O Medo de Sair do Euro

30-06-2011
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Agora que se torna evidente que a saída do euro é uma solução real e que nem sequer depende tanto da vontade dos que desejam manter a moeda única, há cada vez mais vozes em Portugal a advogar esta saída como a única aceitável dadas as condições. A reacção contra estas vozes já se fez sentir, e vem de todos os quadrantes, inclusivamente de quadrantes liberais, especialmente por aqueles, como o João Mendes, que se denominam liberais (sociais) mas querem um Estado federal centralizado em Bruxelas que afasta o poder político dos indivíduos. Porém, outros liberais simplesmente estão, por princípio, contra desvalorizações monetárias e as suas consequências, como parece ser o caso deste texto do Miguel.

O argumento de ambos consiste nos perigos de entregar o controlo monetário ao governo português. O principal argumento que liga estas vozes críticas da saída do euro é que ao se sair do euro resolve-se a curto prazo o problema da competitividade em relação ao exterior mas desaparecem os incentivos para se liberalizar a economia, que é, suponho eu, o principal problema da economia portuguesa. Eu quero aqui desafiar este argumento.

O euro foi um dos grandes responsáveis pelo estado de endividamento a que chegamos. Só nos endividamos desta forma porque o Banco Central Europeu indirectamente injectou crédito barato no Estado português ao aceitar títulos de dívida pública como colateral para empréstimos a bancos comerciais. Isto sim, impediu que qualquer reforma liberal fosse feita internamente, fazendo com que o Estado pudesse subsidiar a improdutividade de inúmeras formas: empregos inúteis na função pública, distribuição de obras públicas para os “rent seekers”, etc… Com o euro (e antes disso com os fundos estruturais europeus) os empresários portugueses passaram a dedicar mais tempo ao “rent seeking” do que a investirem na produtividade. Retirar uma “renda” do Estado proveniente da impressão monetária do BCE passou a ser desporto nacional. Mesmo que Portugal entre em default (e vai entrar), não sair do euro significa apenas a perpetuação deste processo onde o crédito barato torna mais apetecível contrair dívida pública do que liberalizar (tal como até então). Isto só não aconteceria se os Estados decidissem impor limites ao endividamento, mas isto é tão improvável como o Woody Allen continuar a escrever um filme por ano até aos 200 anos.

Sobre os receios de entregar o controlo monetário ao governo português e voltar ao escudo, já o escrevi antes que, apesar de não ser ideal, está um degrau acima do que temos hoje em dia com o BCE. Eu percebia esta resistência contra a desvalorização monetária se a alternativa ao escudo fosse claramente melhor, mas não é. A alternativa à impressora de dinheiro português é a impressora do BCE. É importante lembrar o argumento do economista Philipp Bagus: os países como Portugal estiveram 10 anos a imprimir dinheiro indirectamente via bancos e BCE, mesmo sem terem a sua própria política monetária. Ademais, a única forma de o euro sobreviver nos actuais moldes (isto é, sem centralização fiscal em Bruxelas) é a impressão monetária que irá compensar todos os bancos vítimas dos defaults e irá salvar o próprio BCE detentor de milhares de títulos de dívida pública que irão “rebentar” quando os defaults inevitavelmente surgirem.

Consequentemente, dentro ou fora do euro a desvalorização irá ocorrer. A principal diferença é que saindo do euro ganhamos alguma vantagem competitiva e o acesso ao crédito por parte do Estado torna-se mais difícil, o que é uma excelente notícia para quem deseja liberalização na economia. Mas a principal vantagem das moedas em competição, em vez da moeda única emitida por um banco central europeu, é que a competição destas funciona como um “check” sobre a acção das “impressoras”, visto que as desvalorizações abusivas tornam-se muito mais evidentes ao grande público perante comparação imediata.

A proposta de lançar um escudo baseado no ouro e na prata em concorrência com o euro é interessante e provavelmente melhor do que sair apenas do euro, pois a longo prazo tal tornaria o BCE pouco relevante devido à disciplina a que seria obrigado. Contudo, não só esta proposta seria recebida com inúmeros anti-corpos políticos, mas também tem a desvantagem de não colocar um ponto final no projecto monetário europeu, sabendo-se que, pelo contrário, a saída de inúmeros países do euro provavelmente o faria.

Como alguém que está interessado em que o poder político esteja o mais próximo possível dos indivíduos, como alguém que vê na descentralização uma virtude, quando tenho de optar entre escolher entre uma impressora europeia centralizada e longe dos indivíduos e outra próxima dos indivíduos e em competição com outras, não tenho dúvidas que prefiro a segunda.

Por outras palavras, o meu modelo de referência não está tanto nos EUA mas sim mais próximo da Suíça; e não deixa de ser inusitado que alguns europeus que gritam END THE FED sejam tão discretos e silenciosos em relação ao FED da Europa: o Banco Central Europeu.

Agora que se torna evidente que a saída do euro é uma solução real e que nem sequer depende tanto da vontade dos que desejam manter a moeda única, há cada vez mais vozes em Portugal a advogar esta saída como a única aceitável dadas as condições. A reacção contra estas vozes já se fez sentir, e vem de todos os quadrantes, inclusivamente de quadrantes liberais, especialmente por aqueles, como o João Mendes, que se denominam liberais (sociais) mas querem um Estado federal centralizado em Bruxelas que afasta o poder político dos indivíduos. Porém, outros liberais simplesmente estão, por princípio, contra desvalorizações monetárias e as suas consequências, como parece ser o caso deste texto do Miguel.

O argumento de ambos consiste nos perigos de entregar o controlo monetário ao governo português. O principal argumento que liga estas vozes críticas da saída do euro é que ao se sair do euro resolve-se a curto prazo o problema da competitividade em relação ao exterior mas desaparecem os incentivos para se liberalizar a economia, que é, suponho eu, o principal problema da economia portuguesa. Eu quero aqui desafiar este argumento.

O euro foi um dos grandes responsáveis pelo estado de endividamento a que chegamos. Só nos endividamos desta forma porque o Banco Central Europeu indirectamente injectou crédito barato no Estado português ao aceitar títulos de dívida pública como colateral para empréstimos a bancos comerciais. Isto sim, impediu que qualquer reforma liberal fosse feita internamente, fazendo com que o Estado pudesse subsidiar a improdutividade de inúmeras formas: empregos inúteis na função pública, distribuição de obras públicas para os “rent seekers”, etc… Com o euro (e antes disso com os fundos estruturais europeus) os empresários portugueses passaram a dedicar mais tempo ao “rent seeking” do que a investirem na produtividade. Retirar uma “renda” do Estado proveniente da impressão monetária do BCE passou a ser desporto nacional. Mesmo que Portugal entre em default (e vai entrar), não sair do euro significa apenas a perpetuação deste processo onde o crédito barato torna mais apetecível contrair dívida pública do que liberalizar (tal como até então). Isto só não aconteceria se os Estados decidissem impor limites ao endividamento, mas isto é tão improvável como o Woody Allen continuar a escrever um filme por ano até aos 200 anos.

Sobre os receios de entregar o controlo monetário ao governo português e voltar ao escudo, já o escrevi antes que, apesar de não ser ideal, está um degrau acima do que temos hoje em dia com o BCE. Eu percebia esta resistência contra a desvalorização monetária se a alternativa ao escudo fosse claramente melhor, mas não é. A alternativa à impressora de dinheiro português é a impressora do BCE. É importante lembrar o argumento do economista Philipp Bagus: os países como Portugal estiveram 10 anos a imprimir dinheiro indirectamente via bancos e BCE, mesmo sem terem a sua própria política monetária. Ademais, a única forma de o euro sobreviver nos actuais moldes (isto é, sem centralização fiscal em Bruxelas) é a impressão monetária que irá compensar todos os bancos vítimas dos defaults e irá salvar o próprio BCE detentor de milhares de títulos de dívida pública que irão “rebentar” quando os defaults inevitavelmente surgirem.

Consequentemente, dentro ou fora do euro a desvalorização irá ocorrer. A principal diferença é que saindo do euro ganhamos alguma vantagem competitiva e o acesso ao crédito por parte do Estado torna-se mais difícil, o que é uma excelente notícia para quem deseja liberalização na economia. Mas a principal vantagem das moedas em competição, em vez da moeda única emitida por um banco central europeu, é que a competição destas funciona como um “check” sobre a acção das “impressoras”, visto que as desvalorizações abusivas tornam-se muito mais evidentes ao grande público perante comparação imediata.

A proposta de lançar um escudo baseado no ouro e na prata em concorrência com o euro é interessante e provavelmente melhor do que sair apenas do euro, pois a longo prazo tal tornaria o BCE pouco relevante devido à disciplina a que seria obrigado. Contudo, não só esta proposta seria recebida com inúmeros anti-corpos políticos, mas também tem a desvantagem de não colocar um ponto final no projecto monetário europeu, sabendo-se que, pelo contrário, a saída de inúmeros países do euro provavelmente o faria.

Como alguém que está interessado em que o poder político esteja o mais próximo possível dos indivíduos, como alguém que vê na descentralização uma virtude, quando tenho de optar entre escolher entre uma impressora europeia centralizada e longe dos indivíduos e outra próxima dos indivíduos e em competição com outras, não tenho dúvidas que prefiro a segunda.

Por outras palavras, o meu modelo de referência não está tanto nos EUA mas sim mais próximo da Suíça; e não deixa de ser inusitado que alguns europeus que gritam END THE FED sejam tão discretos e silenciosos em relação ao FED da Europa: o Banco Central Europeu.

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