Ainda há lodo no cais: Videotas

01-10-2009
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Sempre evitei pronunciar-me sobre o triste desaparecimento de Madeleine McCann e continuarei a não o fazer. É um caso de polícia e, como tal, não me parece que possa especular-se com senso. Há, todavia, dois aspectos que não posso deixar escapar, pois já assim actuara em 2002 (defesa da minha tese de mestrado) , 2004 (edição do livro a que aquela deu origem) e passim em diversas intervenções: falo da cultura mediática e da mediocridade intelectual que, à míngua de uma escola moderna e de uma classe política capaz de pedagogia (saindo de entre os eleitores, os políticos estão, de igual modo, em versão pop), se foram instalando. A televisão é causa de adormecimento do pensamento (Sartori fala em "Homo Videns" e João de Almeida Santos do "Homo Zappiens") e a Internet fracciona-nos, podendo levar-nos, já que não há uma ética concebida à dimensão da pós-modernidade em que vivêmos, a ignorar problemas ou até a nutrir perversões. Além disso, ao mesmo tempo que dão informação, causam sobre-informação (estima-se que uma edição de domingo do New York Times forneça mais informação do que a que estaria acessível a um homem culto do século XVIII, durante toda a sua vida*), levando-nos a, na impossibilidade de escolher o certo e o errado, vogar ao sabor de empresas que, além de informar, gostam de lucrar, nem que seja manipulando as emoções para o indulto, num dia, e para a condenação, no outro, fazendo com habitemos um mundo em que um sujeito que esteja debaixo dos holofotes se encontre perante a discricionaridade a que estavam submetidos os gladiadores de Roma, embora, agora, perante um "César mediatico". Se mais provas fossem necessárias, bastou ver a triste figura que, ontem, dezenas de populares fizeram, apupando a mãe de Maddy, pelo simples facto de os media anunciarem que podia ser constituída arguida, como veio, aliás, a suceder com ambos os progenitores. Independentemente do desfecho do caso, se sempre achei exageradas as manifestações de solidariedade nas missas, acho estúpida a vaia de ontem. Mostra a pobreza de espírito dos consumidores da nova (in)cultura mediática e prova a irresponsabilidade das empresas de comunicação social e dos políticos e a ineficácia, neste domínio, das universidades. *Cito, com tradução nossa, não a Wikipédia :))) , mas sim Donald Wood ("Post-Intellectualism and the Decline of Democracy (The Future of Reason and Responsability in the Tweentieh Century)", Westport, Connecticut, Londres, Praeger Publishers, 1996).


Sempre evitei pronunciar-me sobre o triste desaparecimento de Madeleine McCann e continuarei a não o fazer. É um caso de polícia e, como tal, não me parece que possa especular-se com senso. Há, todavia, dois aspectos que não posso deixar escapar, pois já assim actuara em 2002 (defesa da minha tese de mestrado) , 2004 (edição do livro a que aquela deu origem) e passim em diversas intervenções: falo da cultura mediática e da mediocridade intelectual que, à míngua de uma escola moderna e de uma classe política capaz de pedagogia (saindo de entre os eleitores, os políticos estão, de igual modo, em versão pop), se foram instalando. A televisão é causa de adormecimento do pensamento (Sartori fala em "Homo Videns" e João de Almeida Santos do "Homo Zappiens") e a Internet fracciona-nos, podendo levar-nos, já que não há uma ética concebida à dimensão da pós-modernidade em que vivêmos, a ignorar problemas ou até a nutrir perversões. Além disso, ao mesmo tempo que dão informação, causam sobre-informação (estima-se que uma edição de domingo do New York Times forneça mais informação do que a que estaria acessível a um homem culto do século XVIII, durante toda a sua vida*), levando-nos a, na impossibilidade de escolher o certo e o errado, vogar ao sabor de empresas que, além de informar, gostam de lucrar, nem que seja manipulando as emoções para o indulto, num dia, e para a condenação, no outro, fazendo com habitemos um mundo em que um sujeito que esteja debaixo dos holofotes se encontre perante a discricionaridade a que estavam submetidos os gladiadores de Roma, embora, agora, perante um "César mediatico". Se mais provas fossem necessárias, bastou ver a triste figura que, ontem, dezenas de populares fizeram, apupando a mãe de Maddy, pelo simples facto de os media anunciarem que podia ser constituída arguida, como veio, aliás, a suceder com ambos os progenitores. Independentemente do desfecho do caso, se sempre achei exageradas as manifestações de solidariedade nas missas, acho estúpida a vaia de ontem. Mostra a pobreza de espírito dos consumidores da nova (in)cultura mediática e prova a irresponsabilidade das empresas de comunicação social e dos políticos e a ineficácia, neste domínio, das universidades. *Cito, com tradução nossa, não a Wikipédia :))) , mas sim Donald Wood ("Post-Intellectualism and the Decline of Democracy (The Future of Reason and Responsability in the Tweentieh Century)", Westport, Connecticut, Londres, Praeger Publishers, 1996).

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