A História Do Bloco De Esquerda Contada Por Um Dos Seus

08-04-2015
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Podemos tentar romanceá-la ou meramente olhá-la com objectividade, maior se for de fora. Daniel Oliveira tenta reescrevê-la a partir do seu ponto de vista, de protagonista disfarçado de observador, sendo que ambos estão comprometidos com uma das leituras dos factos.

O texto que escreve no jornal que mais fez pela ascensão e queda do Bloco é interessante pelas deformações do olhar que contém. Pode ser «escrito por alguém que esteve profundamente envolvido na sua fundação, que foi seu dirigente e que é seu militante», mas essas tanto são as suas vantagens quanto limitações.

A efabulação sobre os objectivos originais do Bloco esbarra com aquilo que um observador não comprometido, mas não desinteressado ou totalmente desconhecedor, conclui com alguma facilidade: existia um partido de esquerda radical com uma razoável estrutura de bases (UDP), mas sem grandes figuras apelativas para o eleitorado, ao mesmo tempo que existia outro partido da esquerda radical com bastantes individualidades mas escassa implantação no terreno, em especial fora de algumas avenidas de Lisboa e, quiçá, de uma ou outra cidade do continente (Setúbal, Porto). A juntar a isto existiam ainda uns farrapos de dissidências diversas e grupos com nomes giros criados para manter alguns nomes no radar mediático (Ruptura-FER, Política XXI).

Deste cozinhado algo desconchavado de sabores muitos diversos e por vezes conflituantes, quis fazer-se algo como uma harmonioso cassoulet ou (para quem preferir peixe) um bouillabaisse, isto para ser fiel à matriz francófona desta espécie de esquerda nova que não era bem uma New Left, até porque os ingleses fazem revistas boas de extrema esquerda, mas fracassam bastante em partidos. Num momento mais inspirado, poderia ser uma boa sopa da pedra de Almeirim, mas num mau um amontoado de ingredientes sem grande sentido.

Daniel Oliveira pode mitificar as origens, afirmando que «resumir o Bloco a uma aliança de grupos de extrema-esquerda não é apenas uma caricatura. Torna impossível a compreensão das suas dinâmicas internas e das suas grandes opções políticas.» Só que impossível é compreender as grandes opções políticas de quem defendia vias diametralmente opostas para objectivos não necessariamente concordantes.

Teve graça, teve amplificação mediática muito favorável, inchou eleitoralmente e, com o tempo, manteve designações diferentes, mas tornou-se mais igual aos outros partidos na forma de agir, com uma ortodoxia, uma disciplina política, uma forma interessante de purgar inconveniências ou as manter afastadas dos círculos de decisão e uma crescente pessoalização da liderança.

O que inchou, desinchou por erros próprios, desfavores alheios, remoques pessoais e porque as coisas são o que são. Cachorros e gatos podem dar-se bem, mas o mais certo é que isso não aconteça, em especial quando a comidinha falta.

O que falha na explicação das origens gloriosas (de que se afirma protagonista), é acertado no diagnóstico dos males seguintes (nos quais não participou). Daniel Oliveira apresenta um passado dourado que ajudou a construir e um presente sombrio, causado em parte pelo afastamento daqueles que, como ele, se arrogam da tocha original.

Mas a verdade, a dura verdade, é apenas uma e a ela também lá chegamos mais perto do final do texto. Há uma opção a fazer: ou o Bloco é um partido de protesto, uma espécie de consciência da esquerda e deverá saber lidar com um peso eleitoral menos significativo ou o Bloco se assume como um partido capaz de fazer pontes para chegar ao poder executivo.

Obviamente, Daniel Oliveira opta pela segunda hipótese.

O papel do Bloco é ocupar um espaço amplo na esquerda, que não se revê nem na ortodoxia do PCP, nem na moleza do PS, mas que quer um Bloco disponível para soluções de poder. Foi essa esperança que levou o Bloco aos dez por cento e que o poderia ter levado ainda mais longe.

Resumindo. Daniel Oliveira poderia ter sintetizado o seu longo e didáctico artigo em poucas frases, a última das quais seria: «o Bloco foi criado para ser um partido de Poder e não de protesto».

É isso que é evidente para quem, como eu, viu o Bloco nascer de fora, mas perto de um dos núcleos jovens do então imaginativo PSR: a FCSH da Nova na segunda metade dos anos 80 e inícios dos anos 90. E que conhecia, pela proximidade, como funcionava a UDP num dos seus terrenos mais férteis. A margem sul.

O que esteve sempre em causa foi ganhar posições, lugares, Poder. Político, académico, cultural, mediático.

Ganhar Poder.

Podemos tentar romanceá-la ou meramente olhá-la com objectividade, maior se for de fora. Daniel Oliveira tenta reescrevê-la a partir do seu ponto de vista, de protagonista disfarçado de observador, sendo que ambos estão comprometidos com uma das leituras dos factos.

O texto que escreve no jornal que mais fez pela ascensão e queda do Bloco é interessante pelas deformações do olhar que contém. Pode ser «escrito por alguém que esteve profundamente envolvido na sua fundação, que foi seu dirigente e que é seu militante», mas essas tanto são as suas vantagens quanto limitações.

A efabulação sobre os objectivos originais do Bloco esbarra com aquilo que um observador não comprometido, mas não desinteressado ou totalmente desconhecedor, conclui com alguma facilidade: existia um partido de esquerda radical com uma razoável estrutura de bases (UDP), mas sem grandes figuras apelativas para o eleitorado, ao mesmo tempo que existia outro partido da esquerda radical com bastantes individualidades mas escassa implantação no terreno, em especial fora de algumas avenidas de Lisboa e, quiçá, de uma ou outra cidade do continente (Setúbal, Porto). A juntar a isto existiam ainda uns farrapos de dissidências diversas e grupos com nomes giros criados para manter alguns nomes no radar mediático (Ruptura-FER, Política XXI).

Deste cozinhado algo desconchavado de sabores muitos diversos e por vezes conflituantes, quis fazer-se algo como uma harmonioso cassoulet ou (para quem preferir peixe) um bouillabaisse, isto para ser fiel à matriz francófona desta espécie de esquerda nova que não era bem uma New Left, até porque os ingleses fazem revistas boas de extrema esquerda, mas fracassam bastante em partidos. Num momento mais inspirado, poderia ser uma boa sopa da pedra de Almeirim, mas num mau um amontoado de ingredientes sem grande sentido.

Daniel Oliveira pode mitificar as origens, afirmando que «resumir o Bloco a uma aliança de grupos de extrema-esquerda não é apenas uma caricatura. Torna impossível a compreensão das suas dinâmicas internas e das suas grandes opções políticas.» Só que impossível é compreender as grandes opções políticas de quem defendia vias diametralmente opostas para objectivos não necessariamente concordantes.

Teve graça, teve amplificação mediática muito favorável, inchou eleitoralmente e, com o tempo, manteve designações diferentes, mas tornou-se mais igual aos outros partidos na forma de agir, com uma ortodoxia, uma disciplina política, uma forma interessante de purgar inconveniências ou as manter afastadas dos círculos de decisão e uma crescente pessoalização da liderança.

O que inchou, desinchou por erros próprios, desfavores alheios, remoques pessoais e porque as coisas são o que são. Cachorros e gatos podem dar-se bem, mas o mais certo é que isso não aconteça, em especial quando a comidinha falta.

O que falha na explicação das origens gloriosas (de que se afirma protagonista), é acertado no diagnóstico dos males seguintes (nos quais não participou). Daniel Oliveira apresenta um passado dourado que ajudou a construir e um presente sombrio, causado em parte pelo afastamento daqueles que, como ele, se arrogam da tocha original.

Mas a verdade, a dura verdade, é apenas uma e a ela também lá chegamos mais perto do final do texto. Há uma opção a fazer: ou o Bloco é um partido de protesto, uma espécie de consciência da esquerda e deverá saber lidar com um peso eleitoral menos significativo ou o Bloco se assume como um partido capaz de fazer pontes para chegar ao poder executivo.

Obviamente, Daniel Oliveira opta pela segunda hipótese.

O papel do Bloco é ocupar um espaço amplo na esquerda, que não se revê nem na ortodoxia do PCP, nem na moleza do PS, mas que quer um Bloco disponível para soluções de poder. Foi essa esperança que levou o Bloco aos dez por cento e que o poderia ter levado ainda mais longe.

Resumindo. Daniel Oliveira poderia ter sintetizado o seu longo e didáctico artigo em poucas frases, a última das quais seria: «o Bloco foi criado para ser um partido de Poder e não de protesto».

É isso que é evidente para quem, como eu, viu o Bloco nascer de fora, mas perto de um dos núcleos jovens do então imaginativo PSR: a FCSH da Nova na segunda metade dos anos 80 e inícios dos anos 90. E que conhecia, pela proximidade, como funcionava a UDP num dos seus terrenos mais férteis. A margem sul.

O que esteve sempre em causa foi ganhar posições, lugares, Poder. Político, académico, cultural, mediático.

Ganhar Poder.

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