Política Dura

24-06-2020
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Um dos dados mais
importantes na campanha eleitoral autárquica que se inicia é, sem dúvida, o aumento
da participação feminina nas listas de candidatos dos vários partidos, e em
posições de elevado destaque. Vale a pena mencionar a candidata à Presidência
da Câmara Municipal pela CDU, a Dra. Maria do Céu Brito, mas também as
candidatas pelo PSD e BE à Assembleia Municipal, respetivamente Dra. Ilídia
Quadrado e Dra. Sílvia Lino, e poderia ainda falar nas cabeças de lista de pelo
menos um dos partidos às Freguesias de Pedro Miguel, Cedros, Conceição, Feteira,
Matriz e Ribeirinha para dar mais alguns exemplos.

Este
significativo aumento da participação feminina tem algo de surpreendente, tendo
em conta as, infelizmente bem conhecidas, dificuldades aumentadas que tantas
mulheres do nosso país e da nossa ilha enfrentam para conseguirem ter uma
participação cidadã ativa. Olhe-se para o trabalho precário – que afeta
proporcionalmente muito mais mulheres do que homens –; olhe-se para a
flexibilidade de horários de trabalho, longos e irregulares, tornando
impossível qualquer espécie de conciliação com a vida pessoal e familiar;
compare-se porque tem também tudo a ver com isto, os salários médios dos homens
e das mulheres e ficamos a perceber claramente que às mulheres se colocam
barreiras acrescidas, obstáculos que são forçadas a enfrentar para poderem
participar num partido político ou numa qualquer organização cidadã. Não lhes
será certamente fácil encontrar tempo, energia, disponibilidade e meios para
contribuírem e participarem em partidos políticos, mas no entanto fazem-no.

A lei da
paridade, que obriga a que pelo menos um terço das listas sejam compostas por
mulheres, terá ajudado a este aumento da sua presença mas, a verdade é que
vários, senão todos os partidos foram bastante mais longe, projetando as suas
candidatas para os lugares cimeiros das suas listas. Não gosto da lei da
paridade e do seu espírito paternalista, que procura impor na secretaria o que muitas
mulheres desejam conquistar por mérito próprio. Construir a igualdade significa
que temos de criar condições, no trabalho, na família e nas organizações para
que mais mulheres participem, deem o seu contributo à sociedade e demonstrem a
sua vontade e capacidade de assumir as mais altas responsabilidades. A
imposição administrativa de cotas de género não é garante de igualdade.

Penso que o
importante aumento da participação feminina nestas eleições tem muito mais a
ver com o caminho percorrido pelas mulheres do Faial ao longo das últimas décadas.
Apesar das dificuldades que atrás referi, a verdade é que, nesta ilha, muitas
mulheres deixaram de ser espectadoras passivas ou recetoras indiferentes e participam
ativamente na cultura, no desporto, nas coletividades e agremiações. Assim, não
é de estranhar que os partidos políticos, para tentarem aumentar a
representatividade das suas listas de candidatos e a abrangência das suas
candidaturas, procurem integrá-las e dar-lhes o espaço que é naturalmente seu.

O aumento da
percentagem de mulheres nos órgãos autárquicos no nosso Concelho é certamente
uma notícia positiva e um bom sinal da evolução da nossa sociedade, Mas este
facto, por si só, não garante as mudanças de que necessitamos.

A participação das
mulheres na política, como facto recente que é, enfrenta ainda profundas
resistências e atavismos culturais, nomeadamente dos que tentam fazer
corresponder o género de uma pessoa a um determinado tipo de atuação ou de comportamento,
como se o facto de se ser mulher obrigue a ter uma dada personalidade ou
comportamento. Por outro lado, quando colocadas em cargos tradicionalmente
masculinos, as próprias mulheres tendem por vezes a imitar os seus
predecessores, como se a competência de uma mulher num cargo político fosse
medida pela capacidade de imitar os homens que a antecederam.

A igualdade
pressupõe a aceitação das diferenças e penso que precisamos ainda de percorrer
um longo caminho para dar às mulheres políticas o espaço para serem elas
próprias. Não basta, embora seja essencial, mudar o género dos titulares
políticos, precisamos de ir mais longe e abrir espaço a uma política mais
feminina, no que a palavra tem de mais profundo. Não me atrevo a tentar delimitar
o que é essa política feminina (às mulheres compete fazê-lo), mas arrisco-me a
dizer que talvez seja uma política virada mais para o “cuidar” do que para o “partir
e fazer de novo”, mais orientada para a cooperação do que para a competição,
com menos orgulhos e vaidades pessoais. Espero sobretudo que as candidatas e
futuras autarcas faialenses tenham as condições para deixar a sua marca própria
na nossa ilha. A hora é delas.

Declaração de interesses: Informo os caros leitores que, com toda a
honra, aceitei fazer parte da lista candidata à Câmara Municipal da Horta
encabeçada pela Dra. Maria do Céu Brito, a quem devo a inspiração para as
reflexões deste texto. Certamente que não utilizarei este espaço para fazer
campanha eleitoral e com igual certeza não deixarei de assumir a minha visão própria
e independente dos factos mais relevantes para a nossa ilha.

  

Texto publicado no Jornal Incentivo

Um dos dados mais
importantes na campanha eleitoral autárquica que se inicia é, sem dúvida, o aumento
da participação feminina nas listas de candidatos dos vários partidos, e em
posições de elevado destaque. Vale a pena mencionar a candidata à Presidência
da Câmara Municipal pela CDU, a Dra. Maria do Céu Brito, mas também as
candidatas pelo PSD e BE à Assembleia Municipal, respetivamente Dra. Ilídia
Quadrado e Dra. Sílvia Lino, e poderia ainda falar nas cabeças de lista de pelo
menos um dos partidos às Freguesias de Pedro Miguel, Cedros, Conceição, Feteira,
Matriz e Ribeirinha para dar mais alguns exemplos.

Este
significativo aumento da participação feminina tem algo de surpreendente, tendo
em conta as, infelizmente bem conhecidas, dificuldades aumentadas que tantas
mulheres do nosso país e da nossa ilha enfrentam para conseguirem ter uma
participação cidadã ativa. Olhe-se para o trabalho precário – que afeta
proporcionalmente muito mais mulheres do que homens –; olhe-se para a
flexibilidade de horários de trabalho, longos e irregulares, tornando
impossível qualquer espécie de conciliação com a vida pessoal e familiar;
compare-se porque tem também tudo a ver com isto, os salários médios dos homens
e das mulheres e ficamos a perceber claramente que às mulheres se colocam
barreiras acrescidas, obstáculos que são forçadas a enfrentar para poderem
participar num partido político ou numa qualquer organização cidadã. Não lhes
será certamente fácil encontrar tempo, energia, disponibilidade e meios para
contribuírem e participarem em partidos políticos, mas no entanto fazem-no.

A lei da
paridade, que obriga a que pelo menos um terço das listas sejam compostas por
mulheres, terá ajudado a este aumento da sua presença mas, a verdade é que
vários, senão todos os partidos foram bastante mais longe, projetando as suas
candidatas para os lugares cimeiros das suas listas. Não gosto da lei da
paridade e do seu espírito paternalista, que procura impor na secretaria o que muitas
mulheres desejam conquistar por mérito próprio. Construir a igualdade significa
que temos de criar condições, no trabalho, na família e nas organizações para
que mais mulheres participem, deem o seu contributo à sociedade e demonstrem a
sua vontade e capacidade de assumir as mais altas responsabilidades. A
imposição administrativa de cotas de género não é garante de igualdade.

Penso que o
importante aumento da participação feminina nestas eleições tem muito mais a
ver com o caminho percorrido pelas mulheres do Faial ao longo das últimas décadas.
Apesar das dificuldades que atrás referi, a verdade é que, nesta ilha, muitas
mulheres deixaram de ser espectadoras passivas ou recetoras indiferentes e participam
ativamente na cultura, no desporto, nas coletividades e agremiações. Assim, não
é de estranhar que os partidos políticos, para tentarem aumentar a
representatividade das suas listas de candidatos e a abrangência das suas
candidaturas, procurem integrá-las e dar-lhes o espaço que é naturalmente seu.

O aumento da
percentagem de mulheres nos órgãos autárquicos no nosso Concelho é certamente
uma notícia positiva e um bom sinal da evolução da nossa sociedade, Mas este
facto, por si só, não garante as mudanças de que necessitamos.

A participação das
mulheres na política, como facto recente que é, enfrenta ainda profundas
resistências e atavismos culturais, nomeadamente dos que tentam fazer
corresponder o género de uma pessoa a um determinado tipo de atuação ou de comportamento,
como se o facto de se ser mulher obrigue a ter uma dada personalidade ou
comportamento. Por outro lado, quando colocadas em cargos tradicionalmente
masculinos, as próprias mulheres tendem por vezes a imitar os seus
predecessores, como se a competência de uma mulher num cargo político fosse
medida pela capacidade de imitar os homens que a antecederam.

A igualdade
pressupõe a aceitação das diferenças e penso que precisamos ainda de percorrer
um longo caminho para dar às mulheres políticas o espaço para serem elas
próprias. Não basta, embora seja essencial, mudar o género dos titulares
políticos, precisamos de ir mais longe e abrir espaço a uma política mais
feminina, no que a palavra tem de mais profundo. Não me atrevo a tentar delimitar
o que é essa política feminina (às mulheres compete fazê-lo), mas arrisco-me a
dizer que talvez seja uma política virada mais para o “cuidar” do que para o “partir
e fazer de novo”, mais orientada para a cooperação do que para a competição,
com menos orgulhos e vaidades pessoais. Espero sobretudo que as candidatas e
futuras autarcas faialenses tenham as condições para deixar a sua marca própria
na nossa ilha. A hora é delas.

Declaração de interesses: Informo os caros leitores que, com toda a
honra, aceitei fazer parte da lista candidata à Câmara Municipal da Horta
encabeçada pela Dra. Maria do Céu Brito, a quem devo a inspiração para as
reflexões deste texto. Certamente que não utilizarei este espaço para fazer
campanha eleitoral e com igual certeza não deixarei de assumir a minha visão própria
e independente dos factos mais relevantes para a nossa ilha.

  

Texto publicado no Jornal Incentivo

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