Sociedade de Debates: Retórica e Violência

02-10-2009
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Onde acaba o confronto de ideias e começa o confronto de personalidades? E onde acaba este e começa o puro insulto? Quantas vezes ouvimos dizer que no parlamento "eles" se insultam uns aos outros e quantas vezes vimos tal acontecer?Antes de mais: Eu acho que há um tremendo preconceito relativamente à violência. A violência para quem não resolve nada tem tido muitos resultados, não acham?Desde o pátio da escola, às guerras mundiais, eu acho que a violência até se tem safado bem. Claro que não digo que ela seja capaz de resolver tudo, ou que a forma como ela resolve as coisas seja a melhor ou a mais eficiente, mas é provavelmente a mais eficaz. A própria ordem jurídica reconhece o valor da violência, especialmente quando se trata de defender "o lícito perante o ilícito", mas tanto a legítima defesa, como o estado de necessidade, como a acção directa não passam, muitas vezes, de causas de legitimação da violência. E o mesmo se passa na ordem jurídica internacional como o uso da força.Gandhi pode ter conseguido o que queria pela resistência pacífica, mas muitos outros líderes conseguiram exactamente o mesmo com recurso à violência. Não digo que seja melhor recorrer a ela, mas não se pode dizer que não traga resultados.Da mesma forma posso relatar-vos da minha experiência pessoal que a violência pode ser um bom remédio para evitar ser assaltado. Mas que outros métodos, como falar com o assaltantes até eles se fartarem, também funcionam.Passando a outro ponto. Em geral as pessoas tendem a confundir as coisas e a dizer que toda a agressividade no confronto é insulto. Que as pessoas defenderem as suas ideias de forma aguerrida as faz perder a razão. (Quantas vezes já ouviram/disseram isto e até pensaram que estava certo?)É normal haver agressividade no discurso. É normal as palavras serem duras, as frases ríspidas, as caras fechadas, os gestos brutais, quando se estão em causa divergências de posição; anormal seria que alguém estivesse a lutar com as palavras sem ser violento, se estevesse a tentar convencer sem tentar vencer."A pena é melhor que a espada", "o voto vale mais que a bala", mas não é por ser menos violento, antes porque tem menos de aleatório e mais de racional. Porque é mais provável que ganhe quem tem razão num debate que num duelo. Não é que quem ganha o debate tenha sempre razão, mas quem tem a força dos argumentos do seu lado tem vantagem comparável à de quem leva consigo a força das armas no duelo. No debate não se chega à verdade, mas à verosimilhança (o que, diga-se, já não é nada mau).Podem pensar que entrei em contradição, ao começar por elogiar a violência e acabar por elogiar o debate, mas isso é só porque existe um outro preconceito, decorrente do primeiro e que por isso mal se destrinça dele, relativamente ao debate. O debate é violento.O debate não é uma simples "troca de ideias" em que "eu fico com a minha e tuas ficas com a tua" para isso eu escrevia a minha opinião tu escrevias a tua, trocavamos de textos e enterrava-se o assunto. O debate não existe para que os oradores saibam a opinião um do outro, para isso em 90% dos casos não era preciso, porque, regra geral, eles já sabem a opinião um do outro. O debate é violento porque exige confronto, exige que as ideias se justaponham, se atropelem, se acotovelem, que façam moche, que "sim"," mas não"," e daí talvez", "ainda assim", "embora", "apesar de", "contudo", "e no entanto talvez não", "não é bem assim", "mas por vezes", "quase sempre", "nem sempre" .... e elas [as ideias, claro] andem ali à pancada, esperando que por entre todos aqueles socos e pontapés haja um, basta um, que acerte em cheio na cabeça de alguém que a adopte e faça daquela ideia sua.É óbvio que a coisa tem de ser violenta. Só não o é para quem pensa que as palavras são só palavras, que as ideias são só ideias e que os sonhos são só sonhos.Pobres coitados sem palavras, nem ideias, nem sonhos."Primeira regra da socidade de debates: não se fala da sociedade de debates"


Onde acaba o confronto de ideias e começa o confronto de personalidades? E onde acaba este e começa o puro insulto? Quantas vezes ouvimos dizer que no parlamento "eles" se insultam uns aos outros e quantas vezes vimos tal acontecer?Antes de mais: Eu acho que há um tremendo preconceito relativamente à violência. A violência para quem não resolve nada tem tido muitos resultados, não acham?Desde o pátio da escola, às guerras mundiais, eu acho que a violência até se tem safado bem. Claro que não digo que ela seja capaz de resolver tudo, ou que a forma como ela resolve as coisas seja a melhor ou a mais eficiente, mas é provavelmente a mais eficaz. A própria ordem jurídica reconhece o valor da violência, especialmente quando se trata de defender "o lícito perante o ilícito", mas tanto a legítima defesa, como o estado de necessidade, como a acção directa não passam, muitas vezes, de causas de legitimação da violência. E o mesmo se passa na ordem jurídica internacional como o uso da força.Gandhi pode ter conseguido o que queria pela resistência pacífica, mas muitos outros líderes conseguiram exactamente o mesmo com recurso à violência. Não digo que seja melhor recorrer a ela, mas não se pode dizer que não traga resultados.Da mesma forma posso relatar-vos da minha experiência pessoal que a violência pode ser um bom remédio para evitar ser assaltado. Mas que outros métodos, como falar com o assaltantes até eles se fartarem, também funcionam.Passando a outro ponto. Em geral as pessoas tendem a confundir as coisas e a dizer que toda a agressividade no confronto é insulto. Que as pessoas defenderem as suas ideias de forma aguerrida as faz perder a razão. (Quantas vezes já ouviram/disseram isto e até pensaram que estava certo?)É normal haver agressividade no discurso. É normal as palavras serem duras, as frases ríspidas, as caras fechadas, os gestos brutais, quando se estão em causa divergências de posição; anormal seria que alguém estivesse a lutar com as palavras sem ser violento, se estevesse a tentar convencer sem tentar vencer."A pena é melhor que a espada", "o voto vale mais que a bala", mas não é por ser menos violento, antes porque tem menos de aleatório e mais de racional. Porque é mais provável que ganhe quem tem razão num debate que num duelo. Não é que quem ganha o debate tenha sempre razão, mas quem tem a força dos argumentos do seu lado tem vantagem comparável à de quem leva consigo a força das armas no duelo. No debate não se chega à verdade, mas à verosimilhança (o que, diga-se, já não é nada mau).Podem pensar que entrei em contradição, ao começar por elogiar a violência e acabar por elogiar o debate, mas isso é só porque existe um outro preconceito, decorrente do primeiro e que por isso mal se destrinça dele, relativamente ao debate. O debate é violento.O debate não é uma simples "troca de ideias" em que "eu fico com a minha e tuas ficas com a tua" para isso eu escrevia a minha opinião tu escrevias a tua, trocavamos de textos e enterrava-se o assunto. O debate não existe para que os oradores saibam a opinião um do outro, para isso em 90% dos casos não era preciso, porque, regra geral, eles já sabem a opinião um do outro. O debate é violento porque exige confronto, exige que as ideias se justaponham, se atropelem, se acotovelem, que façam moche, que "sim"," mas não"," e daí talvez", "ainda assim", "embora", "apesar de", "contudo", "e no entanto talvez não", "não é bem assim", "mas por vezes", "quase sempre", "nem sempre" .... e elas [as ideias, claro] andem ali à pancada, esperando que por entre todos aqueles socos e pontapés haja um, basta um, que acerte em cheio na cabeça de alguém que a adopte e faça daquela ideia sua.É óbvio que a coisa tem de ser violenta. Só não o é para quem pensa que as palavras são só palavras, que as ideias são só ideias e que os sonhos são só sonhos.Pobres coitados sem palavras, nem ideias, nem sonhos."Primeira regra da socidade de debates: não se fala da sociedade de debates"

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