mesa do café: "The return of Suricata"

05-10-2009
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Após um longo período de hibernação e já que chegou a Primavera decidi retornar a esta mesa.O Inverno foi longo e duro, com muitas solicitações quer da comunidade quer da cria, com muitas alturas de desespero e outras de bonanza, mas como qualquer suricata que se preze, lá se foram ultrapassando!Aposto que estavam com saudades minhas?!Gostaria de vos lançar um repto:A lei da Paridade.Como sabem, foi ontem discutida esta lei na AR.Na minha opinião esta lei é um mal necessário!Deveria ser natural o acesso de mulheres aos cargos de chefia e aos cargos políticos com base na sua competência, numa sociedade com igualdade de direitos.Eu pessoalmente, nunca senti qualquer tipo de discriminação, mas bem sei que juntamente com muitas outras mulheres, constituímos a excepção e não a regra.Por isso esta lei, de alguma forma, força a que as mulheres estejam mais representadas. Temos que forçar um pouco a evolução natural, pois de contrário ela só ocorrerá daqui a muitos anos. A inércia e a cultura geracional ainda são a força motriz para que esta situação não se altere!Deixo-vos alguns depoimentos interessantes de gente da política e da sociedade.Opinem sobre este assunto! Digam de vossa justiça! Pensem nisto!Público de 30/0/06São mulheres e deputadas. Todas afirmam que, pessoalmente, não sentiram discriminação, mas não duvidam que ela exista no espaço político e defendem uma maior presença de mulheres. Porém, divergem no meio para atingir o fim. Por Sofia BrancoAna Catarina Mendes (PS)"Pessoalmente, não senti. O que não significa que não exista", responde Ana Catarina Mendes, que entrou no Parlamento em 1998 e que actualmente é vice-presidente da bancada socialista. "Ainda há uma dificuldade muito grande para as mulheres participarem na política, designadamente na tomada de decisões", avalia. Realçando que a sua "geração" já beneficiou das "conquistas de Abril", entre as quais está o princípio da igualdade entre mulheres e homens, reconhece que "ainda há um trabalho a fazer, porque a plena igualdade ainda não está atingida". Mas sublinha que a discriminação não se mantém só na política, subsistindo noutras áreas.Ana Drago (BE)Deputada durante um ano e meio, não consecutivo, afirma nunca ter sido discriminada por ser mulher e fazer política: "O BE fez sempre a aposta não só de trazer mulheres para as listas como de colocá-las em lugares de visibilidade." Mas, afirma a vice-presidente da bancada do BE, outra coisa é a "reflexão política" sobre a paridade: "Pensar que as mentalidades mudam por si próprias é o maior erro que se pode fazer." Em geral, as deputadas, diz, "falam menos e tendem a ficar com confrontos políticos menos importantes", "estão mais próximas de certas matérias, ligadas às áreas sociais", o que não é negativo, mas "não é valorizado". Por outro lado, sublinha, a necessidade que as mulheres têm de "mostrar que são competentes" leva-as a irem "mais ao fundo das matérias", a terem um "discurso mais estruturado e com mais substância política", menos retórico que o dos homens.Heloísa Apolónia (Os Verdes)Na Assembleia da República desde Outubro de 1995, com algumas interrupções, Heloísa Apolónia diz que nunca sentiu "nenhuma forma de discriminação por ser mulher" e exercer a actividade política, mas, como "há certo tipo de acompanhamento familiar que continua a caber mais às mulheres", tem uma história para contar. Em 1998, estava no oitavo mês de gravidez, descobriu que as deputadas não tinham direito a licença de maternidade. As que tinham filhos, ou tinham optado por faltar e invocar doença, ou tinham suspendido o mandato, sem usufruírem de quaisquer direitos por maternidade. Nessa altura, descobriu também que aquelas que optavam pela segunda hipótese "não voltavam mais", pois, entretanto, eram substituídas, "geralmente por um homem". Da gravidez de Heloísa Apolónia nasceu o projecto de lei dos Verdes que introduziu o regime de licenças de maternidade e paternidade na AR. Foi aprovado por unanimidade.Luísa Mesquita (PCP)"Discriminação efectiva nunca senti, mas não tenho dúvidas de que ela existe", começa por dizer a deputada comunista, no Parlamento desde 1995. Nesse ano, quando liderava uma lista da CDU, ouviu um jornalista perguntar-lhe "como era possível, num distrito como o de Santarém, que uma mulher fosse cabeça-de-lista por um partido". Já quando foi deputada, entre 1983 e 85, reparou que não havia licenças de maternidade no Parlamento. Nessa altura, afastou-se porque "não tinha condições para continuar". "Fui forçada a dizer que não" à política. Contra uma mudança "por decreto-lei ou produção legislativa", diz não acreditar em "soluções únicas" e que a paridade depende de "um conjunto de vectores", entre os quais o de as próprias mulheres começarem a considerar importante a presença de mais mulheres nos espaços políticos.Regina Bastos (PSD)Nunca se sentiu discriminada e acha que "as mulheres, quando querem estar na política e progredir na carreira, têm toda a possibilidade de o fazer", pois "não há qualquer obstáculo". Deputada desde as últimas legislativas, sublinha, porém, que, apesar de não existirem "constrangimentos legais", há "constrangimentos fácticos" que afastam as mulheres da política. Sobre o número reduzido de deputadas na bancada do PSD, afirma: "Tenho pena [que não haja mais mulheres]. Estávamos no bom caminho. É uma regressão lamentável." O projecto de lei da paridade do PS, diz a ex-eurodeputada, é "uma medida politicamente correcta", que "não dignifica a mulher" e "não resolve a ausência de mulheres na tomada de decisões, a diferenciação salarial e laboral, a desigualdade em casa". "Os partidos, tudo bem, agora o Estado, um órgão de soberania, estabelecer por via administrativa uma discriminação?", critica.Teresa Caeiro (CDS)"É um facto que a actividade política ainda é muito masculina", reconhece a deputada do CDS, afirmando que o facto de a actividade política ter sido "tomada de assalto" por homens resultou em determinadas "regras", nomeadamente "falta de pontualidade, reuniões pela madrugada dentro, deslocações permanentes pelo país", "regras" essas que levam as mulheres a desinteressar-se "cada vez mais pela política". Eleita deputada nas últimas legislativas, ex-secretária de Estado nos XV e XVI Governos, identifica, actualmente, "dois tipos de obstáculos de facto" à participação das mulheres. "Em primeiro lugar, a sociedade está organizada de uma forma que afasta a mulher típica portuguesa, casada e com filhos, do exercício da actividade política". Além disso, "ainda existem muitas ideias preconcebidas quanto ao papel da mulher na política". Concretamente: "Os assuntos sociais são "para as mulheres", enquanto as finanças, a administração interna ou obras públicas são "para homens"." Para contrariar esta situação, o "único critério é a competência e o empenho".O pecado de SócratesAs mulheres chegam em maior número à política, mas são poucas as que atingem cargos de poder, normalmente cargos por nomeação. Exemplo disso é o Governo socialista de José Sócrates, com duas mulheres independentes, num total de 15 pastas. Helena Terra reconhece que esta é uma crítica que tem vindo a ser feita e que é "indesmentível porque é um facto". Na altura da composição do Governo, foram várias as críticas ao primeiro-ministro. Ana Catarina Mendes admite que a escolha de José Sócrates causou algum desconforto dentro do PS. "Todos nós sentimos com alguma pena um governo socialista com apenas duas mulheres. Até porque os estatutos do PS foram pioneiros a consagrar 33,3 por cento de mulheres nas listas." Teresa Portugal ficou surpreendida ao ver um governo com duas ministras: "Achei que não estava de acordo com as posições do engenheiro Sócrates, se não fosse a exigência dele não sei se as listas teriam tido tantas mulheres." Maria Antónia Almeida Santos afirma que não sentiu, da parte do primeiro-ministro, que as mulheres tivessem sido afastadas de propósito da composição do Governo. Maria José Gamboa, deputada pela primeira vez, considera que "esta caminhada [da paridade] começou há pouco tempo", mas tem a certeza de que, no futuro, mais mulheres vão ocupar pastas ministeriais, aliás, "esse só pode ser o caminho da coerência". Isabel Santos é outra das deputadas que entraram na actual legislatura e adverte: "Apesar de o governo de Durão Barroso ter mais mulheres, remeteu as questões da igualdade para a família." Telma Madaleno, também recém-chegada à Assembleia, reconhece que ainda "há tradição de ver homens em vez de mulheres em lugares de topo". Manuela de Melo, ex-jornalista da RTP e vice-presidente da bancada parlamentar, considera que foi de "grande coragem" o exemplo do governo paritário de Zapatero em Espanha, e espera que sirva de bom exemplo.Igualdade e discriminaçãopor José Manuel FernandesSe se pudesse mudar o que é uma sociedade, o que é a sua cultura, o que é o seu "capital social", apenas escrevendo leis, era tudo mais fácil. Só que o mundo não funciona assim nem se muda assim...De novo a "paridade". E de novo porque a democracia ainda não "influenciou, decisivamente, a representação das mulheres no "mundo político"". Isto mesmo sabendo que entre 1976 e 2006 a percentagem de mulheres deputadas cresceu de seis para 26 por cento. Dir-se-á: é pouco. Por certo, mas se a representação feminina foi aumentando de eleição para eleição, por que motivo se quer impor por lei o que tem sucedido com naturalidade? Por que se quer acelerar na política o protagonismo crescente, e saudável, que as mulheres têm vindo a assumir noutras áreas? E, para mais, de uma forma que porventura ofende a letra da Constituição? Só porque Sócrates se recusa "a dar tempo ao tempo", como o próprio disse? Revisitemos pois alguns argumentos.Comecemos pelas dúvidas constitucionais, quase ausentes do debate (excepto para o sempre atento PCP), já que a lei, no seu preâmbulo, assume que pretende a "efectivação concreta dos direitos das mulheres", o que passa por regras que impõem como critério de avaliação de elegibilidade de um político no contexto de uma lista eleitoral o sexo a que pertence. Este tipo de intenção legislativa tem um nome: chama-se "discriminação positiva". Sendo assim, e apesar de a lei tentar contornar a inconstitucionalidade material à luz do artigo 109.º da Constituição - o que estabelece "a não discriminação em função do sexo no acesso a cargos públicos" -, ao referir-se não a uma representação mínima de um terço de mulheres, mas "de cada um dos sexos", a sua "exposição de motivos" explica que é necessário promover a eleição de mais mulheres, o que só pode ser obtido colocando barreiras legais à eleição de tantos homens. Por outras palavras: a "não discriminação" imposta pela Constituição é violada pois não implica, antes impede, que em nome da promoção da "igualdade no exercício de direitos cívicos e políticos" se introduza um factor objectivo de desigualdade, para mais sem limite temporal. Ou seja, para promover os direitos de um grupo, mesmo que este represente metade da população, introduzem-se regras que violam direitos individuais (sempre os mais sagrados) e introduzem-se limitações à liberdade de os partidos se organizarem como entenderem. A segunda dúvida constitucional deriva de a lei, ao impor regras para a formação de listas eleitorais, chegando ao detalhe de estabelecer como devem ser ordenados os candidatos, dever ser considerada uma lei eleitoral e, por isso, requerer a aprovação por uma maioria qualificada de dois terços dos deputados. Com efeito, que outra qualidade pode ter uma lei que, no seu Artigo 3.º, estabelece como pena para o não cumprimento das regras que impõe a rejeição das listas, assim modificando as regras eleitorais em vigor? Ora como o PS parece querer vê-la aprovada por maioria simples...do que é melhor em vez de permitir que funcionem os mecanismos que, com os passar dos anos, farão cair com naturalidade as barreiras que ainda impedem uma maior participação das mulheres na política.Um desses mecanismos devia ser o próprio jogo democrático: os partidos que praticam a paridade (fazendo-o no quadro da liberdade que assiste a uma associação voluntária de cidadãos e não por imposição exterior) só podem acreditar que isso é um trunfo eleitoral. Mas se é, então deve ser praticada de forma consequente, pelo que se estranha que o PS, tendo conseguido levar para a Assembleia uma percentagem elevada de mulheres, ao mesmo tempo forme um Governo onde estas estão menos representadas do que nos anteriores executivos (duas mulheres numa equipa de 16 ministros, contra quatro em 16 no Governo de Durão Barroso e três em 18 no de Santana Lopes; pior só o último de Guterres, que tinha apenas uma mulher entre 17 ministros).Por outro lado, se é óbvio que a qualidade de muito do actual pessoal político não permite defender a tese de que as mulheres vão conquistar os seus lugares sem terem mérito para tal, a lei não ajuda a distinguir o trigo do joio. É indiscutível que muitas mulheres teriam mais mérito e mais qualidades para estar na Assembleia (assim o desejando) do que muitos dos seus actuais membros, mas é perverso para elas próprias deixarem que se crie uma situação em que haverá sempre a dúvida sobre se foram escolhidas pelo mérito ou "pela quota". Se, como se reconhece na própria introdução à lei, estamos apenas perante um problema de "velocidade" - "a velocidade a que o universo político reflecte as transformações pelas quais tem passado a condição feminina portuguesa é inferior à velocidade verificada noutros contextos sociais, nomeadamente no mundo laboral e universitário" - e não perante reais barreiras discriminatórias, por que se insiste então em apressar a história por via de uma diferenciação essa sim discriminatória e que atropela princípios formais que são centrais numa democracia?


Após um longo período de hibernação e já que chegou a Primavera decidi retornar a esta mesa.O Inverno foi longo e duro, com muitas solicitações quer da comunidade quer da cria, com muitas alturas de desespero e outras de bonanza, mas como qualquer suricata que se preze, lá se foram ultrapassando!Aposto que estavam com saudades minhas?!Gostaria de vos lançar um repto:A lei da Paridade.Como sabem, foi ontem discutida esta lei na AR.Na minha opinião esta lei é um mal necessário!Deveria ser natural o acesso de mulheres aos cargos de chefia e aos cargos políticos com base na sua competência, numa sociedade com igualdade de direitos.Eu pessoalmente, nunca senti qualquer tipo de discriminação, mas bem sei que juntamente com muitas outras mulheres, constituímos a excepção e não a regra.Por isso esta lei, de alguma forma, força a que as mulheres estejam mais representadas. Temos que forçar um pouco a evolução natural, pois de contrário ela só ocorrerá daqui a muitos anos. A inércia e a cultura geracional ainda são a força motriz para que esta situação não se altere!Deixo-vos alguns depoimentos interessantes de gente da política e da sociedade.Opinem sobre este assunto! Digam de vossa justiça! Pensem nisto!Público de 30/0/06São mulheres e deputadas. Todas afirmam que, pessoalmente, não sentiram discriminação, mas não duvidam que ela exista no espaço político e defendem uma maior presença de mulheres. Porém, divergem no meio para atingir o fim. Por Sofia BrancoAna Catarina Mendes (PS)"Pessoalmente, não senti. O que não significa que não exista", responde Ana Catarina Mendes, que entrou no Parlamento em 1998 e que actualmente é vice-presidente da bancada socialista. "Ainda há uma dificuldade muito grande para as mulheres participarem na política, designadamente na tomada de decisões", avalia. Realçando que a sua "geração" já beneficiou das "conquistas de Abril", entre as quais está o princípio da igualdade entre mulheres e homens, reconhece que "ainda há um trabalho a fazer, porque a plena igualdade ainda não está atingida". Mas sublinha que a discriminação não se mantém só na política, subsistindo noutras áreas.Ana Drago (BE)Deputada durante um ano e meio, não consecutivo, afirma nunca ter sido discriminada por ser mulher e fazer política: "O BE fez sempre a aposta não só de trazer mulheres para as listas como de colocá-las em lugares de visibilidade." Mas, afirma a vice-presidente da bancada do BE, outra coisa é a "reflexão política" sobre a paridade: "Pensar que as mentalidades mudam por si próprias é o maior erro que se pode fazer." Em geral, as deputadas, diz, "falam menos e tendem a ficar com confrontos políticos menos importantes", "estão mais próximas de certas matérias, ligadas às áreas sociais", o que não é negativo, mas "não é valorizado". Por outro lado, sublinha, a necessidade que as mulheres têm de "mostrar que são competentes" leva-as a irem "mais ao fundo das matérias", a terem um "discurso mais estruturado e com mais substância política", menos retórico que o dos homens.Heloísa Apolónia (Os Verdes)Na Assembleia da República desde Outubro de 1995, com algumas interrupções, Heloísa Apolónia diz que nunca sentiu "nenhuma forma de discriminação por ser mulher" e exercer a actividade política, mas, como "há certo tipo de acompanhamento familiar que continua a caber mais às mulheres", tem uma história para contar. Em 1998, estava no oitavo mês de gravidez, descobriu que as deputadas não tinham direito a licença de maternidade. As que tinham filhos, ou tinham optado por faltar e invocar doença, ou tinham suspendido o mandato, sem usufruírem de quaisquer direitos por maternidade. Nessa altura, descobriu também que aquelas que optavam pela segunda hipótese "não voltavam mais", pois, entretanto, eram substituídas, "geralmente por um homem". Da gravidez de Heloísa Apolónia nasceu o projecto de lei dos Verdes que introduziu o regime de licenças de maternidade e paternidade na AR. Foi aprovado por unanimidade.Luísa Mesquita (PCP)"Discriminação efectiva nunca senti, mas não tenho dúvidas de que ela existe", começa por dizer a deputada comunista, no Parlamento desde 1995. Nesse ano, quando liderava uma lista da CDU, ouviu um jornalista perguntar-lhe "como era possível, num distrito como o de Santarém, que uma mulher fosse cabeça-de-lista por um partido". Já quando foi deputada, entre 1983 e 85, reparou que não havia licenças de maternidade no Parlamento. Nessa altura, afastou-se porque "não tinha condições para continuar". "Fui forçada a dizer que não" à política. Contra uma mudança "por decreto-lei ou produção legislativa", diz não acreditar em "soluções únicas" e que a paridade depende de "um conjunto de vectores", entre os quais o de as próprias mulheres começarem a considerar importante a presença de mais mulheres nos espaços políticos.Regina Bastos (PSD)Nunca se sentiu discriminada e acha que "as mulheres, quando querem estar na política e progredir na carreira, têm toda a possibilidade de o fazer", pois "não há qualquer obstáculo". Deputada desde as últimas legislativas, sublinha, porém, que, apesar de não existirem "constrangimentos legais", há "constrangimentos fácticos" que afastam as mulheres da política. Sobre o número reduzido de deputadas na bancada do PSD, afirma: "Tenho pena [que não haja mais mulheres]. Estávamos no bom caminho. É uma regressão lamentável." O projecto de lei da paridade do PS, diz a ex-eurodeputada, é "uma medida politicamente correcta", que "não dignifica a mulher" e "não resolve a ausência de mulheres na tomada de decisões, a diferenciação salarial e laboral, a desigualdade em casa". "Os partidos, tudo bem, agora o Estado, um órgão de soberania, estabelecer por via administrativa uma discriminação?", critica.Teresa Caeiro (CDS)"É um facto que a actividade política ainda é muito masculina", reconhece a deputada do CDS, afirmando que o facto de a actividade política ter sido "tomada de assalto" por homens resultou em determinadas "regras", nomeadamente "falta de pontualidade, reuniões pela madrugada dentro, deslocações permanentes pelo país", "regras" essas que levam as mulheres a desinteressar-se "cada vez mais pela política". Eleita deputada nas últimas legislativas, ex-secretária de Estado nos XV e XVI Governos, identifica, actualmente, "dois tipos de obstáculos de facto" à participação das mulheres. "Em primeiro lugar, a sociedade está organizada de uma forma que afasta a mulher típica portuguesa, casada e com filhos, do exercício da actividade política". Além disso, "ainda existem muitas ideias preconcebidas quanto ao papel da mulher na política". Concretamente: "Os assuntos sociais são "para as mulheres", enquanto as finanças, a administração interna ou obras públicas são "para homens"." Para contrariar esta situação, o "único critério é a competência e o empenho".O pecado de SócratesAs mulheres chegam em maior número à política, mas são poucas as que atingem cargos de poder, normalmente cargos por nomeação. Exemplo disso é o Governo socialista de José Sócrates, com duas mulheres independentes, num total de 15 pastas. Helena Terra reconhece que esta é uma crítica que tem vindo a ser feita e que é "indesmentível porque é um facto". Na altura da composição do Governo, foram várias as críticas ao primeiro-ministro. Ana Catarina Mendes admite que a escolha de José Sócrates causou algum desconforto dentro do PS. "Todos nós sentimos com alguma pena um governo socialista com apenas duas mulheres. Até porque os estatutos do PS foram pioneiros a consagrar 33,3 por cento de mulheres nas listas." Teresa Portugal ficou surpreendida ao ver um governo com duas ministras: "Achei que não estava de acordo com as posições do engenheiro Sócrates, se não fosse a exigência dele não sei se as listas teriam tido tantas mulheres." Maria Antónia Almeida Santos afirma que não sentiu, da parte do primeiro-ministro, que as mulheres tivessem sido afastadas de propósito da composição do Governo. Maria José Gamboa, deputada pela primeira vez, considera que "esta caminhada [da paridade] começou há pouco tempo", mas tem a certeza de que, no futuro, mais mulheres vão ocupar pastas ministeriais, aliás, "esse só pode ser o caminho da coerência". Isabel Santos é outra das deputadas que entraram na actual legislatura e adverte: "Apesar de o governo de Durão Barroso ter mais mulheres, remeteu as questões da igualdade para a família." Telma Madaleno, também recém-chegada à Assembleia, reconhece que ainda "há tradição de ver homens em vez de mulheres em lugares de topo". Manuela de Melo, ex-jornalista da RTP e vice-presidente da bancada parlamentar, considera que foi de "grande coragem" o exemplo do governo paritário de Zapatero em Espanha, e espera que sirva de bom exemplo.Igualdade e discriminaçãopor José Manuel FernandesSe se pudesse mudar o que é uma sociedade, o que é a sua cultura, o que é o seu "capital social", apenas escrevendo leis, era tudo mais fácil. Só que o mundo não funciona assim nem se muda assim...De novo a "paridade". E de novo porque a democracia ainda não "influenciou, decisivamente, a representação das mulheres no "mundo político"". Isto mesmo sabendo que entre 1976 e 2006 a percentagem de mulheres deputadas cresceu de seis para 26 por cento. Dir-se-á: é pouco. Por certo, mas se a representação feminina foi aumentando de eleição para eleição, por que motivo se quer impor por lei o que tem sucedido com naturalidade? Por que se quer acelerar na política o protagonismo crescente, e saudável, que as mulheres têm vindo a assumir noutras áreas? E, para mais, de uma forma que porventura ofende a letra da Constituição? Só porque Sócrates se recusa "a dar tempo ao tempo", como o próprio disse? Revisitemos pois alguns argumentos.Comecemos pelas dúvidas constitucionais, quase ausentes do debate (excepto para o sempre atento PCP), já que a lei, no seu preâmbulo, assume que pretende a "efectivação concreta dos direitos das mulheres", o que passa por regras que impõem como critério de avaliação de elegibilidade de um político no contexto de uma lista eleitoral o sexo a que pertence. Este tipo de intenção legislativa tem um nome: chama-se "discriminação positiva". Sendo assim, e apesar de a lei tentar contornar a inconstitucionalidade material à luz do artigo 109.º da Constituição - o que estabelece "a não discriminação em função do sexo no acesso a cargos públicos" -, ao referir-se não a uma representação mínima de um terço de mulheres, mas "de cada um dos sexos", a sua "exposição de motivos" explica que é necessário promover a eleição de mais mulheres, o que só pode ser obtido colocando barreiras legais à eleição de tantos homens. Por outras palavras: a "não discriminação" imposta pela Constituição é violada pois não implica, antes impede, que em nome da promoção da "igualdade no exercício de direitos cívicos e políticos" se introduza um factor objectivo de desigualdade, para mais sem limite temporal. Ou seja, para promover os direitos de um grupo, mesmo que este represente metade da população, introduzem-se regras que violam direitos individuais (sempre os mais sagrados) e introduzem-se limitações à liberdade de os partidos se organizarem como entenderem. A segunda dúvida constitucional deriva de a lei, ao impor regras para a formação de listas eleitorais, chegando ao detalhe de estabelecer como devem ser ordenados os candidatos, dever ser considerada uma lei eleitoral e, por isso, requerer a aprovação por uma maioria qualificada de dois terços dos deputados. Com efeito, que outra qualidade pode ter uma lei que, no seu Artigo 3.º, estabelece como pena para o não cumprimento das regras que impõe a rejeição das listas, assim modificando as regras eleitorais em vigor? Ora como o PS parece querer vê-la aprovada por maioria simples...do que é melhor em vez de permitir que funcionem os mecanismos que, com os passar dos anos, farão cair com naturalidade as barreiras que ainda impedem uma maior participação das mulheres na política.Um desses mecanismos devia ser o próprio jogo democrático: os partidos que praticam a paridade (fazendo-o no quadro da liberdade que assiste a uma associação voluntária de cidadãos e não por imposição exterior) só podem acreditar que isso é um trunfo eleitoral. Mas se é, então deve ser praticada de forma consequente, pelo que se estranha que o PS, tendo conseguido levar para a Assembleia uma percentagem elevada de mulheres, ao mesmo tempo forme um Governo onde estas estão menos representadas do que nos anteriores executivos (duas mulheres numa equipa de 16 ministros, contra quatro em 16 no Governo de Durão Barroso e três em 18 no de Santana Lopes; pior só o último de Guterres, que tinha apenas uma mulher entre 17 ministros).Por outro lado, se é óbvio que a qualidade de muito do actual pessoal político não permite defender a tese de que as mulheres vão conquistar os seus lugares sem terem mérito para tal, a lei não ajuda a distinguir o trigo do joio. É indiscutível que muitas mulheres teriam mais mérito e mais qualidades para estar na Assembleia (assim o desejando) do que muitos dos seus actuais membros, mas é perverso para elas próprias deixarem que se crie uma situação em que haverá sempre a dúvida sobre se foram escolhidas pelo mérito ou "pela quota". Se, como se reconhece na própria introdução à lei, estamos apenas perante um problema de "velocidade" - "a velocidade a que o universo político reflecte as transformações pelas quais tem passado a condição feminina portuguesa é inferior à velocidade verificada noutros contextos sociais, nomeadamente no mundo laboral e universitário" - e não perante reais barreiras discriminatórias, por que se insiste então em apressar a história por via de uma diferenciação essa sim discriminatória e que atropela princípios formais que são centrais numa democracia?

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