Pontos de Fuga

15-08-2015
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Pontos de Fuga

Posted on Fevereiro 28, 2007 by Adolfo Mesquita Nunes

José Sócrates e a lei pós referendo
A esquerda maioritária lá fez a sua “lei do aborto”, afastando da sua elaboração todos aqueles que, não fazendo parte da esquerda, aderiram ao voto “sim”. Nunca esperei que assim não fosse. Sempre disse que esperava coragem política de uma futura nova maioria para corrigir os erros da regulamentação que a esquerda seguramente aprovaria. Afinal de contas, votei “sim”, mas não sou de esquerda. Faz todo o sentido que discorde dos seus métodos e das densificações das suas opções genéricas.
É um facto que José Sócrates poderia ter optado por uma regulamentação mais consensual, integrando as vozes do “sim” que não partilham do seu socialismo. A questão é saber se ele tinha, na realidade, algum incentivo político para o fazer.

Ora, o referendo serviu para mostrar um José Sócrates de esquerda. Esse era um dos seus objectivos, de forma a neutralizar a colagem à direita que fazem das suas políticas. E para esse efeito, era essencial que PSD (absolutamente colado ao “não”) e CDS cometessem todos os erros que cometeram na campanha para o referendo.
Sabendo que a questão levada a referendo mexe com as profundas convicções do cidadão, e não com os arranjos partidários do costume, José Sócrates sabia que o “sim” se alargaria até à direita. E sabia que apareceriam nesta campanha, devidamente destacadas, vozes moderadas e insuspeitas de apoio ao “sim”. Mas também sabia, para proveito da sua estratégia, que CDS e PSD tudo fariam para desvalorizar e menorizar essas vozes. Ou seja, sabia que poderia contar com os dois partidos para ganhar com votos da direita, sem perder a imagem de esquerda. Perfeito, portanto.
Acaso o CDS e o PSD tivessem feito uma campanha diferente, sem colagem do “sim” à esquerda, sem menorização dos votos “transfugas” (que, em alguns casos, roçou a humilhação), as coisas poderiam hoje ser diferentes. Se acaso o CDS e o PSD se tivessem dispensado à apresentação de propostas de “sim” encapotado, esticando o “não” para além dos limites do aceitável e empurrando o “sim” muito mais para a esquerda, talvez José Sócrates tivesse hoje mais dificuldades em explicar a elaboração da nova lei.
O facto é que a esquerda saiu vitoriosa do referendo. E, ao contrário do que tanto soe dizer-se por aí, a culpa de tal vitória não foi dos moderados que votaram “sim”, mas da direita que insiste em não saber acolher tal moderação, de tal sorte que transformou este referendo numa verdadeira batalha entre esquerda e direita, aliás bem patente nas reacções pós-referendo.
Resulta de tudo isto que José Sócrates nada tem a ganhar com uma “lei do aborto” feita a par com os partidos da chamada direita. Antes pelo contrário.
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José Sócrates e a lei pós referendo
A esquerda maioritária lá fez a sua “lei do aborto”, afastando da sua elaboração todos aqueles que, não fazendo parte da esquerda, aderiram ao voto “sim”. Nunca esperei que assim não fosse. Sempre disse que esperava coragem política de uma futura nova maioria para corrigir os erros da regulamentação que a esquerda seguramente aprovaria. Afinal de contas, votei “sim”, mas não sou de esquerda. Faz todo o sentido que discorde dos seus métodos e das densificações das suas opções genéricas.
É um facto que José Sócrates poderia ter optado por uma regulamentação mais consensual, integrando as vozes do “sim” que não partilham do seu socialismo. A questão é saber se ele tinha, na realidade, algum incentivo político para o fazer.

Ora, o referendo serviu para mostrar um José Sócrates de esquerda. Esse era um dos seus objectivos, de forma a neutralizar a colagem à direita que fazem das suas políticas. E para esse efeito, era essencial que PSD (absolutamente colado ao “não”) e CDS cometessem todos os erros que cometeram na campanha para o referendo.
Sabendo que a questão levada a referendo mexe com as profundas convicções do cidadão, e não com os arranjos partidários do costume, José Sócrates sabia que o “sim” se alargaria até à direita. E sabia que apareceriam nesta campanha, devidamente destacadas, vozes moderadas e insuspeitas de apoio ao “sim”. Mas também sabia, para proveito da sua estratégia, que CDS e PSD tudo fariam para desvalorizar e menorizar essas vozes. Ou seja, sabia que poderia contar com os dois partidos para ganhar com votos da direita, sem perder a imagem de esquerda. Perfeito, portanto.
Acaso o CDS e o PSD tivessem feito uma campanha diferente, sem colagem do “sim” à esquerda, sem menorização dos votos “transfugas” (que, em alguns casos, roçou a humilhação), as coisas poderiam hoje ser diferentes. Se acaso o CDS e o PSD se tivessem dispensado à apresentação de propostas de “sim” encapotado, esticando o “não” para além dos limites do aceitável e empurrando o “sim” muito mais para a esquerda, talvez José Sócrates tivesse hoje mais dificuldades em explicar a elaboração da nova lei.
O facto é que a esquerda saiu vitoriosa do referendo. E, ao contrário do que tanto soe dizer-se por aí, a culpa de tal vitória não foi dos moderados que votaram “sim”, mas da direita que insiste em não saber acolher tal moderação, de tal sorte que transformou este referendo numa verdadeira batalha entre esquerda e direita, aliás bem patente nas reacções pós-referendo.
Resulta de tudo isto que José Sócrates nada tem a ganhar com uma “lei do aborto” feita a par com os partidos da chamada direita. Antes pelo contrário.
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