Foi você que disse anti-semitismo?

07-11-2013
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Marta Almeida, no comentário ao meu post de estreia nesta casa, diz que só posso ser nazi ou fundamentalista islâmico. Felizmente que o “ser” não se esgota no “poder ser” da Marta. Não sou nem uma coisa, nem outra. Ateu militante em religião, comunista em política, clássico em arte. Mas nominalismos à parte, a Marta usa, mesmo que implicitamente, um argumento que importa discutir.

Não é inocente que os termos “nazi” e “fundamentalista islâmico” apareçam assim associados, tentando passar por natural ou óbvia essa ligação que, basta pensar um pouco, é tudo menos clara. O primeiro nome, nazi, remete para a acusação de anti-semitismo a quem se opõe à política do Estado de Israel. O segundo pressupõe que os que se opõem a Israel só podem ser apoiantes dos movimentos radicais islâmicos. Em ambos os casos, a tomada de posição política transforma-se numa forma de confronto cultural ou racial. O que move os opositores de Israel ou é o ódio racial, o anti-semitismo, ou a identificação com uma forma de extremismo religioso. Este tentativa de evacuar da discussão do conflito a política para a instalar no campo das acusações de racismo e de fundamentalismo convém, como é óbvio, aos acusadores. Joga com a culpa dos europeus em relação ao extermínio nazi dos Judeus da Europa, e também com a associação fundamentalismo islâmico-terrorismo, desqualificando o adversário e evitando a espinhosa tarefa de defender politicamente Israel. Compreendo-os, não é de facto fácil defender o indefensável.

O problema da acusação é que se esgota nela própria, não tendo outra base de sustentação que não a atribuição ao outro lado de uma intenção. Ele diz que é contra a ocupação Israelita, contra a instalação de colonatos, contra a prática de assassinatos selectivos, contra a forma policial como Israel se relaciona com as autoridades palestinianas, contra a proibição do regresso dos refugiados à terra de onde foram brutalmente expulsos…. mas, embora, não o diga, o que o move é o ódio aos Judeus. Assim vai o argumento. Mas a atribuição de uma intenção ao opositor tem de ter algo mais na sua base do que a conveniência do acusador. O facto de alguém ter apoiado os movimentos de libertação das ex-colónias faz dele um anti-português? Ser a favor da independência do Sahara Ocidental faz de alguém um anti-árabe?

É claro que isto não quer dizer que não haja anti-semitismo entre os opositores a Israel. E Mahmoud Ahmadinejad tem-se esforçado por dar argumentos a favor da tese do anti-semitismo aos defensores de Israel, ao promover colóquios onde se expõem teses negacionistas do genocídio nazi. São posições em relação às quais temos de estar vigilantes e que há que combater energicamente. Não é com manipulações historiográficas que se defende o povo palestiniano, e a oposição à repressão estatal israelita não pode justificar formas de aviltamento subsidiárias do racismo anti-semita. Há que ser intransigente na condenação dos crimes do Nazi-fascismo, bem como de todas as formas de opressão colectiva, como aquela de que os palestinianos são vítimas. E evitar substancializar povos ou etnias atribuindo-lhes um destino colectivo transcendente.

Retirar a discussão da religião e da cultura e colocá-la onde se deve: no plano da história e da política. Esta directiva, do mais banal senso comum, torna a discussão mais difícil do que simplesmente acusar o adversário de esconder intenções racistas, mesmo que nada mais aponte para isso. O ridículo vai ao ponto de se acusar a esquerda, em geral, de tender para o anti-semitismo, devido à s suas críticas a Israel, mesmo quando as críticas são colocadas em termos universalistas, como “opressão”, “desíquilíbrio de forças”, “abuso de poder”, etc. Há cerca de dois anos falei com uma pessoa que defendia convictamente que os textos do Miguel Sousa Tavares a criticar Israel (bem tímidos, por sinal) eram anti-semitas. E defendia que hoje o anti-semitismo não vinha maioritariamente da extrema-direita, mas sim da extrema esquerda. Mesmo que a extrema-esquerda nunca acuse “os judeus”, mas sim Israel, ao contrário da extrema-direita, que faz questão de racializar sempre as questões.

Estes argumentos serão sempre recorrentes enquanto durar o conflito. Têm como único objectivo desligitimar qualquer crítica ao Estado de Israel e às suas políticas. Todas as críticas a Israel, como a qualquer Estado, são legítimas. E ninguém tem o direito de acusar de racista quem assim critica.

Marta Almeida, no comentário ao meu post de estreia nesta casa, diz que só posso ser nazi ou fundamentalista islâmico. Felizmente que o “ser” não se esgota no “poder ser” da Marta. Não sou nem uma coisa, nem outra. Ateu militante em religião, comunista em política, clássico em arte. Mas nominalismos à parte, a Marta usa, mesmo que implicitamente, um argumento que importa discutir.

Não é inocente que os termos “nazi” e “fundamentalista islâmico” apareçam assim associados, tentando passar por natural ou óbvia essa ligação que, basta pensar um pouco, é tudo menos clara. O primeiro nome, nazi, remete para a acusação de anti-semitismo a quem se opõe à política do Estado de Israel. O segundo pressupõe que os que se opõem a Israel só podem ser apoiantes dos movimentos radicais islâmicos. Em ambos os casos, a tomada de posição política transforma-se numa forma de confronto cultural ou racial. O que move os opositores de Israel ou é o ódio racial, o anti-semitismo, ou a identificação com uma forma de extremismo religioso. Este tentativa de evacuar da discussão do conflito a política para a instalar no campo das acusações de racismo e de fundamentalismo convém, como é óbvio, aos acusadores. Joga com a culpa dos europeus em relação ao extermínio nazi dos Judeus da Europa, e também com a associação fundamentalismo islâmico-terrorismo, desqualificando o adversário e evitando a espinhosa tarefa de defender politicamente Israel. Compreendo-os, não é de facto fácil defender o indefensável.

O problema da acusação é que se esgota nela própria, não tendo outra base de sustentação que não a atribuição ao outro lado de uma intenção. Ele diz que é contra a ocupação Israelita, contra a instalação de colonatos, contra a prática de assassinatos selectivos, contra a forma policial como Israel se relaciona com as autoridades palestinianas, contra a proibição do regresso dos refugiados à terra de onde foram brutalmente expulsos…. mas, embora, não o diga, o que o move é o ódio aos Judeus. Assim vai o argumento. Mas a atribuição de uma intenção ao opositor tem de ter algo mais na sua base do que a conveniência do acusador. O facto de alguém ter apoiado os movimentos de libertação das ex-colónias faz dele um anti-português? Ser a favor da independência do Sahara Ocidental faz de alguém um anti-árabe?

É claro que isto não quer dizer que não haja anti-semitismo entre os opositores a Israel. E Mahmoud Ahmadinejad tem-se esforçado por dar argumentos a favor da tese do anti-semitismo aos defensores de Israel, ao promover colóquios onde se expõem teses negacionistas do genocídio nazi. São posições em relação às quais temos de estar vigilantes e que há que combater energicamente. Não é com manipulações historiográficas que se defende o povo palestiniano, e a oposição à repressão estatal israelita não pode justificar formas de aviltamento subsidiárias do racismo anti-semita. Há que ser intransigente na condenação dos crimes do Nazi-fascismo, bem como de todas as formas de opressão colectiva, como aquela de que os palestinianos são vítimas. E evitar substancializar povos ou etnias atribuindo-lhes um destino colectivo transcendente.

Retirar a discussão da religião e da cultura e colocá-la onde se deve: no plano da história e da política. Esta directiva, do mais banal senso comum, torna a discussão mais difícil do que simplesmente acusar o adversário de esconder intenções racistas, mesmo que nada mais aponte para isso. O ridículo vai ao ponto de se acusar a esquerda, em geral, de tender para o anti-semitismo, devido à s suas críticas a Israel, mesmo quando as críticas são colocadas em termos universalistas, como “opressão”, “desíquilíbrio de forças”, “abuso de poder”, etc. Há cerca de dois anos falei com uma pessoa que defendia convictamente que os textos do Miguel Sousa Tavares a criticar Israel (bem tímidos, por sinal) eram anti-semitas. E defendia que hoje o anti-semitismo não vinha maioritariamente da extrema-direita, mas sim da extrema esquerda. Mesmo que a extrema-esquerda nunca acuse “os judeus”, mas sim Israel, ao contrário da extrema-direita, que faz questão de racializar sempre as questões.

Estes argumentos serão sempre recorrentes enquanto durar o conflito. Têm como único objectivo desligitimar qualquer crítica ao Estado de Israel e às suas políticas. Todas as críticas a Israel, como a qualquer Estado, são legítimas. E ninguém tem o direito de acusar de racista quem assim critica.

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