Mais de 70% das autarquias empolaram receitas dois anos seguidos

02-08-2014
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Mais de 70% das autarquias empolaram receitas dois anos seguidos

Margarida Peixoto e Marta Moitinho Oliveira

29 Jul 2014

A partir deste ano já há um mecanismo de alerta precoce para sinalizar estes casos.

Mais de 70% das 308 autarquias do país empolaram as receitas inscritas nos seus orçamentos durante os últimos dois anos. Se o mecanismo de alerta introduzido pela nova lei de Finanças Locais já estivesse em vigor, apenas 89 autarquias escapavam à denúncia junto do Governo central.

Os dados são do Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses e colocam a nu um dos mecanismos mais usados pelas câmaras para viabilizar despesa. A estratégia é bem conhecida tanto de autarcas como do próprio Governo central: não quer dizer que seja o objectivo de todos os municípios, mas muitas vezes as previsões de receita são propositadamente sobrestimados de modo a viabilizar mais facilmente despesa. Uma das formas de obter este efeito é sobrestimar, por exemplo, as receitas esperadas com a venda de património.

É por este expediente ser conhecido que foi introduzido na nova Lei das Finanças Locais, que entrou em vigor a 1 de Janeiro deste ano, um sistema de alerta: quando a taxa de execução das receitas fica abaixo dos 85%, em dois anos seguidos, as câmaras são sinalizadas ao ministro das Finanças e ao secretário de Estado da Administração Local. Também são notificados o presidente da Câmara e o presidente da Assembleia Municipal.

"O mecanismo de alerta só se aplica a dados a partir de 2014, mas se já estivesse a funcionar as câmaras sinalizadas seriam aquelas com taxa de execução da receita inferior a 85%", confirma o secretário de Estado da Administração Local, António Leitão Amaro, ao Diário Económico. Isto quer dizer que estas autarquias têm este ano e o próximo para mudar o seu modo de construção dos respectivos orçamentos. Quando as contas de 2015 forem fechadas, o mecanismo de alerta começará a funcionar.

Embora esta seja a única sanção prevista especificamente para o problema da sobreorçamentação das receitas - as restantes penalizações são feitas sobre o endividamento excessivo e a não redução dos pagamentos em atraso - certo é que a entrada em vigor da nova lei já está a provocar mudanças de atitude, garante o governante.

"Os orçamentos de 2014 já revelaram melhorias. Houve muitas câmaras com forte redução dos orçamentos de receita, algumas para cerca de metade, para valores mais realistas", reconhece Leitão Amaro.

Segundo os dados do Anuário Financeiro, em 2013 os dez municípios com uma diferença maior no grau de execução das despesas, face às receitas, apresentaram diferenças superiores a 45,5 pontos percentuais. Portimão, por exemplo, que é o município com maior diferença, apresentou um grau de execução da despesa de 99,6%, mas o grau de execução da receita ficou em 22,9%, com uma diferença de 76,6 pontos.

1.705 milhões de euros por pagar não pesam no défice

Segundo as contas do Anuário Financeiro, ficaram 1.705 milhões de euros de despesa comprometida em 2013 por pagar. Não quer dizer que não haja receita suficiente para a totalidade deste valor - a falta de cobertura só se verifica para 1.088 milhões de euros, já que o restante não foi pago porque a receita liquidada não tinha sido ainda efectivamente cobrada, ou porque o dinheiro ainda estava em caixa. Mas estes gastos rebolam para 2014.

Como a despesa foi assumida no ano passado, estes gastos não contam para a meta do défice deste ano. Na contabilidade que interessa a Bruxelas - a óptica de compromisso - os gastos já foram registados nas contas de 2013, mesmo que o pagamento só seja efectivado este ano. Mas isto não quer dizer que não tenha consequências.

Na prática, o resultado é que este valor vai absorver parte das receitas que forem arrecadadas este ano. Se o orçamento da despesa não tiver sido desenhado a contar com os encargos que sobraram de 2013, as câmaras chegam ao final do ano novamente sem receita para cobrir toda a despesa efectuada - e os atrasos nos pagamentos a fornecedores, bem como o excessivo endividamento, são bons reflexos disso.

Segundo o Anuário, pelo menos desde 2007 que o saldo orçamental, excluindo as operações com activos e passivos financeiros, é negativo em mais de mil milhões de euros. Na verdade, dos anos em análise, 2013 até foi o que registou o défice mais baixo (1.088 milhões de euros). O ano mais negativo foi 2010, com um défice de 2.440 milhões de euros.

Mais de 70% das autarquias empolaram receitas dois anos seguidos

Margarida Peixoto e Marta Moitinho Oliveira

29 Jul 2014

A partir deste ano já há um mecanismo de alerta precoce para sinalizar estes casos.

Mais de 70% das 308 autarquias do país empolaram as receitas inscritas nos seus orçamentos durante os últimos dois anos. Se o mecanismo de alerta introduzido pela nova lei de Finanças Locais já estivesse em vigor, apenas 89 autarquias escapavam à denúncia junto do Governo central.

Os dados são do Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses e colocam a nu um dos mecanismos mais usados pelas câmaras para viabilizar despesa. A estratégia é bem conhecida tanto de autarcas como do próprio Governo central: não quer dizer que seja o objectivo de todos os municípios, mas muitas vezes as previsões de receita são propositadamente sobrestimados de modo a viabilizar mais facilmente despesa. Uma das formas de obter este efeito é sobrestimar, por exemplo, as receitas esperadas com a venda de património.

É por este expediente ser conhecido que foi introduzido na nova Lei das Finanças Locais, que entrou em vigor a 1 de Janeiro deste ano, um sistema de alerta: quando a taxa de execução das receitas fica abaixo dos 85%, em dois anos seguidos, as câmaras são sinalizadas ao ministro das Finanças e ao secretário de Estado da Administração Local. Também são notificados o presidente da Câmara e o presidente da Assembleia Municipal.

"O mecanismo de alerta só se aplica a dados a partir de 2014, mas se já estivesse a funcionar as câmaras sinalizadas seriam aquelas com taxa de execução da receita inferior a 85%", confirma o secretário de Estado da Administração Local, António Leitão Amaro, ao Diário Económico. Isto quer dizer que estas autarquias têm este ano e o próximo para mudar o seu modo de construção dos respectivos orçamentos. Quando as contas de 2015 forem fechadas, o mecanismo de alerta começará a funcionar.

Embora esta seja a única sanção prevista especificamente para o problema da sobreorçamentação das receitas - as restantes penalizações são feitas sobre o endividamento excessivo e a não redução dos pagamentos em atraso - certo é que a entrada em vigor da nova lei já está a provocar mudanças de atitude, garante o governante.

"Os orçamentos de 2014 já revelaram melhorias. Houve muitas câmaras com forte redução dos orçamentos de receita, algumas para cerca de metade, para valores mais realistas", reconhece Leitão Amaro.

Segundo os dados do Anuário Financeiro, em 2013 os dez municípios com uma diferença maior no grau de execução das despesas, face às receitas, apresentaram diferenças superiores a 45,5 pontos percentuais. Portimão, por exemplo, que é o município com maior diferença, apresentou um grau de execução da despesa de 99,6%, mas o grau de execução da receita ficou em 22,9%, com uma diferença de 76,6 pontos.

1.705 milhões de euros por pagar não pesam no défice

Segundo as contas do Anuário Financeiro, ficaram 1.705 milhões de euros de despesa comprometida em 2013 por pagar. Não quer dizer que não haja receita suficiente para a totalidade deste valor - a falta de cobertura só se verifica para 1.088 milhões de euros, já que o restante não foi pago porque a receita liquidada não tinha sido ainda efectivamente cobrada, ou porque o dinheiro ainda estava em caixa. Mas estes gastos rebolam para 2014.

Como a despesa foi assumida no ano passado, estes gastos não contam para a meta do défice deste ano. Na contabilidade que interessa a Bruxelas - a óptica de compromisso - os gastos já foram registados nas contas de 2013, mesmo que o pagamento só seja efectivado este ano. Mas isto não quer dizer que não tenha consequências.

Na prática, o resultado é que este valor vai absorver parte das receitas que forem arrecadadas este ano. Se o orçamento da despesa não tiver sido desenhado a contar com os encargos que sobraram de 2013, as câmaras chegam ao final do ano novamente sem receita para cobrir toda a despesa efectuada - e os atrasos nos pagamentos a fornecedores, bem como o excessivo endividamento, são bons reflexos disso.

Segundo o Anuário, pelo menos desde 2007 que o saldo orçamental, excluindo as operações com activos e passivos financeiros, é negativo em mais de mil milhões de euros. Na verdade, dos anos em análise, 2013 até foi o que registou o défice mais baixo (1.088 milhões de euros). O ano mais negativo foi 2010, com um défice de 2.440 milhões de euros.

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