A regra de Juncker

20-06-2011
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Paul Volcker, antigo presidente do banco central americano, disse uma vez que a única coisa útil que os bancos inventaram nos últimos 20 foi a caixa automática. O humilde multibanco, acrescentou Volcker, "dá mesmo muito jeito, evita visitas desnecessárias ao banco e ajuda as pessoas". "Não consigo pensar em mais nenhuma inovação financeira de que se possa dizer o mesmo."

Noutra ocasião, Paul Volcker disse que não entendia como funcionavam os derivados financeiros como os credit default swaps. Alguém respondeu: se calhar devíamos ter uma "regra de Volcker": "Se o Volcker não entende, não podes vender." Vários prémios Nobel da economia, de diversas correntes políticas e doutrinárias, idolatram a inteligência e o conhecimento de Paul Volcker. A implicação daquela "regra de Volcker" é a de que se nem ele entende um determinado produto financeiro, muito menos o consumidor o conseguirá entender, e, em consequência, a venda desse produto representa um risco social maior do que as suas vantagens.

Noutra versão, a "regra de Volcker" refere-se aos bancos "demasiado grandes para deixar falir", mas por detrás encontra-se um raciocínio análogo: se a existência de bancos enormes representa um risco maior do que as suas vantagens, ela deve ser limitada.

A Administração Obama tentou implementar esta versão da "regra de Volcker" num pacote legislativo que mereceu, é claro, a oposição dos bancos, e bastante adulteração no Congresso. Ainda não desceu à Terra uma utopia simples em que bancos pequenos e sérios se dedicam a fazer boas caixas multibanco, aceitar depósitos, conceder empréstimos responsáveis e não levar à falência os países onde se encontram sediados.

Jean-Claude Juncker, presidente do Eurogrupo e primeiro-ministro do Luxemburgo, deve ser - salvo engano meu - o chefe de governo há mais tempo em funções na União. É também dos mais velhos, e lembra-se bem da Europa do pós-guerra. Várias fontes confirmam que, na escalada para a guerra do Iraque, foi dos poucos capazes de dizer a Blair, Aznar e Barroso que estes não sabiam a insanidade que era a guerra (Chirac, é claro, lembrava-se da guerra propriamente dita).

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Numa entrevista recente, Juncker confessa: "Eu não percebo - sem dúvida sou demasiado ingénuo - esta perversidade europeia que exige à Grécia co-financiamento [em programas estruturais]." Avisa que ninguém se lembra de "dar esperança aos gregos". Acrescenta que "estamos a brincar com o fogo" e que vários países europeus, incluindo a Itália, a Bélgica e a Espanha, sofrem risco de contágio na atual crise grega. Depois disto, nota o evidente: que a UE, ao não resolver e agravar os problemas, pode criar uma nova geração de eurocéticos. E conclui, lembrando que "após a crise financeira, seguida por uma crise da economia real, arriscamo-nos a ter uma crise social e, ao fim e ao cabo, uma crise do sistema".

Acho que precisamos, aqui na Europa, de uma "regra de Juncker". Quando o presidente do Eurogrupo não percebe o que a União anda a fazer, ou percebe bem de mais e sabe que isso leva ao desastre, é porque rebentou a bolha.

O tempo está a esgotar-se para uma política feita de remendos. A partir de agora temos como opções a refundação ou a fragmentação. Historiador. Deputado independente ao Parlamento Europeu pelo BE (http://twitter.com/ruitavares); a pedido do autor, este artigo respeita as normas do Acordo Ortográfico

Paul Volcker, antigo presidente do banco central americano, disse uma vez que a única coisa útil que os bancos inventaram nos últimos 20 foi a caixa automática. O humilde multibanco, acrescentou Volcker, "dá mesmo muito jeito, evita visitas desnecessárias ao banco e ajuda as pessoas". "Não consigo pensar em mais nenhuma inovação financeira de que se possa dizer o mesmo."

Noutra ocasião, Paul Volcker disse que não entendia como funcionavam os derivados financeiros como os credit default swaps. Alguém respondeu: se calhar devíamos ter uma "regra de Volcker": "Se o Volcker não entende, não podes vender." Vários prémios Nobel da economia, de diversas correntes políticas e doutrinárias, idolatram a inteligência e o conhecimento de Paul Volcker. A implicação daquela "regra de Volcker" é a de que se nem ele entende um determinado produto financeiro, muito menos o consumidor o conseguirá entender, e, em consequência, a venda desse produto representa um risco social maior do que as suas vantagens.

Noutra versão, a "regra de Volcker" refere-se aos bancos "demasiado grandes para deixar falir", mas por detrás encontra-se um raciocínio análogo: se a existência de bancos enormes representa um risco maior do que as suas vantagens, ela deve ser limitada.

A Administração Obama tentou implementar esta versão da "regra de Volcker" num pacote legislativo que mereceu, é claro, a oposição dos bancos, e bastante adulteração no Congresso. Ainda não desceu à Terra uma utopia simples em que bancos pequenos e sérios se dedicam a fazer boas caixas multibanco, aceitar depósitos, conceder empréstimos responsáveis e não levar à falência os países onde se encontram sediados.

Jean-Claude Juncker, presidente do Eurogrupo e primeiro-ministro do Luxemburgo, deve ser - salvo engano meu - o chefe de governo há mais tempo em funções na União. É também dos mais velhos, e lembra-se bem da Europa do pós-guerra. Várias fontes confirmam que, na escalada para a guerra do Iraque, foi dos poucos capazes de dizer a Blair, Aznar e Barroso que estes não sabiam a insanidade que era a guerra (Chirac, é claro, lembrava-se da guerra propriamente dita).

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Numa entrevista recente, Juncker confessa: "Eu não percebo - sem dúvida sou demasiado ingénuo - esta perversidade europeia que exige à Grécia co-financiamento [em programas estruturais]." Avisa que ninguém se lembra de "dar esperança aos gregos". Acrescenta que "estamos a brincar com o fogo" e que vários países europeus, incluindo a Itália, a Bélgica e a Espanha, sofrem risco de contágio na atual crise grega. Depois disto, nota o evidente: que a UE, ao não resolver e agravar os problemas, pode criar uma nova geração de eurocéticos. E conclui, lembrando que "após a crise financeira, seguida por uma crise da economia real, arriscamo-nos a ter uma crise social e, ao fim e ao cabo, uma crise do sistema".

Acho que precisamos, aqui na Europa, de uma "regra de Juncker". Quando o presidente do Eurogrupo não percebe o que a União anda a fazer, ou percebe bem de mais e sabe que isso leva ao desastre, é porque rebentou a bolha.

O tempo está a esgotar-se para uma política feita de remendos. A partir de agora temos como opções a refundação ou a fragmentação. Historiador. Deputado independente ao Parlamento Europeu pelo BE (http://twitter.com/ruitavares); a pedido do autor, este artigo respeita as normas do Acordo Ortográfico

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