Da Literatura: DONA JURUBINDA

21-05-2009
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Uma leitora que assina Jurubinda da Concavada manifestou por correio electrónico a sua indignação: «Lendo-o, parece que quer acabar com o Ministério da Cultura.» Prezada Jurubinda, se me tivesse lido com atenção nos 21 meses que levo de bloga teria percebido quanto o ministério da Cultura me parece uma excrescência. Não vou perder tempo com remissões, tenho mais que fazer, mas foram sem conta as vezes em que expliquei por A+B quanto o ministério da Cultura — não o actual, naturalmente; todos, sem excepção — é um adereço fútil, caro e extravagante à democracia. Talvez seja necessário na Coreia do Norte, em Cuba ou no Zimbábue. Aqui, não. E não me venha com o exemplo da França porque a França não serve de exemplo para coisa nenhuma (excepto, para quem pode, para a douceur de vivre...). A Jurubinda acha “admirável” a ideia do Museu do Mar da Língua. Nem por um momento lhe ocorre que é mais um a juntar aos vários que este ministério tem na calha. Está com certeza lembrada da prometida extensão do Ermitage. Pois é. E mais obras de ampliação no Museu do Chiado; a transferência em curso do Museu do Design do CCB para um palacete do Alto de Santa Catarina — li algures que as obras de adaptação exigem para cima de 50 milhões de euros, a suportar, em parte, pela autarquia —; o projectado “espaço da multiculturalidade” que vai custar uma pipa de massa e roubar espaço às dezenas de milhares de utentes da Estação do Rossio; e por aí fora. A cada quinze dias a gente ouve falar de um novo museu. Tudo à conta do orçamento do Estado. Era muito bonito se fossemos ricos. Mas não somos. O OGE 2007 que hoje dá entrada na Assembleia da República é o primeiro em 32 anos de democracia a cortar na despesa. Em nome da decência, o Estado devia prescindir de certos ademanes. No momento em que o Estado se prepara para accionar os mecanismos de mobilidade do funcionalismo público, bem como para introduzir taxas moderadoras no internamento hospitalar, duas medidas infelizmente necessárias, o ministério da Cultura é um ademane absolutamente dispensável. Nada tenho contra Isabel Pires de Lima, com quem de resto mantenho relações cordiais. Sucede que por este caminho ninguém pode levar a austeridade a sério. Ainda esta manhã se soube que a ministra da Cultura está disposta a mediar o diferendo que opõe a Câmara do Porto aos manifestantes barricados (desde ontem) no Teatro Rivoli. Mas a ministra não responde perante a comunidade artística da Invicta. A ministra responde perante o país. Dito isto, e dando de barato o evidente conflito de interesses — o governo não deve intervir na esfera da autarquia nem chamar a si um caso de polícia —, é caso para dizer que a ministra tem uma noção de “serviço público” extremamente selectiva. Então se em 2007, como consequência dos cortes orçamentais, a Festa da Música do CCB vai, na melhor das hipóteses, ficar reduzida a saraus de coreto (a hipótese de acabar não está posta de parte), como é que um membro do governo pode “exigir” o que quer que seja em matéria de gestão de espaços públicos sob tutela autárquica? Exigir serviço público a terceiros? E o serviço público que o ministério da Cultura é suposto assegurar? Ora aí está uma coisa que não esperava deste governo. E só o decoro me abstém de classificar.

Uma leitora que assina Jurubinda da Concavada manifestou por correio electrónico a sua indignação: «Lendo-o, parece que quer acabar com o Ministério da Cultura.» Prezada Jurubinda, se me tivesse lido com atenção nos 21 meses que levo de bloga teria percebido quanto o ministério da Cultura me parece uma excrescência. Não vou perder tempo com remissões, tenho mais que fazer, mas foram sem conta as vezes em que expliquei por A+B quanto o ministério da Cultura — não o actual, naturalmente; todos, sem excepção — é um adereço fútil, caro e extravagante à democracia. Talvez seja necessário na Coreia do Norte, em Cuba ou no Zimbábue. Aqui, não. E não me venha com o exemplo da França porque a França não serve de exemplo para coisa nenhuma (excepto, para quem pode, para a douceur de vivre...). A Jurubinda acha “admirável” a ideia do Museu do Mar da Língua. Nem por um momento lhe ocorre que é mais um a juntar aos vários que este ministério tem na calha. Está com certeza lembrada da prometida extensão do Ermitage. Pois é. E mais obras de ampliação no Museu do Chiado; a transferência em curso do Museu do Design do CCB para um palacete do Alto de Santa Catarina — li algures que as obras de adaptação exigem para cima de 50 milhões de euros, a suportar, em parte, pela autarquia —; o projectado “espaço da multiculturalidade” que vai custar uma pipa de massa e roubar espaço às dezenas de milhares de utentes da Estação do Rossio; e por aí fora. A cada quinze dias a gente ouve falar de um novo museu. Tudo à conta do orçamento do Estado. Era muito bonito se fossemos ricos. Mas não somos. O OGE 2007 que hoje dá entrada na Assembleia da República é o primeiro em 32 anos de democracia a cortar na despesa. Em nome da decência, o Estado devia prescindir de certos ademanes. No momento em que o Estado se prepara para accionar os mecanismos de mobilidade do funcionalismo público, bem como para introduzir taxas moderadoras no internamento hospitalar, duas medidas infelizmente necessárias, o ministério da Cultura é um ademane absolutamente dispensável. Nada tenho contra Isabel Pires de Lima, com quem de resto mantenho relações cordiais. Sucede que por este caminho ninguém pode levar a austeridade a sério. Ainda esta manhã se soube que a ministra da Cultura está disposta a mediar o diferendo que opõe a Câmara do Porto aos manifestantes barricados (desde ontem) no Teatro Rivoli. Mas a ministra não responde perante a comunidade artística da Invicta. A ministra responde perante o país. Dito isto, e dando de barato o evidente conflito de interesses — o governo não deve intervir na esfera da autarquia nem chamar a si um caso de polícia —, é caso para dizer que a ministra tem uma noção de “serviço público” extremamente selectiva. Então se em 2007, como consequência dos cortes orçamentais, a Festa da Música do CCB vai, na melhor das hipóteses, ficar reduzida a saraus de coreto (a hipótese de acabar não está posta de parte), como é que um membro do governo pode “exigir” o que quer que seja em matéria de gestão de espaços públicos sob tutela autárquica? Exigir serviço público a terceiros? E o serviço público que o ministério da Cultura é suposto assegurar? Ora aí está uma coisa que não esperava deste governo. E só o decoro me abstém de classificar.

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