - uma óbvia insegurança do Ministério da Educação relativamente ao seu sistema de avaliação por exames nacionais, precavendo a variabilidade nas condições da leccionação, escola a escola e professor a professor, dos conteúdos programáticos de cada disciplina sujeita a exame nacional (leccionações que as políticas educativas dos últimos anos atrapalharam com farsas, burocracias e pressões para a facilitação), e evitando, deste modo, exames nacionais demasiado encostados ao programa oficial ou ao mínimo denominador comum de algumas das suas leccionações concretas.Como tal, considero que a partir do ponto em que sejam assegurados o enquadramento político, as condições e os mecanismos que suportem uma aposta exigente dos professores nos processos de ensino-aprendizagem, a administração dos testes intermédios deixa de fazer qualquer sentido, ganhando-se em poupança de recursos, em reconhecimento da autoridade e maioridade dos professores e em redução de interferências centralistas e paternalistas na planificação disciplinar e na aferição contínua das aprendizagens dos alunos.

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