Filho do 25 de Abril: 710. Balanço Provisório das Presidenciais 2006

21-05-2009
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Começa a chegar a hora certa para fazer um balanço - ainda que provisório - do que já aconteceu até agora nesta campanha eleitoral.Uma eleição com estas características, ou seja, muito personalizada, é sempre uma campanha muito diferente de qualquer outra das que costumam realizar-se em Portugal. E aproveito já esta deixa para sublinhar que houve um candidato que não percebeu ou não quis perceber as características deste tipo de eleições. Falo de Francisco Louçã. Não é que as questões que este candidato trouxe a debate não sejam importantes mas eram as mesmas de outras eleições, ditas com o mesmo tom, feitas não à procura de consensos - como o cargo obriga - mas à procura de rupturas como se esta eleição fosse uma eleição ideológica, algo que nunca chegou a ser.Depois temos o candidato que, qual Dom Quixote, procura encaixar o seu quadrado no rectângulo português, ilhas incluídas. A campanha de Manuel Alegre teve várias fases e beneficiou do seu ar sereno e constante ao longo do tempo. Numa primeira fase enredou-se em falsos sinais de independência com toques visíveis de revanchismo. Ao querer colocar-se ao centro quando o eleitorado identificava-o como a reserva de esquerda do PS fez um erro táctico e se adicionarmos a isso a sua não comparência na votação do Orçamento fica explicada a sua queda nas intenções de voto no final de 2005. Mas o ano de 2006 fez bem a este candidato por mérito próprio mas também porque a estabilidade de Cavaco nas sondagens desmobilizou o voto útil - que não tem lógica nestas eleições mas que é um factor a ter em conta - e concentrou nele um voto de protesto. Aqui jaz uma das incongruências da campanha, ou seja, Alegre surge como o homem que não está no sistema apesar de sempre ter lá estado e de o ter criado também à sua imagem. Manuel Alegre encontrou, já em 2006, o tom certo para a sua campanha e está em franca recuperação.Mário Soares, por outro lado, sofreu do problema que a esquerda tem sofrido sempre que Cavaco Silva concorre. Ninguém, eu incluído, percebe a atracção que Cavaco Silva provoca num certo tipo de eleitorado e Mário Soares certamente nunca vai perceber isso. Com o seu passado - brilhante a todos os níveis - não precisava ter feito uma campanha, ao mesmo tempo, tão defensiva quanto à sua pessoa (um dia ainda vou escrever com mais pormenor sobre a questão da idade em Portugal) e tão agressiva quanto ao outro candidato. Pareceu um candidato crispado quando foi, em toda a sua vida política, um político moderado. É pena porque, na minha opinião, é dos poucos candidatos que tem uma visão mais alargada dos problemas - e não tão vaga ou técnica como outros candidatos, no plural - e dos poucos que consegue contextualizar os problemas no grande quadro e não só na pequena mercearia. Também é o único candidato que, na minha opinião, sabe ler e entender o papel que o Presidente da República deve ter. O seu debate com Cavaco Silva foi esclarecedor em dois pontos, ou seja, ao mesmo tempo mostrou que Cavaco é um deserto de ideias mas também mostrou que não esteve preocupado em expor as suas. Pensou, talvez, que uma vida inteira no palco político bastava para que soubessem o que pensa esquecendo-se que precisamos, em todos os momentos, de sermos mobilizados. Cavaco Silva é como uma caixa de chocolates, nunca sabemos o que vamos tirar de lá. A sua postura perante a vida - não só a política - merece o meu maior respeito. Sempre o considerei uma pessoa séria, mesmo nos momentos em que aceitava ir a convite da Nestlé a óperas no estrangeiro. Desenganem-se aqueles que pensam que Cavaco não é um político e será, porventura, dos mais profissionais que conheço. Aparece na hora certa - a mais tardia possível - e comporta-se como qualquer gestor de imagem gosta, ou seja, não comete erros porque segue em linha recta - hirto e firme - como uma máquina que coloca uma peça numa engrenagem vezes sem conta. Por isso mesmo Cavaco é uma figura enigmática, porventura o político mais misterioso da nossa democracia. Ninguém conhece-lhe um excesso, uma ideia ou um impulso. Mesmo na sua profissão é um economista que não arrisca, não reflecte, não inova. E, ao mesmo tempo, parece-se tanto com qualquer um de nós. E é dessa imagem, do self made man, do homem pobre que lutou, do homem que é a essência do nosso Portugal esquecido que pode estar a explicação para os sucessivos sucessos políticos de alguém que não é bom orador, que não diz nada de novo, que não tem luz própria. A sua própria ignorãncia perante a cultura dá-lhe um ar menos elitista, mais humilde e, estranhamente, funciona a seu favor na identificação com o homem comum (que também não sabe “quantos Cantos tem os Lusíadas, ou que Thomas Moore e Thomas Mann, não são a mesma pessoa, nem parentes, nem viveram na mesma época” - Anónimo dixit). Cavaco fez, sem dúvida, a campanha perfeita porque soube falar para o português que está sem esperança, que está desempregado, que está inseguro, que não compreende os novos desafios. Não mobiliza ninguém pela positiva, mas sabe assustar porque foi sempre ele que avisou que as desgraças iam chegar um dia. Ele que é apenas um homem comum, que não é socialista mas canta a 'Grândola, Vila Morena', que não é comunista mas sabe que O Povo é quem mais ordena, que não é liberal mas que defende mercados liberais, que não é social democrata mas que não quer que sectores estratégicos da economia saiam de Portugal e aconselha ao Governo a criar mais Secretarias para controlar o tal mercado liberal! Quem é Cavaco Silva? É o homem que ganha eleições por razões que são tão distintas que se tornam rivais... é o homem do passado que não inova mas que não deixa as coisas piorarem... é o homem seguro que por não arriscar não erra (se não considerarmos, claro, que não arriscar é errar)... é o nosso mais puro reflexo!Deixei para o fim Jerónimo de Sousa! Não foi por acaso! Apesar da sua candidatura nascer dum comité central e apesar das suas ideias para Portugal estarem a precisar duma clara actualização é um homem que irradia simpatia. É impressionante como Jerónimo de Sousa tem invertido a queda do PCP e isso tem uma explicação muito simples, ou seja, quando ouço Jerónimo a falar noto uma convicção que vem do fundo da sua agnóstica - presumo - alma! Mesmo sem concordar com o que defende e mesmo sendo incapaz de assinar por baixo a maioria das suas propostas, estou a aprender a gostar dum estilo de autenticidade que parecia extinto na nossa política! Não deixa, porém, de ser uma candidatura com objectivos que não estão em sintonia com o que está em discussão nesta campanha.

Começa a chegar a hora certa para fazer um balanço - ainda que provisório - do que já aconteceu até agora nesta campanha eleitoral.Uma eleição com estas características, ou seja, muito personalizada, é sempre uma campanha muito diferente de qualquer outra das que costumam realizar-se em Portugal. E aproveito já esta deixa para sublinhar que houve um candidato que não percebeu ou não quis perceber as características deste tipo de eleições. Falo de Francisco Louçã. Não é que as questões que este candidato trouxe a debate não sejam importantes mas eram as mesmas de outras eleições, ditas com o mesmo tom, feitas não à procura de consensos - como o cargo obriga - mas à procura de rupturas como se esta eleição fosse uma eleição ideológica, algo que nunca chegou a ser.Depois temos o candidato que, qual Dom Quixote, procura encaixar o seu quadrado no rectângulo português, ilhas incluídas. A campanha de Manuel Alegre teve várias fases e beneficiou do seu ar sereno e constante ao longo do tempo. Numa primeira fase enredou-se em falsos sinais de independência com toques visíveis de revanchismo. Ao querer colocar-se ao centro quando o eleitorado identificava-o como a reserva de esquerda do PS fez um erro táctico e se adicionarmos a isso a sua não comparência na votação do Orçamento fica explicada a sua queda nas intenções de voto no final de 2005. Mas o ano de 2006 fez bem a este candidato por mérito próprio mas também porque a estabilidade de Cavaco nas sondagens desmobilizou o voto útil - que não tem lógica nestas eleições mas que é um factor a ter em conta - e concentrou nele um voto de protesto. Aqui jaz uma das incongruências da campanha, ou seja, Alegre surge como o homem que não está no sistema apesar de sempre ter lá estado e de o ter criado também à sua imagem. Manuel Alegre encontrou, já em 2006, o tom certo para a sua campanha e está em franca recuperação.Mário Soares, por outro lado, sofreu do problema que a esquerda tem sofrido sempre que Cavaco Silva concorre. Ninguém, eu incluído, percebe a atracção que Cavaco Silva provoca num certo tipo de eleitorado e Mário Soares certamente nunca vai perceber isso. Com o seu passado - brilhante a todos os níveis - não precisava ter feito uma campanha, ao mesmo tempo, tão defensiva quanto à sua pessoa (um dia ainda vou escrever com mais pormenor sobre a questão da idade em Portugal) e tão agressiva quanto ao outro candidato. Pareceu um candidato crispado quando foi, em toda a sua vida política, um político moderado. É pena porque, na minha opinião, é dos poucos candidatos que tem uma visão mais alargada dos problemas - e não tão vaga ou técnica como outros candidatos, no plural - e dos poucos que consegue contextualizar os problemas no grande quadro e não só na pequena mercearia. Também é o único candidato que, na minha opinião, sabe ler e entender o papel que o Presidente da República deve ter. O seu debate com Cavaco Silva foi esclarecedor em dois pontos, ou seja, ao mesmo tempo mostrou que Cavaco é um deserto de ideias mas também mostrou que não esteve preocupado em expor as suas. Pensou, talvez, que uma vida inteira no palco político bastava para que soubessem o que pensa esquecendo-se que precisamos, em todos os momentos, de sermos mobilizados. Cavaco Silva é como uma caixa de chocolates, nunca sabemos o que vamos tirar de lá. A sua postura perante a vida - não só a política - merece o meu maior respeito. Sempre o considerei uma pessoa séria, mesmo nos momentos em que aceitava ir a convite da Nestlé a óperas no estrangeiro. Desenganem-se aqueles que pensam que Cavaco não é um político e será, porventura, dos mais profissionais que conheço. Aparece na hora certa - a mais tardia possível - e comporta-se como qualquer gestor de imagem gosta, ou seja, não comete erros porque segue em linha recta - hirto e firme - como uma máquina que coloca uma peça numa engrenagem vezes sem conta. Por isso mesmo Cavaco é uma figura enigmática, porventura o político mais misterioso da nossa democracia. Ninguém conhece-lhe um excesso, uma ideia ou um impulso. Mesmo na sua profissão é um economista que não arrisca, não reflecte, não inova. E, ao mesmo tempo, parece-se tanto com qualquer um de nós. E é dessa imagem, do self made man, do homem pobre que lutou, do homem que é a essência do nosso Portugal esquecido que pode estar a explicação para os sucessivos sucessos políticos de alguém que não é bom orador, que não diz nada de novo, que não tem luz própria. A sua própria ignorãncia perante a cultura dá-lhe um ar menos elitista, mais humilde e, estranhamente, funciona a seu favor na identificação com o homem comum (que também não sabe “quantos Cantos tem os Lusíadas, ou que Thomas Moore e Thomas Mann, não são a mesma pessoa, nem parentes, nem viveram na mesma época” - Anónimo dixit). Cavaco fez, sem dúvida, a campanha perfeita porque soube falar para o português que está sem esperança, que está desempregado, que está inseguro, que não compreende os novos desafios. Não mobiliza ninguém pela positiva, mas sabe assustar porque foi sempre ele que avisou que as desgraças iam chegar um dia. Ele que é apenas um homem comum, que não é socialista mas canta a 'Grândola, Vila Morena', que não é comunista mas sabe que O Povo é quem mais ordena, que não é liberal mas que defende mercados liberais, que não é social democrata mas que não quer que sectores estratégicos da economia saiam de Portugal e aconselha ao Governo a criar mais Secretarias para controlar o tal mercado liberal! Quem é Cavaco Silva? É o homem que ganha eleições por razões que são tão distintas que se tornam rivais... é o homem do passado que não inova mas que não deixa as coisas piorarem... é o homem seguro que por não arriscar não erra (se não considerarmos, claro, que não arriscar é errar)... é o nosso mais puro reflexo!Deixei para o fim Jerónimo de Sousa! Não foi por acaso! Apesar da sua candidatura nascer dum comité central e apesar das suas ideias para Portugal estarem a precisar duma clara actualização é um homem que irradia simpatia. É impressionante como Jerónimo de Sousa tem invertido a queda do PCP e isso tem uma explicação muito simples, ou seja, quando ouço Jerónimo a falar noto uma convicção que vem do fundo da sua agnóstica - presumo - alma! Mesmo sem concordar com o que defende e mesmo sendo incapaz de assinar por baixo a maioria das suas propostas, estou a aprender a gostar dum estilo de autenticidade que parecia extinto na nossa política! Não deixa, porém, de ser uma candidatura com objectivos que não estão em sintonia com o que está em discussão nesta campanha.

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