O BAR DO OSSIAN: AUDACES FORTUNA JUVAT – River Gurara

02-10-2009
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Está um temporal horrível! O céu adivinha-se cor do chumbo, as gotas de água parecem do tamanho de tangerinas, o vento uiva nas pás do helicóptero. Tem sido uma noite agitada, meia-dúzia de barcos estão em dificuldade de Norte a Sul do país, o mais grave é o River Gurara, um cargueiro nigeriano de 175 metros, que embateu no Cabo Espichel. O sol está preste a nascer e temos de fazer o briefing e partir para lá.A situação parece ser caótica, o mar está feito num cão, o vento é fortíssimo e o barco partiu-se ao meio com a força do mar. Olho para o calendário – 26 de Fevereiro de 1989. Este dia ainda vai ser lembrado, não sei se pelo bem se pelo mal ou se por ambos, mas tenho a certeza que vai ser uma data que será recordada por mais de 20 anos.Dirijo-me para o helicóptero, o velho Puma não se faz rogado e levanta no meio daquele temporal sem um queixume. Olho para o piloto, a minha vida depende dele, já estou habituado, mas hoje o tempo está assustador, ele está tranquilo, seguro, transmite-me essa sensação, sinto-me calmo e tranquilo.Levantamos e partimos para o Cabo Espichel. A viagem foi horrível, das piores da minha vida.– Agora sei como se sente a roupa dentro da máquina – graceja o operador do guincho.Os nervos aumentam à medida que nos aproximamos, vislumbro um destroço com 4 homens agarrados, pobres diabos, estão a passar o pior momento da vida deles. Preparo o equipamento e abro a porta à espera de ordem para descer.Chegou o momento, os nervos desaparecem, lanço-me no vazio preso por um fino cabo de aço e desço na direcção daqueles infelizes. Uma figura sobressai, parece ser o capitão, tenta manter os outros equilibrados e juntos. Continuo a descer, sou sacudido violentamente pelo vento. É impossível alcançá-los, uma, outra e mais outra tentativa falhada e lá embaixo o capitão mantém os homens agarrados. O altruísmo dele deixa-me rendido, num acto impensado solto o cabo e lanço-me ao mar, a manobra resulta pois livre do peso, o cabo alcança o capitão que o agarra. Está salvo! Consegui!O homem atira-se ao mar agarrado ao cabo e vem ter comigo.– Você é doido! Tome lá o seu cabo! Salve-se você, se alguém tem de morrer aqui somos nós.– Eu tenho um fato e equipamento, posso sobreviver mais tempo que vocês. Além disso estou treinado...– Jovem, não há equipamento nem treino que valha quando a natureza reclama por vidas. A sua manobra foi audaz, talvez por isso esteja com sorte. Agarre o cabo e salve-se.– Quem tem por missão salvar sou eu – protestei.– Mais uma razão para se salvar. Para que possa salvar outros.Olhei profundamente nos olhos daquele Homem e vi uma determinação firme, não, não valia a pena argumentar mais, ele não iria aceitar trocar a vida dele pela minha. Prendi o cabo ao arnés e tentei dissuadi-lo mais uma vez.– Olhe só vou se levar todos os meus camaradas juntos, como esse cabo não pode com os 5, salve-se você.Dito isto empurrou-me e voltou para junto dos outros. O guincho içou-me e com um nó na garganta vi-os desaparecer um por um no meio das vagas.Quero dedicar esta ficção a todos os intervenientes nesta tragédia e prestar a minha sincera homenagem às verdadeiras personagens cujas acções reproduzi ficcionando pensamentos e palavras.


Está um temporal horrível! O céu adivinha-se cor do chumbo, as gotas de água parecem do tamanho de tangerinas, o vento uiva nas pás do helicóptero. Tem sido uma noite agitada, meia-dúzia de barcos estão em dificuldade de Norte a Sul do país, o mais grave é o River Gurara, um cargueiro nigeriano de 175 metros, que embateu no Cabo Espichel. O sol está preste a nascer e temos de fazer o briefing e partir para lá.A situação parece ser caótica, o mar está feito num cão, o vento é fortíssimo e o barco partiu-se ao meio com a força do mar. Olho para o calendário – 26 de Fevereiro de 1989. Este dia ainda vai ser lembrado, não sei se pelo bem se pelo mal ou se por ambos, mas tenho a certeza que vai ser uma data que será recordada por mais de 20 anos.Dirijo-me para o helicóptero, o velho Puma não se faz rogado e levanta no meio daquele temporal sem um queixume. Olho para o piloto, a minha vida depende dele, já estou habituado, mas hoje o tempo está assustador, ele está tranquilo, seguro, transmite-me essa sensação, sinto-me calmo e tranquilo.Levantamos e partimos para o Cabo Espichel. A viagem foi horrível, das piores da minha vida.– Agora sei como se sente a roupa dentro da máquina – graceja o operador do guincho.Os nervos aumentam à medida que nos aproximamos, vislumbro um destroço com 4 homens agarrados, pobres diabos, estão a passar o pior momento da vida deles. Preparo o equipamento e abro a porta à espera de ordem para descer.Chegou o momento, os nervos desaparecem, lanço-me no vazio preso por um fino cabo de aço e desço na direcção daqueles infelizes. Uma figura sobressai, parece ser o capitão, tenta manter os outros equilibrados e juntos. Continuo a descer, sou sacudido violentamente pelo vento. É impossível alcançá-los, uma, outra e mais outra tentativa falhada e lá embaixo o capitão mantém os homens agarrados. O altruísmo dele deixa-me rendido, num acto impensado solto o cabo e lanço-me ao mar, a manobra resulta pois livre do peso, o cabo alcança o capitão que o agarra. Está salvo! Consegui!O homem atira-se ao mar agarrado ao cabo e vem ter comigo.– Você é doido! Tome lá o seu cabo! Salve-se você, se alguém tem de morrer aqui somos nós.– Eu tenho um fato e equipamento, posso sobreviver mais tempo que vocês. Além disso estou treinado...– Jovem, não há equipamento nem treino que valha quando a natureza reclama por vidas. A sua manobra foi audaz, talvez por isso esteja com sorte. Agarre o cabo e salve-se.– Quem tem por missão salvar sou eu – protestei.– Mais uma razão para se salvar. Para que possa salvar outros.Olhei profundamente nos olhos daquele Homem e vi uma determinação firme, não, não valia a pena argumentar mais, ele não iria aceitar trocar a vida dele pela minha. Prendi o cabo ao arnés e tentei dissuadi-lo mais uma vez.– Olhe só vou se levar todos os meus camaradas juntos, como esse cabo não pode com os 5, salve-se você.Dito isto empurrou-me e voltou para junto dos outros. O guincho içou-me e com um nó na garganta vi-os desaparecer um por um no meio das vagas.Quero dedicar esta ficção a todos os intervenientes nesta tragédia e prestar a minha sincera homenagem às verdadeiras personagens cujas acções reproduzi ficcionando pensamentos e palavras.

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