Chove: Acerca da autenticidade e das putas das vírgulas

04-10-2009
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Parte IEm prosa inesperadamente pífia, a Isabel Coutinho escreve hoje no Ípsilon/Público:«[…]Ao aproximarem-se do caixão para se despedir, algumas pessoas tocavam na madeira, outras rezavam, outras lamentavam não ter os óculos para ler o texto emoldurado em cima do caixão. Tinha por título Um Vazio no Tempo, não tinha data e foi escrito por Raul Solnado*.Neste texto, o actor conta que durante uma visita à Expo de Lisboa descobriu uma pequena sala despojada, onde não existia qualquer sinal religioso, só meia dúzia de bancos corridos. Foi aí que, "quase como um espanto", sentiu uma sensação que nunca sentira antes: "Uma enorme vontade de rezar não sei a quê ou a quem." Fechou os olhos, apertou as mãos, entrelaçou os dedos e sentiu "uma emoção rara, um silêncio absoluto e tudo o que pensava só podia ser trazido por um Deus que ali deveria viver e que me ia envolvendo no meu corpo amolecido". Mas quando os seus olhos se abriram, aquele seu Deus tinha desaparecido. "Aquela vírgula no tempo foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e que me deu a esperança de que num tempo que seja breve me volte a acontecer. Que esse Deus assim queira", escreveu Solnado e lia-se em cima do seu caixão."Testemunho indelével"Já fora daquela sala, no pátio, o realizador António-Pedro Vasconcelos lembrou o amigo e o texto "extraordinário" que acabara de ler. Um texto sobre um momento de emoção, sobre um encontro com Deus. Um texto de um homem que tinha "a noção da sua infinitude"** e deixou um "testemunho indelével". […]»«[...]A urna com o corpo do actor, falecido na manhã de sábado em Lisboa, esteve na biblioteca do palácio Galveias rodeada por dezenas de coroas de flores e encimada por um texto atribuído ao actor*.No texto, intitulado "Um vazio no tempo", o actor conta uma experiência tida no recinto da Expo98 em que, num espaço vazio, descobriu "o seu Deus".[...]»- Diário de Notícias «[...]Além das dezenas de flores, depostas sobre a urna de Solnado, estava um texto que o próprio redigiu* sobre uma das suas últimas idas à Expo de Lisboa e do seu encontro ‘espiritual’ com um Deus que o actor desconhecia.[...]»- Correio da Manhã [...]A urna com o corpo do actor, falecido na manhã de sábado em Lisboa, encontra-se na biblioteca do palácio rodeada por dezenas de coroas de flores e encimada por um texto atribuído ao actor*.No texto, intitulado "Um vazio no tempo", o actor conta uma experiência tida no recinto da Expo98 em que, num espaço vazio, descobriu "o seu Deus".[...]»- ExpressoO 24 horas - a partir de hoje, com direcção do Nuno Azinheira, "o jornal das estrelas"; antes, na direcção do Pedro Tadeu, era "o jornal do cidadão"; mas deixemo-nos de merdas, que o que ele não passa é de um, entre outros, "jornal do Oliveira" -, vai um pouco mais longe:«O último texto de Solnado - Alexandra Solnado descobriu um texto escrito pelo punho do pai* e ontem resolveu afixá-lo à porta do palácio onde se realizou o velório. Quem o leu emocionou-se. O documento foi depois afixado no caixão de Raul Solnado. Leia-o na íntegra. [...]»O real documento em causa. [Blogue “Às vezes - fim de semana”]* Temos assim, e sempre dito por jornalistas presume-se que competentes, sérios e exigentes,- escrito por Raul Solnado- atribuído ao actor [louve-se a prudência do Diário de Notícias e do Expresso]- que o próprio redigiu- escrito pelo punho [de Raul Solnado]Parte II«Momento de vidaUm dia um amigo contou-me…Entrou num pequeno espaço despojado de coisas. Sentou-se nos raros bancos encontrados ao acaso. As paredes estavam nuas. Não existiam sons e havia poucas cores. Fechou os olhos e esteve. Apenas. Sentiu e sentiu-se, como se alguma coisa transcendente ao tempo e ao espaço o invadisse por um momento. Olhou-se e saiu. Correu para a beira do Tejo para dar um berro de gratidão e a alma sorrir para o Universo.Nesse dia o meu amigo contou-me: “Aquela virgula no tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e me deu a esperança, que num tempo, que seja breve, me volte a acontecer.”»- Blogue "Estes momentos", 13.Set.2006«Momento de vidaHoje sei saber bem porquê o meu corpo conduziu-me…Entrei no meu carro, e sem que dar conta, vi-me numa estrada que não ia dar a minha casa. Seguia até ao seu fim. Não existiam sons e havia poucas cores. Fechei os olhos e ali estive. Apenas. Senti e senti-me, como se alguma coisa transcendente ao tempo e ao espaço me invadisse por um momento. Olhei o horizonte e caí em mim. Subi ao cimo do monte para dar um berro de gratidão e a minha alma sorriu para o Universo.Agora que me lembro disso penso: “Aquela virgula no tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e me deu a esperança, que num tempo, que seja breve, me volte a acontecer…”»- Blogue “Ice on fire 666”, 17.Mar.2007 «UM MINUTO DE SILÊNCIOAquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida e fez com que eu me reencontrasse. - Raul Solnado, Actor»- Blogue "Ângulo recto", 15.Abr.2007 «Nas Sete Artes e mais umaAquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida e fez com que eu me reencontrasse. - Raul Solnado, Actor»- Blogue "Estudar o silêncio", 25.Fev.2009Ou sejaA Alexandra Solnado, que é tu-cá tu-lá com Deus, desperdiçou a oportunidade singular de um ainda mais comovente favor ao povo e ao arrebatamento do António-Pedro Vasconcelos: em vez de se ter posto a 'passar à máquina' e a fazer fotocópias do texto impresso, melhor teria procedido não digo em levar o original para o velório mas em ter fotocopiado o manuscrito que descobriu.Assim, e para lá da fruição - uma coisa mais personalizada, mais íntima, sei lá - da letra do Solnado, sempre ficaríamos a saber se ele escreveu "no meu corpo amolecido" ou "no meu corpo adormecido" [como li hoje em reproduções provavelmente contrafeitas do papel posto junto do caixão], se escreveu "fez com que eu me reencontrasse" ou "que me fez reencontrar", mas sobretudo se escreveu "Aquela vírgula de tempo foi o mais belo minuto", "Aquela vírgula no tempo foi o mais belo minuto", "Aquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto" ou "Aquela vírgula no tempo, foi o mais belo minuto". E assim sucessivamente.__________________________________________________________** Ó Dra. Isabel, o António hífen Pedro não terá dito "finitude"? Olhe que ele é um tipo culto.


Parte IEm prosa inesperadamente pífia, a Isabel Coutinho escreve hoje no Ípsilon/Público:«[…]Ao aproximarem-se do caixão para se despedir, algumas pessoas tocavam na madeira, outras rezavam, outras lamentavam não ter os óculos para ler o texto emoldurado em cima do caixão. Tinha por título Um Vazio no Tempo, não tinha data e foi escrito por Raul Solnado*.Neste texto, o actor conta que durante uma visita à Expo de Lisboa descobriu uma pequena sala despojada, onde não existia qualquer sinal religioso, só meia dúzia de bancos corridos. Foi aí que, "quase como um espanto", sentiu uma sensação que nunca sentira antes: "Uma enorme vontade de rezar não sei a quê ou a quem." Fechou os olhos, apertou as mãos, entrelaçou os dedos e sentiu "uma emoção rara, um silêncio absoluto e tudo o que pensava só podia ser trazido por um Deus que ali deveria viver e que me ia envolvendo no meu corpo amolecido". Mas quando os seus olhos se abriram, aquele seu Deus tinha desaparecido. "Aquela vírgula no tempo foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e que me deu a esperança de que num tempo que seja breve me volte a acontecer. Que esse Deus assim queira", escreveu Solnado e lia-se em cima do seu caixão."Testemunho indelével"Já fora daquela sala, no pátio, o realizador António-Pedro Vasconcelos lembrou o amigo e o texto "extraordinário" que acabara de ler. Um texto sobre um momento de emoção, sobre um encontro com Deus. Um texto de um homem que tinha "a noção da sua infinitude"** e deixou um "testemunho indelével". […]»«[...]A urna com o corpo do actor, falecido na manhã de sábado em Lisboa, esteve na biblioteca do palácio Galveias rodeada por dezenas de coroas de flores e encimada por um texto atribuído ao actor*.No texto, intitulado "Um vazio no tempo", o actor conta uma experiência tida no recinto da Expo98 em que, num espaço vazio, descobriu "o seu Deus".[...]»- Diário de Notícias «[...]Além das dezenas de flores, depostas sobre a urna de Solnado, estava um texto que o próprio redigiu* sobre uma das suas últimas idas à Expo de Lisboa e do seu encontro ‘espiritual’ com um Deus que o actor desconhecia.[...]»- Correio da Manhã [...]A urna com o corpo do actor, falecido na manhã de sábado em Lisboa, encontra-se na biblioteca do palácio rodeada por dezenas de coroas de flores e encimada por um texto atribuído ao actor*.No texto, intitulado "Um vazio no tempo", o actor conta uma experiência tida no recinto da Expo98 em que, num espaço vazio, descobriu "o seu Deus".[...]»- ExpressoO 24 horas - a partir de hoje, com direcção do Nuno Azinheira, "o jornal das estrelas"; antes, na direcção do Pedro Tadeu, era "o jornal do cidadão"; mas deixemo-nos de merdas, que o que ele não passa é de um, entre outros, "jornal do Oliveira" -, vai um pouco mais longe:«O último texto de Solnado - Alexandra Solnado descobriu um texto escrito pelo punho do pai* e ontem resolveu afixá-lo à porta do palácio onde se realizou o velório. Quem o leu emocionou-se. O documento foi depois afixado no caixão de Raul Solnado. Leia-o na íntegra. [...]»O real documento em causa. [Blogue “Às vezes - fim de semana”]* Temos assim, e sempre dito por jornalistas presume-se que competentes, sérios e exigentes,- escrito por Raul Solnado- atribuído ao actor [louve-se a prudência do Diário de Notícias e do Expresso]- que o próprio redigiu- escrito pelo punho [de Raul Solnado]Parte II«Momento de vidaUm dia um amigo contou-me…Entrou num pequeno espaço despojado de coisas. Sentou-se nos raros bancos encontrados ao acaso. As paredes estavam nuas. Não existiam sons e havia poucas cores. Fechou os olhos e esteve. Apenas. Sentiu e sentiu-se, como se alguma coisa transcendente ao tempo e ao espaço o invadisse por um momento. Olhou-se e saiu. Correu para a beira do Tejo para dar um berro de gratidão e a alma sorrir para o Universo.Nesse dia o meu amigo contou-me: “Aquela virgula no tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e me deu a esperança, que num tempo, que seja breve, me volte a acontecer.”»- Blogue "Estes momentos", 13.Set.2006«Momento de vidaHoje sei saber bem porquê o meu corpo conduziu-me…Entrei no meu carro, e sem que dar conta, vi-me numa estrada que não ia dar a minha casa. Seguia até ao seu fim. Não existiam sons e havia poucas cores. Fechei os olhos e ali estive. Apenas. Senti e senti-me, como se alguma coisa transcendente ao tempo e ao espaço me invadisse por um momento. Olhei o horizonte e caí em mim. Subi ao cimo do monte para dar um berro de gratidão e a minha alma sorriu para o Universo.Agora que me lembro disso penso: “Aquela virgula no tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida, que me fez reencontrar, e me deu a esperança, que num tempo, que seja breve, me volte a acontecer…”»- Blogue “Ice on fire 666”, 17.Mar.2007 «UM MINUTO DE SILÊNCIOAquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida e fez com que eu me reencontrasse. - Raul Solnado, Actor»- Blogue "Ângulo recto", 15.Abr.2007 «Nas Sete Artes e mais umaAquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto de silêncio que iluminou a minha vida e fez com que eu me reencontrasse. - Raul Solnado, Actor»- Blogue "Estudar o silêncio", 25.Fev.2009Ou sejaA Alexandra Solnado, que é tu-cá tu-lá com Deus, desperdiçou a oportunidade singular de um ainda mais comovente favor ao povo e ao arrebatamento do António-Pedro Vasconcelos: em vez de se ter posto a 'passar à máquina' e a fazer fotocópias do texto impresso, melhor teria procedido não digo em levar o original para o velório mas em ter fotocopiado o manuscrito que descobriu.Assim, e para lá da fruição - uma coisa mais personalizada, mais íntima, sei lá - da letra do Solnado, sempre ficaríamos a saber se ele escreveu "no meu corpo amolecido" ou "no meu corpo adormecido" [como li hoje em reproduções provavelmente contrafeitas do papel posto junto do caixão], se escreveu "fez com que eu me reencontrasse" ou "que me fez reencontrar", mas sobretudo se escreveu "Aquela vírgula de tempo foi o mais belo minuto", "Aquela vírgula no tempo foi o mais belo minuto", "Aquela vírgula de tempo, foi o mais belo minuto" ou "Aquela vírgula no tempo, foi o mais belo minuto". E assim sucessivamente.__________________________________________________________** Ó Dra. Isabel, o António hífen Pedro não terá dito "finitude"? Olhe que ele é um tipo culto.

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