Evitar o fim do mundo, um dia de cada vez

31-01-2013
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Sirince, na Turquia e Bugarach, em França. Duas pequenas vilas que saltaram para a boca do mundo nos últimos dias por serem o reduto para aqueles que procuram hoje escapar ao fim do Mundo.

Sirince, na Turquia e Bugarach, em França. Duas pequenas vilas que saltaram para a boca do mundo nos últimos dias por serem o reduto para aqueles que procuram hoje escapar ao fim do Mundo aproveitando a "energia positiva" que emanará destes locais. Gente vinda de todo o globo para saltar para uma última tábua de salvação, indiferente aos vários estudos e comentários que mostram que os Maias não pararam o calendário neste dia porque acharam que era o fim do Mundo, mas sim porque, convenhamos, para quem vivia por volta do século VIII, fazer um calendário até ao século XXI já dava alguma margem.

Assim se vê o poder dos discursos apocalípticos, na capacidade de levar as pessoas a seguir o caminho aparentemente único da salvação ignorando o resto. Discursos do "Fim do Mundo" são, aliás, coisa a que os europeus se habituaram nos últimos tempos, mas numa vertente "colapso financeiro". O fim da civilização não chegava em forma de bolas de fogo mas sim em algoritmos e sinais de subtrair. Menos espectacular em termos de imagem, não menos assustador. É certo que a coisa melhorou em relação a 2011, em que o Mundo estava pronto a desabar todas as semanas. Em 2012 o cenário dantesco passou a ser apenas mensal. Era o "Fim do Mundo" que estava iminente antes de cada uma das decisivas cimeiras europeias que, na maioria das vezes, resultaram em zero. Era o fim que se adivinhava se os bancos não fossem inundados de liquidez a preço de saldo. O apocalipse inevitável se os Estados europeus não embarcassem na austeridade com o mesmo fervor com que os crentes nas vilas de Bugarach e Sirince acreditam que a coisa não passa de hoje.

Em Portugal, o discurso do fim à vista também teve a sua utilidade. O Governo e as empresas soltaram os arautos da desgraça e foi carregar nos impostos (que senão é o "Fim do Mundo"), foi despedir a eito (senão o colapso, obviamente), foi atropelar direitos, esquecer deveres, porque com estas coisas do "Fim do Mundo" não se brinca.

Os portugueses habituaram-se de tal forma à perspectiva do colapso que, a existir uma versão portuguesa do calendário Maia, teria como data final 31 de Janeiro, dia em que a nova carga fiscal se irá revelar em toda a sua dimensão.

Mas nem tudo foi mau neste discurso. A perspectiva do fim obriga a um exame de consciência e levou os portugueses a arrepiar caminho e a procurar a redenção (financeira), cortando gastos desnecessários e repensando a poupança. O problema é que o discurso trágico é curto. Se a perspectiva da desgraça iminente facilita quando é preciso tomar decisões impopulares, não é menos certo que pouco faz para se criar algo novo.

Quem vai para as vilas de Bugarach e Sirince acredita na "energia positiva" como a estrada para a salvação. É isto que os responsáveis lusos e europeus têm de perceber quando olham para 2013. O que falta é alguém que diga que o Mundo não vai acabar. E como o mundo não acaba, temos projectos para fazer. Ao Governo português pede-se que pare de traçar metas tendo em vista a próxima avaliação da ‘troika' e que defina o rumo para a economia avançar de forma sustentável. Seja a explorar o mar, seja com um choque tecnológico, seja a vender novos calendários do "Fim do Mundo". O que é preciso é um rumo para seguir. À Europa pede-se que se aperceba que os ‘PIGS' já aprenderam a lição e que alivie as amarras da austeridade sob pena de condenar o Continente não ao colapso mas ao limbo. Que dê espaço para que se combata o cenário do fim, um dia de cada vez.

E claro, se tudo isso falhar, teremos sempre Bugarach e Sirince.

Sirince, na Turquia e Bugarach, em França. Duas pequenas vilas que saltaram para a boca do mundo nos últimos dias por serem o reduto para aqueles que procuram hoje escapar ao fim do Mundo.

Sirince, na Turquia e Bugarach, em França. Duas pequenas vilas que saltaram para a boca do mundo nos últimos dias por serem o reduto para aqueles que procuram hoje escapar ao fim do Mundo aproveitando a "energia positiva" que emanará destes locais. Gente vinda de todo o globo para saltar para uma última tábua de salvação, indiferente aos vários estudos e comentários que mostram que os Maias não pararam o calendário neste dia porque acharam que era o fim do Mundo, mas sim porque, convenhamos, para quem vivia por volta do século VIII, fazer um calendário até ao século XXI já dava alguma margem.

Assim se vê o poder dos discursos apocalípticos, na capacidade de levar as pessoas a seguir o caminho aparentemente único da salvação ignorando o resto. Discursos do "Fim do Mundo" são, aliás, coisa a que os europeus se habituaram nos últimos tempos, mas numa vertente "colapso financeiro". O fim da civilização não chegava em forma de bolas de fogo mas sim em algoritmos e sinais de subtrair. Menos espectacular em termos de imagem, não menos assustador. É certo que a coisa melhorou em relação a 2011, em que o Mundo estava pronto a desabar todas as semanas. Em 2012 o cenário dantesco passou a ser apenas mensal. Era o "Fim do Mundo" que estava iminente antes de cada uma das decisivas cimeiras europeias que, na maioria das vezes, resultaram em zero. Era o fim que se adivinhava se os bancos não fossem inundados de liquidez a preço de saldo. O apocalipse inevitável se os Estados europeus não embarcassem na austeridade com o mesmo fervor com que os crentes nas vilas de Bugarach e Sirince acreditam que a coisa não passa de hoje.

Em Portugal, o discurso do fim à vista também teve a sua utilidade. O Governo e as empresas soltaram os arautos da desgraça e foi carregar nos impostos (que senão é o "Fim do Mundo"), foi despedir a eito (senão o colapso, obviamente), foi atropelar direitos, esquecer deveres, porque com estas coisas do "Fim do Mundo" não se brinca.

Os portugueses habituaram-se de tal forma à perspectiva do colapso que, a existir uma versão portuguesa do calendário Maia, teria como data final 31 de Janeiro, dia em que a nova carga fiscal se irá revelar em toda a sua dimensão.

Mas nem tudo foi mau neste discurso. A perspectiva do fim obriga a um exame de consciência e levou os portugueses a arrepiar caminho e a procurar a redenção (financeira), cortando gastos desnecessários e repensando a poupança. O problema é que o discurso trágico é curto. Se a perspectiva da desgraça iminente facilita quando é preciso tomar decisões impopulares, não é menos certo que pouco faz para se criar algo novo.

Quem vai para as vilas de Bugarach e Sirince acredita na "energia positiva" como a estrada para a salvação. É isto que os responsáveis lusos e europeus têm de perceber quando olham para 2013. O que falta é alguém que diga que o Mundo não vai acabar. E como o mundo não acaba, temos projectos para fazer. Ao Governo português pede-se que pare de traçar metas tendo em vista a próxima avaliação da ‘troika' e que defina o rumo para a economia avançar de forma sustentável. Seja a explorar o mar, seja com um choque tecnológico, seja a vender novos calendários do "Fim do Mundo". O que é preciso é um rumo para seguir. À Europa pede-se que se aperceba que os ‘PIGS' já aprenderam a lição e que alivie as amarras da austeridade sob pena de condenar o Continente não ao colapso mas ao limbo. Que dê espaço para que se combata o cenário do fim, um dia de cada vez.

E claro, se tudo isso falhar, teremos sempre Bugarach e Sirince.

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