ABRUPTO

23-06-2009
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INTEND�NCIA

Parece, sublinho, parece, que os problemas de migra��o dos computadores v�o ser resolvidos, sem qualquer recurso � ajuda e assist�ncia da HP. A solu��o veio-me dos leitores do Abrupto que j� tinham tido que resolver problemas id�nticos, tamb�m sem qualquer ajuda da HP, revelando s�rias incompatibilidades da instala��o original do software feita pelo fabricante. � uma solu��o trabalhosa e com outro tipo de dificuldades, mas que me parecem (talvez) mais f�ceis de resolver. Seja como for, se acabar por ficar com o computador, este ser� o �ltimo HP que compro.

Em breve darei pormenores. Parece, sublinho, parece, que os problemas de migra��o dos computadores v�o ser resolvidos, sem qualquer recurso � ajuda e assist�ncia da HP. A solu��o veio-me dos leitores do Abrupto que j� tinham tido que resolver problemas id�nticos, tamb�m sem qualquer ajuda da HP, revelando s�rias incompatibilidades da instala��o original do software feita pelo fabricante. � uma solu��o trabalhosa e com outro tipo de dificuldades, mas que me parecem (talvez) mais f�ceis de resolver. Seja como for, se acabar por ficar com o computador, este ser� o �ltimo HP que compro.Em breve darei pormenores.

EARLY MORNING BLOGS

806 -" I bear a burden that might well try / Men that do all by rule"

Two Songs Of A Fool (I)

A speckled cat and a tame hare

Eat at my hearthstone

And sleep there;

And both look up to me alone

For learning and defence

As I look up to Providence.

I start out of my sleep to think

Some day I may forget

Their food and drink;

Or, the house door left unshut,

The hare may run till it's found

The horn's sweet note and the tooth of the hound.

I bear a burden that might well try

Men that do all by rule,

And what can I

That am a wandering-witted fool

But pray to God that He ease

My great responsibilities?

(William Butler Yeats)

*

Bom dia! (William Butler Yeats)Bom dia!

A �NICA OPOSI��O POSS�VEL � A LIBERAL

Estamos num desses momentos em que mais � necess�ria pol�tica no espa�o p�blico, e o que acontece � o contr�rio, ela praticamente n�o existe, obscurecida por uma mistura anestesiante de circo, de conveni�ncias, falsos consensos e maus h�bitos do poder. N�o havendo cr�tica nem altern�ncia, gera-se um feito de obscuridade, n�o havendo �nimo cr�tico, o espa�o p�blico mirra.

Os tempos que vivemos recordam-me, e a mem�ria � uma maldi��o, de outro tempo recente muito semelhante: os primeiros anos do engenheiro Guterres. Nesses anos de gl�ria, quando o engenheiro apesar de n�o ter maioria absoluta governava como se a tivesse, era um esc�ndalo suscitar d�vidas, interroga��es, cr�ticas ao seu magn�fico desempenho. Lembro-me de ter escrito ent�o que me sentia uma esp�cie de ET quando mesmo os meus mais pr�ximos me diziam que era imposs�vel criticar Guterres. Havia dinheiro por todo o lado, a bolsa dava, a cada pequena esquina uma pequena fortuna, todos estavam felizes.

Hoje sabemos que muitos dos erros tr�gicos, que se est�o a pagar caro uma d�cada depois, foram cometidos nessa altura, quando uma excepcional conjuntura favor�vel nos dava a �ltima oportunidade de arrancar e a malbaratamos sem resultados. O governo de Guterres � hoje visto como a grande "oportunidade perdida", mas quem o percebeu e disse na altura? Contavam-se pelos dedos de uma s� m�o os cr�ticos do engenheiro, isolados e ignorados, pelo mesmo "consenso" que hoje considera o seu governo um desastre. � assim e continuar� a ser - em Portugal quando um consenso de rebanho, entre elites, pol�ticos e jornalistas, se instala, tem muita for�a, abafa quase tudo.

Hoje passa-se o mesmo, com a grande diferen�a que estamos em tempo de vacas magras e o Governo, em vez de nos prometer abund�ncia, promete-nos dificuldades. � interessante verificar que � exactamente esta diferen�a que alicer�a o consenso de hoje, com a mesma for�a acr�tica do consenso do passado. O consenso assenta na ideia de que o pa�s est� mal e de que o Governo defronta esses males com coragem, pelo que merece o abater de todos os pend�es. Muito pouca gente se pergunta se n�o era poss�vel n�o apenas fazer melhor, mas fazer muito diferente e se essa diferen�a faz, afinal, toda a diferen�a. Banhados em milhares horas de circo e gladiadores, na anomia generalizada de todos a fazerem a sua vidinha como se nada fosse, e no escapismo, who cares ?

Como � que se chegou aqui? Pela combina��o da vit�ria de duas pessoas, Manuela Ferreira Leite e Jos� S�crates. Num certo sentido, Manuel Ferreira Leite � a grande vencedora pol�tica da actualidade. Com a ironia habitual da hist�ria, para se ver a sua raz�o, foi necess�ria a sua queda e a do governo que se preparava para a afastar do cargo, por pensar que queria mais vida para al�m do d�fice. Tamb�m o governo que se lhe seguiu queria dar mais folga aos portugueses e descobriu uma "retoma" que nunca houve. Ambos, Dur�o Barroso e Santana Lopes, com o PSD profundo �s palmas, queriam ver-se livre da "antip�tica" ministra que lhes dava cabo das sondagens. Mas Manuela Ferreira Leite tinha convencido os portugueses a aceitar sacrif�cios para p�r a casa em ordem e, como estes desconfiavam das facilidades e da compet�ncia que Santana Lopes lhes prometia, foi procurar no outro lado, no PS.

S�crates apanhou a boleia desta ideia da necessidade de austeridade que o PS e ele pr�prio tanto tinham criticado. Ele come�ou a falar a linguagem apropriada ao sentimento da opini�o p�blica que Manuela Ferreira Leite lhe tinha deixado. Como se apercebeu de imediato, isso tinha sucesso e ele conseguiu um consenso legitimador que se estende muito para al�m do PS. Com condi��es pol�ticas excepcionais, maioria absoluta de um s� partido, fragilidade extrema da oposi��o e agora um Presidente "cooperador", aproveitou com perfei��o o "ar do tempo", revelando o seu estilo desde o primeiro minuto. O seu governo tem feito algumas coisas bem, mas n�o � o governo que serve para defrontar os problemas com que Portugal se defronta. Esta percep��o refor�a-se todos os dias e s� a acefalia actual do espa�o p�blico tem deixado sem discuss�o medidas sobre medidas, sempre apresentadas, inclusive pela comunica��o social, como inevit�veis. Eu, como j� vi muitas coisas "inevit�veis" serem evitadas, como por exemplo a Constitui��o europeia, pouco me conformo com este ambiente de inevitabilidade.

Pode-se, sobre o governo S�crates, fazer dois tipos de cr�ticas: ou dizer que faz bem mas faz pouco (que � a linha que de alguma maneira a pr�pria Manuela Ferreira Leite sugeriu no congresso do PSD); ou entender que o que � necess�rio � fazer de outro modo, muito diferente. S� haver� verdadeira oposi��o quando se combinarem os dois termos, com preponder�ncia do segundo.

Os n�o socialistas esquecem-se muitas vezes de que S�crates � socialista, ou seja, acredita no Estado como protector e corrector social, n�o concebe vida fora de um jacobinismo econ�mico, social e cultural deslavado e modernizado, que � o socialismo dos dias de hoje. Acrescenta a isso um remake de positivismo cientista, crendo com deslumbramento que as tecnologias mudam a sociedade e n�o vice-versa, como se percebe no chamado "choque tecnol�gico", investindo-se em tecnologias de ponta sem se cuidar das literacias necess�rias ao seu uso.

O que S�crates tem feito � defrontar a crise do Estado-provid�ncia propondo rem�dios que atrasam o seu colapso. N�o o p�e em causa, nem contesta a sua forma, concorda com ele por raz�es ideol�gicas. V�rias vezes afirmou que essas medidas de austeridade t�m como objectivo �ltimo garantir a "seguran�a social" para os portugueses e, com uma oposi��o que n�o contesta o essencial da sua atitude, faz o mal e a caramunha, ou seja, governa como governaram Barroso e Lopes e, mesmo aos olhos de muitos opositores do PS, com a vantagem de o fazer melhor do que os seus imediatos antecessores sociais-democratas.

Ora, que eu saiba, n�o foi Deus que fez o Estado-provid�ncia, nem a Hist�ria chegou ao fim com ele. Foram os homens, numa �poca, numa circunst�ncia, em determinadas partes do mundo. Resultou, como todas as coisas na sociedade, de uma complexa interac��o entre interesses e vontades, entre conflitos sociais e decis�es pol�ticas. Adequou-se �s sociedades europeias do p�s-guerra, geradas pelo Plano Marshall e pela integra��o europeia e beneficiando das circunst�ncias excepcionais de n�o terem de fazer avultadas despesas militares, porque estavam cobertas pelo guarda-chuva nuclear americano. S� que esse mundo acabou e acabou de vez e poucas d�vidas me sobram de que, mantendo os seus fundamentos iniciais e program�ticos, n�o se far� outra coisa do que gerir nas pr�ximas d�cadas o empobrecimento e as tens�es sociais em Portugal e na Europa, sempre presos nas mesmas pol�ticas de esticar at� ao limite o "modelo social", deixando para as gera��es futuras uma heran�a cada vez mais inger�vel.

H� alternativas a esta pol�tica dos socialistas e elas podem ser socialmente muito mais justas do que as pol�ticas actuais. As medidas de austeridade que o Governo est� a tentar implementar, t�midas mas mesmo assim passos de gigante em rela��o aos governos anteriores, apenas adiam a crise estrutural do Estado-provid�ncia e t�m custos muito mais gravosos para os mais pobres do que para os ricos. Mais: a seguir-se esta pol�tica, a crise tornar-se-� end�mica e, com intervalos de pequenos surtos de prosperidade, continuar-se-� a ter de pedir novos sacrif�cios e o problema de fundo permanecer� na mesma. Por isso, a prazo, o Estado-provid�ncia est� condenado, pelas mesmas raz�es que lhe deram o sucesso. N�o sobreviver� nem � globaliza��o nem ao bem-estar adquirido, que n�o � reproduz�vel de gera��o para gera��o com a composi��o et�ria das sociedades ocidentais.

Este � o custo de querer manter sistemas de seguran�a social universais que n�o t�m outra raz�o de ser que n�o seja a ideologia do "modelo social europeu", que os socialistas consideram ser o �ltimo reduto do seu "socialismo". A reconfigura��o do modelo do nosso Estado devia apenas garantir uma protec��o social m�nima para quem realmente a exige, limitar a esse m�nimo de solidariedade social b�sica o car�cter distributivo dos impostos, assim libertando para cada um a gest�o da parte da sua "seguran�a" que est� para al�m do m�nimo garantido e para a economia recursos de que o Estado tem vindo a apropriar-se numa espiral cada vez maior.

O que significa que a �nica oposi��o poss�vel � a liberal. Sem este tipo de oposi��o, n�o h� oposi��o a n�o ser a comunista e a do BE, que � uma variante da comunista. S� uma oposi��o liberal reformista e moderada pode mudar este estado de coisas. O consenso ac�falo dos dias de hoje � favorecido pela inexist�ncia ou debilidade desta oposi��o.

(No P�blico de hoje.) Estamos num desses momentos em que mais � necess�ria pol�tica no espa�o p�blico, e o que acontece � o contr�rio, ela praticamente n�o existe, obscurecida por uma mistura anestesiante de circo, de conveni�ncias, falsos consensos e maus h�bitos do poder. N�o havendo cr�tica nem altern�ncia, gera-se um feito de obscuridade, n�o havendo �nimo cr�tico, o espa�o p�blico mirra.Os tempos que vivemos recordam-me, e a mem�ria � uma maldi��o, de outro tempo recente muito semelhante: os primeiros anos do engenheiro Guterres. Nesses anos de gl�ria, quando o engenheiro apesar de n�o ter maioria absoluta governava como se a tivesse, era um esc�ndalo suscitar d�vidas, interroga��es, cr�ticas ao seu magn�fico desempenho. Lembro-me de ter escrito ent�o que me sentia uma esp�cie de ET quando mesmo os meus mais pr�ximos me diziam que era imposs�vel criticar Guterres. Havia dinheiro por todo o lado, a bolsa dava, a cada pequena esquina uma pequena fortuna, todos estavam felizes.Hoje sabemos que muitos dos erros tr�gicos, que se est�o a pagar caro uma d�cada depois, foram cometidos nessa altura, quando uma excepcional conjuntura favor�vel nos dava a �ltima oportunidade de arrancar e a malbaratamos sem resultados. O governo de Guterres � hoje visto como a grande "oportunidade perdida", mas quem o percebeu e disse na altura? Contavam-se pelos dedos de uma s� m�o os cr�ticos do engenheiro, isolados e ignorados, pelo mesmo "consenso" que hoje considera o seu governo um desastre. � assim e continuar� a ser - em Portugal quando um consenso de rebanho, entre elites, pol�ticos e jornalistas, se instala, tem muita for�a, abafa quase tudo.Hoje passa-se o mesmo, com a grande diferen�a que estamos em tempo de vacas magras e o Governo, em vez de nos prometer abund�ncia, promete-nos dificuldades. � interessante verificar que � exactamente esta diferen�a que alicer�a o consenso de hoje, com a mesma for�a acr�tica do consenso do passado. O consenso assenta na ideia de que o pa�s est� mal e de que o Governo defronta esses males com coragem, pelo que merece o abater de todos os pend�es. Muito pouca gente se pergunta se n�o era poss�vel n�o apenas fazer melhor, mas fazer muito diferente e se essa diferen�a faz, afinal, toda a diferen�a. Banhados em milhares horas de circo e gladiadores, na anomia generalizada de todos a fazerem a sua vidinha como se nada fosse, e no escapismo,Como � que se chegou aqui? Pela combina��o da vit�ria de duas pessoas, Manuela Ferreira Leite e Jos� S�crates. Num certo sentido, Manuel Ferreira Leite � a grande vencedora pol�tica da actualidade. Com a ironia habitual da hist�ria, para se ver a sua raz�o, foi necess�ria a sua queda e a do governo que se preparava para a afastar do cargo, por pensar que queria mais vida para al�m do d�fice. Tamb�m o governo que se lhe seguiu queria dar mais folga aos portugueses e descobriu uma "retoma" que nunca houve. Ambos, Dur�o Barroso e Santana Lopes, com o PSD profundo �s palmas, queriam ver-se livre da "antip�tica" ministra que lhes dava cabo das sondagens. Mas Manuela Ferreira Leite tinha convencido os portugueses a aceitar sacrif�cios para p�r a casa em ordem e, como estes desconfiavam das facilidades e da compet�ncia que Santana Lopes lhes prometia, foi procurar no outro lado, no PS.S�crates apanhou a boleia desta ideia da necessidade de austeridade que o PS e ele pr�prio tanto tinham criticado. Ele come�ou a falar a linguagem apropriada ao sentimento da opini�o p�blica que Manuela Ferreira Leite lhe tinha deixado. Como se apercebeu de imediato, isso tinha sucesso e ele conseguiu um consenso legitimador que se estende muito para al�m do PS. Com condi��es pol�ticas excepcionais, maioria absoluta de um s� partido, fragilidade extrema da oposi��o e agora um Presidente "cooperador", aproveitou com perfei��o o "ar do tempo", revelando o seu estilo desde o primeiro minuto. O seu governo tem feito algumas coisas bem, mas n�o � o governo que serve para defrontar os problemas com que Portugal se defronta. Esta percep��o refor�a-se todos os dias e s� a acefalia actual do espa�o p�blico tem deixado sem discuss�o medidas sobre medidas, sempre apresentadas, inclusive pela comunica��o social, como inevit�veis. Eu, como j� vi muitas coisas "inevit�veis" serem evitadas, como por exemplo a Constitui��o europeia, pouco me conformo com este ambiente de inevitabilidade.Pode-se, sobre o governo S�crates, fazer dois tipos de cr�ticas: ou dizer que faz bem mas faz pouco (que � a linha que de alguma maneira a pr�pria Manuela Ferreira Leite sugeriu no congresso do PSD); ou entender que o que � necess�rio � fazer de outro modo, muito diferente. S� haver� verdadeira oposi��o quando se combinarem os dois termos, com preponder�ncia do segundo.Os n�o socialistas esquecem-se muitas vezes de que S�crates � socialista, ou seja, acredita no Estado como protector e corrector social, n�o concebe vida fora de um jacobinismo econ�mico, social e cultural deslavado e modernizado, que � o socialismo dos dias de hoje. Acrescenta a isso um remake de positivismo cientista, crendo com deslumbramento que as tecnologias mudam a sociedade e n�o vice-versa, como se percebe no chamado "choque tecnol�gico", investindo-se em tecnologias de ponta sem se cuidar das literacias necess�rias ao seu uso.O que S�crates tem feito � defrontar a crise do Estado-provid�ncia propondo rem�dios que atrasam o seu colapso. N�o o p�e em causa, nem contesta a sua forma, concorda com ele por raz�es ideol�gicas. V�rias vezes afirmou que essas medidas de austeridade t�m como objectivo �ltimo garantir a "seguran�a social" para os portugueses e, com uma oposi��o que n�o contesta o essencial da sua atitude, faz o mal e a caramunha, ou seja, governa como governaram Barroso e Lopes e, mesmo aos olhos de muitos opositores do PS, com a vantagem de o fazer melhor do que os seus imediatos antecessores sociais-democratas.Ora, que eu saiba, n�o foi Deus que fez o Estado-provid�ncia, nem a Hist�ria chegou ao fim com ele. Foram os homens, numa �poca, numa circunst�ncia, em determinadas partes do mundo. Resultou, como todas as coisas na sociedade, de uma complexa interac��o entre interesses e vontades, entre conflitos sociais e decis�es pol�ticas. Adequou-se �s sociedades europeias do p�s-guerra, geradas pelo Plano Marshall e pela integra��o europeia e beneficiando das circunst�ncias excepcionais de n�o terem de fazer avultadas despesas militares, porque estavam cobertas pelo guarda-chuva nuclear americano. S� que esse mundo acabou e acabou de vez e poucas d�vidas me sobram de que, mantendo os seus fundamentos iniciais e program�ticos, n�o se far� outra coisa do que gerir nas pr�ximas d�cadas o empobrecimento e as tens�es sociais em Portugal e na Europa, sempre presos nas mesmas pol�ticas de esticar at� ao limite o "modelo social", deixando para as gera��es futuras uma heran�a cada vez mais inger�vel.H� alternativas a esta pol�tica dos socialistas e elas podem ser socialmente muito mais justas do que as pol�ticas actuais. As medidas de austeridade que o Governo est� a tentar implementar, t�midas mas mesmo assim passos de gigante em rela��o aos governos anteriores, apenas adiam a crise estrutural do Estado-provid�ncia e t�m custos muito mais gravosos para os mais pobres do que para os ricos. Mais: a seguir-se esta pol�tica, a crise tornar-se-� end�mica e, com intervalos de pequenos surtos de prosperidade, continuar-se-� a ter de pedir novos sacrif�cios e o problema de fundo permanecer� na mesma. Por isso, a prazo, o Estado-provid�ncia est� condenado, pelas mesmas raz�es que lhe deram o sucesso. N�o sobreviver� nem � globaliza��o nem ao bem-estar adquirido, que n�o � reproduz�vel de gera��o para gera��o com a composi��o et�ria das sociedades ocidentais.Este � o custo de querer manter sistemas de seguran�a social universais que n�o t�m outra raz�o de ser que n�o seja a ideologia do "modelo social europeu", que os socialistas consideram ser o �ltimo reduto do seu "socialismo". A reconfigura��o do modelo do nosso Estado devia apenas garantir uma protec��o social m�nima para quem realmente a exige, limitar a esse m�nimo de solidariedade social b�sica o car�cter distributivo dos impostos, assim libertando para cada um a gest�o da parte da sua "seguran�a" que est� para al�m do m�nimo garantido e para a economia recursos de que o Estado tem vindo a apropriar-se numa espiral cada vez maior.O que significa que a �nica oposi��o poss�vel � a liberal. Sem este tipo de oposi��o, n�o h� oposi��o a n�o ser a comunista e a do BE, que � uma variante da comunista. S� uma oposi��o liberal reformista e moderada pode mudar este estado de coisas. O consenso ac�falo dos dias de hoje � favorecido pela inexist�ncia ou debilidade desta oposi��o.(Node hoje.)

O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:

ANUNCIA-SE, LEGISLA-SE, ...QUANDO SE PUDER FAZ-SE

Hoje, o Di�rio da Rep�blica, presenteia-nos com mais um choque tecnol�gico:

Portaria n.� 657-A/2006 de 29 de Junho - Aprova o Regulamento do Registo Comercial

Pre�mbulo:

�O Decreto-Lei n.� 76-A/2006, de 29 de Mar�o, procedeu a uma profunda altera��o do C�digo do Registo Comercial, designadamente com (�) a cria��o de condi��es para a plena utiliza��o dos sistemas inform�ticos e a reformula��o de actos e procedimentos internos.

Simultaneamente, procedeu � revoga��o do Regulamento do Registo Comercial, pelo que se torna necess�rio aprovar uma nova regulamenta��o daquele C�digo, desenvolvendo as novas solu��es nele previstas.

Artigo 2.�

Disposi��es transit�rias

1 - Enquanto n�o se verificar a informatiza��o do servi�o de registo, s�o aplic�veis a este as disposi��es do Regulamento do Registo Comercial, aprovado pela Portaria n.� 883/89, de 13 de Outubro, que respeitem a livros, fichas e verbetes ou que pressuponham a sua exist�ncia.�

Ou seja, a nova lei entrou em vigor, salvo nos seus aspectos principais, em que se aplica a legisla��o anterior.

Continua-se a fazer tudo como dantes, porque n�o h� condi��es materiais para implementar a lei. Primeiro anuncia-se e legisla-se. Se e quando se puder, faz-se. Dito, mas n�o feito. (Estamos a criar condi��es, dizem no pre�mbulo �.)

Valia a pena contabilizar os casos como este. Suspeito que �amos ter uma surpresa.

(RM)

RETRATOS DO TRABALHO EM MONTREAL, CANAD�

(Ricardo Prata) (Ricardo Prata)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 29 de Junho de 2006

Continuam as palavras a revelar as posi��es. No notici�rio da RTP1 sobre a manifesta��o da FRETILIN em Dili, v�rias interessantes distin��es entre "n�s" e "eles", inscritas na escolha das palavras. A favor de Xanana e contra o Governo s�o os "timorenses", a favor do Governo s�o "os apoiantes da FRETILIN". De um lado os "jovens", do outro os "manifestantes". Uns s�o contados para sugerir que s�o poucos e finitos; outros, nunca s�o contados para serem os "timorenses", a na��o, o povo. Continuam as palavras a revelar as posi��es. No notici�rio da RTP1 sobre a manifesta��o da FRETILIN em Dili, v�rias interessantes distin��es entre "n�s" e "eles", inscritas na escolha das palavras. A favor de Xanana e contra o Governo s�o os "timorenses", a favor do Governo s�o "os apoiantes da FRETILIN". De um lado os "jovens", do outro os "manifestantes". Uns s�o contados para sugerir que s�o poucos e finitos; outros, nunca s�o contados para serem os "timorenses", a na��o, o povo.

INTEND�NCIA

O caminho para a devolu��o � origem (a FNAC) do HP Pavilion Dual core continua a passo acelerado. Pelo meio, ficam muitas horas de trabalho perdidas. A assist�ncia da HP ap�s uma longa navega��o entre "prima 1 e "prima 2", remete-me para outro n�mero de telefone. No segundo n�mero, um t�cnico informa-me que � "normal" que n�o se possa instalar o Windows XP Professional, sobre o Home de origem, devido � configura��o especial do software feita na f�brica. Excelente! Depois quando lhe digo que o computador bloqueia sempre que acede � Internet em banda larga, apesar de fazer a liga��o, - que o seu irm�o HP mais velho ao lado faz na perfei��o -, diz que nunca soube da exist�ncia desse problema e que deve ser um problema com o modem da Telepac, o mesmo modem que deve existir em milhares de casas. Excelente! O computador liga, n�o liga? Liga, com alguma dificuldade depois dos bloqueios, mas liga. O software arranca normalmente, n�o arranca? Arranca, depois de ser reconfigurado de raiz n vezes. O computador liga � Internet n�o liga? Liga, e funciona entre trinta segundos e um minuto antes de bloquear exigindo ser desligado. Ent�o o problema n�o � com a HP.

PS. - Agrade�o aos meus amigos leitores que me aconselham... a mudar para um Macintosh. O caminho para a devolu��o � origem (a FNAC) do HP Pavilion Dual core continua a passo acelerado. Pelo meio, ficam muitas horas de trabalho perdidas. A assist�ncia da HP ap�s uma longa navega��o entre "prima 1 e "prima 2", remete-me para outro n�mero de telefone. No segundo n�mero, um t�cnico informa-me que � "normal" que n�o se possa instalar o Windows XP Professional, sobre o Home de origem, devido � configura��o especial do software feita na f�brica. Excelente! Depois quando lhe digo que o computador bloqueia sempre que acede � Internet em banda larga, apesar de fazer a liga��o, - que o seu irm�o HP mais velho ao lado faz na perfei��o -, diz que nunca soube da exist�ncia desse problema e que deve ser um problema com o modem da Telepac, o mesmo modem que deve existir em milhares de casas. Excelente! O computador liga, n�o liga? Liga, com alguma dificuldade depois dos bloqueios, mas liga. O software arranca normalmente, n�o arranca? Arranca, depois de ser reconfigurado de raiz n vezes. O computador liga � Internet n�o liga? Liga, e funciona entre trinta segundos e um minuto antes de bloquear exigindo ser desligado. Ent�o o problema n�o � com a HP.PS. - Agrade�o aos meus amigos leitores que me aconselham... a mudar para um Macintosh.

EARLY MORNING BLOGS

805 -

"La vieille crut qu'on la m�prisait, et grommela quelques menaces entre ses dents."

Il �tait une fois un Roi et une Reine, qui �taient si f�ch�s de n'avoir point d'enfants, si f�ch�s qu'on ne saurait dire. Ils all�rent � toutes les eaux du monde; voeux, p�lerinages, menues d�votions, tout fut mis en oeuvre, et rien n'y faisait. Enfin pourtant la Reine devint grosse, et accoucha d'une fille: on fit un beau Bapt�me; on donna pour Marraines � la petite Princesse toutes les F�es qu'on p�t trouver dans le Pays (il s'en trouva sept), afin que chacune d'elles lui faisant un don, comme c'�tait la coutume des F�es en ce temps-l�, la Princesse e�t par ce moyen toutes les perfections imaginables. Apr�s les c�r�monies du Bapt�me toute la compagnie revint au Palais du Roi, o� il y avait un grand festin pour les F�es. On mit devant chacune d'elles un couvert magnifique, avec un �tui d'or massif, o� il y avait une cuiller, une fourchette, et un couteau de fin or, garni de diamants et de rubis. Mais comme chacun prenait sa place � table, on vit entrer une vieille F�e qu'on n'avait point pri�e parce qu'il y avait plus de cinquante ans qu'elle n'�tait sortie d'une Tour et qu'on la croyait morte, ou enchant�e. Le Roi lui fit donner un couvert, mais il n'y eut pas moyen de lui donner un �tui d'or massif, comme aux autres, parce que l'on n'en avait fait faire que sept pour les sept F�es. La vieille crut qu'on la m�prisait, et grommela quelques menaces entre ses dents.

(Charles Perrault, La belle au bois dormant )

*

Bom dia! (Charles Perrault,Bom dia!

COISAS SIMPLES

Jean-L�on G�r�me, Les pigeons

Jean-L�on G�r�me,

INTEND�NCIA

Continuo enredado na tarefa, que devia ser simples e se torna cada vez mais complicada, de mudar de um computador para outro, ambos da mesma marca, HP. O meu primeiro encontro com a assist�ncia t�cnica da HP foi prometedor: tudo o que funciona mal �, pelos vistos, suposto funcionar mal e eu devo resignar-me a essa realidade. Para um computador de topo de gama, � meio caminho andado para ser devolvido � proced�ncia. Vamos ver se consigo evitar o outro meio do caminho, pelos meus meios. Darei not�cias para prevenir os incautos. Continuo enredado na tarefa, que devia ser simples e se torna cada vez mais complicada, de mudar de um computador para outro, ambos da mesma marca, HP. O meu primeiro encontro com a assist�ncia t�cnica da HP foi prometedor: tudo o que funciona mal �, pelos vistos, suposto funcionar mal e eu devo resignar-me a essa realidade. Para um computador de topo de gama, � meio caminho andado para ser devolvido � proced�ncia. Vamos ver se consigo evitar o outro meio do caminho, pelos meus meios. Darei not�cias para prevenir os incautos.

EARLY MORNING BLOGS

804 - IT SURE WAS PLEASANT TO SPEND A DAY IN THE COUNTRY

Farm Implements and Rutabagas in a Landscape

The first of the undecoded messages read: "Popeye sits

in thunder,

Unthought of. From that shoebox of an apartment,

From livid curtain's hue, a tangram emerges: a country."

Meanwhile the Sea Hag was relaxing on a green couch: "How

pleasant

To spend one's vacation en la casa de Popeye," she

scratched

Her cleft chin's solitary hair. She remembered spinach

And was going to ask Wimpy if he had bought any spinach.

"M'love," he intercepted, "the plains are decked out

in thunder

Today, and it shall be as you wish." He scratched

The part of his head under his hat. The apartment

Seemed to grow smaller. "But what if no pleasant

Inspiration plunge us now to the stars? For this is my

country."

Suddenly they remembered how it was cheaper in the country.

Wimpy was thoughtfully cutting open a number 2 can of spinach

When the door opened and Swee'pea crept in. "How pleasant!"

But Swee'pea looked morose. A note was pinned to his bib.

"Thunder

And tears are unavailing," it read. "Henceforth shall

Popeye's apartment

Be but remembered space, toxic or salubrious, whole or

scratched."

Olive came hurtling through the window; its geraniums scratched

Her long thigh. "I have news!" she gasped. "Popeye, forced as

you know to flee the country

One musty gusty evening, by the schemes of his wizened,

duplicate father, jealous of the apartment

And all that it contains, myself and spinach

In particular, heaves bolts of loving thunder

At his own astonished becoming, rupturing the pleasant

Arpeggio of our years. No more shall pleasant

Rays of the sun refresh your sense of growing old, nor the

scratched

Tree-trunks and mossy foliage, only immaculate darkness and

thunder."

She grabbed Swee'pea. "I'm taking the brat to the country."

"But you can't do that--he hasn't even finished his spinach,"

Urged the Sea Hag, looking fearfully around at the apartment.

But Olive was already out of earshot. Now the apartment

Succumbed to a strange new hush. "Actually it's quite pleasant

Here," thought the Sea Hag. "If this is all we need fear from

spinach

Then I don't mind so much. Perhaps we could invite Alice the Goon

over"--she scratched

One dug pensively--"but Wimpy is such a country

Bumpkin, always burping like that." Minute at first, the thunder

Soon filled the apartment. It was domestic thunder,

The color of spinach. Popeye chuckled and scratched

His balls: it sure was pleasant to spend a day in the country.

(John Ashbery)

*

Bom dia! (John Ashbery)Bom dia!

CORREIO / INTEND�NCIA

Uma mudan�a de computador, com as habituais complica��es, tem afectado o correio mais do que ele j� estava com um infinito e irrecuper�vel atraso nas respostas. As minhas desculpas. Uma mudan�a de computador, com as habituais complica��es, tem afectado o correio mais do que ele j� estava com um infinito e irrecuper�vel atraso nas respostas. As minhas desculpas.

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 27 de Junho de 2006

Os defensores do nosso omnipresente Estado devem estar contentes: conforme declara��es do Secret�rio de Estado do Desporto � TSF uma das coisas de que cuida com desvelo o nosso Governo � escolher (neste caso manter) o selecionador nacional do futebol. � certamente uma quest�o de Estado... Os defensores do nosso omnipresente Estado devem estar contentes: conforme declara��es do Secret�rio de Estado do Desporto � TSF uma das coisas de que cuida com desvelo o nosso Governo � escolher (neste caso manter) o selecionador nacional do futebol. � certamente uma quest�o de Estado...

COISAS DA S�BADO : A FRAGMENTA��O DE ESPANHA

Existe uma velha m�xima da nossa pol�tica externa que considera sempre positivas as dificuldades do poder central de Castela face �s suas periferias bascas, catal�s e galegas. Qualquer refor�o da unidade do estado espanhol � visto como perigoso para Portugal, a �nica �regi�o� que ficaria de fora da puls�o centralizadora de Madrid e do seu olhar capcioso para um Portugal independente. Desde 1640 agradecemos � Catalunha o puro facto desta existir e assim nos ajudar tamb�m a existir. De Espanha, como todos sabemos, n�o vem nem bom vento, nem bom casamento.

Sei tudo isto e � no entanto, n�o deixo de ver com preocupa��o a tend�ncia para a fragmenta��o do estado espanhol que deu a semana passada outro passo com a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha. � um caminho perigoso, trilhado por Zapatero tamb�m no Pa�s Basco, abrindo as portas � negocia��o com a ETA terrorista. � daquelas coisas que hoje parecem pac�ficas e benignas, mas que come�am a revelar um caminho sem retorno para a independ�ncia da Catalunha e do Pais Basco, sob o olhar apaziguador, mas bem pouco espanhol, de Zapatero. N�o ser� nos dias mais pr�ximos, mas l�ngua, impostos, pol�cias, �rg�os de comunica��o regionais e proximidades a outros lugares centrais que n�o Madrid, dar�o � Espanha dias quentes e isso n�o � bom para Portugal.

*

Lembro-me de ter lido no Abrupto, aquando duma visita a Budapeste,o seguinte coment�rio: "A descentra��o �tnica, lingu�stica, cultural e religiosa significa toda uma �hist�ria� por resolver (por exemplo, a importante popula��o que fala h�ngaro e que ficou na Rom�nia, como se v� no mapa [...])" (Abrupto, 15.5.06) Tenho dificuldade em compreender a posi��o do Abrupto: por um lado, a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha � considerada "um caminho perigoso", por outro lado, os conflictos �tnicos latentes na long�nqua Transilvania representam "uma hist�ria por resolver". Tentar resolver essa hist�ria n�o seria um caminho perigoso ? Por qu� ? S� porque a Espanha est� mais perto ? S� porque eventuais "dias quentes" na Hungria e na Rom�nia n�o chegariam a ter influ�ncia em Portugal ?

(Cristian Barbarosie)

*

N�o posso deixar de considerar o seu texto uma manifesta��o de conservadorismo, no mau sentido do termo. Um medo de mudar nem que seja para se sair de uma situa��o de injusti�a, neste caso a opress�o secular de v�rias na��es por um estado imperialista administrativa, culturalmente, etc. D�-lhe medo que se cumpra um dos princ�pios consagrado pelas Na��es

Unidas, o direito � autodetermina��o dos povos. E parece ser um sentimento t�o forte e irracional que lhe chega para tirar a conclus�o il�gica de que essa independ�ncia � prejudicial a um terceiro pa�s, neste caso a n�s, Portugal; a conclus�o absurda de que quanto maior e mais forte for o vizinho de um pequeno pa�s, melhor ser� para este �ltimo. Isto j� n�o se trata de um julgamento de valor, do direito � autodetermina��o dos povos, mas um julgamento de conveni�ncia pr�tica que a ser verdadeira teria levado durante a hist�ria a todos os pequenos pa�ses desejarem que os seus vizinhos fossem grandes e poderosos.

(Henrique Oliveira)

*

J� em tempos tinha tomado a liberdade de lhe escrever focando o problema que constitu�a a aus�ncia de qualquer debate estrat�gico (pelo menos p�blico), em Portugal, sobre a quest�o das nacionalidades e autonomias de Espanha (e da Pen�nsula, j� agora). Infelizmente, penso o assunto tem sido quase sempre tratado como uma mera quest�o interna de Espanha e da luta contra o terrorismo da ETA e, mesmo assim, de um modo demasiado emocional: � direita, a sua ala mais radical � quem tem liderado o debate, decalcando as suas posi��es, de forma imediatista, das posi��es dos sectores mais conservadores, e tamb�m mais emocionais, do PP de Espanha, influenciados pela "Associa��o de V�timas da ETA"; � esquerda, demasiado ausente na an�lise, a emo��o ainda remete para a associa��o da unidade do estado espanhol ao imp�rio castelhano, � ditadura franquista e � monarquia do in�cio do s�culo XX. Tudo isto influenciado, por um lado, por uma certa frustra��o latente no centro-direita em Portugal pelos fracassos dos governos Barroso e Santana Lopes, tentando cavalgar os indiscut�veis sucessos do PP de Espanha durante o governo Aznar; por outro, pelo peso que o pensamento republicano tradicional e as mem�rias da guerra civil ainda t�m em alguns sectores da esquerda e pela associa��o que sempre se fez das burguesia basca e catal� ao desenvolvimento e ao "progressismo". Em ambos os casos, a aus�ncia de qualquer vis�o estrat�gica para Portugal est� infelizmente ausente, esquecendo-se que a luta pela unidade/fragmenta��o da pen�nsula tem sido uma constante em toda a sua hist�ria e que muito pouco distingue um portugu�s de um castelhano (muito menos de um galego). Muito menos, certamente, do que o que distingue um basco de um castelhano ou de um catal�o... Filho de um madrileno, embora sem sangue espanhol mas com fortes liga��es culturais e sentimentais a Espanha, devo ter sido dos poucos portugueses que n�o foi educado no "�dio a Castela". Por isso, sempre acompanhei a quest�o das nacionalidades e autonomias peninsulares com um interesse redobrado, mais tarde ainda mais acentuado por contactos profissionais e por um dos meus filhos ter feito parte do seu curso na Universidade Polit�cnica da Catalunha e uma filha viver e trabalhar actualmente em Madrid. Devo dizer, do ponto de vista estrat�gico para Portugal, que tenho tudo menos certezas, sendo bem necess�rio lan�ar a discuss�o ignorando o "politicamente correcto" e as emo��es. Tenho, contudo, uma certeza: a necessidade de tornar obrigat�rio o ensino do castelhano na escola portuguesa como segunda l�ngua estrangeira. Sem "�dio a Castela" e sem medo de "perder a p�tria" - e antes que se acorde tarde como aconteceu com o Ingl�s. Quanto a Espanha, o caminho das "nacionalidades" trilhado por Zapatero parece-me inelut�vel, e s� a Hist�ria dir� at� onde. At� porque a direita espanhola n�o me parece alguma vez ter tido para a quest�o uma estrat�gia sustent�vel, que, com maior ou menor grau de centralismo, fosse muito para al�m, no limite, da "Espa�a Una, Grande Y Libre".

(Jo�o Cilia) Existe uma velha m�xima da nossa pol�tica externa que considera sempre positivas as dificuldades do poder central de Castela face �s suas periferias bascas, catal�s e galegas. Qualquer refor�o da unidade do estado espanhol � visto como perigoso para Portugal, a �nica �regi�o� que ficaria de fora da puls�o centralizadora de Madrid e do seu olhar capcioso para um Portugal independente. Desde 1640 agradecemos � Catalunha o puro facto desta existir e assim nos ajudar tamb�m a existir. De Espanha, como todos sabemos, n�o vem nem bom vento, nem bom casamento.Sei tudo isto e � no entanto, n�o deixo de ver com preocupa��o a tend�ncia para a fragmenta��o do estado espanhol que deu a semana passada outro passo com a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha. � um caminho perigoso, trilhado por Zapatero tamb�m no Pa�s Basco, abrindo as portas � negocia��o com a ETA terrorista. � daquelas coisas que hoje parecem pac�ficas e benignas, mas que come�am a revelar um caminho sem retorno para a independ�ncia da Catalunha e do Pais Basco, sob o olhar apaziguador, mas bem pouco espanhol, de Zapatero. N�o ser� nos dias mais pr�ximos, mas l�ngua, impostos, pol�cias, �rg�os de comunica��o regionais e proximidades a outros lugares centrais que n�o Madrid, dar�o � Espanha dias quentes e isso n�o � bom para Portugal.

COISAS DA S�BADO : XADREZ

Nestas alturas de futebolite aguda, volto ao xadrez. Ou�o os berros habituais ao longe, muito ao longe, com o �intelectualismo livresco� deste pobre autor que cometeu o crime de lesa-p�tria de n�o saber quem era o Quaresma� Pois eu respondo aos berros anti-livrescos com o xadrez, venham c� pedir me�as, num jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota. Em poucos jogos � mais evidente o car�cter, a psicologia do jogador, a sua agressividade ou calma, a sua racionalidade ou criatividade, a sua teimosia ou ousadia. Mas cuidado, porque o xadrez �, num certo sentido, o mais violento dos jogos. No tabuleiro, o que se passa � uma batalha e quem l� est� s�o soldados, cavaleiros, oficiais, fortalezas e uma tenebrosa rainha, O rei � o penhor da soberania mas, por si, pode pouco.

Est� l� tudo, no sil�ncio, naquela aparente suspens�o do mundo que torna os jogadores de xadrez figuras m�ticas, travando uma batalha �pica, isolados no meio de um mundo que lhes passa ao lado. Introspectivo e sem a grande teatraliza��o do espect�culo moderno de massas, o xadrez � ainda um dos pin�culos das virtudes da intelig�ncia matem�tica, posicional, territorial, t�ctica e estrat�gica.

Valia a pena haver mais xadrez e muito menos futebol. Por um �tomo do que est�o a gastar no futebol, estado e privados, podiam colocar centenas de escolas a jogar xadrez, milhares de jovens e crian�as a pensar com a cabe�a e n�o com os p�s. Fica o pa�s melhor? Fica, fica. N�o faz mal nenhum usar os neur�nios.

*

Sem colocar em causa o ponto capital do seu artigo "Xadrez", devo dizer que n�o concordo consigo quando defende que o desporto a que o mesmo se refere � "um jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota." De facto, j� no tempo da Uni�o Sovi�tica, Bobby Fisher - hist�rico jogador norte-americano - se queixava de que os sovi�ticos combinavam resultados entre si, de forma a terem maior disponibilidade mental para o derrotar. Tal facto levou-o mesmo a afirmar, em 1963, que n�o voltaria a participar em

torneios da FIDE.

Por outro lado, o "doping" tamb�m existe no xadrez. A t�tulo meramente indicativo chamaria aten��o para o artigo "O 'doping' inteligente para jogadores de xadrez" publicado no Di�rio de Not�cias a vinte e quatro de Janeiro do presente ano.

(Frederico dos Santos Silva)

*

Ent�o V. acredita que estas pobres gentes, mesmo 36 anos depois de Abril, iriam promover o jogo nacional dos patifes dos bolchevistas? E ainda por cima um jogo que estimula o intelecto? Claro que concordo consigo e que me aflijo com um pa�s que vai desbaratando alegrementeo o bem mais precioso de qualquer sociedade: a INSTRU��O.

(Jos� Manuel Calazans)

*

Tem raz�o quando refere que seria mais �til colocar xadrez nas escolas e da�, gastar efectivamente dinheiro nas escolas (a isso chama-se investimento, n�o?). Mas sabe, isso � pouco medi�tico, n�o d� o show do qual o nosso ministro revela depend�ncia, n�o � imediato. Moldar uma sociedade leva muito tempo, � um trabalho �silencioso� feito nas escolas, e com efeitos para outros tantos mais anos. O continuar a apostar na bola � continuar a adiar o trabalho dos neur�nios (como disse). Como fica bem o povo entretido com a bola; assim n�o pensa! Esta estrat�gia qual muleta de regimes passados autorit�rios, continua preocupantemente actual. Parece-me que afinal, desde que partimos do 25 de Abril, o nosso percurso tem sido um c�rculo, que est� prestes, prestes a fechar-se. Se � que me fa�o entender.

(Sofia �vila da Silveira)

Nestas alturas de futebolite aguda, volto ao xadrez. Ou�o os berros habituais ao longe, muito ao longe, com o �intelectualismo livresco� deste pobre autor que cometeu o crime de lesa-p�tria de n�o saber quem era o Quaresma� Pois eu respondo aos berros anti-livrescos com o xadrez, venham c� pedir me�as, num jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota. Em poucos jogos � mais evidente o car�cter, a psicologia do jogador, a sua agressividade ou calma, a sua racionalidade ou criatividade, a sua teimosia ou ousadia. Mas cuidado, porque o xadrez �, num certo sentido, o mais violento dos jogos. No tabuleiro, o que se passa � uma batalha e quem l� est� s�o soldados, cavaleiros, oficiais, fortalezas e uma tenebrosa rainha, O rei � o penhor da soberania mas, por si, pode pouco.Est� l� tudo, no sil�ncio, naquela aparente suspens�o do mundo que torna os jogadores de xadrez figuras m�ticas, travando uma batalha �pica, isolados no meio de um mundo que lhes passa ao lado. Introspectivo e sem a grande teatraliza��o do espect�culo moderno de massas, o xadrez � ainda um dos pin�culos das virtudes da intelig�ncia matem�tica, posicional, territorial, t�ctica e estrat�gica.Valia a pena haver mais xadrez e muito menos futebol. Por um �tomo do que est�o a gastar no futebol, estado e privados, podiam colocar centenas de escolas a jogar xadrez, milhares de jovens e crian�as a pensar com a cabe�a e n�o com os p�s. Fica o pa�s melhor? Fica, fica. N�o faz mal nenhum usar os neur�nios.

RETRATOS DO TRABALHO

P. S. Kroyer, Tr�s Pescadores

P. S. Kroyer,

EARLY MORNING BLOGS

803 - THE BOND OF THE SEA

The Nellie, a cruising yawl, swung to her anchor without a flutter of the sails, and was at rest. The flood had made, the wind was nearly calm, and being bound down the river, the only thing for it was to come to and wait for the turn of the tide.

The sea-reach of the Thames stretched before us like the beginning of an interminable waterway. In the offing the sea and the sky were welded together without a joint, and in the luminous space the tanned sails of the barges drifting up with the tide seemed to stand still in red clusters of canvas sharply peaked, with gleams of varnished sprits. A haze rested on the low shores that ran out to sea in vanishing flatness. The air was dark above Gravesend, and farther back still seemed condensed into a mournful gloom, brooding motionless over the biggest, and the greatest, town on earth.

The Director of Companies was our captain and our host. We four affectionately watched his back as he stood in the bows looking to seaward. On the whole river there was nothing that looked half so nautical. He resembled a pilot, which to a seaman is trustworthiness personified. It was difficult to realize his work was not out there in the luminous estuary, but behind him, within the brooding gloom.

Between us there was, as I have already said somewhere, the bond of the sea.

(Joseph Conrad, Heart of Darkness )

*

Bom dia! (Joseph Conrad,Bom dia!

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OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 25 de Junho de 2006

Solidariedade na Futebol�ndia: estamos sempre muito preocupados com Timor, muito solid�rios, mas � s� depois do futebol. Hoje, que h� not�cias importantes sobre Timor, em todos os notici�rios dos canais de televis�o, esperaram vinte minutos (na Sic a mais r�pida), para aparecer. Antes disso havia a n�o-not�cia: o espect�culo da bola antes da bola. � assim, prioridades. E a televis�o p�blica deu o exemplo, continuou com o futebol j� a SIC dava not�cias. Solidariedade na Futebol�ndia: estamos sempre muito preocupados com Timor, muito solid�rios, mas � s� depois do futebol. Hoje, que h� not�cias importantes sobre Timor, em todos os notici�rios dos canais de televis�o, esperaram vinte minutos (na Sic a mais r�pida), para aparecer. Antes disso havia a n�o-not�cia: o espect�culo da bola antes da bola. � assim, prioridades. E a televis�o p�blica deu o exemplo, continuou com o futebol j� a SIC dava not�cias.

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802 - "O HOMEM S� � SUPERIORMENTE FELIZ QUANDO � SUPERIORMENTE CIVILIZADO"

Ora nesse tempo Jacinto concebera uma id�ia... Este Pr�ncipe concebera a id�ia de que o �homem s� � superiormente feliz quando � superiormente civilizado�. E p�r homem civilizado o meu camarada entendia aquele que, robustecendo a sua for�a pensante com todas as no��es adquiridas desde Arist�teles, e multiplicando a pot�ncia corporal dos seus �rg�os com todos os mecanismos inventados desde Ter�menes, criador da roda, se torna um magn�fico Ad�o, quase onipotente, quase onisciente, e apto portanto a recolher dentro duma sociedade, e nos limites do Progresso (tal) como ele se comportava em 1875) todos os gozos e todos os proveitos que resultam de Saber e Poder... Pelo menos assim Jacinto formulava copiosamente a sua id�ia, quando convers�vamos de fins e destinos humanos, sorvendo bocks poeirentos, sob o toldo das cervejarias filos�ficas, no Boulevard Saint-Michel.

Este conceito de Jacinto impressionara os nossos camaradas de cen�culo, que tendo surgido para a vida intelectual, de 1866 a 1875, entre a batalha de Sadova e a batalha de Sedan e ouvindo constantemente, desde ent�o, aos t�cnicos e aos fil�sofos, que fora a Espingarda-de-agulha que vencera em Sadova e fora o Mestre-de-escola quem vencera em Sedan, estavam largamente preparados a acreditar que a felicidade dos indiv�duos, como a das na��es, se realiza pelo ilimitado desenvolvimento da Mec�nica e da erudi��o. Um desses mo�os mesmo, o nosso inventivo Jorge Carlande, reduzira a teoria de Jacinto, para lhe facilitar a circula��o e lhe condensar o brilho, a uma forma alg�brica:

Suma ci�ncia X Suma pot�ncia= Suma felicidade

E durante dias, do Odeon � Sorbona, foi louvada pela mocidade positiva a Equa��o Metaf�sica de Jacinto.

Para Jacinto, por�m, o seu conceito n�o era meramente metaf�sico e lan�ado pelo gozo elegante de exercer a raz�o especulativa: - mas constitu�a uma regra, toda de realidade e de utilidade, determinando a conduta, modalizando a vida. E j� a esse tempo, em concord�ncia com o seu preceito � ele se surtira da Pequena Enciclop�dia dos Conhecimentos Universais em setenta e cinco volumes e instalara, sobre os telhados do 202, num mirante envidra�ado, um telesc�pio. Justamente com esse telesc�pio me tornou ele palp�vel a sua id�ia, numa noite de Agosto, de mole e dormente calor. Nos c�us remotos lampejavam rel�mpagos l�nguidos. Pela Avenida dos Campos El�sios, os fiacres rolavam para as frescuras do Bosque, lentos, abertos, cansados, transbordando de vestidos claros.

- Aqui tens tu, Z� Fernandes (come�ou Jacinto, encostado � janela do mirante), a teoria que me governa, bem comprovada.

(E�a de Queir�s)

*

Bom dia! (E�a de Queir�s)Bom dia!

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OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 24 de Junho de 2006

O

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primeiro retrato , a nossa fragilidade na pedra, por uma m�o (ou duas, ou tr�s) com 27.000 anos. N�o mudamos nada. A RTP1 ontem transmitiu em directo o "S. Jo�o" do Porto. Mas para poder ter programa, o S. Jo�o da televis�o n�o � o S. Jo�o do Porto. A televis�o transmitiu uma festa organizada para ela pr�pria e o fogo de artif�cio, mas nem uma coisa nem outra s�o o S. Jo�o do Porto. O S. Jo�o do Porto n�o se presta a passar na televis�o, � uma festa �nica, absoluta e democr�tica como nada neste pa�s. Na noite de S. Jo�o o Porto sai � rua, para estar na rua e andar na rua. Atr�s daquelas festas para a televis�o milhares e milhares de pessoas est�o pura e simplesmente a andar pelas ruas e a bater na cabe�a umas das outras com um alho-porro (cada vez menos) e com uns abomin�veis martelos de pl�stico, que cada vez parecem ser maiores. Em quase todas as casas, ricas e pobres, depois do jantar, as fam�lias juntas, ou os jovens para um lado e os mais velhos para outro, fecham a casa e v�m para a rua. No S. Jo�o do Porto n�o h� lugares centrais, n�o � uma festa dos bairros populares, � uma festa que se estende por toda a cidade, embora as Fonta�nhas e a Ribeira fossem p�los de atrac��o. Mas eram apenas s�tios onde havia alguma coisa mais do que a rua, nas Fontainhas uns carross�is e farturas e na Ribeira uns bailes. Na Ribeira havia um baile, que penso �nico nos anos da ditadura, em que homens dan�avam com homens e onde pontificava o c�lebre "Carlinhos da S�". Os populares da Ribeira impediam qualquer provoca��o ou incidente, considerando que aquela noite era de todos e da liberdade de todos. Era a noite em que se podia fazer tudo e n�o havia pol�cia nas ruas. (Antes do 25 de Abril era tamb�m uma noite aproveitada para distribuir panfletos, a que a PIDE estava cada vez mais vigilante embora evitasse dar nas vistas porque com a multid�o nada era seguro�). O ambiente democr�tico da rua, em que ningu�m se livrava de levar com o alho na cabe�a, e onde completos desconhecidos trocavam cumprimentos e piropos, revelava o car�cter muito especial da �nica cidade verdadeiramente �burguesa� do pa�s. Trabalhava duro durante o ano e depois tinha a sua Saturnalia, que tomava t�o a s�rio como o trabalho. No Porto, n�o havia (e n�o h�) essa coisa de �bairros populares� versus �avenidas novas�, nem nobres marialvas e fadistas que depois dos touros v�o para as �casas de tabuinhas� conviver com apaches e severas, isto para usar os nomes antigos e poupar os ouvidos sens�veis. No Porto todos, menos os �ingleses� que nunca se viam, estavam na rua. Ora isso n�o cabe na televis�o, s� num IMAX e mesmo assim transborda. J� h� uns anos que l� n�o estou no S. Jo�o. Espero que tudo continue assim. Espero.

EARLY MORNING BLOGS

801 - CALL ME ISHMAEL

Call me Ishmael. Some years ago- never mind how long precisely- having little or no money in my purse, and nothing particular to interest me on shore, I thought I would sail about a little and see the watery part of the world. It is a way I have of driving off the spleen and regulating the circulation. Whenever I find myself growing grim about the mouth; whenever it is a damp, drizzly November in my soul; whenever I find myself involuntarily pausing before coffin warehouses, and bringing up the rear of every funeral I meet; and especially whenever my hypos get such an upper hand of me, that it requires a strong moral principle to prevent me from deliberately stepping into the street, and methodically knocking people's hats off- then, I account it high time to get to sea as soon as I can. This is my substitute for pistol and ball. With a philosophical flourish Cato throws himself upon his sword; I quietly take to the ship. There is nothing surprising in this. If they but knew it, almost all men in their degree, some time or other, cherish very nearly the same feelings towards the ocean with me.

(Herman Melville)

*

Bom dia! (Herman Melville)Bom dia!

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VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 23 de Junho de 2006 (2� s�rie)

Scary news : Confirmado primeiro caso de transmiss�o de gripe das aves entre seres humanos.

800 EARLY MORNING E OUTRAS EFEM�RIDES

O primeiro da s�rie era assim:

O primeiro da s�rie era assim: 4.7.03

10:20 (JPP)

VALE A PENA : EARLY MORNING BLOGS

O Comprometido Espectador acrescenta novos elementos sobre a situa��o italiana por quem a conhece em primeira m�o. E prop�e um �Ver outra vez� a acrescentar ao �Ler outra vez� . Primeira men��o : o Pin�quio de Disney ou seja era o que � hoje o LENDO / VENDO / OUVINDO, uma revista de blogues. Depois tombou o "VALE A PENA" e ficou apenas o EARLY MORNING BLOGS, ambos sem negrito. A maioria dos blogues citados nos primeiros cinquenta EARLY MORNINGs j� desapareceram, embora nalguns casos os seus autores tenham aberto outros, fechados de novo e aberto uma terceira vaga.

A blogosfera era ent�o muito diferente e estava a mudar muito depressa. O grande surto dos blogues era contempor�neo desta nota. Vinha de ser mais pequena, estava a democratizar-se. Era pol�mica, mas ainda era am�vel. Estava a tornar-se �cida t�o rapidamente quanto se estava a democratizar. Nos EARLY MORNING BLOGs tentou acompanhar-se essas mudan�as dando origem �quilo que se veio a chamar "metabloguismo". Recorde-se para a mem�ria que o meta-bloguismo foi recebido com muita hostilidade, em particular pelos autores de blogues pioneiros. Exemplos de metabloguismo nos primeiros cinquenta EARLY MORNING BLOGs:

5 de Julho de 2003: EARLY MORNING BLOGS 2: O mundo continua l� fora e quanto mais vozes se ouvirem melhor. Eu sou um liberal, acredito na lei dos grandes n�meros, na �m�o invis�vel�. H� virtudes na cacofonia, cada voz a menos empobrece.

15 de Julho de 2003: EARLY MORNING BLOGS 9

Quando se l� um n�mero suficiente de blogues e, esfor�ando-me por sair da rede mais densa do mainstream, � aquele c�rculo de blogues que est�o intensamente �linkados� uns com os outros e tem uma massa cr�tica suficiente para impor tem�ticas e aparecer como a face da blogosfera fora dela � apercebem-se as tend�ncias e apercebe-se, acima de tudo, a enorme revolu��o do meio em Portugal nos �ltimos meses. Por isso � que o meta-bloguismo � natural, � uma reac��o de auto-compreens�o e auto-defini��o compreens�vel em tempos de tumulto.

V�rias coisas aconteceram ao mesmo tempo como � habitual numa revolu��o. Cito Lenine, j� que os nossos amigos � esquerda tem grande pudor em o fazer, - e permito mais umas brincadeiras humor�sticas comigo inteiramente previs�veis - porque a frase aplica-se bem ao momento actual da blogosfera :

�S� quando os "de baixo" n�o querem e os "de cima" n�o podem continuar vivendo � moda antiga � que a revolu��o pode triunfar.�

O que se est� a dar � a democratiza��o da blogosfera com a entrada de muita gente no duplo sentido: novos blogues e novos leitores. Por outro lado, a exposi��o exterior dos blogues introduziu diferentes crit�rios de avalia��o que n�o coincidiam com os dominantes no seu interior.

Este efeito acabou com a blogosfera cosy , fortemente estratificada entre blogues a quem ningu�m ligava nenhuma e blogues que atrav�s de um permanente di�logo, do auto-elogio, de um esp�rito de elite que ultrapassava claramente qualquer barreira ideol�gica, se apresentavam como primus inter pares. A distin��o esquerda - direita era menos importante do que a distin��o entre os amigos e os desconhecidos, entre �n�s, os bons� e eles a turba ignara de mau gosto. A lista de �blogues de servi�o p�blico� no Blogo era o retrato desse mundo fechado que explodiu.

Era tamb�m natural que a maioria das pessoas se conhecessem umas �s outras e fossem amigos. Quando, num meio de comunica��o qualquer, todos se conhecem, ou todos tem a mesma idade, ou todos tem a mesma forma��o, ou todos l�em os mesmos livros, ou frequentam todos os mesmos restaurantes, � porque esse meio est� na inf�ncia.

Tudo isto gera muitas tens�es e uma certa irrita��o era inevit�vel (�os "de cima" n�o podem continuar vivendo � moda antiga�). Nalguns blogues mais antigos h� uma clara evolu��o do blogue-optimismo para o blogue-cepticismo, que nada justifica, porque s� um cego � que pensa que a blogosfera est� pior porque n�o � um clube de vinte amigos. � natural que tenham vontade de migrar e para isso, por raz�es psicol�gicas, desvalorizam o que deixam para tr�s.

Um dos aspectos mais saud�veis da democratiza��o da blogosfera � que hoje � mais dif�cil �competir� (tomem a palavra com a latitude que quiserem), ter influ�ncia, j� h� muitas vozes qualificadas, muito saber em muitas �reas, uma diversifica��o tem�tica, de opini�es e de escritas, que a capacidade para se afirmar j� n�o depende do elogio m�tuo, mas de se ter ou n�o uma voz pr�pria e persist�ncia. Este �ltimo factor � o que mais falta na blogosfera, onde um m�s � um s�culo e se chega a conclus�es taxativas lendo cinco ou seis blogues de um dia para o outro.

Eu sou liberal no sentido antigo, prezo a chuva e o mau tempo, a f�ria e a calma das discuss�es, e gosto de ouvir muitas vozes diferentes. Como j� disse e repito, na blogosfera, a �m�o invis�vel� est� dentro da cacofonia e para exercer o seu efeito positivo � suposto ser mesmo �invis�vel�. A blogosfera portuguesa passou de ter uma m�o �vis�vel� para ter uma �invis�vel� e foi, em primeiro lugar, o n�mero que provocou esse efeito. Mais gente, mais vozes, tudo mais �rduo. Esta � a revolu��o.

19 de Julho: EARLY MORNING BLOGS 12

Nos blogues �

� as pessoas zangam-se muito, s�o muito piegas, s�o malcriadas, s�o gentis, s�o espertas, s�o espertinhas, s�o parvas, copiam, fazem de conta que n�o copiam, irritam-se, reconciliam-se, cuidam muito da sua identidade, d�o-se todas aos estranhos, representam, representam-se, s�o azedas, s�o poucas vezes alegres, s�o tristes, s�o tristonhas, s�o f�teis, s�o totalmente f�teis, t�m interesse, t�m interesses, t�m egos gigantescos, t�m egos pequeninos, t�m que �dizer-qualquer-coisismo� , deixam cair muitos nomes, deixam cair muitos livros, parece que l�em muito, l�em muito, n�o l�em quase nada, nunca v�em televis�o, tem gra�a, s�o engra�adinhas, t�m tribos, t�m f�rias, t�m territ�rios, est�o sozinhas, est�o tanto mais sozinhas quanto mais acompanhadas, t�m alguns pais, come�am a ter filhos, t�m maridos, n�o t�m amantes, t�m �o que escrevo � para ti�, t�m �o que escrevo � s� para ti�, t�m �o que escrevo � s� para ti�, mas � s� para mim , ou para o outro(a), n�o t�m muita paci�ncia, t�m pressa de chegar a algum lado, t�m a esperan�a de chegar a qualquer lado, est�o convictos que n�o v�o chegar a lado nenhum, t�m quereres, t�m birras, s�o meli-melo, s�o assim �

� porque se calhar � assim na vida toda.

Como os blogues n�o t�m editor, a vida aparece sem ser editada.

Engano, puro engano. Funciona aqui um gigantesco editor, o monstro que est� dentro.

19 de Julho EARLY MORNING BLOGS 13

Eu sou um adepto do meta-bloguismo, embora pense que o excesso do dito levaria a uma esterilidade completa. O meu meta-bloguismo vem de n�o conseguir usar um meio sem me esfor�ar por o perceber. Num primeiro tempo, este olhar �tira� liberdade, condiciona, �prende� e por isso o meta-bloguismo gera sempre um certo mal-estar. Mas h� um segundo olhar, que se calhar tamb�m vem com o primeiro, que acaba por nos dar uma ainda maior liberdade. Eu sou da escola de quem pensa que conhecer liberta. N�o h� provavelmente maior ilus�o nos �ltimos duzentos anos, do que achar que as �luzes� alumiam, mas eu prefiro um mundo em que se proceda (eu disse proceda e n�o acredite) segundo essa ilus�o.

28 de Julho: EARLY MORNING BLOGS 19

Mat�rias que n�o entram nos blogues: pobreza, desemprego, levar os filhos � escola �s oito da manh�, cozinhar (sem ser por prazer), trabalhos dom�sticos, trabalho de um modo geral com excep��o de algum trabalho intelectual, doen�as, quase todas as formas de escassez. Lugares que n�o entram: locais de trabalho fora de universidades, escolas, firmas de inform�tica, telecomunica��es, e jornais, nove d�cimos de Portugal e muito mais ainda.

Pelo contr�rio, os caminhos do Magn�lia � FNAC do Chiado, do Lux ao Algarve ou ao Alentejo, est�o t�o trilhados nos Moleskines que at� deixam um sulco como os carros de bois nas pedras antigas.Nesta mat�ria n�o h� distin��es nem pol�ticas, nem ideol�gicas, nem esquerda , nem direita.

N�o � um julgamento de valor, porque tamb�m n�o entram no Abrupto, � uma constata��o, chamemos-lhe assim, social. Para que n�o percamos a nossa (a minha) medida.

No dia 13 de Setembro, no EARLY MORNING BLUES 39, j� a negrito, publica-se o primeiro poema:

Foram os �Early Morning Blues� que deram o nome aos �Early Morning Blogs�. H� v�rios e em v�rias vers�es. Aqui est� uma dos The Monkees:

A distant night bird mocks the sun.

I wake as I have always done,

To freshly scented sycamore

And cold bare feet on hardwood floor.

My steaming coffee warms my face

I'm disappointed in the taste.

But there's a peace the early brings

The morning world of growing things.

I feel the moments hurry on

It was today, it's died away,

And now it is forever gone.

And I will drink my coffee slow

And I will watch my shadow grow

And disappear in firelight

And sleep alone again tonight.

e a f�rmula foi-se consolidando. Ainda houve um EARLY MORNING BLOGS / BLUES 45 , um EARLY MORNING BLOGS / BOOKS 47 , um EARLY MORNING BLOGS / SONGS 48. S� bastante depois do cinquenta � que esta parte do Abrupto se tornou o que � hoje. "A poem a day keeps boredom at bay" .

(Devo a uma leitora de sempre a gentileza de ter feito uma antologia dos EARLY MORNINGS que me surpreendeu pelas diferen�as - de "tom" , como se diz no

ou seja era o que � hoje ouma revista de blogues. Depois tombou o "VALE A PENA" e ficou apenas o EARLY MORNING BLOGS, ambos sem negrito. A maioria dos blogues citados nos primeiros cinquenta EARLY MORNINGs j� desapareceram, embora nalguns casos os seus autores tenham aberto outros, fechados de novo e aberto uma terceira vaga.A blogosfera era ent�o muito diferente e estava a mudar muito depressa. O grande surto dos blogues era contempor�neo desta nota. Vinha de ser mais pequena, estava a democratizar-se. Era pol�mica, mas ainda era am�vel. Estava a tornar-se �cida t�o rapidamente quanto se estava a democratizar. Nos EARLY MORNING BLOGs tentou acompanhar-se essas mudan�as dando origem �quilo que se veio a chamar "metabloguismo". Recorde-se para a mem�ria que o meta-bloguismo foi recebido com muita hostilidade, em particular pelos autores de blogues pioneiros. Exemplos de metabloguismo nos primeiros cinquenta EARLY MORNING BLOGs:No dia 13 de Setembro, noj� a negrito, publica-se o primeiro poema:e a f�rmula foi-se consolidando. Ainda houve um, um, umS� bastante depois do cinquenta � que esta parte do Abrupto se tornou o que � hoje.(Devo a uma leitora de sempre a gentileza de ter feito uma antologia dos EARLY MORNINGS que me surpreendeu pelas diferen�as - de "tom" , como se diz no Miniscente , o que nunca se repete -, embora n�o com as continuidades, porque eu sou da escola teimosa em mat�ria do pensamento e opini�o.)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 23 de Junho de 2006

� Mahomet n�est ici autre chose que Tartuffe les armes � la main .�

*

Muito, muito interessante

Veja-se este exemplo de uma cr�tica de um leitor:

Em Fran�a, no meio do inc�modo geral e de muitos sil�ncios (uma excep��o em La R�publique des Livres ) , republica-se Le Fanatisme ou Mahomet et le proph�te de Voltaire, uma pe�a de teatro, como o nome indica, contra o fanatismo e a utiliza��o da religi�o para fomentar o assassinato . Voltaire dizia :.�Muito, muito interessante a an�lise e os exemplos (via Frescos ) com que o (ou a? � masculino ou feminino?) Slate examina as cr�ticas dos seus leitores e o problema de uma publica��o na Rede corrigir junto da nota original, uma vez esta colocada num arquivo. O modo como no texto em linha se circula entre os tempos do presente e do passado, particularmente quando o passado � tornado presente por novos dados e pelas rectifica��es dos erros, ainda n�o est� resolvido.Veja-se este exemplo de uma cr�tica de um leitor: "So, if, for instance, you think you've nailed President Bush in an error, link to the whole speech, so people can see the context. That way, when you're mocking Bush for saying, "I'm honored to shake the hand of a brave Iraqi citizen who had his hand cut off by Saddam Hussein," readers can easily go to the full quote, and see that it says I'm honored to shake the hand of a brave Iraqi citizen who had his hand cut off by Saddam Hussein. � I appreciate Joe Agris, the doctor who helped put these hands on these men. � These men had hands restored because of the generosity and love of an American citizen � Bush was shaking the prosthetic hands of people whose real hands had been cut off by Hussein. In context, there's nothing risible about his statement (as Spinsanity also noted; for similar examples, see here, here, and here). Because of this, I think the Bushisms column shouldn't have run this statement. But I realize that others may disagree. That's why, rather than the impossible first-best world of "always quote accurate sources, and in context," I prefer the second-best world in which writers try their hardest to be accurate, but also provide the sources so readers can judge for themselves." *

Por falar em Timor, est� na altura de os �rg�os de comunica��o social come�arem a preparar outra ida e volta dos seus enviados. At� para se saber o que est� l� a fazer a GNR, e que timorenses mandam nela, Xanana ou o governo do pa�s. A n�o ser que tudo isso seja uma fic��o e sejam as autoridades portuguesas a decidir quais os timorenses que t�m legitimidade para dar ordens � GNR, ou seja, tomem partido. Ent�o, nesse caso, um governo democr�tico (o nosso) devia ir � Assembleia explicar as suas op��es, e uma oposi��o a s�rio devia exigi-las. A n�o ser assim temos que ler os jornais australianos para saber o papel de Portugal na crise de poder em Timor.

*

A doen�a dos t�tulos: em cami�es e autocarros � capital timorense e juntaram-se �s cerca de 700 pessoas que passaram a noite diante do Pal�cio do Governo. " Mais do que isto, o jornalista n�o sabe e provavelmente n�o pode saber. Por falar em Timor, est� na altura de os �rg�os de comunica��o social come�arem a preparar outra ida e volta dos seus enviados. At� para se saber o que est� l� a fazer a GNR, e que timorenses mandam nela, Xanana ou o governo do pa�s. A n�o ser que tudo isso seja uma fic��o e sejam as autoridades portuguesas a decidir quais os timorenses que t�m legitimidade para dar ordens � GNR, ou seja, tomem partido. Ent�o, nesse caso, um governo democr�tico (o nosso) devia ir � Assembleia explicar as suas op��es, e uma oposi��o a s�rio devia exigi-las. A n�o ser assim temos que ler os jornais australianos para saber o papel de Portugal na crise de poder em Timor.A doen�a dos t�tulos: "Timorenses solid�rios com Xanana" . Todos? A maioria? A resposta certa � "alguns" que at� podem ser muitos, os que s�o trazidos "" Mais do que isto, o jornalista n�o sabe e provavelmente n�o pode saber.

EARLY MORNING BLOGS

800

Soneto

Acusam-me de m�goa e desalento,

como se toda a pena dos meus versos

n�o fosse carne vossa, homens dispersos,

e a minha dor a tua, pensamento.

Hei-de cantar-vos a beleza um dia,

quando a luz que n�o nego abrir o escuro

da noite que nos cerca como um muro,

e chegares a teus reinos, alegria.

Entretanto, deixai que me n�o cale:

at� que o muro fenda, a treva estale,

seja a tristeza o vinho da vingan�a.

A minha voz de morte � a voz da luta:

se quem confia a pr�pria dor perscruta,

maior gl�ria tem em ter esperan�a.

(Carlos de Oliveira)

*

Bom dia! (Carlos de Oliveira)Bom dia!

OS BLOGUES ANTES DOS BLOGUES

" Tenho o fragmento no sangue. "

(Cioran)

(Cioran)

A escrita que se encontra hoje nos blogues � velha como o tempo, embora o tempo pregue partidas, transformando as coisas noutras muito diferentes. O tempo � aquilo a que hoje se chama os "suportes", no caso da escrita na Rede, a forma dos blogues.

Repito, a tecnologia do software em que assentam os blogues tem um papel ao moldar a sua forma. Vimos no artigo anterior como ela valoriza o presente, presentificando a escrita, obrigando-a � actualidade. Agora podemos ver como ela acentua aspectos da escrita: favorece o texto contido, aquilo que na linguagem da blogosfera se chama o "post curto". O "post curto" gera uma tens�o sobre o espa�o das palavras, acentua a utiliza��o est�tica da frase, em combina��o com o t�tulo e com outros elementos gr�ficos. O facto de os blogues poderem usar simultaneamente texto e imagens, sons e v�deo est� a dar origem � primeira grande vaga de um novo tipo de textos, nascidos na Rede e para serem lidos na Rede.

Os blogues revelam e geram

Ora nem todo o tipo de texto, nem todos os conte�dos se prestam a esta nova forma que despeda�a legibilidades antigas a favor de novas. No "post curto" a escrita vai desde a mera frase com uma liga��o, ou seja, uma porta, um caminho que nos leva para longe daquela p�gina, daquele ecr� at� � entrada diar�stica, impressionista ou faceta, at� ao mini-ensaio, pouco mais do que o aforismo. � uma escrita que favorece, comunicando quer com os t�tulos de jornais, quer com o aforismo, a utiliza��o de mecanismos po�ticos, mas tamb�m humor�sticos e sarc�sticos. Nesse sentido os blogues caem sob

Que textos t�m esta qualidade de serem protoblogues? Toda a escrita moldada pelo tempo, ou pela "constru��o" da personagem (ou da obra) pelo tempo. Os di�rios, ou uma forma muito francesa de di�rios, os "cadernos". Mas tamb�m alguma correspond�ncia e ensaios. Textos que colocados em blogues parecem ser escritos para blogues encontram-se no Para Al�m do Bem e do Mal de Nietzsche, em anota��es de Kafka, A escrita que se encontra hoje nos blogues � velha como o tempo, embora o tempo pregue partidas, transformando as coisas noutras muito diferentes. O tempo � aquilo a que hoje se chama os "suportes", no caso da escrita na Rede, a forma dos blogues.Repito, a tecnologia do software em que assentam os blogues tem um papel ao moldar a sua forma. Vimos no artigo anterior como ela valoriza o presente, presentificando a escrita, obrigando-a � actualidade. Agora podemos ver como ela acentua aspectos da escrita: favorece o texto contido, aquilo que na linguagem da blogosfera se chama o "post curto". O "post curto" gera uma tens�o sobre o espa�o das palavras, acentua a utiliza��o est�tica da frase, em combina��o com o t�tulo e com outros elementos gr�ficos. O facto de os blogues poderem usar simultaneamente texto e imagens, sons e v�deo est� a dar origem � primeira grande vaga de um novo tipo de textos, nascidos na Rede e para serem lidos na Rede.Os blogues revelam e geram novas normas de leitura na Rede que s�o distintas dos livros, acentuando a n�o-linearidade da leitura . Esta segue n�o apenas a frase, mas as liga��es, ganha em espessura ao deslocar-se entre as diferentes p�ginas associadas pelo hipertexto ( mais em Hypertext ). Move-se n�o apenas no texto, mas tamb�m pelas imagens e sons ligados ao texto, em detrimento da leitura sequencial, habitual no livro e nos jornais. A leitura num ecr� raras vezes anda para tr�s, tende a andar para o lado antes de andar para a frente. A escrita nos blogues � moldada por estas caracter�sticas f�sicas do novo texto electr�nico e, no seu conjunto, est� a ensinar a uma gera��o um novo c�none de leitura e escrita que poucos exploram conscientemente, mas que molda a todos.Ora nem todo o tipo de texto, nem todos os conte�dos se prestam a esta nova forma que despeda�a legibilidades antigas a favor de novas. No "post curto" a escrita vai desde a mera frase com uma liga��o, ou seja, uma porta, um caminho que nos leva para longe daquela p�gina, daquele ecr� at� � entrada diar�stica, impressionista ou faceta, at� ao mini-ensaio, pouco mais do que o aforismo. � uma escrita que favorece, comunicando quer com os t�tulos de jornais, quer com o aforismo, a utiliza��o de mecanismos po�ticos, mas tamb�m humor�sticos e sarc�sticos. Nesse sentido os blogues caem sob a cr�tica que Luk�cs fazia aos textos de Nietzsche - a de serem, pela sua forma, naturalmente irracionalistas, valorizando a met�fora, a sedu��o est�tica, em detrimento da argumenta��o.Que textos t�m esta qualidade de serem protoblogues? Toda a escrita moldada pelo tempo, ou pela "constru��o" da personagem (ou da obra) pelo tempo. Os di�rios, ou uma forma muito francesa de di�rios, os "cadernos". Mas tamb�m alguma correspond�ncia e ensaios. Textos que colocados em blogues parecem ser escritos para blogues encontram-se node Nietzsche, em anota��es de Kafka, nos "propos" de Alain, nos di�rios de Morand, nos "cadernos" de Camus, Valery e Cioran. Noutros casos, o tempo e a hist�ria "partiram" os textos originais, dando-lhe essa qualidade de escrita de blogues, como acontece com os fragmentos dos pr�-socr�ticos, restos de textos mais compridos, de tratados e de livros. E muito do que encontramos em dicion�rios de cita��es, frases que vivem por si pr�prias, s�o mat�ria-prima de blogues.

No plano gr�fico, muitos "cadernos" de desenhos, a come�ar pelos desenhos de Leonardo da Vinci com anota��es, muito dos moleskines de artistas, em que o esbo�o e o texto manuscrito se entrela�am, alguma banda desenhada, alguns livros de viagens. A fotografia deu origem a fotoblogues, mas est� longe de revelar as suas potencialidades na constru��o narrativa dos blogues, para onde transporta, em imagem, tudo o que valoriza o texto curto: a impress�o, o fragmento da realidade, o "olhar" no tempo. No v�deo, o sketch , o pequeno filme caseiro do g�nero dos "apanhados", alguns filmes publicit�rios. O som � o menos explorado nos blogues, mas a sua utiliza��o, por exemplo no

Muito significativamente, todo este tipo de material � favorito na actividade de "c�pia-colagem" que tamb�m a forma blogue e a Rede favorecem, apropriando-se cada um das cita��es, de textos e imagens que servem de refor�o da sua identidade em linha. Nalgumas experi�ncias com sucesso na blogosfera, di�rios foram colocados na Rede, como o de Samuel Pepys, que foi transformado num

Seria poss�vel fazer o mesmo com muitos "cadernos" de Cioran, Camus e Valery, muito diferentes entre si, mas todos passando o teste do blogue. O facto de, no caso de Cioran, este n�o ter a inten��o de os divulgar e inclusive ter pedido para que fossem destru�dos, n�o retira aos seus textos a puls�o fragment�ria que os aproxima do registo dos blogues. Ali�s, Cioran, autor dos

Valery passava o teste e os seus cadernos ganhariam muito com o uso de hipertexto e liga��es. Um aspecto fundamental, nos cadernos de Valery, � a sua utiliza��o como instrumento para a constru��o da obra, como meio de treinar o pensamento, mas tamb�m de o desenvolver, experimentar, testar, deixando-o aparecer sem a responsabilidade do ensaio final, do livro a publicar. Valery usava os seus cadernos, que escreveu ininterruptamente (no final eram cerca de 261 com 28.000 p�ginas), como um instrumento para pensar, fazendo uso n�o s� da escrita, mas tamb�m do desenho, e escrevendo sobre tudo: arte, filosofia, poesia, matem�tica. E escreveu sobre como o "eu", como o "seu cogito" "funcionava", mat�ria de blogues, como se sabe.

Camus �, de todos, quem, sem d�vidas, faria um blogue excepcional. A escrita, umas vezes mais tensa e outras mais solta, curta e imag�tica, intercalando fragmentos de di�logos, recorda��es de paisagens e de encontros, notas de leitura, revela o olhar de Camus sobre a sua geografia africana peculiar, a Arg�lia, e sobre os acontecimentos que est� a viver. Os cadernos de Camus n�o s� suportariam

Em todos os casos que referi, a legibilidade dos textos na actualidade ganharia com a forma blogue, pela representa��o mais perfeita do tempo que a Rede permite. Os cadernos de Camus s�o os que melhor se l�em, enquanto os de Valery e de Cioran s� s�o leg�veis, na sua forma livro, em antologias depuradas. O de Cioran tem centenas de p�ginas de um grosso volume e os de Valery estendem-se por dez volumes na edi��o da Gallimard. Mesmo em Portugal foram os �nicos divulgados numa edi��o barata e popular, de h� muito esgotada.

Por tudo isto, valia a pena, e acabar� com certeza por ser feito, o teste pr�tico de colocar todas estas escritas na Rede usando modelos iguais ou pr�ximos dos blogues. A blogosfera ter� ent�o ao seu lado Nietzsche, Valery, Camus, Cioran e tantos outros, como autores de blogues.

(No P�blico .)

nos "propos" de Alain, nos di�rios de Morand, nos "cadernos" de Camus, Valery e Cioran. Noutros casos, o tempo e a hist�ria "partiram" os textos originais, dando-lhe essa qualidade de escrita de blogues, como acontece com os fragmentos dos pr�-socr�ticos, restos de textos mais compridos, de tratados e de livros. E muito do que encontramos em dicion�rios de cita��es, frases que vivem por si pr�prias, s�o mat�ria-prima de blogues.No plano gr�fico, muitos "cadernos" de desenhos, a come�ar pelos desenhos de Leonardo da Vinci com anota��es, muito dos moleskines de artistas, em que o esbo�o e o texto manuscrito se entrela�am, alguma banda desenhada, alguns livros de viagens. A fotografia deu origem a fotoblogues, mas est� longe de revelar as suas potencialidades na constru��o narrativa dos blogues, para onde transporta, em imagem, tudo o que valoriza o texto curto: a impress�o, o fragmento da realidade, o "olhar" no tempo. No v�deo, o, o pequeno filme caseiro do g�nero dos "apanhados", alguns filmes publicit�rios. O som � o menos explorado nos blogues, mas a sua utiliza��o, por exemplo no Kottke.org como complemento de viagem - o som dos sem�foros de Singapura, o ru�do de um mercado, o barulho de uma f�brica -, acentua a fragmenta��o da narrativa ou da ilustra��o que est� no �mago da escrita dos blogues.Muito significativamente, todo este tipo de material � favorito na actividade de "c�pia-colagem" que tamb�m a forma blogue e a Rede favorecem, apropriando-se cada um das cita��es, de textos e imagens que servem de refor�o da sua identidade em linha. Nalgumas experi�ncias com sucesso na blogosfera, di�rios foram colocados na Rede, como o de Samuel Pepys, que foi transformado num blogue , com o texto original e liga��es, dando uma nova legibilidade ao texto original do s�culo XVII.Seria poss�vel fazer o mesmo com muitos "cadernos" de Cioran, Camus e Valery, muito diferentes entre si, mas todos passando o teste do blogue. O facto de, no caso de Cioran, este n�o ter a inten��o de os divulgar e inclusive ter pedido para que fossem destru�dos, n�o retira aos seus textos a puls�o fragment�ria que os aproxima do registo dos blogues. Ali�s, Cioran, autor dos Silogismos da Amargura � um cultor de uma forma de escrita muito adaptada ao "post curto".Valery passava o teste e os seus cadernos ganhariam muito com o uso de hipertexto e liga��es. Um aspecto fundamental, nos cadernos de Valery, � a sua utiliza��o como instrumento para a constru��o da obra, como meio de treinar o pensamento, mas tamb�m de o desenvolver, experimentar, testar, deixando-o aparecer sem a responsabilidade do ensaio final, do livro a publicar. Valery usava os seus cadernos, que escreveu ininterruptamente (no final eram cerca de 261 com 28.000 p�ginas), como um instrumento para pensar, fazendo uso n�o s� da escrita, mas tamb�m do desenho, e escrevendo sobre tudo: arte, filosofia, poesia, matem�tica. E escreveu sobre como o "eu", como o "seu cogito" "funcionava", mat�ria de blogues, como se sabe.Camus �, de todos, quem, sem d�vidas, faria um blogue excepcional. A escrita, umas vezes mais tensa e outras mais solta, curta e imag�tica, intercalando fragmentos de di�logos, recorda��es de paisagens e de encontros, notas de leitura, revela o olhar de Camus sobre a sua geografia africana peculiar, a Arg�lia, e sobre os acontecimentos que est� a viver. Os cadernos de Camus n�o s� suportariam o formato do blogue , como ganhariam com a imagem na sua dimens�o mediterr�nica. Ganhariam tamb�m com o hipertexto, embora menos que Valery ou Cioran, que quase o exigem para serem devidamente lidos.Em todos os casos que referi, a legibilidade dos textos na actualidade ganharia com a forma blogue, pela representa��o mais perfeita do tempo que a Rede permite. Os cadernos de Camus s�o os que melhor se l�em, enquanto os de Valery e de Cioran s� s�o leg�veis, na sua forma livro, em antologias depuradas. O de Cioran tem centenas de p�ginas de um grosso volume e os de Valery estendem-se por dez volumes na edi��o da Gallimard. Mesmo em Portugal foram os �nicos divulgados numa edi��o barata e popular, de h� muito esgotada.Por tudo isto, valia a pena, e acabar� com certeza por ser feito, o teste pr�tico de colocar todas estas escritas na Rede usando modelos iguais ou pr�ximos dos blogues. A blogosfera ter� ent�o ao seu lado Nietzsche, Valery, Camus, Cioran e tantos outros, como autores de blogues.(No.)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 22 de Junho de 2006

Eu bem sei que a vida est� dif�cil para os jornais, mas o que � que leva o P�blico a pensar que dedicar as suas primeiras dezassete p�ginas ao futebol, antes de come�ar o jornal propriamente dito, lhe acrescenta alguma coisa que os seus leitores n�o encontram noutro lado? Quem � que vai comprar o P�blico para ler sobre futebol? E quem � que vai deixar de comprar o P�blico porque ele n�o embarca (n�o embarcava) no reino da Futebol�ndia?

*

Sobre as teorias da conspira��o ver os "

*

com pares e trios e quartetos muito especiais. Um usa muitos an�is, outro � muito frio, outro faz pela vida no meio dos grandes, outro respira uma atmosfera muito especial. Eu bem sei que a vida est� dif�cil para os jornais, mas o que � que leva oa pensar que dedicar as suas primeiras dezassete p�ginas ao futebol, antes de come�ar o jornal propriamente dito, lhe acrescenta alguma coisa que os seus leitores n�o encontram noutro lado? Quem � que vai comprar opara ler sobre futebol? E quem � que vai deixar de comprar oporque ele n�o embarca (n�o embarcava) no reino da Futebol�ndia?Sobre as teorias da conspira��o ver os " professores da paranoia ". V�rias dan�as com pares e trios e quartetos muito especiais. Um usa muitos an�is, outro � muito frio, outro faz pela vida no meio dos grandes, outro respira uma atmosfera muito especial.

EARLY MORNING BLOGS

799

Just Keep Quiet and Nobody Will Notice

There is one thing that ought to be taught in all the colleges,

Which is that people ought to be taught not to go around always making apologies.

I don't mean the kind of apologies people make when they run over you or borrow five dollars or step on your feet,

Because I think that is sort of sweet;

No, I object to one kind of apology alone,

Which is when people spend their time and yours apologizing for everything they own.

You go to their house for a meal,

And they apologize because the anchovies aren't caviar or the partridge is veal;

They apologize privately for the crudeness of the other guests,

And they apologzie publicly for their wife's housekeeping or their husband's jests;

If they give you a book by Dickens they apologize because it isn't by Scott,

And if they take you to the theater, they apologize for the acting and the dialogue and the plot;

They contain more milk of human kindness than the most capacious dairy can,

But if you are from out of town they apologize for everything local and if you are a foreigner they apologize for everything American.

I dread these apologizers even as I am depicting them,

I shudder as I think of the hours that must be spent in contradicting them,

Because you are very rude if you let them emerge from an argument victorious,

And when they say something of theirs is awful, it is your duty to convince them politely that it is magnificent and glorious,

And what particularly bores me with them,

Is that half the time you have to politely contradict them when you rudely agree with them,

So I think there is one rule every host and hostess ought to keep with the comb and nail file and bicarbonate and aromatic spirits on a handy shelf,

Which is don't spoil the denouement by telling the guests everything is terrible, but let them have the thrill of finding it out for themselves.

(Ogden Nash)

*

Bom dia! (Ogden Nash)Bom dia!

LENDO / VENDO /OUVINDO

(BLOGUES, JORNAIS, TELEVIS�ES, IMAGENS, SONS, PAP�IS, PAREDES)

(20 de Junho de 2006)

"Ver" o P�lo Norte em tempo real: uma "Ver" o P�lo Norte em tempo real: uma Web Cam num dos s�tios mais bizarros da terra. Na realidade, no meio do mar.

EARLY MORNING BLOGS

798

Enfin quelle apparence de pouvoir remplir tous les go�ts si diff�rents des hommes par un seul ouvrage de morale?

Les uns cherchent des d�finitions, des divisions, des tables, et de la m�thode: ils veulent qu'on leur explique ce que c'est que la vertu en g�n�ral, et cette vertu en particulier; quelle diff�rence se trouve entre la valeur, la force et la magnanimit�; les vices extr�mes par le d�faut ou par l'exc�s entre lesquels chaque vertu se trouve plac�e, et duquel de ces deux extr�mes elle emprunte davantage; toute autre doctrine ne leur pla�t pas. Les autres, contents que l'on r�duise les moeurs aux passions et que l'on explique celles-ci par le mouvement du sang, par celui des fibres et des art�res, quittent un auteur de tout le reste.

Il s'en trouve d'un troisi�me ordre qui, persuad�s que toute doctrine des moeurs doit tendre � les r�former, � discerner les bonnes d'avec les mauvaises, et � d�m�ler dans les hommes ce qu'il y a de vain, de faible et de ridicule, d'avec ce qu'ils peuvent avoir de bon, de sain et de louable, se plaisent infiniment dans la lecture des livres qui, supposant les principes physiques et moraux rebattus par les anciens et les modernes, se jettent d'abord dans leur application aux moeurs du temps, corrigent les hommes les uns par les autres, par ces images de choses qui leur sont si famili�res, et dont n�anmoins ils ne s'avisaient pas de tirer leur instruction.

Tel est le trait� des Caract�res des moeurs que nous a laiss� Th�ophraste.

(La Bruy�re, Les caract�res ou Les moeurs de ce si�cle )

*

Bom dia!

EARLY MORNING BLOGS

797

Me voici donc seul sur la terre, n'ayant plus de fr�re, de prochain, d'ami, de soci�t� que moi-m�me. Le plus sociable et le plus aimant des humains en a �t� proscrit par un accord unanime. Ils ont cherch� dans les raffinements de leur haine quel tourment pouvait �tre le plus cruel � mon �me sensible, et ils ont bris� violemment tous les liens qui m'attachaient � eux. J'aurais aim� les hommes en d�pit d'eux-m�mes. Ils n'ont pu qu'en cessant de l'�tre se d�rober � mon affection. Les voil� donc �trangers, inconnus, nuls enfin pour moi puisqu'ils l'ont voulu. Mais moi, d�tach� d'eux et de tout, que suis-je moi-m�me? Voil� ce qui me reste � chercher. Malheureusement cette recherche doit �tre pr�c�d�e d'un coup d'oeil sur ma position. C'est une id�e par laquelle il faut n�cessairement que je passe pour arriver d'eux � moi.

(Jean-Jacques Rousseau, Les r�veries du promeneur solitaire )

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Bom dia! (Jean-Jacques Rousseau,Bom dia!

FUTEBOL�NDIA

Obrigado por Obrigado por este presente

NUNCA � TARDE PARA APRENDER OU " EU BEM SABIA QUE DEVIA HAVER ALGO DE DEMON�ACO NOS TELEM�VEIS" 2 Stephen King, Cell

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. H� coisas que Stephen King faz sempre bem: � um mestre da Surpresa. N�o h� suspense nos seus livros, mas sim pura Surpresa. Depois come�a sempre de uma maneira que, � segunda p�gina, j� n�o se larga o livro. L� para a frente, esmorece um pouco, escreve demais, repete-se, mas percebe-se sempre a capacidade de dom�nio sobre o leitor, fundamental em livros que usam o terror, o medo, como sedu��o. N�o � arte � of�cio, mas � excelente of�cio, profissional, capaz. N�o admira que venda mais do que qualquer outro autor popular.

EARLY MORNING BLOGS 796

Alice was beginning to get very tired of sitting by her sister on the bank, and of having nothing to do: once or twice she had peeped into the book her sister was reading, but it had no pictures or conversations in it, 'and what is the use of a book,' thought Alice 'without pictures or conversation?'

So she was considering in her own mind (as well as she could, for the hot day made her feel very sleepy and stupid), whether the pleasure of making a daisy-chain would be worth the trouble of getting up and picking the daisies, when suddenly a White Rabbit with pink eyes ran close by her.

There was nothing so very remarkable in that; nor did Alice think it so very much out of the way to hear the Rabbit say to itself, 'Oh dear! Oh dear! I shall be late!' (when she thought it over afterwards, it occurred to her that she ought to have wondered at this, but at the time it all seemed quite natural); but when the Rabbit actually took a watch out of its waistcoat-pocket, and looked at it, and then hurried on, Alice started to her feet, for it flashed across her mind that she had never before seen a rabbit with either a waistcoat-pocket, or a watch to take out of it, and burning with curiosity, she ran across the field after it, and fortunately was just in time to see it pop down a large rabbit-hole under the hedge.

In another moment down went Alice after it, never once considering how in the world she was to get out again.

(Lewis Carroll)

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Bom dia! (Lewis Carroll)Bom dia!

COISAS SIMPLES

(Marie Kroyer) (Marie Kroyer)

NUNCA � TARDE PARA APRENDER OU " EU BEM SABIA QUE DEVIA HAVER ALGO DE DEMON�ACO NOS TELEM�VEIS" Stephen King, Cell

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O fim do mundo chega pelos telem�veis.

LUIS FILIPE CASTRO MENDES - PORTUGAL E O BRASIL : ATRIBULA��ES DE DUAS IDENTIDADES

Como foi que temperaste,

Portugal, meu av�zinho,

Esse gosto misturado

De saudade e de carinho?

MANUEL BANDEIRA

Numa terra radiosa vive um povo

triste. Legaram-lhe essa melancolia

os descobridores que a revelaram ao

mundo e a povoaram.

PAULO PRADO

I DA INFELICIDADE DE SER IB�RICO�

Um preconceito hist�rico, persistente no nosso universo cultural desde o S�culo das Luzes, enfatiza o atraso e a barb�rie dos desgra�ados povos ib�ricos, afastados pelo obscurantismo pol�tico e religioso das luzes da civiliza��o, um degrau apenas acima dos mouros e dos cafres, culpados de n�o serem protestantes, norte-europeus e, consequentemente, trabalhadores, individualistas e empreendedores. Durante os s�culos XVIII e XIX, Portugal e a Espanha s�o vistos pelo mundo civilizado (isto �, o mundo organizado conforme os interesses das pot�ncias dominantes) como qualquer coisa de interm�dio entre a civiliza��o e o exotismo, n�o t�o estranhos que coubessem nos estudos dos orientalistas, mas suficientemente bizarros para despertarem a ironia superior dos viajantes e o fasc�nio er�tico dos poetas e novelistas.

Ironia da Hist�ria: esta unidade de destino entre portugueses e espanh�is decorre mais da rejei��o de que os dois pa�ses foram alvo por parte dos novos centros de poder mundial emergentes no limiar da modernidade, isto �, no fim da idade barroca, do que de uma real identidade de projectos hist�ricos. No s�culo XVI, portugueses e espanh�is, ciosos das suas soberanias e rivais na expans�o mar�tima, sentiam-se, n�o obstante, partilhar uma cultura comum. Mas esta identidade cultural ib�rica, bem vis�vel em Gil Vicente ou Cam�es, quebrou-se no s�culo XVII, com a tentativa filipina de unifica��o pol�tica sob hegemonia castelhana, que veio determinar um persistente div�rcio pol�tico e cultural entre os dois pa�ses, de que s� hoje come�amos, felizmente, a sair.

Eduardo Louren�o, no seu ensaio N�s e a Europa ou as Duas Raz�es, contrap�e � raz�o cartesiana, que funda a nossa modernidade, uma outra raz�o, ib�rica, contra-reformista, barroca, de que o expoente seria Graci�n, o da Agudeza e Arte de Engenho. Nessa raz�o barroca participaram espanh�is e portugueses, mas tamb�m o que, a partir dos espanh�is e dos portugueses, se formava do outro lado do Atl�ntico: n�o s�o Sor Juana In�s de la Cruz e o Padre Ant�nio Vieira express�es maiores do barroco universal, como o vir� a ser, num genial anacronismo, a escultura do Aleijadinho? N�o foi a Ratio Studiorum dos jesu�tas uma matriz fundadora da cultura no Brasil?

Mas a verdade � que esta rejei��o da cultura ib�rica foi assumida por um grande n�mero de historiadores brasileiros como a chave que explicaria todos os atrasos, injusti�as e opress�es sofridos pelo Brasil. A coloniza��o portuguesa seria o pecado original desta terra, o que lhe vedara o acesso ao para�so ou os caminhos da modernidade.

Esta ideia encontra-se formulada exemplarmente na obra cl�ssica de S�rgio Buarque de Holanda Ra�zes do Brasil. Todos os obst�culos ao desenvolvimento do Brasil derivariam dos tra�os de car�cter herdados do colonizador portugu�s, reconstru�dos como um tipo-ideal, � maneira de Max Weber, e contrapostos (sempre seguindo a li��o de Weber) �queles que fundamentam o esp�rito moderno, essencialmente derivados da �tica do protestantismo. Da� o grande confronto, obsessivo na cultura brasileira, entre o Brasil e os Estados Unidos, encarados estes, mesmo quando demonizados, como o supremo paradigma. Bandeirantes e Pioneiros de Vianna Moog � a triste elegia a um Brasil que poderia ter sido, um Brasil que se poderia vir a identificar com os Estados Unidos.

Conhecemos a grande obra de interpreta��o do Brasil antag�nica desta vis�o, que foi a de Gilberto Freyre. Para o autor de Casa Grande e Senzala foi da coloniza��o portuguesa e da escravid�o africana que provieram toda a originalidade e a inova��o da civiliza��o brasileira, atrav�s do processo de miscigena��o. Freyre n�o idealiza o processo colonizador, mas escreve de uma hist�ria olhada sem ressentimentos, com o amor fati nietzscheano e a permanente gula dos sentidos que o tornam o mais moderno de todos os seus contempor�neos.

Com a not�vel excep��o de Vamireh Chacon, as correntes dominantes do pensamento social brasileiro de tend�ncias mais progressistas tenderam a identificar as teses de Gilberto Freyre com o conservadorismo e a nostalgia de uma sociedade patriarcal e pr�-moderna, colocando assim as ideias do mestre de Apicucos como mais um obst�culo ao progresso e � emancipa��o dos brasileiros. Uma rejei��o global que Jos� Guilherme Merquior, grande desmistificador, qualificou um dia de �suprema burrice�.

Sem querer intervir neste debate (porque penso, como Alfredo Bosi, que � uma quest�o ociosa escolher agora quem teriam sido os melhores colonizadores), julgo necess�rio integorrarmo-nos em que medida as duas correntes de interpreta��o aqui demarcadas partilhariam um terreno comum, uma vis�o que da imagem constru�da do passado hist�rico deriva para um olhar intemporal sobre o Outro, o portugu�s, e em que medida n�s, os portugueses, nos confrontamos ainda e sempre com essa imagem intemporal que de n�s foram tecendo os brasileiros no processo de constru��o da sua pr�pria identidade (a piada de portugu�s � apenas a manifesta��o mais superficial e inocente dessa imagem estereotipada).

II �� DESGRA�A DE SER PORTUGU�S

O facto � que Portugal hoje aparece no Brasil, de forma in�dita, e para surpresa e desconcerto de alguns brasileiros, como um pa�s exportador de investimentos produtivos, alguns em sectores de elevada tecnologia, e n�o mais como um mero exportador de m�o-de-obra pouco qualificada para pequenas empresas de com�rcio e servi�os. Esta mudan�a da base material da presen�a portuguesa no Brasil, embora custe muito a ser digerida por alguns (para o historiador Lu�s Felipe de Alencastro, por exemplo, o investimento portugu�s seria apenas um bra�o subordinado do capital espanhol, esse sim o verdadeiro actor da Hist�ria), n�o deixou de trazer mudan�as sens�veis � percep��o de Portugal do outro lado do Atl�ntico. Acresce que a imagem de Portugal como persist�ncia de uma sociedade de Antigo Regime encravada na modernidade europeia, t�o cultivada tamb�m pela intelectualidade brasileira, mesmo quando solidariamente a denunciava, dificilmente se sustenta face � realidade actual de um pa�s democr�tico, moderno e integrado na Uni�o Europeia.

Conv�m n�o esquecer que a imagem de Portugal para os brasileiros foi durante muito tempo a de um pa�s atrasado, arcaico, imune � mudan�a, ancorado no tempo como uma nau de pedra silenciosa. Para os conservadores aut�ntico guardi�o das tradi��es de que nasceu o Brasil, para os progressistas resumo de tudo o que o Brasil deveria destruir dentro de si para ser verdadeiramente moderno e autenticamente justo, Portugal s� era tratado pelos brasileiros como um antepassado.

A recente comemora��o dos 500 anos do �descobrimento� ou �achamento� ou �encontro� dividiu o Brasil. De um lado os que aceitam a heran�a portuguesa como uma matriz fundadora da identidade brasileira; do outro aqueles que, n�o podendo negar essa realidade, n�o se conformam com ela, porque pensam sinceramente que todos os atrasos e as injusti�as do Brasil derivaram em linha directa da coloniza��o portuguesa.

Para dar um exemplo, entre os mais not�veis, um livro como Os Donos do Poder de Raymundo Faoro, na sua vis�o fixista da sociedade brasileira (tudo se joga na sociedade estamental herdada da coloniza��o portuguesa, que se mant�m metafisicamente incorrupta atrav�s dos s�culos), vem tornar mais compreens�vel a dificuldade que os brasileiros sentem em reconhecer no antigo pa�s colonizador mudan�as que muitas vezes n�o conseguem ver no seu pr�prio pa�s. � que o Brasil nunca ser� �um imenso Portugal�, como cantava Chico Buarque, pela simples raz�o de que h� quase 200 anos que vivemos separados.

Na verdade, para um portugu�s � mais claro e mais saud�vel este sentimento de separa��o do Brasil do que para um brasileiro. Para n�s, o colonialismo portugu�s jogou-se no nosso tempo nos dramas de �frica e h� muito j� que reconhecemos o Brasil como uma outra na��o. N�o assim no Brasil, que, de um certo modo, introjectou Portugal, incorporou-o a si mesmo (antropofagicamente, como diriam os modernistas de 1922), olhando-o quase como um cap�tulo do seu passado, como uma refer�ncia incontorn�vel (para o bem e para o mal) da afirma��o da sua pr�pria identidade, mas que, por isso mesmo, se tornou estranhamente invis�vel aos brasileiros enquanto realidade existente e pa�s actual, como diagnosticava Eduardo Louren�o na sua l�cida Nau de �caro. Como se para os brasileiros o �nico sentido de ser portugu�s fosse vir a tornar-se brasileiro�

Acresce que � escala mundial vivemos hoje tempos de uma curiosa ofensiva ideol�gica anti-europeia, fomentada por algum pensamento �politicamente correcto�. Atrav�s do conceito de �p�s-colonial�, conceb

INTEND�NCIA

Parece, sublinho, parece, que os problemas de migra��o dos computadores v�o ser resolvidos, sem qualquer recurso � ajuda e assist�ncia da HP. A solu��o veio-me dos leitores do Abrupto que j� tinham tido que resolver problemas id�nticos, tamb�m sem qualquer ajuda da HP, revelando s�rias incompatibilidades da instala��o original do software feita pelo fabricante. � uma solu��o trabalhosa e com outro tipo de dificuldades, mas que me parecem (talvez) mais f�ceis de resolver. Seja como for, se acabar por ficar com o computador, este ser� o �ltimo HP que compro.

Em breve darei pormenores. Parece, sublinho, parece, que os problemas de migra��o dos computadores v�o ser resolvidos, sem qualquer recurso � ajuda e assist�ncia da HP. A solu��o veio-me dos leitores do Abrupto que j� tinham tido que resolver problemas id�nticos, tamb�m sem qualquer ajuda da HP, revelando s�rias incompatibilidades da instala��o original do software feita pelo fabricante. � uma solu��o trabalhosa e com outro tipo de dificuldades, mas que me parecem (talvez) mais f�ceis de resolver. Seja como for, se acabar por ficar com o computador, este ser� o �ltimo HP que compro.Em breve darei pormenores.

EARLY MORNING BLOGS

806 -" I bear a burden that might well try / Men that do all by rule"

Two Songs Of A Fool (I)

A speckled cat and a tame hare

Eat at my hearthstone

And sleep there;

And both look up to me alone

For learning and defence

As I look up to Providence.

I start out of my sleep to think

Some day I may forget

Their food and drink;

Or, the house door left unshut,

The hare may run till it's found

The horn's sweet note and the tooth of the hound.

I bear a burden that might well try

Men that do all by rule,

And what can I

That am a wandering-witted fool

But pray to God that He ease

My great responsibilities?

(William Butler Yeats)

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Bom dia! (William Butler Yeats)Bom dia!

A �NICA OPOSI��O POSS�VEL � A LIBERAL

Estamos num desses momentos em que mais � necess�ria pol�tica no espa�o p�blico, e o que acontece � o contr�rio, ela praticamente n�o existe, obscurecida por uma mistura anestesiante de circo, de conveni�ncias, falsos consensos e maus h�bitos do poder. N�o havendo cr�tica nem altern�ncia, gera-se um feito de obscuridade, n�o havendo �nimo cr�tico, o espa�o p�blico mirra.

Os tempos que vivemos recordam-me, e a mem�ria � uma maldi��o, de outro tempo recente muito semelhante: os primeiros anos do engenheiro Guterres. Nesses anos de gl�ria, quando o engenheiro apesar de n�o ter maioria absoluta governava como se a tivesse, era um esc�ndalo suscitar d�vidas, interroga��es, cr�ticas ao seu magn�fico desempenho. Lembro-me de ter escrito ent�o que me sentia uma esp�cie de ET quando mesmo os meus mais pr�ximos me diziam que era imposs�vel criticar Guterres. Havia dinheiro por todo o lado, a bolsa dava, a cada pequena esquina uma pequena fortuna, todos estavam felizes.

Hoje sabemos que muitos dos erros tr�gicos, que se est�o a pagar caro uma d�cada depois, foram cometidos nessa altura, quando uma excepcional conjuntura favor�vel nos dava a �ltima oportunidade de arrancar e a malbaratamos sem resultados. O governo de Guterres � hoje visto como a grande "oportunidade perdida", mas quem o percebeu e disse na altura? Contavam-se pelos dedos de uma s� m�o os cr�ticos do engenheiro, isolados e ignorados, pelo mesmo "consenso" que hoje considera o seu governo um desastre. � assim e continuar� a ser - em Portugal quando um consenso de rebanho, entre elites, pol�ticos e jornalistas, se instala, tem muita for�a, abafa quase tudo.

Hoje passa-se o mesmo, com a grande diferen�a que estamos em tempo de vacas magras e o Governo, em vez de nos prometer abund�ncia, promete-nos dificuldades. � interessante verificar que � exactamente esta diferen�a que alicer�a o consenso de hoje, com a mesma for�a acr�tica do consenso do passado. O consenso assenta na ideia de que o pa�s est� mal e de que o Governo defronta esses males com coragem, pelo que merece o abater de todos os pend�es. Muito pouca gente se pergunta se n�o era poss�vel n�o apenas fazer melhor, mas fazer muito diferente e se essa diferen�a faz, afinal, toda a diferen�a. Banhados em milhares horas de circo e gladiadores, na anomia generalizada de todos a fazerem a sua vidinha como se nada fosse, e no escapismo, who cares ?

Como � que se chegou aqui? Pela combina��o da vit�ria de duas pessoas, Manuela Ferreira Leite e Jos� S�crates. Num certo sentido, Manuel Ferreira Leite � a grande vencedora pol�tica da actualidade. Com a ironia habitual da hist�ria, para se ver a sua raz�o, foi necess�ria a sua queda e a do governo que se preparava para a afastar do cargo, por pensar que queria mais vida para al�m do d�fice. Tamb�m o governo que se lhe seguiu queria dar mais folga aos portugueses e descobriu uma "retoma" que nunca houve. Ambos, Dur�o Barroso e Santana Lopes, com o PSD profundo �s palmas, queriam ver-se livre da "antip�tica" ministra que lhes dava cabo das sondagens. Mas Manuela Ferreira Leite tinha convencido os portugueses a aceitar sacrif�cios para p�r a casa em ordem e, como estes desconfiavam das facilidades e da compet�ncia que Santana Lopes lhes prometia, foi procurar no outro lado, no PS.

S�crates apanhou a boleia desta ideia da necessidade de austeridade que o PS e ele pr�prio tanto tinham criticado. Ele come�ou a falar a linguagem apropriada ao sentimento da opini�o p�blica que Manuela Ferreira Leite lhe tinha deixado. Como se apercebeu de imediato, isso tinha sucesso e ele conseguiu um consenso legitimador que se estende muito para al�m do PS. Com condi��es pol�ticas excepcionais, maioria absoluta de um s� partido, fragilidade extrema da oposi��o e agora um Presidente "cooperador", aproveitou com perfei��o o "ar do tempo", revelando o seu estilo desde o primeiro minuto. O seu governo tem feito algumas coisas bem, mas n�o � o governo que serve para defrontar os problemas com que Portugal se defronta. Esta percep��o refor�a-se todos os dias e s� a acefalia actual do espa�o p�blico tem deixado sem discuss�o medidas sobre medidas, sempre apresentadas, inclusive pela comunica��o social, como inevit�veis. Eu, como j� vi muitas coisas "inevit�veis" serem evitadas, como por exemplo a Constitui��o europeia, pouco me conformo com este ambiente de inevitabilidade.

Pode-se, sobre o governo S�crates, fazer dois tipos de cr�ticas: ou dizer que faz bem mas faz pouco (que � a linha que de alguma maneira a pr�pria Manuela Ferreira Leite sugeriu no congresso do PSD); ou entender que o que � necess�rio � fazer de outro modo, muito diferente. S� haver� verdadeira oposi��o quando se combinarem os dois termos, com preponder�ncia do segundo.

Os n�o socialistas esquecem-se muitas vezes de que S�crates � socialista, ou seja, acredita no Estado como protector e corrector social, n�o concebe vida fora de um jacobinismo econ�mico, social e cultural deslavado e modernizado, que � o socialismo dos dias de hoje. Acrescenta a isso um remake de positivismo cientista, crendo com deslumbramento que as tecnologias mudam a sociedade e n�o vice-versa, como se percebe no chamado "choque tecnol�gico", investindo-se em tecnologias de ponta sem se cuidar das literacias necess�rias ao seu uso.

O que S�crates tem feito � defrontar a crise do Estado-provid�ncia propondo rem�dios que atrasam o seu colapso. N�o o p�e em causa, nem contesta a sua forma, concorda com ele por raz�es ideol�gicas. V�rias vezes afirmou que essas medidas de austeridade t�m como objectivo �ltimo garantir a "seguran�a social" para os portugueses e, com uma oposi��o que n�o contesta o essencial da sua atitude, faz o mal e a caramunha, ou seja, governa como governaram Barroso e Lopes e, mesmo aos olhos de muitos opositores do PS, com a vantagem de o fazer melhor do que os seus imediatos antecessores sociais-democratas.

Ora, que eu saiba, n�o foi Deus que fez o Estado-provid�ncia, nem a Hist�ria chegou ao fim com ele. Foram os homens, numa �poca, numa circunst�ncia, em determinadas partes do mundo. Resultou, como todas as coisas na sociedade, de uma complexa interac��o entre interesses e vontades, entre conflitos sociais e decis�es pol�ticas. Adequou-se �s sociedades europeias do p�s-guerra, geradas pelo Plano Marshall e pela integra��o europeia e beneficiando das circunst�ncias excepcionais de n�o terem de fazer avultadas despesas militares, porque estavam cobertas pelo guarda-chuva nuclear americano. S� que esse mundo acabou e acabou de vez e poucas d�vidas me sobram de que, mantendo os seus fundamentos iniciais e program�ticos, n�o se far� outra coisa do que gerir nas pr�ximas d�cadas o empobrecimento e as tens�es sociais em Portugal e na Europa, sempre presos nas mesmas pol�ticas de esticar at� ao limite o "modelo social", deixando para as gera��es futuras uma heran�a cada vez mais inger�vel.

H� alternativas a esta pol�tica dos socialistas e elas podem ser socialmente muito mais justas do que as pol�ticas actuais. As medidas de austeridade que o Governo est� a tentar implementar, t�midas mas mesmo assim passos de gigante em rela��o aos governos anteriores, apenas adiam a crise estrutural do Estado-provid�ncia e t�m custos muito mais gravosos para os mais pobres do que para os ricos. Mais: a seguir-se esta pol�tica, a crise tornar-se-� end�mica e, com intervalos de pequenos surtos de prosperidade, continuar-se-� a ter de pedir novos sacrif�cios e o problema de fundo permanecer� na mesma. Por isso, a prazo, o Estado-provid�ncia est� condenado, pelas mesmas raz�es que lhe deram o sucesso. N�o sobreviver� nem � globaliza��o nem ao bem-estar adquirido, que n�o � reproduz�vel de gera��o para gera��o com a composi��o et�ria das sociedades ocidentais.

Este � o custo de querer manter sistemas de seguran�a social universais que n�o t�m outra raz�o de ser que n�o seja a ideologia do "modelo social europeu", que os socialistas consideram ser o �ltimo reduto do seu "socialismo". A reconfigura��o do modelo do nosso Estado devia apenas garantir uma protec��o social m�nima para quem realmente a exige, limitar a esse m�nimo de solidariedade social b�sica o car�cter distributivo dos impostos, assim libertando para cada um a gest�o da parte da sua "seguran�a" que est� para al�m do m�nimo garantido e para a economia recursos de que o Estado tem vindo a apropriar-se numa espiral cada vez maior.

O que significa que a �nica oposi��o poss�vel � a liberal. Sem este tipo de oposi��o, n�o h� oposi��o a n�o ser a comunista e a do BE, que � uma variante da comunista. S� uma oposi��o liberal reformista e moderada pode mudar este estado de coisas. O consenso ac�falo dos dias de hoje � favorecido pela inexist�ncia ou debilidade desta oposi��o.

(No P�blico de hoje.) Estamos num desses momentos em que mais � necess�ria pol�tica no espa�o p�blico, e o que acontece � o contr�rio, ela praticamente n�o existe, obscurecida por uma mistura anestesiante de circo, de conveni�ncias, falsos consensos e maus h�bitos do poder. N�o havendo cr�tica nem altern�ncia, gera-se um feito de obscuridade, n�o havendo �nimo cr�tico, o espa�o p�blico mirra.Os tempos que vivemos recordam-me, e a mem�ria � uma maldi��o, de outro tempo recente muito semelhante: os primeiros anos do engenheiro Guterres. Nesses anos de gl�ria, quando o engenheiro apesar de n�o ter maioria absoluta governava como se a tivesse, era um esc�ndalo suscitar d�vidas, interroga��es, cr�ticas ao seu magn�fico desempenho. Lembro-me de ter escrito ent�o que me sentia uma esp�cie de ET quando mesmo os meus mais pr�ximos me diziam que era imposs�vel criticar Guterres. Havia dinheiro por todo o lado, a bolsa dava, a cada pequena esquina uma pequena fortuna, todos estavam felizes.Hoje sabemos que muitos dos erros tr�gicos, que se est�o a pagar caro uma d�cada depois, foram cometidos nessa altura, quando uma excepcional conjuntura favor�vel nos dava a �ltima oportunidade de arrancar e a malbaratamos sem resultados. O governo de Guterres � hoje visto como a grande "oportunidade perdida", mas quem o percebeu e disse na altura? Contavam-se pelos dedos de uma s� m�o os cr�ticos do engenheiro, isolados e ignorados, pelo mesmo "consenso" que hoje considera o seu governo um desastre. � assim e continuar� a ser - em Portugal quando um consenso de rebanho, entre elites, pol�ticos e jornalistas, se instala, tem muita for�a, abafa quase tudo.Hoje passa-se o mesmo, com a grande diferen�a que estamos em tempo de vacas magras e o Governo, em vez de nos prometer abund�ncia, promete-nos dificuldades. � interessante verificar que � exactamente esta diferen�a que alicer�a o consenso de hoje, com a mesma for�a acr�tica do consenso do passado. O consenso assenta na ideia de que o pa�s est� mal e de que o Governo defronta esses males com coragem, pelo que merece o abater de todos os pend�es. Muito pouca gente se pergunta se n�o era poss�vel n�o apenas fazer melhor, mas fazer muito diferente e se essa diferen�a faz, afinal, toda a diferen�a. Banhados em milhares horas de circo e gladiadores, na anomia generalizada de todos a fazerem a sua vidinha como se nada fosse, e no escapismo,Como � que se chegou aqui? Pela combina��o da vit�ria de duas pessoas, Manuela Ferreira Leite e Jos� S�crates. Num certo sentido, Manuel Ferreira Leite � a grande vencedora pol�tica da actualidade. Com a ironia habitual da hist�ria, para se ver a sua raz�o, foi necess�ria a sua queda e a do governo que se preparava para a afastar do cargo, por pensar que queria mais vida para al�m do d�fice. Tamb�m o governo que se lhe seguiu queria dar mais folga aos portugueses e descobriu uma "retoma" que nunca houve. Ambos, Dur�o Barroso e Santana Lopes, com o PSD profundo �s palmas, queriam ver-se livre da "antip�tica" ministra que lhes dava cabo das sondagens. Mas Manuela Ferreira Leite tinha convencido os portugueses a aceitar sacrif�cios para p�r a casa em ordem e, como estes desconfiavam das facilidades e da compet�ncia que Santana Lopes lhes prometia, foi procurar no outro lado, no PS.S�crates apanhou a boleia desta ideia da necessidade de austeridade que o PS e ele pr�prio tanto tinham criticado. Ele come�ou a falar a linguagem apropriada ao sentimento da opini�o p�blica que Manuela Ferreira Leite lhe tinha deixado. Como se apercebeu de imediato, isso tinha sucesso e ele conseguiu um consenso legitimador que se estende muito para al�m do PS. Com condi��es pol�ticas excepcionais, maioria absoluta de um s� partido, fragilidade extrema da oposi��o e agora um Presidente "cooperador", aproveitou com perfei��o o "ar do tempo", revelando o seu estilo desde o primeiro minuto. O seu governo tem feito algumas coisas bem, mas n�o � o governo que serve para defrontar os problemas com que Portugal se defronta. Esta percep��o refor�a-se todos os dias e s� a acefalia actual do espa�o p�blico tem deixado sem discuss�o medidas sobre medidas, sempre apresentadas, inclusive pela comunica��o social, como inevit�veis. Eu, como j� vi muitas coisas "inevit�veis" serem evitadas, como por exemplo a Constitui��o europeia, pouco me conformo com este ambiente de inevitabilidade.Pode-se, sobre o governo S�crates, fazer dois tipos de cr�ticas: ou dizer que faz bem mas faz pouco (que � a linha que de alguma maneira a pr�pria Manuela Ferreira Leite sugeriu no congresso do PSD); ou entender que o que � necess�rio � fazer de outro modo, muito diferente. S� haver� verdadeira oposi��o quando se combinarem os dois termos, com preponder�ncia do segundo.Os n�o socialistas esquecem-se muitas vezes de que S�crates � socialista, ou seja, acredita no Estado como protector e corrector social, n�o concebe vida fora de um jacobinismo econ�mico, social e cultural deslavado e modernizado, que � o socialismo dos dias de hoje. Acrescenta a isso um remake de positivismo cientista, crendo com deslumbramento que as tecnologias mudam a sociedade e n�o vice-versa, como se percebe no chamado "choque tecnol�gico", investindo-se em tecnologias de ponta sem se cuidar das literacias necess�rias ao seu uso.O que S�crates tem feito � defrontar a crise do Estado-provid�ncia propondo rem�dios que atrasam o seu colapso. N�o o p�e em causa, nem contesta a sua forma, concorda com ele por raz�es ideol�gicas. V�rias vezes afirmou que essas medidas de austeridade t�m como objectivo �ltimo garantir a "seguran�a social" para os portugueses e, com uma oposi��o que n�o contesta o essencial da sua atitude, faz o mal e a caramunha, ou seja, governa como governaram Barroso e Lopes e, mesmo aos olhos de muitos opositores do PS, com a vantagem de o fazer melhor do que os seus imediatos antecessores sociais-democratas.Ora, que eu saiba, n�o foi Deus que fez o Estado-provid�ncia, nem a Hist�ria chegou ao fim com ele. Foram os homens, numa �poca, numa circunst�ncia, em determinadas partes do mundo. Resultou, como todas as coisas na sociedade, de uma complexa interac��o entre interesses e vontades, entre conflitos sociais e decis�es pol�ticas. Adequou-se �s sociedades europeias do p�s-guerra, geradas pelo Plano Marshall e pela integra��o europeia e beneficiando das circunst�ncias excepcionais de n�o terem de fazer avultadas despesas militares, porque estavam cobertas pelo guarda-chuva nuclear americano. S� que esse mundo acabou e acabou de vez e poucas d�vidas me sobram de que, mantendo os seus fundamentos iniciais e program�ticos, n�o se far� outra coisa do que gerir nas pr�ximas d�cadas o empobrecimento e as tens�es sociais em Portugal e na Europa, sempre presos nas mesmas pol�ticas de esticar at� ao limite o "modelo social", deixando para as gera��es futuras uma heran�a cada vez mais inger�vel.H� alternativas a esta pol�tica dos socialistas e elas podem ser socialmente muito mais justas do que as pol�ticas actuais. As medidas de austeridade que o Governo est� a tentar implementar, t�midas mas mesmo assim passos de gigante em rela��o aos governos anteriores, apenas adiam a crise estrutural do Estado-provid�ncia e t�m custos muito mais gravosos para os mais pobres do que para os ricos. Mais: a seguir-se esta pol�tica, a crise tornar-se-� end�mica e, com intervalos de pequenos surtos de prosperidade, continuar-se-� a ter de pedir novos sacrif�cios e o problema de fundo permanecer� na mesma. Por isso, a prazo, o Estado-provid�ncia est� condenado, pelas mesmas raz�es que lhe deram o sucesso. N�o sobreviver� nem � globaliza��o nem ao bem-estar adquirido, que n�o � reproduz�vel de gera��o para gera��o com a composi��o et�ria das sociedades ocidentais.Este � o custo de querer manter sistemas de seguran�a social universais que n�o t�m outra raz�o de ser que n�o seja a ideologia do "modelo social europeu", que os socialistas consideram ser o �ltimo reduto do seu "socialismo". A reconfigura��o do modelo do nosso Estado devia apenas garantir uma protec��o social m�nima para quem realmente a exige, limitar a esse m�nimo de solidariedade social b�sica o car�cter distributivo dos impostos, assim libertando para cada um a gest�o da parte da sua "seguran�a" que est� para al�m do m�nimo garantido e para a economia recursos de que o Estado tem vindo a apropriar-se numa espiral cada vez maior.O que significa que a �nica oposi��o poss�vel � a liberal. Sem este tipo de oposi��o, n�o h� oposi��o a n�o ser a comunista e a do BE, que � uma variante da comunista. S� uma oposi��o liberal reformista e moderada pode mudar este estado de coisas. O consenso ac�falo dos dias de hoje � favorecido pela inexist�ncia ou debilidade desta oposi��o.(Node hoje.)

O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:

ANUNCIA-SE, LEGISLA-SE, ...QUANDO SE PUDER FAZ-SE

Hoje, o Di�rio da Rep�blica, presenteia-nos com mais um choque tecnol�gico:

Portaria n.� 657-A/2006 de 29 de Junho - Aprova o Regulamento do Registo Comercial

Pre�mbulo:

�O Decreto-Lei n.� 76-A/2006, de 29 de Mar�o, procedeu a uma profunda altera��o do C�digo do Registo Comercial, designadamente com (�) a cria��o de condi��es para a plena utiliza��o dos sistemas inform�ticos e a reformula��o de actos e procedimentos internos.

Simultaneamente, procedeu � revoga��o do Regulamento do Registo Comercial, pelo que se torna necess�rio aprovar uma nova regulamenta��o daquele C�digo, desenvolvendo as novas solu��es nele previstas.

Artigo 2.�

Disposi��es transit�rias

1 - Enquanto n�o se verificar a informatiza��o do servi�o de registo, s�o aplic�veis a este as disposi��es do Regulamento do Registo Comercial, aprovado pela Portaria n.� 883/89, de 13 de Outubro, que respeitem a livros, fichas e verbetes ou que pressuponham a sua exist�ncia.�

Ou seja, a nova lei entrou em vigor, salvo nos seus aspectos principais, em que se aplica a legisla��o anterior.

Continua-se a fazer tudo como dantes, porque n�o h� condi��es materiais para implementar a lei. Primeiro anuncia-se e legisla-se. Se e quando se puder, faz-se. Dito, mas n�o feito. (Estamos a criar condi��es, dizem no pre�mbulo �.)

Valia a pena contabilizar os casos como este. Suspeito que �amos ter uma surpresa.

(RM)

RETRATOS DO TRABALHO EM MONTREAL, CANAD�

(Ricardo Prata) (Ricardo Prata)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 29 de Junho de 2006

Continuam as palavras a revelar as posi��es. No notici�rio da RTP1 sobre a manifesta��o da FRETILIN em Dili, v�rias interessantes distin��es entre "n�s" e "eles", inscritas na escolha das palavras. A favor de Xanana e contra o Governo s�o os "timorenses", a favor do Governo s�o "os apoiantes da FRETILIN". De um lado os "jovens", do outro os "manifestantes". Uns s�o contados para sugerir que s�o poucos e finitos; outros, nunca s�o contados para serem os "timorenses", a na��o, o povo. Continuam as palavras a revelar as posi��es. No notici�rio da RTP1 sobre a manifesta��o da FRETILIN em Dili, v�rias interessantes distin��es entre "n�s" e "eles", inscritas na escolha das palavras. A favor de Xanana e contra o Governo s�o os "timorenses", a favor do Governo s�o "os apoiantes da FRETILIN". De um lado os "jovens", do outro os "manifestantes". Uns s�o contados para sugerir que s�o poucos e finitos; outros, nunca s�o contados para serem os "timorenses", a na��o, o povo.

INTEND�NCIA

O caminho para a devolu��o � origem (a FNAC) do HP Pavilion Dual core continua a passo acelerado. Pelo meio, ficam muitas horas de trabalho perdidas. A assist�ncia da HP ap�s uma longa navega��o entre "prima 1 e "prima 2", remete-me para outro n�mero de telefone. No segundo n�mero, um t�cnico informa-me que � "normal" que n�o se possa instalar o Windows XP Professional, sobre o Home de origem, devido � configura��o especial do software feita na f�brica. Excelente! Depois quando lhe digo que o computador bloqueia sempre que acede � Internet em banda larga, apesar de fazer a liga��o, - que o seu irm�o HP mais velho ao lado faz na perfei��o -, diz que nunca soube da exist�ncia desse problema e que deve ser um problema com o modem da Telepac, o mesmo modem que deve existir em milhares de casas. Excelente! O computador liga, n�o liga? Liga, com alguma dificuldade depois dos bloqueios, mas liga. O software arranca normalmente, n�o arranca? Arranca, depois de ser reconfigurado de raiz n vezes. O computador liga � Internet n�o liga? Liga, e funciona entre trinta segundos e um minuto antes de bloquear exigindo ser desligado. Ent�o o problema n�o � com a HP.

PS. - Agrade�o aos meus amigos leitores que me aconselham... a mudar para um Macintosh. O caminho para a devolu��o � origem (a FNAC) do HP Pavilion Dual core continua a passo acelerado. Pelo meio, ficam muitas horas de trabalho perdidas. A assist�ncia da HP ap�s uma longa navega��o entre "prima 1 e "prima 2", remete-me para outro n�mero de telefone. No segundo n�mero, um t�cnico informa-me que � "normal" que n�o se possa instalar o Windows XP Professional, sobre o Home de origem, devido � configura��o especial do software feita na f�brica. Excelente! Depois quando lhe digo que o computador bloqueia sempre que acede � Internet em banda larga, apesar de fazer a liga��o, - que o seu irm�o HP mais velho ao lado faz na perfei��o -, diz que nunca soube da exist�ncia desse problema e que deve ser um problema com o modem da Telepac, o mesmo modem que deve existir em milhares de casas. Excelente! O computador liga, n�o liga? Liga, com alguma dificuldade depois dos bloqueios, mas liga. O software arranca normalmente, n�o arranca? Arranca, depois de ser reconfigurado de raiz n vezes. O computador liga � Internet n�o liga? Liga, e funciona entre trinta segundos e um minuto antes de bloquear exigindo ser desligado. Ent�o o problema n�o � com a HP.PS. - Agrade�o aos meus amigos leitores que me aconselham... a mudar para um Macintosh.

EARLY MORNING BLOGS

805 -

"La vieille crut qu'on la m�prisait, et grommela quelques menaces entre ses dents."

Il �tait une fois un Roi et une Reine, qui �taient si f�ch�s de n'avoir point d'enfants, si f�ch�s qu'on ne saurait dire. Ils all�rent � toutes les eaux du monde; voeux, p�lerinages, menues d�votions, tout fut mis en oeuvre, et rien n'y faisait. Enfin pourtant la Reine devint grosse, et accoucha d'une fille: on fit un beau Bapt�me; on donna pour Marraines � la petite Princesse toutes les F�es qu'on p�t trouver dans le Pays (il s'en trouva sept), afin que chacune d'elles lui faisant un don, comme c'�tait la coutume des F�es en ce temps-l�, la Princesse e�t par ce moyen toutes les perfections imaginables. Apr�s les c�r�monies du Bapt�me toute la compagnie revint au Palais du Roi, o� il y avait un grand festin pour les F�es. On mit devant chacune d'elles un couvert magnifique, avec un �tui d'or massif, o� il y avait une cuiller, une fourchette, et un couteau de fin or, garni de diamants et de rubis. Mais comme chacun prenait sa place � table, on vit entrer une vieille F�e qu'on n'avait point pri�e parce qu'il y avait plus de cinquante ans qu'elle n'�tait sortie d'une Tour et qu'on la croyait morte, ou enchant�e. Le Roi lui fit donner un couvert, mais il n'y eut pas moyen de lui donner un �tui d'or massif, comme aux autres, parce que l'on n'en avait fait faire que sept pour les sept F�es. La vieille crut qu'on la m�prisait, et grommela quelques menaces entre ses dents.

(Charles Perrault, La belle au bois dormant )

*

Bom dia! (Charles Perrault,Bom dia!

COISAS SIMPLES

Jean-L�on G�r�me, Les pigeons

Jean-L�on G�r�me,

INTEND�NCIA

Continuo enredado na tarefa, que devia ser simples e se torna cada vez mais complicada, de mudar de um computador para outro, ambos da mesma marca, HP. O meu primeiro encontro com a assist�ncia t�cnica da HP foi prometedor: tudo o que funciona mal �, pelos vistos, suposto funcionar mal e eu devo resignar-me a essa realidade. Para um computador de topo de gama, � meio caminho andado para ser devolvido � proced�ncia. Vamos ver se consigo evitar o outro meio do caminho, pelos meus meios. Darei not�cias para prevenir os incautos. Continuo enredado na tarefa, que devia ser simples e se torna cada vez mais complicada, de mudar de um computador para outro, ambos da mesma marca, HP. O meu primeiro encontro com a assist�ncia t�cnica da HP foi prometedor: tudo o que funciona mal �, pelos vistos, suposto funcionar mal e eu devo resignar-me a essa realidade. Para um computador de topo de gama, � meio caminho andado para ser devolvido � proced�ncia. Vamos ver se consigo evitar o outro meio do caminho, pelos meus meios. Darei not�cias para prevenir os incautos.

EARLY MORNING BLOGS

804 - IT SURE WAS PLEASANT TO SPEND A DAY IN THE COUNTRY

Farm Implements and Rutabagas in a Landscape

The first of the undecoded messages read: "Popeye sits

in thunder,

Unthought of. From that shoebox of an apartment,

From livid curtain's hue, a tangram emerges: a country."

Meanwhile the Sea Hag was relaxing on a green couch: "How

pleasant

To spend one's vacation en la casa de Popeye," she

scratched

Her cleft chin's solitary hair. She remembered spinach

And was going to ask Wimpy if he had bought any spinach.

"M'love," he intercepted, "the plains are decked out

in thunder

Today, and it shall be as you wish." He scratched

The part of his head under his hat. The apartment

Seemed to grow smaller. "But what if no pleasant

Inspiration plunge us now to the stars? For this is my

country."

Suddenly they remembered how it was cheaper in the country.

Wimpy was thoughtfully cutting open a number 2 can of spinach

When the door opened and Swee'pea crept in. "How pleasant!"

But Swee'pea looked morose. A note was pinned to his bib.

"Thunder

And tears are unavailing," it read. "Henceforth shall

Popeye's apartment

Be but remembered space, toxic or salubrious, whole or

scratched."

Olive came hurtling through the window; its geraniums scratched

Her long thigh. "I have news!" she gasped. "Popeye, forced as

you know to flee the country

One musty gusty evening, by the schemes of his wizened,

duplicate father, jealous of the apartment

And all that it contains, myself and spinach

In particular, heaves bolts of loving thunder

At his own astonished becoming, rupturing the pleasant

Arpeggio of our years. No more shall pleasant

Rays of the sun refresh your sense of growing old, nor the

scratched

Tree-trunks and mossy foliage, only immaculate darkness and

thunder."

She grabbed Swee'pea. "I'm taking the brat to the country."

"But you can't do that--he hasn't even finished his spinach,"

Urged the Sea Hag, looking fearfully around at the apartment.

But Olive was already out of earshot. Now the apartment

Succumbed to a strange new hush. "Actually it's quite pleasant

Here," thought the Sea Hag. "If this is all we need fear from

spinach

Then I don't mind so much. Perhaps we could invite Alice the Goon

over"--she scratched

One dug pensively--"but Wimpy is such a country

Bumpkin, always burping like that." Minute at first, the thunder

Soon filled the apartment. It was domestic thunder,

The color of spinach. Popeye chuckled and scratched

His balls: it sure was pleasant to spend a day in the country.

(John Ashbery)

*

Bom dia! (John Ashbery)Bom dia!

CORREIO / INTEND�NCIA

Uma mudan�a de computador, com as habituais complica��es, tem afectado o correio mais do que ele j� estava com um infinito e irrecuper�vel atraso nas respostas. As minhas desculpas. Uma mudan�a de computador, com as habituais complica��es, tem afectado o correio mais do que ele j� estava com um infinito e irrecuper�vel atraso nas respostas. As minhas desculpas.

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VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 27 de Junho de 2006

Os defensores do nosso omnipresente Estado devem estar contentes: conforme declara��es do Secret�rio de Estado do Desporto � TSF uma das coisas de que cuida com desvelo o nosso Governo � escolher (neste caso manter) o selecionador nacional do futebol. � certamente uma quest�o de Estado... Os defensores do nosso omnipresente Estado devem estar contentes: conforme declara��es do Secret�rio de Estado do Desporto � TSF uma das coisas de que cuida com desvelo o nosso Governo � escolher (neste caso manter) o selecionador nacional do futebol. � certamente uma quest�o de Estado...

COISAS DA S�BADO : A FRAGMENTA��O DE ESPANHA

Existe uma velha m�xima da nossa pol�tica externa que considera sempre positivas as dificuldades do poder central de Castela face �s suas periferias bascas, catal�s e galegas. Qualquer refor�o da unidade do estado espanhol � visto como perigoso para Portugal, a �nica �regi�o� que ficaria de fora da puls�o centralizadora de Madrid e do seu olhar capcioso para um Portugal independente. Desde 1640 agradecemos � Catalunha o puro facto desta existir e assim nos ajudar tamb�m a existir. De Espanha, como todos sabemos, n�o vem nem bom vento, nem bom casamento.

Sei tudo isto e � no entanto, n�o deixo de ver com preocupa��o a tend�ncia para a fragmenta��o do estado espanhol que deu a semana passada outro passo com a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha. � um caminho perigoso, trilhado por Zapatero tamb�m no Pa�s Basco, abrindo as portas � negocia��o com a ETA terrorista. � daquelas coisas que hoje parecem pac�ficas e benignas, mas que come�am a revelar um caminho sem retorno para a independ�ncia da Catalunha e do Pais Basco, sob o olhar apaziguador, mas bem pouco espanhol, de Zapatero. N�o ser� nos dias mais pr�ximos, mas l�ngua, impostos, pol�cias, �rg�os de comunica��o regionais e proximidades a outros lugares centrais que n�o Madrid, dar�o � Espanha dias quentes e isso n�o � bom para Portugal.

*

Lembro-me de ter lido no Abrupto, aquando duma visita a Budapeste,o seguinte coment�rio: "A descentra��o �tnica, lingu�stica, cultural e religiosa significa toda uma �hist�ria� por resolver (por exemplo, a importante popula��o que fala h�ngaro e que ficou na Rom�nia, como se v� no mapa [...])" (Abrupto, 15.5.06) Tenho dificuldade em compreender a posi��o do Abrupto: por um lado, a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha � considerada "um caminho perigoso", por outro lado, os conflictos �tnicos latentes na long�nqua Transilvania representam "uma hist�ria por resolver". Tentar resolver essa hist�ria n�o seria um caminho perigoso ? Por qu� ? S� porque a Espanha est� mais perto ? S� porque eventuais "dias quentes" na Hungria e na Rom�nia n�o chegariam a ter influ�ncia em Portugal ?

(Cristian Barbarosie)

*

N�o posso deixar de considerar o seu texto uma manifesta��o de conservadorismo, no mau sentido do termo. Um medo de mudar nem que seja para se sair de uma situa��o de injusti�a, neste caso a opress�o secular de v�rias na��es por um estado imperialista administrativa, culturalmente, etc. D�-lhe medo que se cumpra um dos princ�pios consagrado pelas Na��es

Unidas, o direito � autodetermina��o dos povos. E parece ser um sentimento t�o forte e irracional que lhe chega para tirar a conclus�o il�gica de que essa independ�ncia � prejudicial a um terceiro pa�s, neste caso a n�s, Portugal; a conclus�o absurda de que quanto maior e mais forte for o vizinho de um pequeno pa�s, melhor ser� para este �ltimo. Isto j� n�o se trata de um julgamento de valor, do direito � autodetermina��o dos povos, mas um julgamento de conveni�ncia pr�tica que a ser verdadeira teria levado durante a hist�ria a todos os pequenos pa�ses desejarem que os seus vizinhos fossem grandes e poderosos.

(Henrique Oliveira)

*

J� em tempos tinha tomado a liberdade de lhe escrever focando o problema que constitu�a a aus�ncia de qualquer debate estrat�gico (pelo menos p�blico), em Portugal, sobre a quest�o das nacionalidades e autonomias de Espanha (e da Pen�nsula, j� agora). Infelizmente, penso o assunto tem sido quase sempre tratado como uma mera quest�o interna de Espanha e da luta contra o terrorismo da ETA e, mesmo assim, de um modo demasiado emocional: � direita, a sua ala mais radical � quem tem liderado o debate, decalcando as suas posi��es, de forma imediatista, das posi��es dos sectores mais conservadores, e tamb�m mais emocionais, do PP de Espanha, influenciados pela "Associa��o de V�timas da ETA"; � esquerda, demasiado ausente na an�lise, a emo��o ainda remete para a associa��o da unidade do estado espanhol ao imp�rio castelhano, � ditadura franquista e � monarquia do in�cio do s�culo XX. Tudo isto influenciado, por um lado, por uma certa frustra��o latente no centro-direita em Portugal pelos fracassos dos governos Barroso e Santana Lopes, tentando cavalgar os indiscut�veis sucessos do PP de Espanha durante o governo Aznar; por outro, pelo peso que o pensamento republicano tradicional e as mem�rias da guerra civil ainda t�m em alguns sectores da esquerda e pela associa��o que sempre se fez das burguesia basca e catal� ao desenvolvimento e ao "progressismo". Em ambos os casos, a aus�ncia de qualquer vis�o estrat�gica para Portugal est� infelizmente ausente, esquecendo-se que a luta pela unidade/fragmenta��o da pen�nsula tem sido uma constante em toda a sua hist�ria e que muito pouco distingue um portugu�s de um castelhano (muito menos de um galego). Muito menos, certamente, do que o que distingue um basco de um castelhano ou de um catal�o... Filho de um madrileno, embora sem sangue espanhol mas com fortes liga��es culturais e sentimentais a Espanha, devo ter sido dos poucos portugueses que n�o foi educado no "�dio a Castela". Por isso, sempre acompanhei a quest�o das nacionalidades e autonomias peninsulares com um interesse redobrado, mais tarde ainda mais acentuado por contactos profissionais e por um dos meus filhos ter feito parte do seu curso na Universidade Polit�cnica da Catalunha e uma filha viver e trabalhar actualmente em Madrid. Devo dizer, do ponto de vista estrat�gico para Portugal, que tenho tudo menos certezas, sendo bem necess�rio lan�ar a discuss�o ignorando o "politicamente correcto" e as emo��es. Tenho, contudo, uma certeza: a necessidade de tornar obrigat�rio o ensino do castelhano na escola portuguesa como segunda l�ngua estrangeira. Sem "�dio a Castela" e sem medo de "perder a p�tria" - e antes que se acorde tarde como aconteceu com o Ingl�s. Quanto a Espanha, o caminho das "nacionalidades" trilhado por Zapatero parece-me inelut�vel, e s� a Hist�ria dir� at� onde. At� porque a direita espanhola n�o me parece alguma vez ter tido para a quest�o uma estrat�gia sustent�vel, que, com maior ou menor grau de centralismo, fosse muito para al�m, no limite, da "Espa�a Una, Grande Y Libre".

(Jo�o Cilia) Existe uma velha m�xima da nossa pol�tica externa que considera sempre positivas as dificuldades do poder central de Castela face �s suas periferias bascas, catal�s e galegas. Qualquer refor�o da unidade do estado espanhol � visto como perigoso para Portugal, a �nica �regi�o� que ficaria de fora da puls�o centralizadora de Madrid e do seu olhar capcioso para um Portugal independente. Desde 1640 agradecemos � Catalunha o puro facto desta existir e assim nos ajudar tamb�m a existir. De Espanha, como todos sabemos, n�o vem nem bom vento, nem bom casamento.Sei tudo isto e � no entanto, n�o deixo de ver com preocupa��o a tend�ncia para a fragmenta��o do estado espanhol que deu a semana passada outro passo com a aprova��o referend�ria do novo estatuto da Catalunha. � um caminho perigoso, trilhado por Zapatero tamb�m no Pa�s Basco, abrindo as portas � negocia��o com a ETA terrorista. � daquelas coisas que hoje parecem pac�ficas e benignas, mas que come�am a revelar um caminho sem retorno para a independ�ncia da Catalunha e do Pais Basco, sob o olhar apaziguador, mas bem pouco espanhol, de Zapatero. N�o ser� nos dias mais pr�ximos, mas l�ngua, impostos, pol�cias, �rg�os de comunica��o regionais e proximidades a outros lugares centrais que n�o Madrid, dar�o � Espanha dias quentes e isso n�o � bom para Portugal.

COISAS DA S�BADO : XADREZ

Nestas alturas de futebolite aguda, volto ao xadrez. Ou�o os berros habituais ao longe, muito ao longe, com o �intelectualismo livresco� deste pobre autor que cometeu o crime de lesa-p�tria de n�o saber quem era o Quaresma� Pois eu respondo aos berros anti-livrescos com o xadrez, venham c� pedir me�as, num jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota. Em poucos jogos � mais evidente o car�cter, a psicologia do jogador, a sua agressividade ou calma, a sua racionalidade ou criatividade, a sua teimosia ou ousadia. Mas cuidado, porque o xadrez �, num certo sentido, o mais violento dos jogos. No tabuleiro, o que se passa � uma batalha e quem l� est� s�o soldados, cavaleiros, oficiais, fortalezas e uma tenebrosa rainha, O rei � o penhor da soberania mas, por si, pode pouco.

Est� l� tudo, no sil�ncio, naquela aparente suspens�o do mundo que torna os jogadores de xadrez figuras m�ticas, travando uma batalha �pica, isolados no meio de um mundo que lhes passa ao lado. Introspectivo e sem a grande teatraliza��o do espect�culo moderno de massas, o xadrez � ainda um dos pin�culos das virtudes da intelig�ncia matem�tica, posicional, territorial, t�ctica e estrat�gica.

Valia a pena haver mais xadrez e muito menos futebol. Por um �tomo do que est�o a gastar no futebol, estado e privados, podiam colocar centenas de escolas a jogar xadrez, milhares de jovens e crian�as a pensar com a cabe�a e n�o com os p�s. Fica o pa�s melhor? Fica, fica. N�o faz mal nenhum usar os neur�nios.

*

Sem colocar em causa o ponto capital do seu artigo "Xadrez", devo dizer que n�o concordo consigo quando defende que o desporto a que o mesmo se refere � "um jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota." De facto, j� no tempo da Uni�o Sovi�tica, Bobby Fisher - hist�rico jogador norte-americano - se queixava de que os sovi�ticos combinavam resultados entre si, de forma a terem maior disponibilidade mental para o derrotar. Tal facto levou-o mesmo a afirmar, em 1963, que n�o voltaria a participar em

torneios da FIDE.

Por outro lado, o "doping" tamb�m existe no xadrez. A t�tulo meramente indicativo chamaria aten��o para o artigo "O 'doping' inteligente para jogadores de xadrez" publicado no Di�rio de Not�cias a vinte e quatro de Janeiro do presente ano.

(Frederico dos Santos Silva)

*

Ent�o V. acredita que estas pobres gentes, mesmo 36 anos depois de Abril, iriam promover o jogo nacional dos patifes dos bolchevistas? E ainda por cima um jogo que estimula o intelecto? Claro que concordo consigo e que me aflijo com um pa�s que vai desbaratando alegrementeo o bem mais precioso de qualquer sociedade: a INSTRU��O.

(Jos� Manuel Calazans)

*

Tem raz�o quando refere que seria mais �til colocar xadrez nas escolas e da�, gastar efectivamente dinheiro nas escolas (a isso chama-se investimento, n�o?). Mas sabe, isso � pouco medi�tico, n�o d� o show do qual o nosso ministro revela depend�ncia, n�o � imediato. Moldar uma sociedade leva muito tempo, � um trabalho �silencioso� feito nas escolas, e com efeitos para outros tantos mais anos. O continuar a apostar na bola � continuar a adiar o trabalho dos neur�nios (como disse). Como fica bem o povo entretido com a bola; assim n�o pensa! Esta estrat�gia qual muleta de regimes passados autorit�rios, continua preocupantemente actual. Parece-me que afinal, desde que partimos do 25 de Abril, o nosso percurso tem sido um c�rculo, que est� prestes, prestes a fechar-se. Se � que me fa�o entender.

(Sofia �vila da Silveira)

Nestas alturas de futebolite aguda, volto ao xadrez. Ou�o os berros habituais ao longe, muito ao longe, com o �intelectualismo livresco� deste pobre autor que cometeu o crime de lesa-p�tria de n�o saber quem era o Quaresma� Pois eu respondo aos berros anti-livrescos com o xadrez, venham c� pedir me�as, num jogo onde nada se esconde, tudo se v� e n�o � poss�vel fazer batota. Em poucos jogos � mais evidente o car�cter, a psicologia do jogador, a sua agressividade ou calma, a sua racionalidade ou criatividade, a sua teimosia ou ousadia. Mas cuidado, porque o xadrez �, num certo sentido, o mais violento dos jogos. No tabuleiro, o que se passa � uma batalha e quem l� est� s�o soldados, cavaleiros, oficiais, fortalezas e uma tenebrosa rainha, O rei � o penhor da soberania mas, por si, pode pouco.Est� l� tudo, no sil�ncio, naquela aparente suspens�o do mundo que torna os jogadores de xadrez figuras m�ticas, travando uma batalha �pica, isolados no meio de um mundo que lhes passa ao lado. Introspectivo e sem a grande teatraliza��o do espect�culo moderno de massas, o xadrez � ainda um dos pin�culos das virtudes da intelig�ncia matem�tica, posicional, territorial, t�ctica e estrat�gica.Valia a pena haver mais xadrez e muito menos futebol. Por um �tomo do que est�o a gastar no futebol, estado e privados, podiam colocar centenas de escolas a jogar xadrez, milhares de jovens e crian�as a pensar com a cabe�a e n�o com os p�s. Fica o pa�s melhor? Fica, fica. N�o faz mal nenhum usar os neur�nios.

RETRATOS DO TRABALHO

P. S. Kroyer, Tr�s Pescadores

P. S. Kroyer,

EARLY MORNING BLOGS

803 - THE BOND OF THE SEA

The Nellie, a cruising yawl, swung to her anchor without a flutter of the sails, and was at rest. The flood had made, the wind was nearly calm, and being bound down the river, the only thing for it was to come to and wait for the turn of the tide.

The sea-reach of the Thames stretched before us like the beginning of an interminable waterway. In the offing the sea and the sky were welded together without a joint, and in the luminous space the tanned sails of the barges drifting up with the tide seemed to stand still in red clusters of canvas sharply peaked, with gleams of varnished sprits. A haze rested on the low shores that ran out to sea in vanishing flatness. The air was dark above Gravesend, and farther back still seemed condensed into a mournful gloom, brooding motionless over the biggest, and the greatest, town on earth.

The Director of Companies was our captain and our host. We four affectionately watched his back as he stood in the bows looking to seaward. On the whole river there was nothing that looked half so nautical. He resembled a pilot, which to a seaman is trustworthiness personified. It was difficult to realize his work was not out there in the luminous estuary, but behind him, within the brooding gloom.

Between us there was, as I have already said somewhere, the bond of the sea.

(Joseph Conrad, Heart of Darkness )

*

Bom dia! (Joseph Conrad,Bom dia!

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 25 de Junho de 2006

Solidariedade na Futebol�ndia: estamos sempre muito preocupados com Timor, muito solid�rios, mas � s� depois do futebol. Hoje, que h� not�cias importantes sobre Timor, em todos os notici�rios dos canais de televis�o, esperaram vinte minutos (na Sic a mais r�pida), para aparecer. Antes disso havia a n�o-not�cia: o espect�culo da bola antes da bola. � assim, prioridades. E a televis�o p�blica deu o exemplo, continuou com o futebol j� a SIC dava not�cias. Solidariedade na Futebol�ndia: estamos sempre muito preocupados com Timor, muito solid�rios, mas � s� depois do futebol. Hoje, que h� not�cias importantes sobre Timor, em todos os notici�rios dos canais de televis�o, esperaram vinte minutos (na Sic a mais r�pida), para aparecer. Antes disso havia a n�o-not�cia: o espect�culo da bola antes da bola. � assim, prioridades. E a televis�o p�blica deu o exemplo, continuou com o futebol j� a SIC dava not�cias.

EARLY MORNING BLOGS

802 - "O HOMEM S� � SUPERIORMENTE FELIZ QUANDO � SUPERIORMENTE CIVILIZADO"

Ora nesse tempo Jacinto concebera uma id�ia... Este Pr�ncipe concebera a id�ia de que o �homem s� � superiormente feliz quando � superiormente civilizado�. E p�r homem civilizado o meu camarada entendia aquele que, robustecendo a sua for�a pensante com todas as no��es adquiridas desde Arist�teles, e multiplicando a pot�ncia corporal dos seus �rg�os com todos os mecanismos inventados desde Ter�menes, criador da roda, se torna um magn�fico Ad�o, quase onipotente, quase onisciente, e apto portanto a recolher dentro duma sociedade, e nos limites do Progresso (tal) como ele se comportava em 1875) todos os gozos e todos os proveitos que resultam de Saber e Poder... Pelo menos assim Jacinto formulava copiosamente a sua id�ia, quando convers�vamos de fins e destinos humanos, sorvendo bocks poeirentos, sob o toldo das cervejarias filos�ficas, no Boulevard Saint-Michel.

Este conceito de Jacinto impressionara os nossos camaradas de cen�culo, que tendo surgido para a vida intelectual, de 1866 a 1875, entre a batalha de Sadova e a batalha de Sedan e ouvindo constantemente, desde ent�o, aos t�cnicos e aos fil�sofos, que fora a Espingarda-de-agulha que vencera em Sadova e fora o Mestre-de-escola quem vencera em Sedan, estavam largamente preparados a acreditar que a felicidade dos indiv�duos, como a das na��es, se realiza pelo ilimitado desenvolvimento da Mec�nica e da erudi��o. Um desses mo�os mesmo, o nosso inventivo Jorge Carlande, reduzira a teoria de Jacinto, para lhe facilitar a circula��o e lhe condensar o brilho, a uma forma alg�brica:

Suma ci�ncia X Suma pot�ncia= Suma felicidade

E durante dias, do Odeon � Sorbona, foi louvada pela mocidade positiva a Equa��o Metaf�sica de Jacinto.

Para Jacinto, por�m, o seu conceito n�o era meramente metaf�sico e lan�ado pelo gozo elegante de exercer a raz�o especulativa: - mas constitu�a uma regra, toda de realidade e de utilidade, determinando a conduta, modalizando a vida. E j� a esse tempo, em concord�ncia com o seu preceito � ele se surtira da Pequena Enciclop�dia dos Conhecimentos Universais em setenta e cinco volumes e instalara, sobre os telhados do 202, num mirante envidra�ado, um telesc�pio. Justamente com esse telesc�pio me tornou ele palp�vel a sua id�ia, numa noite de Agosto, de mole e dormente calor. Nos c�us remotos lampejavam rel�mpagos l�nguidos. Pela Avenida dos Campos El�sios, os fiacres rolavam para as frescuras do Bosque, lentos, abertos, cansados, transbordando de vestidos claros.

- Aqui tens tu, Z� Fernandes (come�ou Jacinto, encostado � janela do mirante), a teoria que me governa, bem comprovada.

(E�a de Queir�s)

*

Bom dia! (E�a de Queir�s)Bom dia!

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 24 de Junho de 2006

O

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primeiro retrato , a nossa fragilidade na pedra, por uma m�o (ou duas, ou tr�s) com 27.000 anos. N�o mudamos nada. A RTP1 ontem transmitiu em directo o "S. Jo�o" do Porto. Mas para poder ter programa, o S. Jo�o da televis�o n�o � o S. Jo�o do Porto. A televis�o transmitiu uma festa organizada para ela pr�pria e o fogo de artif�cio, mas nem uma coisa nem outra s�o o S. Jo�o do Porto. O S. Jo�o do Porto n�o se presta a passar na televis�o, � uma festa �nica, absoluta e democr�tica como nada neste pa�s. Na noite de S. Jo�o o Porto sai � rua, para estar na rua e andar na rua. Atr�s daquelas festas para a televis�o milhares e milhares de pessoas est�o pura e simplesmente a andar pelas ruas e a bater na cabe�a umas das outras com um alho-porro (cada vez menos) e com uns abomin�veis martelos de pl�stico, que cada vez parecem ser maiores. Em quase todas as casas, ricas e pobres, depois do jantar, as fam�lias juntas, ou os jovens para um lado e os mais velhos para outro, fecham a casa e v�m para a rua. No S. Jo�o do Porto n�o h� lugares centrais, n�o � uma festa dos bairros populares, � uma festa que se estende por toda a cidade, embora as Fonta�nhas e a Ribeira fossem p�los de atrac��o. Mas eram apenas s�tios onde havia alguma coisa mais do que a rua, nas Fontainhas uns carross�is e farturas e na Ribeira uns bailes. Na Ribeira havia um baile, que penso �nico nos anos da ditadura, em que homens dan�avam com homens e onde pontificava o c�lebre "Carlinhos da S�". Os populares da Ribeira impediam qualquer provoca��o ou incidente, considerando que aquela noite era de todos e da liberdade de todos. Era a noite em que se podia fazer tudo e n�o havia pol�cia nas ruas. (Antes do 25 de Abril era tamb�m uma noite aproveitada para distribuir panfletos, a que a PIDE estava cada vez mais vigilante embora evitasse dar nas vistas porque com a multid�o nada era seguro�). O ambiente democr�tico da rua, em que ningu�m se livrava de levar com o alho na cabe�a, e onde completos desconhecidos trocavam cumprimentos e piropos, revelava o car�cter muito especial da �nica cidade verdadeiramente �burguesa� do pa�s. Trabalhava duro durante o ano e depois tinha a sua Saturnalia, que tomava t�o a s�rio como o trabalho. No Porto, n�o havia (e n�o h�) essa coisa de �bairros populares� versus �avenidas novas�, nem nobres marialvas e fadistas que depois dos touros v�o para as �casas de tabuinhas� conviver com apaches e severas, isto para usar os nomes antigos e poupar os ouvidos sens�veis. No Porto todos, menos os �ingleses� que nunca se viam, estavam na rua. Ora isso n�o cabe na televis�o, s� num IMAX e mesmo assim transborda. J� h� uns anos que l� n�o estou no S. Jo�o. Espero que tudo continue assim. Espero.

EARLY MORNING BLOGS

801 - CALL ME ISHMAEL

Call me Ishmael. Some years ago- never mind how long precisely- having little or no money in my purse, and nothing particular to interest me on shore, I thought I would sail about a little and see the watery part of the world. It is a way I have of driving off the spleen and regulating the circulation. Whenever I find myself growing grim about the mouth; whenever it is a damp, drizzly November in my soul; whenever I find myself involuntarily pausing before coffin warehouses, and bringing up the rear of every funeral I meet; and especially whenever my hypos get such an upper hand of me, that it requires a strong moral principle to prevent me from deliberately stepping into the street, and methodically knocking people's hats off- then, I account it high time to get to sea as soon as I can. This is my substitute for pistol and ball. With a philosophical flourish Cato throws himself upon his sword; I quietly take to the ship. There is nothing surprising in this. If they but knew it, almost all men in their degree, some time or other, cherish very nearly the same feelings towards the ocean with me.

(Herman Melville)

*

Bom dia! (Herman Melville)Bom dia!

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 23 de Junho de 2006 (2� s�rie)

Scary news : Confirmado primeiro caso de transmiss�o de gripe das aves entre seres humanos.

800 EARLY MORNING E OUTRAS EFEM�RIDES

O primeiro da s�rie era assim:

O primeiro da s�rie era assim: 4.7.03

10:20 (JPP)

VALE A PENA : EARLY MORNING BLOGS

O Comprometido Espectador acrescenta novos elementos sobre a situa��o italiana por quem a conhece em primeira m�o. E prop�e um �Ver outra vez� a acrescentar ao �Ler outra vez� . Primeira men��o : o Pin�quio de Disney ou seja era o que � hoje o LENDO / VENDO / OUVINDO, uma revista de blogues. Depois tombou o "VALE A PENA" e ficou apenas o EARLY MORNING BLOGS, ambos sem negrito. A maioria dos blogues citados nos primeiros cinquenta EARLY MORNINGs j� desapareceram, embora nalguns casos os seus autores tenham aberto outros, fechados de novo e aberto uma terceira vaga.

A blogosfera era ent�o muito diferente e estava a mudar muito depressa. O grande surto dos blogues era contempor�neo desta nota. Vinha de ser mais pequena, estava a democratizar-se. Era pol�mica, mas ainda era am�vel. Estava a tornar-se �cida t�o rapidamente quanto se estava a democratizar. Nos EARLY MORNING BLOGs tentou acompanhar-se essas mudan�as dando origem �quilo que se veio a chamar "metabloguismo". Recorde-se para a mem�ria que o meta-bloguismo foi recebido com muita hostilidade, em particular pelos autores de blogues pioneiros. Exemplos de metabloguismo nos primeiros cinquenta EARLY MORNING BLOGs:

5 de Julho de 2003: EARLY MORNING BLOGS 2: O mundo continua l� fora e quanto mais vozes se ouvirem melhor. Eu sou um liberal, acredito na lei dos grandes n�meros, na �m�o invis�vel�. H� virtudes na cacofonia, cada voz a menos empobrece.

15 de Julho de 2003: EARLY MORNING BLOGS 9

Quando se l� um n�mero suficiente de blogues e, esfor�ando-me por sair da rede mais densa do mainstream, � aquele c�rculo de blogues que est�o intensamente �linkados� uns com os outros e tem uma massa cr�tica suficiente para impor tem�ticas e aparecer como a face da blogosfera fora dela � apercebem-se as tend�ncias e apercebe-se, acima de tudo, a enorme revolu��o do meio em Portugal nos �ltimos meses. Por isso � que o meta-bloguismo � natural, � uma reac��o de auto-compreens�o e auto-defini��o compreens�vel em tempos de tumulto.

V�rias coisas aconteceram ao mesmo tempo como � habitual numa revolu��o. Cito Lenine, j� que os nossos amigos � esquerda tem grande pudor em o fazer, - e permito mais umas brincadeiras humor�sticas comigo inteiramente previs�veis - porque a frase aplica-se bem ao momento actual da blogosfera :

�S� quando os "de baixo" n�o querem e os "de cima" n�o podem continuar vivendo � moda antiga � que a revolu��o pode triunfar.�

O que se est� a dar � a democratiza��o da blogosfera com a entrada de muita gente no duplo sentido: novos blogues e novos leitores. Por outro lado, a exposi��o exterior dos blogues introduziu diferentes crit�rios de avalia��o que n�o coincidiam com os dominantes no seu interior.

Este efeito acabou com a blogosfera cosy , fortemente estratificada entre blogues a quem ningu�m ligava nenhuma e blogues que atrav�s de um permanente di�logo, do auto-elogio, de um esp�rito de elite que ultrapassava claramente qualquer barreira ideol�gica, se apresentavam como primus inter pares. A distin��o esquerda - direita era menos importante do que a distin��o entre os amigos e os desconhecidos, entre �n�s, os bons� e eles a turba ignara de mau gosto. A lista de �blogues de servi�o p�blico� no Blogo era o retrato desse mundo fechado que explodiu.

Era tamb�m natural que a maioria das pessoas se conhecessem umas �s outras e fossem amigos. Quando, num meio de comunica��o qualquer, todos se conhecem, ou todos tem a mesma idade, ou todos tem a mesma forma��o, ou todos l�em os mesmos livros, ou frequentam todos os mesmos restaurantes, � porque esse meio est� na inf�ncia.

Tudo isto gera muitas tens�es e uma certa irrita��o era inevit�vel (�os "de cima" n�o podem continuar vivendo � moda antiga�). Nalguns blogues mais antigos h� uma clara evolu��o do blogue-optimismo para o blogue-cepticismo, que nada justifica, porque s� um cego � que pensa que a blogosfera est� pior porque n�o � um clube de vinte amigos. � natural que tenham vontade de migrar e para isso, por raz�es psicol�gicas, desvalorizam o que deixam para tr�s.

Um dos aspectos mais saud�veis da democratiza��o da blogosfera � que hoje � mais dif�cil �competir� (tomem a palavra com a latitude que quiserem), ter influ�ncia, j� h� muitas vozes qualificadas, muito saber em muitas �reas, uma diversifica��o tem�tica, de opini�es e de escritas, que a capacidade para se afirmar j� n�o depende do elogio m�tuo, mas de se ter ou n�o uma voz pr�pria e persist�ncia. Este �ltimo factor � o que mais falta na blogosfera, onde um m�s � um s�culo e se chega a conclus�es taxativas lendo cinco ou seis blogues de um dia para o outro.

Eu sou liberal no sentido antigo, prezo a chuva e o mau tempo, a f�ria e a calma das discuss�es, e gosto de ouvir muitas vozes diferentes. Como j� disse e repito, na blogosfera, a �m�o invis�vel� est� dentro da cacofonia e para exercer o seu efeito positivo � suposto ser mesmo �invis�vel�. A blogosfera portuguesa passou de ter uma m�o �vis�vel� para ter uma �invis�vel� e foi, em primeiro lugar, o n�mero que provocou esse efeito. Mais gente, mais vozes, tudo mais �rduo. Esta � a revolu��o.

19 de Julho: EARLY MORNING BLOGS 12

Nos blogues �

� as pessoas zangam-se muito, s�o muito piegas, s�o malcriadas, s�o gentis, s�o espertas, s�o espertinhas, s�o parvas, copiam, fazem de conta que n�o copiam, irritam-se, reconciliam-se, cuidam muito da sua identidade, d�o-se todas aos estranhos, representam, representam-se, s�o azedas, s�o poucas vezes alegres, s�o tristes, s�o tristonhas, s�o f�teis, s�o totalmente f�teis, t�m interesse, t�m interesses, t�m egos gigantescos, t�m egos pequeninos, t�m que �dizer-qualquer-coisismo� , deixam cair muitos nomes, deixam cair muitos livros, parece que l�em muito, l�em muito, n�o l�em quase nada, nunca v�em televis�o, tem gra�a, s�o engra�adinhas, t�m tribos, t�m f�rias, t�m territ�rios, est�o sozinhas, est�o tanto mais sozinhas quanto mais acompanhadas, t�m alguns pais, come�am a ter filhos, t�m maridos, n�o t�m amantes, t�m �o que escrevo � para ti�, t�m �o que escrevo � s� para ti�, t�m �o que escrevo � s� para ti�, mas � s� para mim , ou para o outro(a), n�o t�m muita paci�ncia, t�m pressa de chegar a algum lado, t�m a esperan�a de chegar a qualquer lado, est�o convictos que n�o v�o chegar a lado nenhum, t�m quereres, t�m birras, s�o meli-melo, s�o assim �

� porque se calhar � assim na vida toda.

Como os blogues n�o t�m editor, a vida aparece sem ser editada.

Engano, puro engano. Funciona aqui um gigantesco editor, o monstro que est� dentro.

19 de Julho EARLY MORNING BLOGS 13

Eu sou um adepto do meta-bloguismo, embora pense que o excesso do dito levaria a uma esterilidade completa. O meu meta-bloguismo vem de n�o conseguir usar um meio sem me esfor�ar por o perceber. Num primeiro tempo, este olhar �tira� liberdade, condiciona, �prende� e por isso o meta-bloguismo gera sempre um certo mal-estar. Mas h� um segundo olhar, que se calhar tamb�m vem com o primeiro, que acaba por nos dar uma ainda maior liberdade. Eu sou da escola de quem pensa que conhecer liberta. N�o h� provavelmente maior ilus�o nos �ltimos duzentos anos, do que achar que as �luzes� alumiam, mas eu prefiro um mundo em que se proceda (eu disse proceda e n�o acredite) segundo essa ilus�o.

28 de Julho: EARLY MORNING BLOGS 19

Mat�rias que n�o entram nos blogues: pobreza, desemprego, levar os filhos � escola �s oito da manh�, cozinhar (sem ser por prazer), trabalhos dom�sticos, trabalho de um modo geral com excep��o de algum trabalho intelectual, doen�as, quase todas as formas de escassez. Lugares que n�o entram: locais de trabalho fora de universidades, escolas, firmas de inform�tica, telecomunica��es, e jornais, nove d�cimos de Portugal e muito mais ainda.

Pelo contr�rio, os caminhos do Magn�lia � FNAC do Chiado, do Lux ao Algarve ou ao Alentejo, est�o t�o trilhados nos Moleskines que at� deixam um sulco como os carros de bois nas pedras antigas.Nesta mat�ria n�o h� distin��es nem pol�ticas, nem ideol�gicas, nem esquerda , nem direita.

N�o � um julgamento de valor, porque tamb�m n�o entram no Abrupto, � uma constata��o, chamemos-lhe assim, social. Para que n�o percamos a nossa (a minha) medida.

No dia 13 de Setembro, no EARLY MORNING BLUES 39, j� a negrito, publica-se o primeiro poema:

Foram os �Early Morning Blues� que deram o nome aos �Early Morning Blogs�. H� v�rios e em v�rias vers�es. Aqui est� uma dos The Monkees:

A distant night bird mocks the sun.

I wake as I have always done,

To freshly scented sycamore

And cold bare feet on hardwood floor.

My steaming coffee warms my face

I'm disappointed in the taste.

But there's a peace the early brings

The morning world of growing things.

I feel the moments hurry on

It was today, it's died away,

And now it is forever gone.

And I will drink my coffee slow

And I will watch my shadow grow

And disappear in firelight

And sleep alone again tonight.

e a f�rmula foi-se consolidando. Ainda houve um EARLY MORNING BLOGS / BLUES 45 , um EARLY MORNING BLOGS / BOOKS 47 , um EARLY MORNING BLOGS / SONGS 48. S� bastante depois do cinquenta � que esta parte do Abrupto se tornou o que � hoje. "A poem a day keeps boredom at bay" .

(Devo a uma leitora de sempre a gentileza de ter feito uma antologia dos EARLY MORNINGS que me surpreendeu pelas diferen�as - de "tom" , como se diz no

ou seja era o que � hoje ouma revista de blogues. Depois tombou o "VALE A PENA" e ficou apenas o EARLY MORNING BLOGS, ambos sem negrito. A maioria dos blogues citados nos primeiros cinquenta EARLY MORNINGs j� desapareceram, embora nalguns casos os seus autores tenham aberto outros, fechados de novo e aberto uma terceira vaga.A blogosfera era ent�o muito diferente e estava a mudar muito depressa. O grande surto dos blogues era contempor�neo desta nota. Vinha de ser mais pequena, estava a democratizar-se. Era pol�mica, mas ainda era am�vel. Estava a tornar-se �cida t�o rapidamente quanto se estava a democratizar. Nos EARLY MORNING BLOGs tentou acompanhar-se essas mudan�as dando origem �quilo que se veio a chamar "metabloguismo". Recorde-se para a mem�ria que o meta-bloguismo foi recebido com muita hostilidade, em particular pelos autores de blogues pioneiros. Exemplos de metabloguismo nos primeiros cinquenta EARLY MORNING BLOGs:No dia 13 de Setembro, noj� a negrito, publica-se o primeiro poema:e a f�rmula foi-se consolidando. Ainda houve um, um, umS� bastante depois do cinquenta � que esta parte do Abrupto se tornou o que � hoje.(Devo a uma leitora de sempre a gentileza de ter feito uma antologia dos EARLY MORNINGS que me surpreendeu pelas diferen�as - de "tom" , como se diz no Miniscente , o que nunca se repete -, embora n�o com as continuidades, porque eu sou da escola teimosa em mat�ria do pensamento e opini�o.)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 23 de Junho de 2006

� Mahomet n�est ici autre chose que Tartuffe les armes � la main .�

*

Muito, muito interessante

Veja-se este exemplo de uma cr�tica de um leitor:

Em Fran�a, no meio do inc�modo geral e de muitos sil�ncios (uma excep��o em La R�publique des Livres ) , republica-se Le Fanatisme ou Mahomet et le proph�te de Voltaire, uma pe�a de teatro, como o nome indica, contra o fanatismo e a utiliza��o da religi�o para fomentar o assassinato . Voltaire dizia :.�Muito, muito interessante a an�lise e os exemplos (via Frescos ) com que o (ou a? � masculino ou feminino?) Slate examina as cr�ticas dos seus leitores e o problema de uma publica��o na Rede corrigir junto da nota original, uma vez esta colocada num arquivo. O modo como no texto em linha se circula entre os tempos do presente e do passado, particularmente quando o passado � tornado presente por novos dados e pelas rectifica��es dos erros, ainda n�o est� resolvido.Veja-se este exemplo de uma cr�tica de um leitor: "So, if, for instance, you think you've nailed President Bush in an error, link to the whole speech, so people can see the context. That way, when you're mocking Bush for saying, "I'm honored to shake the hand of a brave Iraqi citizen who had his hand cut off by Saddam Hussein," readers can easily go to the full quote, and see that it says I'm honored to shake the hand of a brave Iraqi citizen who had his hand cut off by Saddam Hussein. � I appreciate Joe Agris, the doctor who helped put these hands on these men. � These men had hands restored because of the generosity and love of an American citizen � Bush was shaking the prosthetic hands of people whose real hands had been cut off by Hussein. In context, there's nothing risible about his statement (as Spinsanity also noted; for similar examples, see here, here, and here). Because of this, I think the Bushisms column shouldn't have run this statement. But I realize that others may disagree. That's why, rather than the impossible first-best world of "always quote accurate sources, and in context," I prefer the second-best world in which writers try their hardest to be accurate, but also provide the sources so readers can judge for themselves." *

Por falar em Timor, est� na altura de os �rg�os de comunica��o social come�arem a preparar outra ida e volta dos seus enviados. At� para se saber o que est� l� a fazer a GNR, e que timorenses mandam nela, Xanana ou o governo do pa�s. A n�o ser que tudo isso seja uma fic��o e sejam as autoridades portuguesas a decidir quais os timorenses que t�m legitimidade para dar ordens � GNR, ou seja, tomem partido. Ent�o, nesse caso, um governo democr�tico (o nosso) devia ir � Assembleia explicar as suas op��es, e uma oposi��o a s�rio devia exigi-las. A n�o ser assim temos que ler os jornais australianos para saber o papel de Portugal na crise de poder em Timor.

*

A doen�a dos t�tulos: em cami�es e autocarros � capital timorense e juntaram-se �s cerca de 700 pessoas que passaram a noite diante do Pal�cio do Governo. " Mais do que isto, o jornalista n�o sabe e provavelmente n�o pode saber. Por falar em Timor, est� na altura de os �rg�os de comunica��o social come�arem a preparar outra ida e volta dos seus enviados. At� para se saber o que est� l� a fazer a GNR, e que timorenses mandam nela, Xanana ou o governo do pa�s. A n�o ser que tudo isso seja uma fic��o e sejam as autoridades portuguesas a decidir quais os timorenses que t�m legitimidade para dar ordens � GNR, ou seja, tomem partido. Ent�o, nesse caso, um governo democr�tico (o nosso) devia ir � Assembleia explicar as suas op��es, e uma oposi��o a s�rio devia exigi-las. A n�o ser assim temos que ler os jornais australianos para saber o papel de Portugal na crise de poder em Timor.A doen�a dos t�tulos: "Timorenses solid�rios com Xanana" . Todos? A maioria? A resposta certa � "alguns" que at� podem ser muitos, os que s�o trazidos "" Mais do que isto, o jornalista n�o sabe e provavelmente n�o pode saber.

EARLY MORNING BLOGS

800

Soneto

Acusam-me de m�goa e desalento,

como se toda a pena dos meus versos

n�o fosse carne vossa, homens dispersos,

e a minha dor a tua, pensamento.

Hei-de cantar-vos a beleza um dia,

quando a luz que n�o nego abrir o escuro

da noite que nos cerca como um muro,

e chegares a teus reinos, alegria.

Entretanto, deixai que me n�o cale:

at� que o muro fenda, a treva estale,

seja a tristeza o vinho da vingan�a.

A minha voz de morte � a voz da luta:

se quem confia a pr�pria dor perscruta,

maior gl�ria tem em ter esperan�a.

(Carlos de Oliveira)

*

Bom dia! (Carlos de Oliveira)Bom dia!

OS BLOGUES ANTES DOS BLOGUES

" Tenho o fragmento no sangue. "

(Cioran)

(Cioran)

A escrita que se encontra hoje nos blogues � velha como o tempo, embora o tempo pregue partidas, transformando as coisas noutras muito diferentes. O tempo � aquilo a que hoje se chama os "suportes", no caso da escrita na Rede, a forma dos blogues.

Repito, a tecnologia do software em que assentam os blogues tem um papel ao moldar a sua forma. Vimos no artigo anterior como ela valoriza o presente, presentificando a escrita, obrigando-a � actualidade. Agora podemos ver como ela acentua aspectos da escrita: favorece o texto contido, aquilo que na linguagem da blogosfera se chama o "post curto". O "post curto" gera uma tens�o sobre o espa�o das palavras, acentua a utiliza��o est�tica da frase, em combina��o com o t�tulo e com outros elementos gr�ficos. O facto de os blogues poderem usar simultaneamente texto e imagens, sons e v�deo est� a dar origem � primeira grande vaga de um novo tipo de textos, nascidos na Rede e para serem lidos na Rede.

Os blogues revelam e geram

Ora nem todo o tipo de texto, nem todos os conte�dos se prestam a esta nova forma que despeda�a legibilidades antigas a favor de novas. No "post curto" a escrita vai desde a mera frase com uma liga��o, ou seja, uma porta, um caminho que nos leva para longe daquela p�gina, daquele ecr� at� � entrada diar�stica, impressionista ou faceta, at� ao mini-ensaio, pouco mais do que o aforismo. � uma escrita que favorece, comunicando quer com os t�tulos de jornais, quer com o aforismo, a utiliza��o de mecanismos po�ticos, mas tamb�m humor�sticos e sarc�sticos. Nesse sentido os blogues caem sob

Que textos t�m esta qualidade de serem protoblogues? Toda a escrita moldada pelo tempo, ou pela "constru��o" da personagem (ou da obra) pelo tempo. Os di�rios, ou uma forma muito francesa de di�rios, os "cadernos". Mas tamb�m alguma correspond�ncia e ensaios. Textos que colocados em blogues parecem ser escritos para blogues encontram-se no Para Al�m do Bem e do Mal de Nietzsche, em anota��es de Kafka, A escrita que se encontra hoje nos blogues � velha como o tempo, embora o tempo pregue partidas, transformando as coisas noutras muito diferentes. O tempo � aquilo a que hoje se chama os "suportes", no caso da escrita na Rede, a forma dos blogues.Repito, a tecnologia do software em que assentam os blogues tem um papel ao moldar a sua forma. Vimos no artigo anterior como ela valoriza o presente, presentificando a escrita, obrigando-a � actualidade. Agora podemos ver como ela acentua aspectos da escrita: favorece o texto contido, aquilo que na linguagem da blogosfera se chama o "post curto". O "post curto" gera uma tens�o sobre o espa�o das palavras, acentua a utiliza��o est�tica da frase, em combina��o com o t�tulo e com outros elementos gr�ficos. O facto de os blogues poderem usar simultaneamente texto e imagens, sons e v�deo est� a dar origem � primeira grande vaga de um novo tipo de textos, nascidos na Rede e para serem lidos na Rede.Os blogues revelam e geram novas normas de leitura na Rede que s�o distintas dos livros, acentuando a n�o-linearidade da leitura . Esta segue n�o apenas a frase, mas as liga��es, ganha em espessura ao deslocar-se entre as diferentes p�ginas associadas pelo hipertexto ( mais em Hypertext ). Move-se n�o apenas no texto, mas tamb�m pelas imagens e sons ligados ao texto, em detrimento da leitura sequencial, habitual no livro e nos jornais. A leitura num ecr� raras vezes anda para tr�s, tende a andar para o lado antes de andar para a frente. A escrita nos blogues � moldada por estas caracter�sticas f�sicas do novo texto electr�nico e, no seu conjunto, est� a ensinar a uma gera��o um novo c�none de leitura e escrita que poucos exploram conscientemente, mas que molda a todos.Ora nem todo o tipo de texto, nem todos os conte�dos se prestam a esta nova forma que despeda�a legibilidades antigas a favor de novas. No "post curto" a escrita vai desde a mera frase com uma liga��o, ou seja, uma porta, um caminho que nos leva para longe daquela p�gina, daquele ecr� at� � entrada diar�stica, impressionista ou faceta, at� ao mini-ensaio, pouco mais do que o aforismo. � uma escrita que favorece, comunicando quer com os t�tulos de jornais, quer com o aforismo, a utiliza��o de mecanismos po�ticos, mas tamb�m humor�sticos e sarc�sticos. Nesse sentido os blogues caem sob a cr�tica que Luk�cs fazia aos textos de Nietzsche - a de serem, pela sua forma, naturalmente irracionalistas, valorizando a met�fora, a sedu��o est�tica, em detrimento da argumenta��o.Que textos t�m esta qualidade de serem protoblogues? Toda a escrita moldada pelo tempo, ou pela "constru��o" da personagem (ou da obra) pelo tempo. Os di�rios, ou uma forma muito francesa de di�rios, os "cadernos". Mas tamb�m alguma correspond�ncia e ensaios. Textos que colocados em blogues parecem ser escritos para blogues encontram-se node Nietzsche, em anota��es de Kafka, nos "propos" de Alain, nos di�rios de Morand, nos "cadernos" de Camus, Valery e Cioran. Noutros casos, o tempo e a hist�ria "partiram" os textos originais, dando-lhe essa qualidade de escrita de blogues, como acontece com os fragmentos dos pr�-socr�ticos, restos de textos mais compridos, de tratados e de livros. E muito do que encontramos em dicion�rios de cita��es, frases que vivem por si pr�prias, s�o mat�ria-prima de blogues.

No plano gr�fico, muitos "cadernos" de desenhos, a come�ar pelos desenhos de Leonardo da Vinci com anota��es, muito dos moleskines de artistas, em que o esbo�o e o texto manuscrito se entrela�am, alguma banda desenhada, alguns livros de viagens. A fotografia deu origem a fotoblogues, mas est� longe de revelar as suas potencialidades na constru��o narrativa dos blogues, para onde transporta, em imagem, tudo o que valoriza o texto curto: a impress�o, o fragmento da realidade, o "olhar" no tempo. No v�deo, o sketch , o pequeno filme caseiro do g�nero dos "apanhados", alguns filmes publicit�rios. O som � o menos explorado nos blogues, mas a sua utiliza��o, por exemplo no

Muito significativamente, todo este tipo de material � favorito na actividade de "c�pia-colagem" que tamb�m a forma blogue e a Rede favorecem, apropriando-se cada um das cita��es, de textos e imagens que servem de refor�o da sua identidade em linha. Nalgumas experi�ncias com sucesso na blogosfera, di�rios foram colocados na Rede, como o de Samuel Pepys, que foi transformado num

Seria poss�vel fazer o mesmo com muitos "cadernos" de Cioran, Camus e Valery, muito diferentes entre si, mas todos passando o teste do blogue. O facto de, no caso de Cioran, este n�o ter a inten��o de os divulgar e inclusive ter pedido para que fossem destru�dos, n�o retira aos seus textos a puls�o fragment�ria que os aproxima do registo dos blogues. Ali�s, Cioran, autor dos

Valery passava o teste e os seus cadernos ganhariam muito com o uso de hipertexto e liga��es. Um aspecto fundamental, nos cadernos de Valery, � a sua utiliza��o como instrumento para a constru��o da obra, como meio de treinar o pensamento, mas tamb�m de o desenvolver, experimentar, testar, deixando-o aparecer sem a responsabilidade do ensaio final, do livro a publicar. Valery usava os seus cadernos, que escreveu ininterruptamente (no final eram cerca de 261 com 28.000 p�ginas), como um instrumento para pensar, fazendo uso n�o s� da escrita, mas tamb�m do desenho, e escrevendo sobre tudo: arte, filosofia, poesia, matem�tica. E escreveu sobre como o "eu", como o "seu cogito" "funcionava", mat�ria de blogues, como se sabe.

Camus �, de todos, quem, sem d�vidas, faria um blogue excepcional. A escrita, umas vezes mais tensa e outras mais solta, curta e imag�tica, intercalando fragmentos de di�logos, recorda��es de paisagens e de encontros, notas de leitura, revela o olhar de Camus sobre a sua geografia africana peculiar, a Arg�lia, e sobre os acontecimentos que est� a viver. Os cadernos de Camus n�o s� suportariam

Em todos os casos que referi, a legibilidade dos textos na actualidade ganharia com a forma blogue, pela representa��o mais perfeita do tempo que a Rede permite. Os cadernos de Camus s�o os que melhor se l�em, enquanto os de Valery e de Cioran s� s�o leg�veis, na sua forma livro, em antologias depuradas. O de Cioran tem centenas de p�ginas de um grosso volume e os de Valery estendem-se por dez volumes na edi��o da Gallimard. Mesmo em Portugal foram os �nicos divulgados numa edi��o barata e popular, de h� muito esgotada.

Por tudo isto, valia a pena, e acabar� com certeza por ser feito, o teste pr�tico de colocar todas estas escritas na Rede usando modelos iguais ou pr�ximos dos blogues. A blogosfera ter� ent�o ao seu lado Nietzsche, Valery, Camus, Cioran e tantos outros, como autores de blogues.

(No P�blico .)

nos "propos" de Alain, nos di�rios de Morand, nos "cadernos" de Camus, Valery e Cioran. Noutros casos, o tempo e a hist�ria "partiram" os textos originais, dando-lhe essa qualidade de escrita de blogues, como acontece com os fragmentos dos pr�-socr�ticos, restos de textos mais compridos, de tratados e de livros. E muito do que encontramos em dicion�rios de cita��es, frases que vivem por si pr�prias, s�o mat�ria-prima de blogues.No plano gr�fico, muitos "cadernos" de desenhos, a come�ar pelos desenhos de Leonardo da Vinci com anota��es, muito dos moleskines de artistas, em que o esbo�o e o texto manuscrito se entrela�am, alguma banda desenhada, alguns livros de viagens. A fotografia deu origem a fotoblogues, mas est� longe de revelar as suas potencialidades na constru��o narrativa dos blogues, para onde transporta, em imagem, tudo o que valoriza o texto curto: a impress�o, o fragmento da realidade, o "olhar" no tempo. No v�deo, o, o pequeno filme caseiro do g�nero dos "apanhados", alguns filmes publicit�rios. O som � o menos explorado nos blogues, mas a sua utiliza��o, por exemplo no Kottke.org como complemento de viagem - o som dos sem�foros de Singapura, o ru�do de um mercado, o barulho de uma f�brica -, acentua a fragmenta��o da narrativa ou da ilustra��o que est� no �mago da escrita dos blogues.Muito significativamente, todo este tipo de material � favorito na actividade de "c�pia-colagem" que tamb�m a forma blogue e a Rede favorecem, apropriando-se cada um das cita��es, de textos e imagens que servem de refor�o da sua identidade em linha. Nalgumas experi�ncias com sucesso na blogosfera, di�rios foram colocados na Rede, como o de Samuel Pepys, que foi transformado num blogue , com o texto original e liga��es, dando uma nova legibilidade ao texto original do s�culo XVII.Seria poss�vel fazer o mesmo com muitos "cadernos" de Cioran, Camus e Valery, muito diferentes entre si, mas todos passando o teste do blogue. O facto de, no caso de Cioran, este n�o ter a inten��o de os divulgar e inclusive ter pedido para que fossem destru�dos, n�o retira aos seus textos a puls�o fragment�ria que os aproxima do registo dos blogues. Ali�s, Cioran, autor dos Silogismos da Amargura � um cultor de uma forma de escrita muito adaptada ao "post curto".Valery passava o teste e os seus cadernos ganhariam muito com o uso de hipertexto e liga��es. Um aspecto fundamental, nos cadernos de Valery, � a sua utiliza��o como instrumento para a constru��o da obra, como meio de treinar o pensamento, mas tamb�m de o desenvolver, experimentar, testar, deixando-o aparecer sem a responsabilidade do ensaio final, do livro a publicar. Valery usava os seus cadernos, que escreveu ininterruptamente (no final eram cerca de 261 com 28.000 p�ginas), como um instrumento para pensar, fazendo uso n�o s� da escrita, mas tamb�m do desenho, e escrevendo sobre tudo: arte, filosofia, poesia, matem�tica. E escreveu sobre como o "eu", como o "seu cogito" "funcionava", mat�ria de blogues, como se sabe.Camus �, de todos, quem, sem d�vidas, faria um blogue excepcional. A escrita, umas vezes mais tensa e outras mais solta, curta e imag�tica, intercalando fragmentos de di�logos, recorda��es de paisagens e de encontros, notas de leitura, revela o olhar de Camus sobre a sua geografia africana peculiar, a Arg�lia, e sobre os acontecimentos que est� a viver. Os cadernos de Camus n�o s� suportariam o formato do blogue , como ganhariam com a imagem na sua dimens�o mediterr�nica. Ganhariam tamb�m com o hipertexto, embora menos que Valery ou Cioran, que quase o exigem para serem devidamente lidos.Em todos os casos que referi, a legibilidade dos textos na actualidade ganharia com a forma blogue, pela representa��o mais perfeita do tempo que a Rede permite. Os cadernos de Camus s�o os que melhor se l�em, enquanto os de Valery e de Cioran s� s�o leg�veis, na sua forma livro, em antologias depuradas. O de Cioran tem centenas de p�ginas de um grosso volume e os de Valery estendem-se por dez volumes na edi��o da Gallimard. Mesmo em Portugal foram os �nicos divulgados numa edi��o barata e popular, de h� muito esgotada.Por tudo isto, valia a pena, e acabar� com certeza por ser feito, o teste pr�tico de colocar todas estas escritas na Rede usando modelos iguais ou pr�ximos dos blogues. A blogosfera ter� ent�o ao seu lado Nietzsche, Valery, Camus, Cioran e tantos outros, como autores de blogues.(No.)

LENDO

VENDO

OUVINDO

�TOMOS E BITS

de 22 de Junho de 2006

Eu bem sei que a vida est� dif�cil para os jornais, mas o que � que leva o P�blico a pensar que dedicar as suas primeiras dezassete p�ginas ao futebol, antes de come�ar o jornal propriamente dito, lhe acrescenta alguma coisa que os seus leitores n�o encontram noutro lado? Quem � que vai comprar o P�blico para ler sobre futebol? E quem � que vai deixar de comprar o P�blico porque ele n�o embarca (n�o embarcava) no reino da Futebol�ndia?

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Sobre as teorias da conspira��o ver os "

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com pares e trios e quartetos muito especiais. Um usa muitos an�is, outro � muito frio, outro faz pela vida no meio dos grandes, outro respira uma atmosfera muito especial. Eu bem sei que a vida est� dif�cil para os jornais, mas o que � que leva oa pensar que dedicar as suas primeiras dezassete p�ginas ao futebol, antes de come�ar o jornal propriamente dito, lhe acrescenta alguma coisa que os seus leitores n�o encontram noutro lado? Quem � que vai comprar opara ler sobre futebol? E quem � que vai deixar de comprar oporque ele n�o embarca (n�o embarcava) no reino da Futebol�ndia?Sobre as teorias da conspira��o ver os " professores da paranoia ". V�rias dan�as com pares e trios e quartetos muito especiais. Um usa muitos an�is, outro � muito frio, outro faz pela vida no meio dos grandes, outro respira uma atmosfera muito especial.

EARLY MORNING BLOGS

799

Just Keep Quiet and Nobody Will Notice

There is one thing that ought to be taught in all the colleges,

Which is that people ought to be taught not to go around always making apologies.

I don't mean the kind of apologies people make when they run over you or borrow five dollars or step on your feet,

Because I think that is sort of sweet;

No, I object to one kind of apology alone,

Which is when people spend their time and yours apologizing for everything they own.

You go to their house for a meal,

And they apologize because the anchovies aren't caviar or the partridge is veal;

They apologize privately for the crudeness of the other guests,

And they apologzie publicly for their wife's housekeeping or their husband's jests;

If they give you a book by Dickens they apologize because it isn't by Scott,

And if they take you to the theater, they apologize for the acting and the dialogue and the plot;

They contain more milk of human kindness than the most capacious dairy can,

But if you are from out of town they apologize for everything local and if you are a foreigner they apologize for everything American.

I dread these apologizers even as I am depicting them,

I shudder as I think of the hours that must be spent in contradicting them,

Because you are very rude if you let them emerge from an argument victorious,

And when they say something of theirs is awful, it is your duty to convince them politely that it is magnificent and glorious,

And what particularly bores me with them,

Is that half the time you have to politely contradict them when you rudely agree with them,

So I think there is one rule every host and hostess ought to keep with the comb and nail file and bicarbonate and aromatic spirits on a handy shelf,

Which is don't spoil the denouement by telling the guests everything is terrible, but let them have the thrill of finding it out for themselves.

(Ogden Nash)

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Bom dia! (Ogden Nash)Bom dia!

LENDO / VENDO /OUVINDO

(BLOGUES, JORNAIS, TELEVIS�ES, IMAGENS, SONS, PAP�IS, PAREDES)

(20 de Junho de 2006)

"Ver" o P�lo Norte em tempo real: uma "Ver" o P�lo Norte em tempo real: uma Web Cam num dos s�tios mais bizarros da terra. Na realidade, no meio do mar.

EARLY MORNING BLOGS

798

Enfin quelle apparence de pouvoir remplir tous les go�ts si diff�rents des hommes par un seul ouvrage de morale?

Les uns cherchent des d�finitions, des divisions, des tables, et de la m�thode: ils veulent qu'on leur explique ce que c'est que la vertu en g�n�ral, et cette vertu en particulier; quelle diff�rence se trouve entre la valeur, la force et la magnanimit�; les vices extr�mes par le d�faut ou par l'exc�s entre lesquels chaque vertu se trouve plac�e, et duquel de ces deux extr�mes elle emprunte davantage; toute autre doctrine ne leur pla�t pas. Les autres, contents que l'on r�duise les moeurs aux passions et que l'on explique celles-ci par le mouvement du sang, par celui des fibres et des art�res, quittent un auteur de tout le reste.

Il s'en trouve d'un troisi�me ordre qui, persuad�s que toute doctrine des moeurs doit tendre � les r�former, � discerner les bonnes d'avec les mauvaises, et � d�m�ler dans les hommes ce qu'il y a de vain, de faible et de ridicule, d'avec ce qu'ils peuvent avoir de bon, de sain et de louable, se plaisent infiniment dans la lecture des livres qui, supposant les principes physiques et moraux rebattus par les anciens et les modernes, se jettent d'abord dans leur application aux moeurs du temps, corrigent les hommes les uns par les autres, par ces images de choses qui leur sont si famili�res, et dont n�anmoins ils ne s'avisaient pas de tirer leur instruction.

Tel est le trait� des Caract�res des moeurs que nous a laiss� Th�ophraste.

(La Bruy�re, Les caract�res ou Les moeurs de ce si�cle )

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Bom dia!

EARLY MORNING BLOGS

797

Me voici donc seul sur la terre, n'ayant plus de fr�re, de prochain, d'ami, de soci�t� que moi-m�me. Le plus sociable et le plus aimant des humains en a �t� proscrit par un accord unanime. Ils ont cherch� dans les raffinements de leur haine quel tourment pouvait �tre le plus cruel � mon �me sensible, et ils ont bris� violemment tous les liens qui m'attachaient � eux. J'aurais aim� les hommes en d�pit d'eux-m�mes. Ils n'ont pu qu'en cessant de l'�tre se d�rober � mon affection. Les voil� donc �trangers, inconnus, nuls enfin pour moi puisqu'ils l'ont voulu. Mais moi, d�tach� d'eux et de tout, que suis-je moi-m�me? Voil� ce qui me reste � chercher. Malheureusement cette recherche doit �tre pr�c�d�e d'un coup d'oeil sur ma position. C'est une id�e par laquelle il faut n�cessairement que je passe pour arriver d'eux � moi.

(Jean-Jacques Rousseau, Les r�veries du promeneur solitaire )

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Bom dia! (Jean-Jacques Rousseau,Bom dia!

FUTEBOL�NDIA

Obrigado por Obrigado por este presente

NUNCA � TARDE PARA APRENDER OU " EU BEM SABIA QUE DEVIA HAVER ALGO DE DEMON�ACO NOS TELEM�VEIS" 2 Stephen King, Cell

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. H� coisas que Stephen King faz sempre bem: � um mestre da Surpresa. N�o h� suspense nos seus livros, mas sim pura Surpresa. Depois come�a sempre de uma maneira que, � segunda p�gina, j� n�o se larga o livro. L� para a frente, esmorece um pouco, escreve demais, repete-se, mas percebe-se sempre a capacidade de dom�nio sobre o leitor, fundamental em livros que usam o terror, o medo, como sedu��o. N�o � arte � of�cio, mas � excelente of�cio, profissional, capaz. N�o admira que venda mais do que qualquer outro autor popular.

EARLY MORNING BLOGS 796

Alice was beginning to get very tired of sitting by her sister on the bank, and of having nothing to do: once or twice she had peeped into the book her sister was reading, but it had no pictures or conversations in it, 'and what is the use of a book,' thought Alice 'without pictures or conversation?'

So she was considering in her own mind (as well as she could, for the hot day made her feel very sleepy and stupid), whether the pleasure of making a daisy-chain would be worth the trouble of getting up and picking the daisies, when suddenly a White Rabbit with pink eyes ran close by her.

There was nothing so very remarkable in that; nor did Alice think it so very much out of the way to hear the Rabbit say to itself, 'Oh dear! Oh dear! I shall be late!' (when she thought it over afterwards, it occurred to her that she ought to have wondered at this, but at the time it all seemed quite natural); but when the Rabbit actually took a watch out of its waistcoat-pocket, and looked at it, and then hurried on, Alice started to her feet, for it flashed across her mind that she had never before seen a rabbit with either a waistcoat-pocket, or a watch to take out of it, and burning with curiosity, she ran across the field after it, and fortunately was just in time to see it pop down a large rabbit-hole under the hedge.

In another moment down went Alice after it, never once considering how in the world she was to get out again.

(Lewis Carroll)

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Bom dia! (Lewis Carroll)Bom dia!

COISAS SIMPLES

(Marie Kroyer) (Marie Kroyer)

NUNCA � TARDE PARA APRENDER OU " EU BEM SABIA QUE DEVIA HAVER ALGO DE DEMON�ACO NOS TELEM�VEIS" Stephen King, Cell

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O fim do mundo chega pelos telem�veis.

LUIS FILIPE CASTRO MENDES - PORTUGAL E O BRASIL : ATRIBULA��ES DE DUAS IDENTIDADES

Como foi que temperaste,

Portugal, meu av�zinho,

Esse gosto misturado

De saudade e de carinho?

MANUEL BANDEIRA

Numa terra radiosa vive um povo

triste. Legaram-lhe essa melancolia

os descobridores que a revelaram ao

mundo e a povoaram.

PAULO PRADO

I DA INFELICIDADE DE SER IB�RICO�

Um preconceito hist�rico, persistente no nosso universo cultural desde o S�culo das Luzes, enfatiza o atraso e a barb�rie dos desgra�ados povos ib�ricos, afastados pelo obscurantismo pol�tico e religioso das luzes da civiliza��o, um degrau apenas acima dos mouros e dos cafres, culpados de n�o serem protestantes, norte-europeus e, consequentemente, trabalhadores, individualistas e empreendedores. Durante os s�culos XVIII e XIX, Portugal e a Espanha s�o vistos pelo mundo civilizado (isto �, o mundo organizado conforme os interesses das pot�ncias dominantes) como qualquer coisa de interm�dio entre a civiliza��o e o exotismo, n�o t�o estranhos que coubessem nos estudos dos orientalistas, mas suficientemente bizarros para despertarem a ironia superior dos viajantes e o fasc�nio er�tico dos poetas e novelistas.

Ironia da Hist�ria: esta unidade de destino entre portugueses e espanh�is decorre mais da rejei��o de que os dois pa�ses foram alvo por parte dos novos centros de poder mundial emergentes no limiar da modernidade, isto �, no fim da idade barroca, do que de uma real identidade de projectos hist�ricos. No s�culo XVI, portugueses e espanh�is, ciosos das suas soberanias e rivais na expans�o mar�tima, sentiam-se, n�o obstante, partilhar uma cultura comum. Mas esta identidade cultural ib�rica, bem vis�vel em Gil Vicente ou Cam�es, quebrou-se no s�culo XVII, com a tentativa filipina de unifica��o pol�tica sob hegemonia castelhana, que veio determinar um persistente div�rcio pol�tico e cultural entre os dois pa�ses, de que s� hoje come�amos, felizmente, a sair.

Eduardo Louren�o, no seu ensaio N�s e a Europa ou as Duas Raz�es, contrap�e � raz�o cartesiana, que funda a nossa modernidade, uma outra raz�o, ib�rica, contra-reformista, barroca, de que o expoente seria Graci�n, o da Agudeza e Arte de Engenho. Nessa raz�o barroca participaram espanh�is e portugueses, mas tamb�m o que, a partir dos espanh�is e dos portugueses, se formava do outro lado do Atl�ntico: n�o s�o Sor Juana In�s de la Cruz e o Padre Ant�nio Vieira express�es maiores do barroco universal, como o vir� a ser, num genial anacronismo, a escultura do Aleijadinho? N�o foi a Ratio Studiorum dos jesu�tas uma matriz fundadora da cultura no Brasil?

Mas a verdade � que esta rejei��o da cultura ib�rica foi assumida por um grande n�mero de historiadores brasileiros como a chave que explicaria todos os atrasos, injusti�as e opress�es sofridos pelo Brasil. A coloniza��o portuguesa seria o pecado original desta terra, o que lhe vedara o acesso ao para�so ou os caminhos da modernidade.

Esta ideia encontra-se formulada exemplarmente na obra cl�ssica de S�rgio Buarque de Holanda Ra�zes do Brasil. Todos os obst�culos ao desenvolvimento do Brasil derivariam dos tra�os de car�cter herdados do colonizador portugu�s, reconstru�dos como um tipo-ideal, � maneira de Max Weber, e contrapostos (sempre seguindo a li��o de Weber) �queles que fundamentam o esp�rito moderno, essencialmente derivados da �tica do protestantismo. Da� o grande confronto, obsessivo na cultura brasileira, entre o Brasil e os Estados Unidos, encarados estes, mesmo quando demonizados, como o supremo paradigma. Bandeirantes e Pioneiros de Vianna Moog � a triste elegia a um Brasil que poderia ter sido, um Brasil que se poderia vir a identificar com os Estados Unidos.

Conhecemos a grande obra de interpreta��o do Brasil antag�nica desta vis�o, que foi a de Gilberto Freyre. Para o autor de Casa Grande e Senzala foi da coloniza��o portuguesa e da escravid�o africana que provieram toda a originalidade e a inova��o da civiliza��o brasileira, atrav�s do processo de miscigena��o. Freyre n�o idealiza o processo colonizador, mas escreve de uma hist�ria olhada sem ressentimentos, com o amor fati nietzscheano e a permanente gula dos sentidos que o tornam o mais moderno de todos os seus contempor�neos.

Com a not�vel excep��o de Vamireh Chacon, as correntes dominantes do pensamento social brasileiro de tend�ncias mais progressistas tenderam a identificar as teses de Gilberto Freyre com o conservadorismo e a nostalgia de uma sociedade patriarcal e pr�-moderna, colocando assim as ideias do mestre de Apicucos como mais um obst�culo ao progresso e � emancipa��o dos brasileiros. Uma rejei��o global que Jos� Guilherme Merquior, grande desmistificador, qualificou um dia de �suprema burrice�.

Sem querer intervir neste debate (porque penso, como Alfredo Bosi, que � uma quest�o ociosa escolher agora quem teriam sido os melhores colonizadores), julgo necess�rio integorrarmo-nos em que medida as duas correntes de interpreta��o aqui demarcadas partilhariam um terreno comum, uma vis�o que da imagem constru�da do passado hist�rico deriva para um olhar intemporal sobre o Outro, o portugu�s, e em que medida n�s, os portugueses, nos confrontamos ainda e sempre com essa imagem intemporal que de n�s foram tecendo os brasileiros no processo de constru��o da sua pr�pria identidade (a piada de portugu�s � apenas a manifesta��o mais superficial e inocente dessa imagem estereotipada).

II �� DESGRA�A DE SER PORTUGU�S

O facto � que Portugal hoje aparece no Brasil, de forma in�dita, e para surpresa e desconcerto de alguns brasileiros, como um pa�s exportador de investimentos produtivos, alguns em sectores de elevada tecnologia, e n�o mais como um mero exportador de m�o-de-obra pouco qualificada para pequenas empresas de com�rcio e servi�os. Esta mudan�a da base material da presen�a portuguesa no Brasil, embora custe muito a ser digerida por alguns (para o historiador Lu�s Felipe de Alencastro, por exemplo, o investimento portugu�s seria apenas um bra�o subordinado do capital espanhol, esse sim o verdadeiro actor da Hist�ria), n�o deixou de trazer mudan�as sens�veis � percep��o de Portugal do outro lado do Atl�ntico. Acresce que a imagem de Portugal como persist�ncia de uma sociedade de Antigo Regime encravada na modernidade europeia, t�o cultivada tamb�m pela intelectualidade brasileira, mesmo quando solidariamente a denunciava, dificilmente se sustenta face � realidade actual de um pa�s democr�tico, moderno e integrado na Uni�o Europeia.

Conv�m n�o esquecer que a imagem de Portugal para os brasileiros foi durante muito tempo a de um pa�s atrasado, arcaico, imune � mudan�a, ancorado no tempo como uma nau de pedra silenciosa. Para os conservadores aut�ntico guardi�o das tradi��es de que nasceu o Brasil, para os progressistas resumo de tudo o que o Brasil deveria destruir dentro de si para ser verdadeiramente moderno e autenticamente justo, Portugal s� era tratado pelos brasileiros como um antepassado.

A recente comemora��o dos 500 anos do �descobrimento� ou �achamento� ou �encontro� dividiu o Brasil. De um lado os que aceitam a heran�a portuguesa como uma matriz fundadora da identidade brasileira; do outro aqueles que, n�o podendo negar essa realidade, n�o se conformam com ela, porque pensam sinceramente que todos os atrasos e as injusti�as do Brasil derivaram em linha directa da coloniza��o portuguesa.

Para dar um exemplo, entre os mais not�veis, um livro como Os Donos do Poder de Raymundo Faoro, na sua vis�o fixista da sociedade brasileira (tudo se joga na sociedade estamental herdada da coloniza��o portuguesa, que se mant�m metafisicamente incorrupta atrav�s dos s�culos), vem tornar mais compreens�vel a dificuldade que os brasileiros sentem em reconhecer no antigo pa�s colonizador mudan�as que muitas vezes n�o conseguem ver no seu pr�prio pa�s. � que o Brasil nunca ser� �um imenso Portugal�, como cantava Chico Buarque, pela simples raz�o de que h� quase 200 anos que vivemos separados.

Na verdade, para um portugu�s � mais claro e mais saud�vel este sentimento de separa��o do Brasil do que para um brasileiro. Para n�s, o colonialismo portugu�s jogou-se no nosso tempo nos dramas de �frica e h� muito j� que reconhecemos o Brasil como uma outra na��o. N�o assim no Brasil, que, de um certo modo, introjectou Portugal, incorporou-o a si mesmo (antropofagicamente, como diriam os modernistas de 1922), olhando-o quase como um cap�tulo do seu passado, como uma refer�ncia incontorn�vel (para o bem e para o mal) da afirma��o da sua pr�pria identidade, mas que, por isso mesmo, se tornou estranhamente invis�vel aos brasileiros enquanto realidade existente e pa�s actual, como diagnosticava Eduardo Louren�o na sua l�cida Nau de �caro. Como se para os brasileiros o �nico sentido de ser portugu�s fosse vir a tornar-se brasileiro�

Acresce que � escala mundial vivemos hoje tempos de uma curiosa ofensiva ideol�gica anti-europeia, fomentada por algum pensamento �politicamente correcto�. Atrav�s do conceito de �p�s-colonial�, conceb

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