Empresas devem dar duas horas por dia a mães com filhos até três anos

01-10-2015
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“Dirijo-me a V. Exa no sentido de apelar à sua sensibilidade feminina e devido ao facto de ser a mulher que ocupa o mais alto cargo público da nação.” É assim que começa a carta que o bastonário da Ordem dos Médicos escreveu à presidente da Assembleia da República para pedir que interceda para serem dados mais direitos às mães portuguesas e enfrentar “a dramática redução da natalidade, talvez o mais grave desafio que Portugal enfrenta”.

Na carta enviada a Assunção Esteves em nome dos médicos, José Manuel Silva pede-lhe que seja “agente da mudança” para que se “consigne em lei o direito a duas horas diárias de redução de horário a todas as mulheres com filhos até aos três anos de idade”. Dada a conhecer ao Presidente da República, ao primeiro-ministro e ao provedor de Justiça, a proposta invoca ainda a necessidade de colocar “em pé de igualdade” as mães, divididas entre as que amamentam e as que aleitam.

A lei consagra o direito a duas horas diárias pagas para amamentação ou aleitação, que pode ser pedida pelo pai, até o bebé ter um ano. Daí em diante, só as mulheres que comprovadamente amamentam mantêm esse direito. A prova é feita por atestado médico, que os clínicos também querem mudar.

A declaração médica deveria bastar à entidade patronal, mas há relatos que mostram que nem sempre é assim. No início do ano, duas enfermeiras dos hospitais de Santo António e de São João, no Porto, contaram ao jornal “Público” que foram chamadas à consulta de saúde ocupacional para mostrarem que o peito tinha leite. Outra enfermeira, do Hospital de Famalicão, passou pelo mesmo, mas foi mais longe: fez queixa à Ordem dos Médicos (OM).

O presidente do Conselho Regional do Norte da OM, Miguel Guimarães, adiantou ao Expresso que “estão a decorrer dois inquéritos disciplinares, em fases diferentes”. São relativos à atuação dos médicos de saúde ocupacional dos hospitais de Famalicão — “será tomada uma decisão daqui a duas semanas”—, e de Santo António. No caso do São João não foi aberto processo, porque a enfermeira não se identificou.

A OM aguarda também esclarecimentos dos hospitais de São João, Gaia e Vila Real para saber se exigem a expressão mamária. “Todas as outras unidades do Norte já responderam e negaram ter qualquer protocolo”, revela Miguel Guimarães. No resto do país não há casos conhecidos, embora “devam existir”.

Os relatos a Norte provocaram uma ‘onda de choque’ que chegou até Bruxelas, mas parou. “Nada tendo sido alterado de substantivo, a OM continua a ser confrontada com as dificuldades e dúvidas de aplicação da lei e com exigências absurdas por parte de algumas instituições, nomeadamente a apresentação de atestados mensais de amamentação”, lê-se na carta. José Manuel Silva pede que a prova seja posta de lado e dado o benefício, de duas horas diárias, a todas as mulheres com filhos pequenos, amamentados ou não.

O gabinete de Assunção Esteves esclarece que a presidente do Parlamento “não costuma fazer comentários sobre sugestões nem mesmo sobre propostas ou projetos de lei”, adiantando apenas que “o assunto foi para os grupos parlamentares e para a Comissão Parlamentar de Saúde”.

Avanço em outra legislatura

A presidente da 9ª comissão, Maria Antónia Almeida Santos, diz ter distribuído a proposta a todos os deputados ‘da Saúde’. A socialista nota que “já não há tempo para um partido levar o assunto avante nesta legislatura”, mas salienta tratar-se de uma “posição muito importante da OM para evitar a forma ultrajante, e que só prova que a mulher tem leite mas não que amamenta, como algumas mulheres são tratadas”.

O mesmo alerta para a falta de tempo é feito pelo presidente da Comissão Parlamentar de Segurança Social e Trabalho. José Manuel Canavarro faz ainda uma reflexão, a título pessoal. “Se a proposta assenta em evidências científicas claras de que há fortes benefícios para a saúde da mãe e do bebé de uma amamentação até aos três anos, esse é o ponto relevante para uma futura discussão de uma proposta universal.” O Expresso tentou, em vão, obter resposta junto da Sociedade Portuguesa de Pediatria.

Cautelas diferentes quanto à concretização da ideia são invocadas pela central sindical CGTP. “Estamos de acordo com todas as medidas para melhorar a maternidade e a parentalidade, mas a redução de horário não pode estar associada a uma redução de salário nem a perda de qualidade, confiança e segurança no emprego”, defende a responsável pela Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens, Fátima Messias.

A responsável pela Comissão para Igualdade no Trabalho e no Emprego, Joana Gíria opta pelo silêncio por desconhecer o conteúdo do documento. E a secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Teresa Morais, também não comenta.

Dar duas horas por dia pagas a todas as mulheres com filhos até aos três anos mudará a rotina das empresas. A Confederação Empresarial de Portugal só comenta propostas concretas, mas a Associação Empresarial de Portugal diz já que “terá grandes impactos no dia a dia das empresas e deverá ser acompanhada por outro tipo de medidas, sob pena de não se refletir nas políticas de natalidade e de apoio à família de que o país carece.”

José Manuel Silva faz outro prognóstico: “No imediato, a medida representa um custo, mas no futuro será claramente rentável.” Além disso, “as mulheres precisam de sentir que a maternidade não é um peso de chumbo”.

“Dirijo-me a V. Exa no sentido de apelar à sua sensibilidade feminina e devido ao facto de ser a mulher que ocupa o mais alto cargo público da nação.” É assim que começa a carta que o bastonário da Ordem dos Médicos escreveu à presidente da Assembleia da República para pedir que interceda para serem dados mais direitos às mães portuguesas e enfrentar “a dramática redução da natalidade, talvez o mais grave desafio que Portugal enfrenta”.

Na carta enviada a Assunção Esteves em nome dos médicos, José Manuel Silva pede-lhe que seja “agente da mudança” para que se “consigne em lei o direito a duas horas diárias de redução de horário a todas as mulheres com filhos até aos três anos de idade”. Dada a conhecer ao Presidente da República, ao primeiro-ministro e ao provedor de Justiça, a proposta invoca ainda a necessidade de colocar “em pé de igualdade” as mães, divididas entre as que amamentam e as que aleitam.

A lei consagra o direito a duas horas diárias pagas para amamentação ou aleitação, que pode ser pedida pelo pai, até o bebé ter um ano. Daí em diante, só as mulheres que comprovadamente amamentam mantêm esse direito. A prova é feita por atestado médico, que os clínicos também querem mudar.

A declaração médica deveria bastar à entidade patronal, mas há relatos que mostram que nem sempre é assim. No início do ano, duas enfermeiras dos hospitais de Santo António e de São João, no Porto, contaram ao jornal “Público” que foram chamadas à consulta de saúde ocupacional para mostrarem que o peito tinha leite. Outra enfermeira, do Hospital de Famalicão, passou pelo mesmo, mas foi mais longe: fez queixa à Ordem dos Médicos (OM).

O presidente do Conselho Regional do Norte da OM, Miguel Guimarães, adiantou ao Expresso que “estão a decorrer dois inquéritos disciplinares, em fases diferentes”. São relativos à atuação dos médicos de saúde ocupacional dos hospitais de Famalicão — “será tomada uma decisão daqui a duas semanas”—, e de Santo António. No caso do São João não foi aberto processo, porque a enfermeira não se identificou.

A OM aguarda também esclarecimentos dos hospitais de São João, Gaia e Vila Real para saber se exigem a expressão mamária. “Todas as outras unidades do Norte já responderam e negaram ter qualquer protocolo”, revela Miguel Guimarães. No resto do país não há casos conhecidos, embora “devam existir”.

Os relatos a Norte provocaram uma ‘onda de choque’ que chegou até Bruxelas, mas parou. “Nada tendo sido alterado de substantivo, a OM continua a ser confrontada com as dificuldades e dúvidas de aplicação da lei e com exigências absurdas por parte de algumas instituições, nomeadamente a apresentação de atestados mensais de amamentação”, lê-se na carta. José Manuel Silva pede que a prova seja posta de lado e dado o benefício, de duas horas diárias, a todas as mulheres com filhos pequenos, amamentados ou não.

O gabinete de Assunção Esteves esclarece que a presidente do Parlamento “não costuma fazer comentários sobre sugestões nem mesmo sobre propostas ou projetos de lei”, adiantando apenas que “o assunto foi para os grupos parlamentares e para a Comissão Parlamentar de Saúde”.

Avanço em outra legislatura

A presidente da 9ª comissão, Maria Antónia Almeida Santos, diz ter distribuído a proposta a todos os deputados ‘da Saúde’. A socialista nota que “já não há tempo para um partido levar o assunto avante nesta legislatura”, mas salienta tratar-se de uma “posição muito importante da OM para evitar a forma ultrajante, e que só prova que a mulher tem leite mas não que amamenta, como algumas mulheres são tratadas”.

O mesmo alerta para a falta de tempo é feito pelo presidente da Comissão Parlamentar de Segurança Social e Trabalho. José Manuel Canavarro faz ainda uma reflexão, a título pessoal. “Se a proposta assenta em evidências científicas claras de que há fortes benefícios para a saúde da mãe e do bebé de uma amamentação até aos três anos, esse é o ponto relevante para uma futura discussão de uma proposta universal.” O Expresso tentou, em vão, obter resposta junto da Sociedade Portuguesa de Pediatria.

Cautelas diferentes quanto à concretização da ideia são invocadas pela central sindical CGTP. “Estamos de acordo com todas as medidas para melhorar a maternidade e a parentalidade, mas a redução de horário não pode estar associada a uma redução de salário nem a perda de qualidade, confiança e segurança no emprego”, defende a responsável pela Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens, Fátima Messias.

A responsável pela Comissão para Igualdade no Trabalho e no Emprego, Joana Gíria opta pelo silêncio por desconhecer o conteúdo do documento. E a secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Teresa Morais, também não comenta.

Dar duas horas por dia pagas a todas as mulheres com filhos até aos três anos mudará a rotina das empresas. A Confederação Empresarial de Portugal só comenta propostas concretas, mas a Associação Empresarial de Portugal diz já que “terá grandes impactos no dia a dia das empresas e deverá ser acompanhada por outro tipo de medidas, sob pena de não se refletir nas políticas de natalidade e de apoio à família de que o país carece.”

José Manuel Silva faz outro prognóstico: “No imediato, a medida representa um custo, mas no futuro será claramente rentável.” Além disso, “as mulheres precisam de sentir que a maternidade não é um peso de chumbo”.

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