O que esperam os amigos do Syriza nestas legislativas?

01-10-2015
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27 de setembro de 2015. Na Feira do Relógio, em Lisboa, os ponteiros da coligação Agir/PTP/MAS não bateram cronometrados com o relógio da cabeça de lista por Lisboa. O principal rosto do movimento não conseguiu acompanhar a pequena comitiva que, às 9h30, já se preparava para se lançar a feirantes e populares à conquista de votos. António Madaleno, líder do PTP, assumiu as despesas da coligação e conduziu o grupo de oito pessoas feira adentro, perante a simpatia de uns, a indiferença de outros e a estranheza de uns quantos. “Este é o partido do filho do Paulo de Carvalho?”, perguntava um curioso, sem esperar pela resposta. Não, não é. “Este é o partido daquela que posou grávida”, comentavam entre si duas amigas noutra ponta feira. Falavam de quem? Joana Amaral Dias, claro. Mas, para vê-la, só à tarde, à porta da residência de Ricardo Salgado, em Cascais.

E à segunda tentativa foi de vez. A comitiva – desta vez, bem mais composta -, já aguardava em frente à casa do ex-líder do Banco Espírito Santo. Com o bombo a marcar o ritmo, o megafone no volume máximo e as vozes já bem afinadas, Joana Amaral Dias juntava-se à serenata observada à distância pelos dois agentes da PSP que estão a vigiar a casa de Ricardo Salgado – mais os quatro que se lhes juntaram. “Salgado estás à janelaaa / Ouve bem com atençãoooo / Só me vou daqui emboraa / Quando fores para a prisãaoooo“.

Coligação Agir/PTP/MAS em protesto à frente da casa de Ricardo Salgado. pic.twitter.com/qhmcMX0rkN — Observador (Eleições) (@OBSEleicoes) September 27, 2015

Não levaram uma prenda dele, mas o objetivo do protesto transformado em ação de campanha também não era esse. “Não podemos consentir mais esta política de dois pesos e duas medidas que só se serviu não para controlar o défice e a dívida, mas sim para dar com o chicote no lombo dos portugueses. Se há dinheiro para Ricardo Salgado e para para o BES” também tem de haver “dinheiro para honrar pensões e salários”, explicava Joana Amaral Dias aos jornalistas.

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72 duas horas antes, outra coligação usava o tema BES/Ricardo Salgado para atacar o ex-banqueiro e fazer mossa no Governo. A sede do Novo Banco, em Lisboa, servia de cenário. “Resgataram os bancos, resgatem as pessoas”, era o mote. Rui Tavares e o Livre/Tempo de Avançar, os protagonistas. “Durante os últimos quatro anos pouco se falou de dívida privada”, mas, na verdade, Portugal tem um dos “problemas de dívida privada mais altos do mundo, ao mesmo tempo que se resgatavam os bancos. E descobrimos que ao fim desses mesmo quatro anos que estamos agora a pagar os gastos do senhor Ricardo Salgado e do BES”, criticava o historiador e cabeça de lista da coligação por Lisboa.

Muito antes, quando a campanha ainda respondia pelo prefixo de pré, já alguém fazia da queda do banco – e não só -uma arma de arremesso. Em jeito de humor, Catarina Martins, porta-voz do Bloco de Esquerda, respondia assim à provocação de Ricardo Araújo Pereira. A verdade é que isto é tudo muito bonito mas “há quem esteja na política por dinheiro, há quem esteja pelo negócio, nós [BE] estamos pelo convívio. Eu convivo com Passos Coelho, pergunto-lhe, por exemplo, pelos seus convívios com Dias Loureiro, pelos convívios na Tecnoforma com Miguel Relvas, pelos convívios com Ricardo Salgado e Zeinal Bava”.

Os três são de esquerda, os três têm inimigos políticos em comum. Os três celebraram a dupla vitória do Syriza nas eleições gregas e querem capitalizar o efeito em Portugal. Os três querem ajudar a derrubar nas urnas a dupla Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, mas, olhando para as sondagens, só o conseguirão fazer se ajudarem António Costa a governar. Dois não estão dispostos a fazê-lo sem definir linhas vermelhas que o PS dificilmente aceitará. O outro não quer conversas com os socialistas, ponto. Na entrada para a reta final desta corrida às urnas, que balanço fica da campanha de Bloco de Esquerda, Livre/Tempo de Avançar e Agir/PTP/MAS?

Rui Tavares: Com o Livre/Tempo de Avançar na Assembleia, “nada voltará a ser como dantes na política em Portugal”

O partido de Rui Tavares e o movimento de Ana Drago e Daniel Oliveira, todos ex-bloquistas, juntaram-se para ocupar um lugar que, acreditavam, estava vazio no espetro político português: uma esquerda que sendo esquerda queria ajudar a governar. Um pouco à semelhança do que aconteceu na Grécia, quando a ala mais moderada do Syriza deixou o partido, formou a Esquerda Democrática (Dimar) e piscou o olho ao partido socialista grego. Mas as mesmas eleições que ditaram a vitória de Alexis Tsipras, acabaram por fragilizar o Dimar, dando-lhe uma votação residual.

Apesar deste resultado menos feliz do partido homólogo na Grécia, o historiador não deixou de celebrar a vitória do Syriza, o que, na altura, lhe valeu duras críticas de Luís Fazenda. “Rui Tavares e e companhia alargada” querem “’embandeirar em arco da governação’ com a vitória do Syriza, quando nem sequer defendem para lusa aplicação nenhum dos pontos fundamentais do seu programa. Por cá há mais queda para a comédia”, escreveu então o fundador do Bloco.

Na verdade, e apesar de ter festejado a vitória dos gregos do Syriza, o rosto do Livre/Tempo de Avançar foi apontando alguns erros estratégicos ao Governo grego. Criticou, desde logo, a coligação com os nacionalistas dos Gregos Independentes e a linha assumida pela dupla Tsipras/Varoufakis à mesa das negociações, por vezes demasiado dura. Rui Tavares vê no Syriza um amigo, mas manteve sempre as distâncias.

Apesar de todas as diferenças, a 20 de maio, quando as negociações entre Atenas e credores estavam muito longe de estar concluídas, Rui Tavares declarava, em entrevista ao Observador, o apoio aos gregos. “Não há milagres, não há viradas de jogo que ocorram em apenas um dia. Agora, acho que a experiência do Syriza no Governo grego tem sido uma excelente prova que o caminho é árduo mas que se pode fazer”.

Mais de quatro meses depois, falhadas as negociações entre gregos e credores, convocado um referendo, desenhado um acordo que trazia ainda mais austeridade e novas eleições, Rui Tavares, em entrevista ao jornal Sol, era desafiado a revelar se se revia no Syriza atual ou pós-acordo. O cabeça de lista do Livre/Tempo de Avançar por Lisboa fugia à questão e preferia lembrar o que dissera Alexis Tsipras. “‘Temos de aguentar firmes”. E explicava porquê: “Vejo a mudança na Europa como uma corrida de longo curso. Uma perna é o um movimento progressista de cidadãos que pensa que esta Europa assim não serve (…) Não vamos virar o jogo de um momento para o outro, mas nós vamos começar a fazê-lo a partir de 4 de outubro”.

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27 de setembro de 2015. Na Feira do Relógio, em Lisboa, os ponteiros da coligação Agir/PTP/MAS não bateram cronometrados com o relógio da cabeça de lista por Lisboa. O principal rosto do movimento não conseguiu acompanhar a pequena comitiva que, às 9h30, já se preparava para se lançar a feirantes e populares à conquista de votos. António Madaleno, líder do PTP, assumiu as despesas da coligação e conduziu o grupo de oito pessoas feira adentro, perante a simpatia de uns, a indiferença de outros e a estranheza de uns quantos. “Este é o partido do filho do Paulo de Carvalho?”, perguntava um curioso, sem esperar pela resposta. Não, não é. “Este é o partido daquela que posou grávida”, comentavam entre si duas amigas noutra ponta feira. Falavam de quem? Joana Amaral Dias, claro. Mas, para vê-la, só à tarde, à porta da residência de Ricardo Salgado, em Cascais.

E à segunda tentativa foi de vez. A comitiva – desta vez, bem mais composta -, já aguardava em frente à casa do ex-líder do Banco Espírito Santo. Com o bombo a marcar o ritmo, o megafone no volume máximo e as vozes já bem afinadas, Joana Amaral Dias juntava-se à serenata observada à distância pelos dois agentes da PSP que estão a vigiar a casa de Ricardo Salgado – mais os quatro que se lhes juntaram. “Salgado estás à janelaaa / Ouve bem com atençãoooo / Só me vou daqui emboraa / Quando fores para a prisãaoooo“.

Coligação Agir/PTP/MAS em protesto à frente da casa de Ricardo Salgado. pic.twitter.com/qhmcMX0rkN — Observador (Eleições) (@OBSEleicoes) September 27, 2015

Não levaram uma prenda dele, mas o objetivo do protesto transformado em ação de campanha também não era esse. “Não podemos consentir mais esta política de dois pesos e duas medidas que só se serviu não para controlar o défice e a dívida, mas sim para dar com o chicote no lombo dos portugueses. Se há dinheiro para Ricardo Salgado e para para o BES” também tem de haver “dinheiro para honrar pensões e salários”, explicava Joana Amaral Dias aos jornalistas.

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72 duas horas antes, outra coligação usava o tema BES/Ricardo Salgado para atacar o ex-banqueiro e fazer mossa no Governo. A sede do Novo Banco, em Lisboa, servia de cenário. “Resgataram os bancos, resgatem as pessoas”, era o mote. Rui Tavares e o Livre/Tempo de Avançar, os protagonistas. “Durante os últimos quatro anos pouco se falou de dívida privada”, mas, na verdade, Portugal tem um dos “problemas de dívida privada mais altos do mundo, ao mesmo tempo que se resgatavam os bancos. E descobrimos que ao fim desses mesmo quatro anos que estamos agora a pagar os gastos do senhor Ricardo Salgado e do BES”, criticava o historiador e cabeça de lista da coligação por Lisboa.

Muito antes, quando a campanha ainda respondia pelo prefixo de pré, já alguém fazia da queda do banco – e não só -uma arma de arremesso. Em jeito de humor, Catarina Martins, porta-voz do Bloco de Esquerda, respondia assim à provocação de Ricardo Araújo Pereira. A verdade é que isto é tudo muito bonito mas “há quem esteja na política por dinheiro, há quem esteja pelo negócio, nós [BE] estamos pelo convívio. Eu convivo com Passos Coelho, pergunto-lhe, por exemplo, pelos seus convívios com Dias Loureiro, pelos convívios na Tecnoforma com Miguel Relvas, pelos convívios com Ricardo Salgado e Zeinal Bava”.

Os três são de esquerda, os três têm inimigos políticos em comum. Os três celebraram a dupla vitória do Syriza nas eleições gregas e querem capitalizar o efeito em Portugal. Os três querem ajudar a derrubar nas urnas a dupla Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, mas, olhando para as sondagens, só o conseguirão fazer se ajudarem António Costa a governar. Dois não estão dispostos a fazê-lo sem definir linhas vermelhas que o PS dificilmente aceitará. O outro não quer conversas com os socialistas, ponto. Na entrada para a reta final desta corrida às urnas, que balanço fica da campanha de Bloco de Esquerda, Livre/Tempo de Avançar e Agir/PTP/MAS?

Rui Tavares: Com o Livre/Tempo de Avançar na Assembleia, “nada voltará a ser como dantes na política em Portugal”

O partido de Rui Tavares e o movimento de Ana Drago e Daniel Oliveira, todos ex-bloquistas, juntaram-se para ocupar um lugar que, acreditavam, estava vazio no espetro político português: uma esquerda que sendo esquerda queria ajudar a governar. Um pouco à semelhança do que aconteceu na Grécia, quando a ala mais moderada do Syriza deixou o partido, formou a Esquerda Democrática (Dimar) e piscou o olho ao partido socialista grego. Mas as mesmas eleições que ditaram a vitória de Alexis Tsipras, acabaram por fragilizar o Dimar, dando-lhe uma votação residual.

Apesar deste resultado menos feliz do partido homólogo na Grécia, o historiador não deixou de celebrar a vitória do Syriza, o que, na altura, lhe valeu duras críticas de Luís Fazenda. “Rui Tavares e e companhia alargada” querem “’embandeirar em arco da governação’ com a vitória do Syriza, quando nem sequer defendem para lusa aplicação nenhum dos pontos fundamentais do seu programa. Por cá há mais queda para a comédia”, escreveu então o fundador do Bloco.

Na verdade, e apesar de ter festejado a vitória dos gregos do Syriza, o rosto do Livre/Tempo de Avançar foi apontando alguns erros estratégicos ao Governo grego. Criticou, desde logo, a coligação com os nacionalistas dos Gregos Independentes e a linha assumida pela dupla Tsipras/Varoufakis à mesa das negociações, por vezes demasiado dura. Rui Tavares vê no Syriza um amigo, mas manteve sempre as distâncias.

Apesar de todas as diferenças, a 20 de maio, quando as negociações entre Atenas e credores estavam muito longe de estar concluídas, Rui Tavares declarava, em entrevista ao Observador, o apoio aos gregos. “Não há milagres, não há viradas de jogo que ocorram em apenas um dia. Agora, acho que a experiência do Syriza no Governo grego tem sido uma excelente prova que o caminho é árduo mas que se pode fazer”.

Mais de quatro meses depois, falhadas as negociações entre gregos e credores, convocado um referendo, desenhado um acordo que trazia ainda mais austeridade e novas eleições, Rui Tavares, em entrevista ao jornal Sol, era desafiado a revelar se se revia no Syriza atual ou pós-acordo. O cabeça de lista do Livre/Tempo de Avançar por Lisboa fugia à questão e preferia lembrar o que dissera Alexis Tsipras. “‘Temos de aguentar firmes”. E explicava porquê: “Vejo a mudança na Europa como uma corrida de longo curso. Uma perna é o um movimento progressista de cidadãos que pensa que esta Europa assim não serve (…) Não vamos virar o jogo de um momento para o outro, mas nós vamos começar a fazê-lo a partir de 4 de outubro”.

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