A retórica da avestruz

09-07-2011
marcar artigo

A Europa nos últimos anos tem vindo a consumir mais do que aquilo que produz. Com a crise do crédito que alimentava este consumo adicional, e com o mundo em desaceleração do crescimento, não há forma de contornar aquilo que é evidente: vamos mesmo ter de mudar de vida.

Mudar de vida significa desde logo que o Estado Social vai passar a ter de viver com aquilo que a sociedade produz hoje. Não há margem para que a solidariedade actual continue a ser feita parcialmente à custa dos recursos futuros: os défices vão deixar de ser uma opção nas mãos dos governos europeus; e vamos ter também de diminuir um pouco o recurso ao crédito, que vai provavelmente tornar-se marginalmente mais caro e selectivo.

Mudar de vida significa também que vamos ter de tornar os Estados menos consumidores de recursos, porque o “Modelo Social Europeu” só é viável, ipso facto, se as economias o suportarem. Só há lugar para políticas sociais na Europa na medida em que os nossos espaços económicos sejam competitivos, e claramente a Europa tem vindo a perder marginalmente competitividade. Ora, o nível da nossa fiscalidade está hoje desfasado da produtividade, e portanto há que libertar cidadãos, empresas e gerações futuras deste excesso de tributação. É também importante que no futuro a fiscalidade e os encargos sociais com o trabalho e a previdência alinhem com o nível de produtividade, o que significa, num cenário de défice 0, e pelo menos no médio prazo, que terá de haver uma redução do peso dos Estados e das suas prestações.

Mudar de vida significa ainda que num mundo mais complexo e incerto, temos de estar dispostos a assumir mais riscos, a viver num quadro de menor segurança, sem encararmos isso como uma tragédia ou uma fatalidade. Temos também de ser menos avessos à mudança e capazes de construir os nossos espaços de felicidade de uma forma distinta das gerações dos nossos pais. Temos ainda de ser mais exigentes nas nossas vidas e naquilo que esperamos dos outros.

Quem ouviu com atenção por estes dias Merkel, Cameron, ou os Ministros Luís Amado e Teixeira dos Santos percebe – se ainda não tinha percebido – que é um pouco isto o que nos está reservado. Na melhor das hipóteses, porque estes são os cenários mais benignos, e aqueles até que desenhando-se no horizonte com cores de exigência, ainda assim deixam em aberto um certo espaço para que alimentemos uma esperança não utópica. Nada garante porém que a Europa não descambe.

Nota final: Não tenho dedicado particular atenção a contrariar os disparates que continuam a ser ditos e escritos nos media e nos blogues que se limitam a repetir até à náusea as retóricas da avestruz, porque o tempo – e não falta muito – se vai encarregar de lhes provar quão gigante tem sido a sua indigência intelectual e incapacidade para perceber o que se está a passar.

A Europa nos últimos anos tem vindo a consumir mais do que aquilo que produz. Com a crise do crédito que alimentava este consumo adicional, e com o mundo em desaceleração do crescimento, não há forma de contornar aquilo que é evidente: vamos mesmo ter de mudar de vida.

Mudar de vida significa desde logo que o Estado Social vai passar a ter de viver com aquilo que a sociedade produz hoje. Não há margem para que a solidariedade actual continue a ser feita parcialmente à custa dos recursos futuros: os défices vão deixar de ser uma opção nas mãos dos governos europeus; e vamos ter também de diminuir um pouco o recurso ao crédito, que vai provavelmente tornar-se marginalmente mais caro e selectivo.

Mudar de vida significa também que vamos ter de tornar os Estados menos consumidores de recursos, porque o “Modelo Social Europeu” só é viável, ipso facto, se as economias o suportarem. Só há lugar para políticas sociais na Europa na medida em que os nossos espaços económicos sejam competitivos, e claramente a Europa tem vindo a perder marginalmente competitividade. Ora, o nível da nossa fiscalidade está hoje desfasado da produtividade, e portanto há que libertar cidadãos, empresas e gerações futuras deste excesso de tributação. É também importante que no futuro a fiscalidade e os encargos sociais com o trabalho e a previdência alinhem com o nível de produtividade, o que significa, num cenário de défice 0, e pelo menos no médio prazo, que terá de haver uma redução do peso dos Estados e das suas prestações.

Mudar de vida significa ainda que num mundo mais complexo e incerto, temos de estar dispostos a assumir mais riscos, a viver num quadro de menor segurança, sem encararmos isso como uma tragédia ou uma fatalidade. Temos também de ser menos avessos à mudança e capazes de construir os nossos espaços de felicidade de uma forma distinta das gerações dos nossos pais. Temos ainda de ser mais exigentes nas nossas vidas e naquilo que esperamos dos outros.

Quem ouviu com atenção por estes dias Merkel, Cameron, ou os Ministros Luís Amado e Teixeira dos Santos percebe – se ainda não tinha percebido – que é um pouco isto o que nos está reservado. Na melhor das hipóteses, porque estes são os cenários mais benignos, e aqueles até que desenhando-se no horizonte com cores de exigência, ainda assim deixam em aberto um certo espaço para que alimentemos uma esperança não utópica. Nada garante porém que a Europa não descambe.

Nota final: Não tenho dedicado particular atenção a contrariar os disparates que continuam a ser ditos e escritos nos media e nos blogues que se limitam a repetir até à náusea as retóricas da avestruz, porque o tempo – e não falta muito – se vai encarregar de lhes provar quão gigante tem sido a sua indigência intelectual e incapacidade para perceber o que se está a passar.

marcar artigo